Tecendo a Manhã – João Cabral de Melo Neto
"Um
galo sozinho não tece a manhã:
ele precisará sempre de outros galos.
De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro:de outro galo
que apanhe o grito que um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzam
os fios de sol de seus gritos de galo
para que a manhã, desde uma tela tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.”
As Moiras, as filhas do Destino, na mitologia grega, teciam os
destinos humanos da mesma forma como os galos do João Cabral tecem a
manhã...
O galo... o galo do terreiro... o galo da torre dos ventos... o galinho de
Barcelos... o galo de rinha... o símbolo do machismo...
As Moiras eram três irmãs que determinavam os destinos humanos,
especialmente a duração da vida e seu quinhão de atribulações e sofrimentos.
Os galos da minha infância... sempre
cantando... por anos sem conta... noite por noite... tecendo os destinos
humanos... o Rudinei morreu jovem... um caminhão... uma tragédia... a Beta, não
sei... sei lá da Gisele, tão delicada,... o Ivo, já foi... o José, foram muitos
Josés, haverá algum vivo? Não lembro... quem sabe? O Carlinhos... morreu. Dos
poucos que restam, o Juca, está rico... a Verônica, velhinha... a Cleni... em
Brasília... o Joãozinho... imitava o Repórter Esso... dele nada mais sei...
ninguém fala... a Mariazinha... ah, a Mariazinha... dizem que ela sonhava
comigo... mas, me fui para sempre... ganhei o mundo... e os galos... eles
sempre marcando as manhãs... dia após dia, no tempo sem conta...
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