CAPÍTULO IX – UM CURIOSO TESOURO – 9B
Recentemente, muitos investigadores encontraram indicações intrigantes sobre os verdadeiros interesses e motivações de Saunière, espalhados pelo seu domaine. Durante uma das nossas visitas à área, em 1996, fomos acompanhados por Lucien Morgan, um apresentador de televisão e autoridade em tantrismo, que ficou espantado por descobrir que a Torre de Magdala e os baluartes eram construídos segundo os antigos princípios de um certo tipo de rito sexual. Ele acredita que Saunière e o seu círculo secreto praticavam rituais sexuais ocultistas, destinados a facilitar a clarividência, pô-los em contato com os “deuses” – realizando, efetivamente, a Grande Obra dos velhos alquimistas – e assegurar poder e influência materiais.
Edição e imagens: Thoth3126@protonmail.ch
Capítulo 09A – UM CURIOSO TESOURO – Livro“The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de Lynn Picknett e Clive Prince.
http://www.picknettprince.com/
CAPÍTULO IX – UM CURIOSO TESOURO – 9-B
Outros reconheceram indicações de magia sexual: os autores britânicos Lionel e Patrícia Fanthrorpe citam o perito ocultista Bremna Agostini, que afirma que Saunière realizava um ritual mágico sexual conhecido por «Convocação de Vênus», em que participavam Marte Dénarnaud e Emma Calvé. No que respeita a esta investigação, a questão verdadeiramente importante de todas as edificações de Saunière em Rennes-le-Château é a importância que ele atribui a Maria Madalena (representante do feminino sagrado e divino).
Na verdade, a igreja já lhe fora dedicada muito antes de Saunière nascer, mas isso não era mera coincidência, porque ela fora a capela da família local dominante – a de Marie de Nègre. Dada a íntima associação desta família com o Rito Escocês Retificado, a dedicação da igreja parecia ser significativa. Saunière também dera o nome de Madalena à sua torre da biblioteca, e denominou a sua casa segundo aquela em que, de acordo com uma interpretação dos acontecimentos do Novo Testamento, ela vivera com seu irmão Lázaro e a sua irmã Marta. E, de todas as decorações da igreja, foi o baixo-relevo do frontal do altar, representando Madalena, que ele decidiu ser ele mesmo a pintar.
Descobrimos que também mandara fazer uma pequena estátua em bronze de Madalena, que ele colocou no exterior da gruta, junto à igreja. A estátua media menos de um metro e pesava cerca de oitenta e cinco quilos, e era a imagem invertida do baixo-relevo, mas, sob outros aspectos, idêntica. Esta estátua desapareceu há muito tempo, mas André Galaup, um jornalista reformado, de Limoux, tem fotografias dela.
A legenda «Terribilis est locus iste» destaca-se por cima da porta da igreja. Como Keith Prince nos indicou, a frase é do Gênesis 29:17 e relata que Jacob sonha com uma escada pela qual os anjos sobem e descem. Ao acordar, Jacob pronuncia estas palavras. Passa a designar aquele lugar por Betel, significando Casa de Deus. Mas, no Antigo Testamento, Betel transforma-se num centro de poder rival de Jerusalém – dando ao conceito de Betel a conotação de centro religioso alternativo ou rival do «oficial».
Mas na França a implicação é mais óbvia: um dicionário francês define «Betel» como um templo de uma seita dissidente. Poderia ser isto que Saunière estava a tentar comunicar? Curiosamente, os Dossiers Secrets reclamam que Saunière, nos seus últimos anos, planejava implantar «uma nova religião» e empreender uma cruzada por toda a área. A última edificação planejada para o seu «domaine» – a grande torre e o batistério exterior – faziam parte desta ambição.
Decidimos concentrar-nos no que Saunière encontrara quando chegou a Rennes-le-Château e no que pode ter inspirado as suas pesquisas. Pondo de parte a falsa pista dos pergaminhos, a aparente contradição do comportamento de Saunière chamou-nos a atenção. Muitas pessoas pensam que ele tentava deixar indicações na decoração da sua igreja. Contudo, também se sabe que ele destruiu cuidadosamente certas coisas que lá encontrou – especificamente, as inscrições das duas pedras que assinalavam a sepultura de Marie de Nègre. Também as removeu da sepultura, o que sugere que ele desejava obscurecer a sua localização exata.
Como vimos, estas pedras – a pedra vertical e a placa horizontal – foram colocadas na sepultura de Marie de Nègre pelo abade Antoine Bigou, cerca de cem anos antes de Saunière chegar. Mas uma coisa estranha já estava implicada: Bigou erigiu as pedras em 1791 – dez anos depois da morte da mulher que, supostamente, estava na sepultura – ao mesmo tempo que mandava voltar ao contrário a «Pedra do Cavaleiro» da igreja. (O levantamento desta pedra parece ter sido um passo importante da pesquisa de Saunière.)
Há ainda outro indicador de que Saunière estava, de algum modo, seguindo as pegadas de Bigou: antes de ser pároco de Rennes, Bigou exercera o cargo em Le Clat, uma pequena aldeia de montanha, a vinte quilômetros de Rennes. Saunière também fora sacerdote de Le Clat, imediatamente antes de vir para Rennes-le-Château. Poderia Saunière estar procurando alguma coisa relacionada com Bigou e, portanto, com as famílias d’Hautpoul ou de Nègre?
O trabalho de Bigou na sepultura de Marie pode ter sido inspirado pelos acontecimentos na França, que ocorreram entre a morte de Marie e 1791 – o ano que marcou o princípio do terror da Revolução Francesa. Os revolucionários eram hostis à Igreja Católica, e muitas relíquias, ícones e decorações foram destruídos ou saqueados neste período. Curiosamente, pouco depois do seu trabalho em Rennes-le-Château, Bigou, que era contrário à República, atravessou a fronteira e fugiu para Espanha, onde morreu em 1793.
Havia outra coisa estranha no sepultamento de Marie de Nègre. Os senhores de Rennes, a família d’Hautpoul, eram tradicionalmente sepultados na cripta da família, que se diz existir por debaixo da igreja. Então, por que razão o sepultamento de Marie não seguiu esta tradição? Sabemos que a cripta existia, porque ela é referida num registro paroquial que abrange os anos 1694-1726 e que está exposto no museu. Segundo este registro, a entrada para a cripta situa-se no interior da igreja. Contudo, a entrada já desapareceu, embora pareça certo que Saunière a descobriu; talvez os documentos que ele encontrou lhe indicassem o lugar onde devia procurá-la.
Segundo o relato da história de Saunière, registrado pelos irmãos Antoine e Marcel Captier e baseado nas memórias da família, o sacerdote descobrira a entrada para a cripta, por debaixo da Pedra do Cavaleiro, e tinha, de fato, entrado nela. Mas voltara, depois, a ocultar a entrada sob o novo pavimento da igreja, presumivelmente porque não queria que a sua localização fosse conhecida. Antoine Bigou devia ter tido a mesma preocupação, porque foi ele, em 1791 quem mandou voltar a Pedra do Cavaleiro ao contrário. Por que estariam os dois sacerdotes, separados por um século, tão interessados em que mais ninguém entrasse na cripta dos senhores de Rennes-le-Château?
Há uma resposta simples. Se Saunière entrasse na cripta e encontrasse o túmulo de Marie de Nègre, onde, em primeiro lugar ele deveria estar, teria compreendido imediatamente que se passava uma coisa muito estranha: a mulher tinha duas sepulturas. Mas a segunda, a do cemitério, fora lá colocada por Bigou, dez anos depois da morte de Marie. Obviamente, Marie não estava enterrada no cemitério – nesse caso, quem, ou o quê, estava lá enterrado?
Uma hipótese aceitável é que Bigou, presumivelmente devido às convulsões sociais da Revolução de 1789, que o ameaçaram pessoalmente, escondera alguma coisa no cemitério de Rennes-le-Château antes de fugir para Espanha. Mas o que poderia ter sido – outro corpo, um objeto ou documentos de certa natureza? Talvez fosse alguma coisa que Bigou tivesse dificuldade em levar consigo para Espanha ou talvez fosse alguma coisa que, de fato, fazia parte de Rennes-le-Château. Podemos nunca saber, mas parece que Saunière soube, porque ele abriu a sepultura para a procurar. E ele tivera muito interesse em que a mensagem das duas pedras tumulares se perdesse – pelo menos, a da placa horizontal, cuja inscrição ele fez desaparecer. Podia a mensagem dar alguma indicação sobre o que a sepultura, de fato, encerraria?
A inscrição da pedra principal da sepultura de Marie de Nègre apresenta muitos erros, que não podem ser apenas o resultado de um acabamento pouco cuidadoso. Há palavras com erros de grafia, letras suprimidas, espaços que são omitidos ou acrescentados onde não são necessários. Das vinte e cinco palavras da inscrição, nada menos de onze apresentam erros. Alguns parecem bastante inócuos, mas um, em particular, era tão grave que teria causado séria ofensa à família. As palavras finais deveriam apresentar-se como o convencional REQUESTA IN PACE – «descanse em paz» – mas aparecem como REQUIES CATIN PACE. A palavra francesa «catin» é a gíria para «prostituta».
E é reforçada por um erro do nome de família do marido de Marie: D’Hautpoul aparece como DHAUPOUL. Este erro pode não alterar muito o significado, mas consegue chamar a atenção para a palavra. E poule (galinha) é outra designação de prostituta, em gíria; de fato, hautpoul podia significar «grande prostituta» … Do mesmo modo, o nome inscrito na pedra tumular faz eco de temas importantes desta investigação. Chega a ser tentador pensar que Marie de Nègre apenas existiu como nome, e como código de alguma coisa absolutamente espantosa.
Porque Blanchefort, embora seja o nome de um posto de fronteira local, significa «torre branca» ou «branco forte» – um termo alquímico. E «Marie de Nègre» evoca as Madonas Negras, com as suas associações a Maria Madalena, o que é reforçado pela referência de hautpoul a «alta prostituição», a sabedoria da prostituta. Encontramos, novamente, aparentes associações que são sugestivas da sexualidade (do feminino) sagrada e talvez – no contexto de rumores de «tesouro» – dos aspectos sexuais da Grande Obra alquímica. E, ainda mais relevante talvez, há outro erro de grafia na pedra tumular: D’ABLES é representado como D’ARLES. Se é, como suspeitamos, uma referência à cidade de Arles, na Provença, pode evocar o fato de que ela foi um antigo centro do culto de ÍSIS. Seja como for, Arles fica muito próximo de Saintes-Maries-de-la- Mer.
O desenho da segunda pedra da sepultura de Marie de Nègre, a placa horizontal, é mais polêmico porque existem algumas discrepâncias nos vários relatos do desenho, que foram publicados. Segundo a maioria das versões, ele ostenta duas inscrições: a frase – em latim, mas curiosamente inscrita em caracteres gregos – Et in Arcadia ego – e quatro palavras latinas: Reddis Regis Cellis Arcis, cruzando a pedra. O significado da última inscrição não é claro e tem sido tema de várias interpretações diferentes, mas parece referir-se a uma cripta ou túmulo real, talvez associado a Rhedae e/ou à aldeia de Arques. (A palavra Arcis tem muitos significados possíveis, desde palavras relacionadas com a inglesa «arco» a palavras que signifiquem «fechado» ou «interior», ou podia ser simplesmente uma alusão a Arques, quer o seu antigo nome de Archis quer uma transcrição fonética do nome moderno.)
O mote Et in Arcadia ego também se encontra no túmulo do quadro de Nicolas Poussin (1593-1665), Os Pastores de Arcádia, o qual é notavelmente semelhante ao que parece sempre ter existido – sob uma forma ou outra – junto da estrada que, de Rennes-le-Château e de Couiza, conduz a Arques. (A mais recente versão foi dinamitada em 1998, porque o agricultor da terra em que ele se encontrava já não estava disposto a tolerar centenas de turistas que violavam a sua propriedade. Infelizmente, esta medida drástica foi em vão: agora os turistas vêm tirar fotografias do local onde o túmulo se costumava encontrar.)
Diz-se que Saunière trouxera de Paris reproduções de certas pinturas, uma das quais era Os Pastores de Arcádia de Poussin. Esta pintura, datando de cerca de 1640, representa um grupo de três pastores examinando um túmulo, observados por uma mulher que é geralmente considerada como sendo uma pastora. O túmulo ostenta a inscrição latina Et in Arcádia ego, uma frase estranhamente não gramatical que tem sido interpretada de várias maneiras, mas que, geralmente, se considera representar um memento mori, uma reflexão sobre a mortalidade: mesmo na terra paradisíaca da Arcádia, a morte está presente.
Este mote tem uma estreita ligação com a história do Priorado de Sião e figura no brasão da família de Plantard de Saint-Clair. Também se diz, como vimos, que ele foi incorporado na decoração da pedra horizontal da sepultura de Marie de Nègre. O tema da pintura não foi inventado por Poussin, sendo a primeira versão conhecida a de Giovanni Francesco Guercino, cerca de vinte anos antes. Contudo, o homem que encomendou a versão de Poussin, o cardeal Rospigliosi, parece também ter sugerido o tema a Guercino. E a primeira aparição artística da frase é numa gravura alemã do século XVI intitulada O Rei da Nova Sião destronado depois de ter inaugurado a Idade de Ouro… Ao discutir Poussin, é interessante considerar uma carta que o abade Louis Fouquet escreveu, de Roma, a seu irmão Nicolas, superintendente de Finanças de Luís XIV, em Abril de 1656:
[Poussin] e eu planejamos certas coisas de que te falarei em pormenor, brevemente, [e] que te darão, por intermédio de M. Poussin, vantagens que reis teriam grande dificuldade em obter dele, e que, depois dele, talvez ninguém dos séculos vindouros conseguirá recuperar; e o que é mais, seria sem grande despesa mas daria lucro, e estas coisas são tão difíceis de encontrar que ninguém desta terra podia ter agora uma fortuna melhor, nem talvez igual.
Curiosamente, foi Charles Fouquet, irmão de Louis e de Nicolas que, mais tarde, como bispo de Narbonne, assumiu o controle exclusivo da catedral de Notre-Dame de Marceilles durante um período de catorze anos.
A pintura de Poussin tem interesse para os investigadores de Rennes porque a paisagem representada na pintura é muito semelhante à da área que rodeia o lugar do túmulo de Arques, e a própria Rennes-le-Château avista-se à distância. Mas a paisagem, embora semelhante, não é idêntica, o que é considerado por algumas pessoas como prova de que a semelhança é uma coincidência. Mas, na nossa opinião, a paisagem representada por Poussin é suficientemente próxima do original para admitir a possibilidade de ele tentar reproduzir a área circundante de Rennes.
Mas a intriga adensa-se: sabe-se que o túmulo de Arques data apenas dos primeiros anos do século XX. Foi construído em 1903 pelo proprietário de uma fábrica local, Jean Galibert, e vendido depois a um americano chamado Lawrence. No entanto, segundo alguns rumores, este túmulo limitou-se a substituir uma versão anterior que existira no mesmo lugar, a qual, por sua vez, substituíra a que existia anteriormente. O nosso amigo John Stephenson, que vivia há muitos anos nesta área, confirmou que os habitantes locais dizem que «sempre existiu um túmulo naquele lugar».
Assim, é possível que Poussin se tivesse limitado a pintar o que vira naquele lugar. John Stephenson também nos informou de que a ligação com a pintura de Poussin era conhecida na área, há muito tempo, o que certamente contraria a ideia dos céticos de que essa associação foi uma invenção dos anos 60 ou 70. O lugar foi sempre considerado muito importante para estudiosos do ocultismo e do feminino sagrado.
Também tem sido afirmado que o mote Arcadia foi adotado por Plantard de Saint-Clair e pelo Priorado de Sião apenas no século XX, tal como a suposta ligação com a pintura de Poussin e o túmulo de Marie de Nègre. Mas a frase já fora associada à área, muito antes da época de Saunière. Em 1832, um certo Auguste de Labouïse-Rochefort escreveu um livro intitulado Voyage à Rennes-le-Bains, que incluía referências a um tesouro oculto, associado a Rennes-le-Château e a Blanchefort. Labouïse-Rochefort escreveu outro livro, Les Amants, à Èléonore (Os Amantes, para Eleonore), que incluía a frase Et in Arcádia ego na página do título.
Localmente, o túmulo é conhecido por «túmulo de Arques», o que, embora seja mais exato que «túmulo de Poussin», ainda não é exatamente verdadeiro, porque a aldeia de Arques fica a três quilômetros, para leste, na estrada principal. Embora o túmulo esteja muito mais próximo da aldeia de Serres, a palavra Arques é demasiado semelhante a Arcádia para não ser explorada.
Segundo Deloux e Brétigny, no seu livro Rennes-le-Château: capitale secrète de l’histoire de France, a placa da pedra tumular de Marie de Nègre foi, de fato, colocada na sua sepultura pelo abade Bigou, retirada de uma versão anterior do túmulo de Arques. Admitindo que sim, isto cria uma possibilidade intrigante. Poderia Poussin ter pintado simplesmente uma coisa que, ele de fato, vira comseus próprios olhos – um túmulo com as palavras Et in Arcadia ego nele inscritas?
John Stephenson relatou-nos uma lenda local espantosa, relacionada com o túmulo de Arques: que ele era ou a sepultura de Maria Madalena ou serviria, de algum modo, de marco ou indicador dela – a inscrição na pedra horizontal de Marie de Nègre tinha, de fato, uma seta que partia do centro. Mas, infelizmente, a pedra fora removida, por isso já não sabemos em que direção a seta apontava originariamente.
As provas sugerem que Saunière acreditava que o corpo de Maria Madalena se encontrava em qualquer parte; ou estava nas proximidades de Rennes-le-Château, ou a aldeia proporcionava algum gênero de indicação sobre o seu paradeiro. O que estava escondido no segundo túmulo de Marie de Nègre? A inscrição codificada que, aparentemente, se referia a uma «grande prostituta» indicava, de fato, Madalena? (Talvez o termo pudesse ser interpretado como «Grande-Sacerdotisa», associando, deste modo, o conceito de sexualidade sagrada a práticas ocultistas antigas, e não modernas).
Saunière, certamente, parecia andar em busca de alguma coisa especial e poderosa, alguma coisa preciosa que estava relacionada com a sua dileta Maria Madalena – e que podia haver mais precioso que os seus restos mortais? É evidente que isto podia ter sido apenas uma obsessão pessoal da sua parte e talvez ele imaginasse que as relíquias ainda não tinham sido encontradas. Por outro lado, como vimos, Saunière trabalhava para uma mais vasta e misteriosa organização, a qual, provavelmente, o financiava. Esta organização estaria igualmente iludida? Talvez não. A evidência sugere que o sacerdote trabalhava baseado em informação secreta acerca de um objeto real.
A medida que a nossa investigação prosseguia, estávamos cada vez mais convencidos desta hipótese de Madalena, mas depressa descobrimos que – pelo menos, entre os investigadores britânicos deste tema – estávamos sozinhos. Assim, foi encorajador saber que investigadores franceses estavam a seguir a mesma orientação. Para eles, bem como para nós, não era inconcebível que Saunière e os seus misteriosos apoiantes andassem em busca da própria Maria Madalena.
Durante uma das nossas viagens a esta área, na Primavera de 1996, Nicole Dawe organizou um jantar para que conhecêssemos Antoine e Claire Captier, juntamente com Charles Bywaters. Antoine, neto do sineiro que encontrou os documentos que entregou a Saunière, viveu toda a vida com este mistério, assim como Claire, que é filha de Noël Corbu.
Antoine foi franco: não tinha interesse em adensar ainda mais o mistério. «Não vou dizer- lhes o que não sei», era esta a sua maneira de começar a discussão. Afirmou que considerava improvável que lhe fizéssemos alguma pergunta diferente, mas ficou surpreendido quando o interrogamos sobre a possível associação de Saunière ao culto de Madalena – porque este fora um ângulo que tinha sido ignorado até recentemente, mas o nosso interesse nele igualava estranhamente o de certos investigadores franceses.
Antoine informou-nos de que Saunière tinha investigado a lenda de Madalena, tendo, por exemplo, visitado Aix-en-Provence e a área circundante. Esta informação estava prestes a surgir na revista Cep d’Or de Pyla, publicada por André Douzet – o homem que encontrou a maquete já discutida no capítulo anterior – que reside em Narbonne. Douzet e o seu círculo são entusiásticos e competentes investigadores da história esotérica da França. Antoine disse que a próxima edição da revista «será interessante para vós… porque encontrarão alguma coisa mais profunda relativamente a Madalena».
De novo graças a Nicole, conhecemos André Douzet, que nos informou de que ele e outros, especialmente Antoine Bruzeau, tinham começado a investigar o interesse de Saunière por Madalena – mas parecia que a chave do mistério se encontrava a alguma distância de Rennes-le-Château. André não fora, inicialmente, atraído pelo mistério de Saunière, mas chegara até ele por um caminho indireto: certos lugares que o interessavam, na sua cidade natal de Lyons, tinham-no conduzido até ali.
A associação remonta a Gérard de Roussillon – que no século IX fundara a abadia de Vézelay, na Borgonha, para onde, foi afirmado mais tarde, levara o corpo de Maria Madalena. Lembramos (consultar o Capítulo III) que esta reivindicação foi ultrapassada, mais tarde, por St. Maximin da Provença, quando os monges de Vézelay não conseguiram apresentar as relíquias. Também recordemos que este acontecimento levou Charles II d’Anjou a empreender uma busca febril, convencido de que os restos mortais de Madalena ainda se encontravam em qualquer parte da Provença.
Gérard de Roussillon era conde de Barcelona, de Narbonne e da Provença – uma vasta região. A sua família também tinha propriedades na região de Le Pilat – agora, o Parque Nacional de Le Pilat -, a sul de Lyons. Eram fervorosos devotos de Madalena, e a área era um centro do seu culto. (Uma capela de Sainte-Madaleine, na região de Le Pilat, conservava as supostas relíquias de Lázaro.)
No século XIII, o conde reinante, Guillaume de Roussillon, morreu nas Cruzadas e a sua pesarosa viúva, Béatrix, retirou-se para as colinas de Le Pilat, onde fundou um mosteiro cartuxo, Sainte-Croix-en-Jarez, onde viveu o resto da sua vida. Mas, depois disso, o mosteiro parecia ter uma estranha associação com Maria Madalena.
Antoine Bruzeau afirma que a família possuíra as verdadeiras relíquias de Maria Madalena e que Béatrix as levara para Sainte-Croix. (Ou talvez ela tivesse simplesmente confiado à abadia o segredo da sua localização.) Ele também sugere que o verdadeiro lugar do desembarque de Madalena em França não foi a Carmargue, mas a costa do Roussillon, num lugar ainda chamado Mas de La Madaleine. De acordo com a sua teoria, ela não vivera o resto da sua vida na Provença, mas no hoje Languedoc-Roussillon – em redor da área de Rennes-le-Château.
Por alguma razão, a família Roussillon sentiu que era seu dever não só conservar as relíquias mas também mantê-las secretas. Isto é muito estranho, numa época em que as relíquias eram tão lucrativas, e sugere que eles tinham motivos diferentes da simples veneração de uma santa do Novo Testamento. Talvez fosse alguma coisa relacionada com o verdadeiro papel de Madalena na vida de Jesus Cristo.
No século XIV, um curioso mural foi acrescentado à abadia de Sainte-Croix, representando Jesus sendo crucificado em madeira viva. Mais tarde, este mural foi coberto de estuque, mas foi redescoberto em 1896 – pouco tempo antes de Saunière, pessoalmente, ter pintado o baixo-relevo do seu altar, representando Madalena a contemplar uma cruz feita de madeira ainda em crescimento.
Mais tarde, no século XVII, um dos frades de Sainte-Croix, Dom Polycarpe de La Rivière, um famoso erudito, empreendeu a recuperação do mosteiro, e talvez tenha descoberto alguma coisa. Ele estava particularmente interessado em Madalena – escreveu um livro acerca dela que, infelizmente, se perdeu, além de um outro sobre a área em redor de Aix-en-Provence, de St. Maximin e de Sainte-Baume, que o Vaticano suprimiu. De la Rivière também estava relacionado com Nicolas Poussin, e a investigação de Bruzeau sugere que ambos faziam parte de uma sociedade secreta conhecida por «Societé Angelique».
Nas colinas de Le Pilat, uma antiga estrada sobe o Mont Pilat até uma capela dedicada a Maria Madalena. A estrada começa na aldeia de Malleval, cuja igreja contém estátuas de St. António de Pádua e de St. Germain, que são idênticas às de Rennes-le-Château. O caminho passa por uma capela dedicada a St. Antônio Eremita – outro santo venerado na igreja de Saunière (e cuja festividade é em 17 de Janeiro). E na capela de Madalena existe um quadro, representando a santa na sua gruta, que é espantosamente semelhante ao de Rennes-le-Château. Bruzeau observa que, no fundo do retábulo de Saunière, há um arco com coluna: em céltico, o primeiro é Pyla; em latim, o segundo é pilla – apontando, foneticamente, para a área de Le Pilat. E os picos representados no horizonte parecem ser os da área circundante de Mont Pilat.
Sempre nos pareceu estranho que, no seu baixo-relevo, Saunière tivesse excluído o elemento mais característico da iconografia de Maria Madalena – o seu vaso de bálsamo santo ou Sainte Baume… Podia ser esta a sua maneira de dizer que as verdadeiras relíquias de Maria Madalena, afinal, não estavam em St. Maximin-le-Sainte-Baume da Provença?
Certamente, a julgar pelas faturas do aluguel de carruagem e cavalos na área de Lyons, em 1898 e 1899, parece que Saunière explorou a área de Le Pilat em busca do que restava da sua dileta Maria Madalena.
A questão primordial é saber por que razão alguém se esforçaria tanto para encontrar o que seria, essencialmente, apenas uma caixa com ossos. Porque, embora os católicos sempre tivessem a mórbida predileção por cadáveres de santos, deve-se recordar que muitos dos que, aparentemente, procuravam os restos mortais de Madalena eram ocultistas ou católicos rebeldes em relação a igreja romana. De qualquer modo, não parecem ter sido pessoas sentimentais e a época das relíquias como grande negócio já passara, há muito tempo – então, por que dedicaram tanto tempo e esforço a esta busca?
Talvez não fosse simplesmente um esqueleto que eles procuravam: talvez julgassem que o caixão, ou túmulo, continha algum segredo, quer alguma coisa relacionada com o próprio corpo quer alguma coisa que estava com ele. Henry Lincoln, presumivelmente com ironia, sugeriu à imprensa francesa que esta «alguma coisa» podia ser a certidão de casamento de Jesus e Maria Madalena.
Falando mais seriamente, o segredo tem de ser alguma coisa semelhante a isso – uma coisa comprovativa e inequívoca que, uma vez tornada pública, causaria um enorme furor e muitos problemas para a igreja de Roma.
Dado o interesse destes grupos específicos, que temos estado a investigar, o segredo tem de ser alguma coisa herética cuja natureza se revelaria profundamente inquietante para a Igreja oficializada. Mas o que teria a possibilidade de provocar esta ameaça? Por que razão uma coisa que tem – presumivelmente – 2000 anos, deveria ter alguma relação importante com a sociedade moderna?
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