Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Mesdeia - Eugène Delacroix |
O mito de Medeia e
Jasão é de traços muito fortes, chegando mesmo a chocar o leitor. O poeta grego
Eurípides em sua peça de teatro é o primeiro grande escritor a abordar esse mitologema
da mulher apaixonada que toma atitudes extremadas. Depois dele, muitíssimos
narradores, em todos os tempos, voltaram ao tema. Em Roma, o filósofo Sêneca escreve
uma versão maravilhosa desse drama. No Brasil, Chico Buarque Hollanda, escreveu
Gota d’Água, que é nossa Medeia brasileira.
Medeia, no mito
original, é filha do rei da Cólquida (atual República da Geórgia, que fazia parte da antiga União Soviética), uma região junto ao Mar Negro. Medeia é uma maga
de grandes poderes. Jasão, para recuperar seu trono, usurpado por seu tio,
recorre aos poderes dela para cumprir as exigências para recuperar o seu reino, herança paterna.
O tio exigia o “velocino
de ouro”, um pelego de ouro, de propriedade do pai de Medeia, guardado por um
dragão. Medeia trai o pai, indicando a Jasão, que com ela se casara, a forma de
subornar o monstro que guardava o tesouro paterno.
Jasão construíra o
Argo, um barco veloz em que juntara cinquenta dos mais destacados heróis da
Grécia e, juntamente com a amada, partiram para o oriente e raptaram o
velocino.
Medeia tomou consigo
seu irmão Apsirto, que sacrificou e jogava seus membros ao mar, a fim de atrasar o
pai, que os perseguia. Dessa forma, conseguiram evadir-se com a presa.
Medeia - Os Argonautas - Morte de Apsirto - James Draper1904) |
Dirigiram-se, então,
para Corinto, onde passaram a viver, na corte de Creonte, à espera do desfecho do processo. Segundo uma tradição, o casal gerou dois filhos. Segundo outras versões, seriam mesmo três.
Creonte, rei de
Corinto, tinha uma filha, Creúsa, muito mais jovem do que Medeia, que, por seu lado, era mais
velha do que Jasão. Este apaixonou-se pela jovem princesa. Quando informou a
Medeia que iria abandoná-la e casar-se com Creúsa e que o rei dava a ela o
prazo de um dia para abandonar a cidade, Medeia solicitou-lhe que lhe deixasse pelo
menos os filhos, pois ele teria novos descendentes com a futura rainha.
Ele negou-lhe o
pedido, afirmando que seus filhos era o que mais queria sob o céu. Medeia,
então, enviou um vestido magnifico de presente a Creúsa.
Jasão levou os
meninos ao palácio onde se hospedava a mãe para despedirem-se dela.
Medeia - John William Waterhouse |
Começou, então, a
maga sua vingança. Quando a jovem princesa vai experimentar o vestido, este,
por efeitos mágicos, incendeia-se, matando a moça e seu pai e destruindo todo o palácio e os que nele estavam. Ao retornar para junto de Medeia a fim de buscar os filhos, essa o aguarda com uma faca e os
meninos no alto do mezanino, fora do alcance do ex-marido. Ele solicita que ela
poupe as crianças. Ela nega-se a isso e mata-os lentamente para aumentar a tortura do
pai.
O mitologema de
Medeia é uma metáfora da mulher que ama nas máximas proporções que o coração humano
pode permitir. Porém, quando não correspondida ou traída, vinga-se também
nessas máximas proporções.
Trair o pai e matar o
irmão são metáforas que apelam para o seguinte: ela faz o máximo que está ao
seu alcance para auxiliar o seu amado. Matar os filhos é outra metáfora que equivale
afirmar que, traída, vinga-se com a maior força vingativa que pode ser concebida.
Segue uma análise
feita pelo professor Junito Brandão em seu livro Mitologia Grega, volume 3,
páginas de 183 a 203.
4
Atingida a Cólquida,
os argonautas puderam, finalmente, respirar por alguns dias em paz. A grande
tarefa, a conquista do velocino de ouro, cabia ao herói Jasão. Este, de
imediato, dirigiu-se à corte de Eetes, irmão de Circe e Pasífae, e pai de
Calcíope, Medéia e Apsirto, dando-lhe ciência da missão que o trazia à Ásia. O rei,
para livrar-se de um importuno, prontificou-se a devolver-lhe o precioso velocino,
desde que o pretendente ao trono de Iolco executasse quatro tarefas, que, diga-se
logo, nenhum mortal poderia sequer iniciar, a não ser que a grande faísca de
eternidade, o amor, que transmuta impossíveis em possíveis, apareces se! As provas
impossíveis para qualquer ser humano eram as seguintes: pôr o jugo em dois
touros bravios, presentes de Hefesto a Eetes, touros de pés e cornos de bronze,
que lançavam chamas pelas narinas e atrelá-los a uma charrua de diamante;
lavrar com eles uma vasta área e nela semear os dentes do dragão morto por
Cadmo na Beócia, presentes de Atená ao rei; matar os gigantes que nasceriam desses
dentes; eliminar o dragão que montava guarda ao Velocino, no bosque sagrado do
deus Ares.
Girolamo Macchietti - Medeia e Jasão |
Perplexo face às
tarefas impostas, que teriam que ser realizadas num só dia, de sol a sol, o
herói estava pronto para retornar a Iolco, quando surgiu Medéia, mágica
consumada, que, apaixonada por ele, talvez por artimanhas da deusa Hera, comprometeu-se
a ajudá-lo a vencer todas as provas. Sob juramento solene de casamento e de
levá-la para a Grécia, Repetindo-se, desse modo, o episódio de Ariadne e Teseu,
Jasão recebeu de Medéia todos os recursos necessários para uma vitória
completa. Deu-lhe a filha de Eetes um bálsamo maravilhoso com que o herói untou
o corpo e as armas, tornando-os invulneráveis ao ferro e ao fogo.
Recomendou-lhe ainda
que, tão logo nascessem os gigantes dos dentes do dragão, atirasse, de longe,
uma pedra no meio deles. Os monstros começariam a se acusar mutuamente do
lançamento da pedra, o que os levaria a lutar uns contra os outros, até se
exterminarem por completo.
Tudo aconteceu
conforme desejava a paixão de Medéia. Restava apenas vencer o dragão no bosque
de Ares. A mágica fê-lo adormecer com seus sortilégios e Jasão o atravessou com
sua lança, apossando-se do velocino de ouro. Face à recusa de Eetes, que se
negou a cumprir a promessa feita, e ainda ameaçou incendiar a nau Argo, Jasão
fugiu com Medéia, que levara seu jovem irmão Apsirto como refém.
183
Quando o rei
descobriu a fuga de Jasão e Medéia com o velocino, pôs-se imediatamente ao
encalço da nau Argo. Medéia, que previra essa perseguição, esquartejou Apsirto,
espalhando-lhe os membros em direções várias. Eetes perdeu muito tempo em
recolhê-los e, quando terminou a dolorosa tarefa, era tarde demais para
perseguir a "ligeira" nau Argo. Assim, com os membros ensanguentados
do filho, Eetes velejou até o porto mais próximo, o de Tomos, na foz do rio
Íster, e ali os enterrou. Antes de regressar à Cólquida , porém, enviou vários
navios em perseguição dos argonautas, advertindo seus tripulantes de que, se regressassem
sem Medéia, pagariam com a vida em lugar dela. Segundo uma outra versão, Eetes
enviara Apsirto com um exército em perseguição dos fugitivos, mas tendo-se este
adiantado muito, deixando o exército para trás, Jasão o teria assassinado,
traiçoeiramente, com auxílio de Medéia, no templo de Ártemis, na embocadura do
Íster, isto é, do Danúbio inferior.
Seja como for, os
argonautas navegaram em direção ao Danúbio e, subindo o majestoso rio, chegaram
ao Adriático, pois, à época da elaboração dessa variante do mito, o Íster era
considerado como uma artéria fluvial, que ligava o Ponto-Euxino ao Adriático.
Zeus, irritado com a morte de Apsirto, enviou uma grande tempestade, que
desviou a Argo de sua rota. Foi então que a nau começou a falar e revelou a
cólera do deus, acrescentando que esta perseguiria os argonautas, até que
fossem purificados por Circe. Foi assim que a nau subiu o rio Erídano (Pó) e o
Ródano, através da região dos lígures e dos celtas. De lá, retomou o
Mediterrâneo e, costeando a Sardenha, chegou à ilha de Eeia, reino de Circe. A
mágica e tia de Medéia purificou os argonautas e manteve uma longa entrevista
com a sobrinha, mas se recusou peremptoriamente a hospedar Jasão em seu
palácio. Da ilha de Circe, Argo retomou seu curso errante, mas a partir de
então, guiada por Tétis, a pedido de Hera, atravessou sem incidentes maiores o
Mar das Sereias. É que Orfeu entoou ao som de sua lira uma canção tão bela, que
os argonautas não lhes deram a menor atenção ao canto mavioso e mortal. Apenas
Butes se deixou "encantar" e a nado chegou aos rochedos dessas
mágicas antropófagas. Afrodite, todavia, o salvou e transportou para Lilibeu,
na costa ocidental da Sicília. Passando por Cila e Caribdes, chegaram à ilha de
Corcira, hodiernamente Corfu, reino dos Feaces, governado por Alcínoo e sua
esposa Arete. Lá, algo de sério e grave aguardava os argonautas. Uma nau,
enviada por Eetes, em perseguição aos fugitivos, chegara antes de Argo à ilha
de
184
Alcínoo. Os súditos
de Eetes, sobretudo porque estavam com a vida em jogo, pressionaram
violentamente o rei, para que lhes entregasse Medéia. O soberano, após
consultar Arete (ao que parece, como se pode observar "mais tarde" na
Odisseia, o regime vigente em Corcira era bem matriarcal), respondeu-lhes que entregaria
a filha de Eetes, desde que ela, uma vez examinada, ainda fosse virgem. Mas, se
a mesma já fosse mulher de Jasão, deveria permanecer com ele. Arete,
secretamente, fez saber a Medeia a decisão do casal real e Jasão se apressou em
fazer da noiva sua mulher. Desse modo, Medéia permaneceu com o esposo. Os
nautas da Cólquida, não ousando retornar à pátria, radicaram-se em Corcira e os
argonautas retomaram os caminhos do mar. Tão logo deixaram a ilha dos Feaces,
violenta borrasca os lançou contra os Sirtes, dois perigosos recifes na costa
norte da África. Tiveram, com isso, que transportar sobre os ombros a nau Argo
até o lago Tritônis. Graças ao deus do Lago, Tritão, os destemidos marinheiros
encontraram uma saída pelo mar e navegaram em direção a Creta. Na ilha de
Minos, os nautas de Argo foram, a princípio, impedidos de desembarcar pelo
monstruoso gigante Talos, de que se falou no Vol. I, p. 175, só o conseguindo
graças aos sortilégios de Medéia, que, tendo descoberto o ponto vulnerável do
corpo do monstro, provocou-lhe a morte. Para agradecer a vitória sobre Talos,
ergueram um santuário a Atená Minoica e, ainda pela manhã, voltaram ao bojo
macio do mar. Repentinamente, porém, foram envolvidos por uma noite escura e
misteriosa e ninguém mais tinha noção de onde estava. Jasão implorou Febo
Apolo, para que lhes mostrasse a rota em meio à total escuridão. O deus
ouviu-lhe a súplica e lançou uma fresta de luz que, como um farol, guiou a nau
Argo até uma das ilhas Espórades, onde lançaram âncora. A essa ilha deram o nome
de Ἀνάφη
(Anáphe), nome interpretado em etimologia popular como ilha da
"Revelação". A derradeira escala de Argo foi na ilha de Egina. Daí,
contornando a ilha de Eubéia, chegaram finalmente a Iolco, completando um
périplo de quatro meses. De imediato, Jasão levou a nau Argo para Corinto e a
consagrou a Posídon, como ex-voto.O mitologema de Jasão e dos argonautas, cuja
redação é anterior à da Odisseia, como se depreende das palavras de Circe a
Ulisses, ao descrever-lhe o perigo que representavam as Πλαγκταί (Planktái), as
Planctas Odiss. XII, 59-61),
185
(os
ameaçadores recifes errantes, que só a altaneira nau Argo, que todos celebram,
conseguiu atravessar, em seu regresso do reino de Eetes (Odiss. XII, 69-70),
acabou por tornar-se muito popular, formando um vasto ciclo. Como os poemas
homéricos, as gestas dos bravos argonautas serviram de matéria-prima a poemas
épicos como as Argonáuticas, em quatro cantos, do poeta da época alexandrina
Apolônio de Rodes (295-215 a.C.) e Argonáutica, igualmente poema épico, em oito
cantos, do vate latino da época imperial, século I, p. C, Caio Valério Flaco
Setino Balbo150 , a poemas de cunho lírico, como as cartas 6 e 12 das Heroides
de Ovídio e as tragédias, como a portentosa Medéia de Eurípides (séc. V a.C.).
5
Jason entrega a Pélia o Tosão de Ouro - Apulie, v. 340 av. J.-C. Musée du Louvre. |
Consagrada, em
Corinto, a nau Argo a Posídon, Jasão retornou a Iolco e entregou o velocino de
ouro a Pélias. A partir desse momento são muitas as tradições e variantes.
Afirmam alguns mitógrafos que Jasão assumiu o poder em Iolco, em lugar do tio,
e viveu tranquilamente em seu reino, tendo com Medeia apenas um filho, Medeio,
conforme a Teogonia, 1001, o qual foi entregue aos cuidados de Quirão. Outros
atribuem-lhe uma filha, Eriópis, a de "olhos grandes".
A tradição trágica
nomeia dois, Feres e Mérmero. Diodoro aumenta o número para três: Téssalo,
Alcímenes e Tisandro.
A versão mais
seguida, no entanto, é a que aponta Medéia como a grande "vingadora de
Iolco". A mola mestra da ação criminosa da mágica da Cólquida seria seu
amor por Jasão. Pélias lhe ofendera gravemente o marido: usurpara o trono, que
de direito lhe pertencia; induzira-lhe o pai Esão ao suicídio, obrigara-o a
buscar o velocino de ouro e, conforme algumas versões, recebido este,
recusara-se a devolver-lhe o trono, como havia prometido.
Para vingar os crimes
e ultrajes de Pélias, a terrível mágica resolveu eliminá-lo. Convenceu as
filhas do usurpador, menos a 150. O poeta latino da época dos Flávios,
CaioValério Flaco (45-88 p. C, datas prováveis), deixou incompleto seu poema
épico Argonáutica, que possivelmente abrangeria dez ou doze cantos. Chegaram
até nós oito cantos (5.593 versos hexâmetros), mas o oitavo se interrompe
bruscamente no meio, exatamente no verso 467, no momento da fuga de Jasão e
Medéia. A respeito do poeta escreveu Quintiliano (Inst. Or. 10,1): Multum
in Valerio
Flaco nuper
amisimus, "recentemente
perdemos muito com a morte de Valério Flaco", testemunho que, de um lado,
mostra que o poeta deve ter falecido durante o reinado de Vespasiano e, de
outro, que a obra de Valério não era considerada, como por vezes se apregoa uma
fria imitação de Apolônio de Rodes.
186
Alceste, ainda muito
menina, de que poderiam facilmente rejuvenescer o pai, já muito avançado em
anos, se o fizessem em pedaços e o deitassem a ferver num caldeirão de bronze
em meio a uma composição mágica, cujo segredo somente ela conhecia. Para provar
sua arte, Medéia tomou um velho cordeiro (outros afirmam que foi Esão) e,
usando o processo acima descrito, transformou-o num cordeirinho ou o velho pai
de Jasão num Esão jovem e robusto. As pelíades, sem hesitar, despedaçaram o pai
e cozinharam-lhe os pedaços, conforme a receita de Medéia.
Como Pélias não
ressuscitasse, transidas de horror, fugiram para a Arcádia.Com a morte do rei,
Jasão e Medéia, com os filhos do casal, Feres e Mérmero, foram banidos de Iolco
por Acasto. Há uma variante, segundo a qual, Medéia, disfarçada numa
sacerdotisa de Ártemis, deixou sozinha a nau Argo e dirigiu-se a Iolco. Tendo
convencido as filhas de Pélias a cozinhar-lhe os membros, fez vir Jasão, que
entregou o trono a Acasto, uma vez que este o acompanhara, contra a vontade do
pai, na perigosa expedição dos argonautas. A seguir tal versão, o exílio em
Corinto foi voluntário. Eetes, filho de Hélio e da oceânida Perseida, recebera
do pai o reino de Corinto, mas deixou o trono vacante para reinar na Cólquida,
cuja capital era Fásis, às margens do rio do mesmo nome. Eetes se casara com
Eurilite ou com a nereida Neera, com a oceânida Idíia ou ainda, segundo algumas
versões, com sua própria sobrinha, a terrível Hécate. Seja como for, filha de
Hécate ou sobrinha de Circe, Medeia conhecia profundamente os segredos da
bruxaria e dos sortilégios."
À época" em que
se passa o "drama de Medéia", Corinto é governada por Creonte, filho
de Liceto, que é preciso não confundir com o segundo Creonte, o tebano, filho
de Meneceu, e irmão da infortunada Jocasta. Jasão e Medéia, expulsos de Iolco,
viviam em paz em Corinto, quando o rei Creonte concebeu a idéia de casar sua
filha Glauce ou Creúsa com o herói dos argonautas. Jasão, sem tergiversar,
aceitou o enlace real e repudiou Medéia, que foi banida de Corinto pelo próprio
soberano. Implorando-lhe o prazo de um só dia, sob o pretexto de se despedir
dos filhos, a feiticeira da Cólquida teve tempo suficiente para preparar a
mortal represália. Enlouquecida pelo ódio, pela dor e pela ingratidão do
esposo, resolveu vingar-se
187
Tragicamente,
enviando à noiva de Jasão, por intermédio de seus filhos Feres e Mérmero, um
sinistro presente de núpcias. Tratava-se de um manto ou de um véu e de uma
coroa de ouro, impregnados de poções mágicas e fatais. A própria Medéia, na
tragédia homônima de Eurípides151, deixa bem claro o poder terrível
de semelhantes adornos: Se ela aceitar estes atavios e com eles se engalanar,
perecerá horrivelmente e, com ela, quem a tocar: tal o poder dos venenos com
que ungirei meus presentes (Med. 787-789)
Vaidosa, Glauce, sem
hesitar, não apenas aceitou, mas igualmente se ataviou com o lindíssimo véu e a
coroa de ouro, prenúncio da coroa real, que, em breve, luziria sobre sua fronte
jovem e bela...
A princesa, todavia,
teve apenas tempo de se ornamentar. De imediato, um fogo misterioso começou a
devorar-lhe as carnes e os ossos. O rei, que correra em socorro da filha, foi
envolvido também por esse incêndio inextinguível, que os transformou
rapidamente num monte de cinzas.
Não parou aí a
vindita louca da filha de Eetes. Também os filhos morrerão pelas mãos da
própria mãe, para que Jasão sofra uma solidão mais aterradora do que aquela que
lhe desejara: Mas aqui mudo minha maneira de falar e gemo sobre o que terei de
fazer a seguir: matarei meus filhos queridíssimos e ninguém pode salvá-los.
E, quando tiver
aniquilado toda a família de Jasão, sairei desta terra, expulsa pelo
assassinato de meus filhos queridos, e pelo crime horrendo que tiver ousado
cometer. (Med. 790-796).
Mortos Creonte e
Creúsa e incendiado o palácio real, Medéia assassinou os próprios filhos no
templo de Hera e, num carro alado, presente de seu avô Hélio, o Sol, puxado por
dois dragões ou duas serpentes monstruosas, fugiu para Atenas.
Este exílio na pólis de Palas Atená, prodigalizado
por Egeu, conforme se mostrou no capítulo anterior, acabou igualmente de
maneira dolorosa para o rei de Atenas e para a própria princesa da Cólquida. É
que Medéia, em tudo que fazia, sempre colocou a paixão como fio condutor de
suas ações. Ela própria o afirma na tragédia euripidiana: 151. Veja-se a
análise que fizemos desta tragédia de Eurípides em Teatro Grego: Tragédia e
Comédia. Petrópolis, Edit. Vozes, 3ª ed. 1985, p. 63sqq.
188
θυμὸς
δὲ
κρείσσων τῶν ἐμῶν
βουλευμάτω (thymòs dè kreísson tôn emôn buleumáton) — a paixão é mais forte em mim do que a razão
(Med. 1.079)ν͵ Existe uma versão segundo a qual a morte dos
filhos pela própria mãe teria sido uma "criação" de Eurípides. Na
realidade, a tradição mais seguida no mito é a de que Feres e Mérmero teriam
sido lapidados pelos habitantes de Corinto pelo fato de terem levado a Glauce
os presentes fatídicos de Medeia.
O drama de Medeia - Anselm Feuerbach |
Uma variante, certamente tardia, atesta que Medeia,
após matar, na Cólquida, a seu tio Perses e repor Eetes no trono, segundo se
viu igualmente no capítulo anterior, não teria morrido; mas transportada para
os Campos Elísios ou para a Ilha dos Bem-Aventurados, se teria consorciado com
o divino Aquiles. É bem verdade que, após gravitar na Odisseia entre os ἕλοιμι (eídola)
abúlicos do Hades, o grande herói da Ilíada fora também promovido à Ilha dos
Bem-Aventurados. Aí o encontramos casado ora com Ifigênia ora com Helena (e
mais uma vez o pacífico Menelau ficou solitarius)
ou ainda com a filha de Hécuba, Políxena, imolada sobre o túmulo do herói, mas
sua união com Medéia é estranha. Seria um par sumamente antitético!
Quanto a Jasão, desejoso de regressar a Iolco, se
aliou a Peleu, inimigo figadal de Acasto, por culpa da esposa deste, Astidamia,
a que se fez referência na Introdução, 5, e com auxílio dos Dioscuros, destruiu
a cidade, assumindo o poder, que, logo depois, passou para seu filho Téssalo. O
frágil e indeciso Jasão, todavia, não foi esquecido. Ovídio, nas Heroides, fez
que duas apaixonadas suspirassem de saudades e de ódio pelo conquistador do
velocino de ouro.
A carta 6, Hypsipyle Iasoni, de "Hipsípila a
Jasão", é o desabafo da rainha das lemníades, a quem o herói seduzira e
deixara grávida de gêmeos na passagem pela ilha de Lemnos em direção à
Cólquida.152
Hipsípila exprobra a Medeia, "feia e
estrangeira, estrangeira cruel", que lhe roubara o amante. Apesar de tudo,
ainda acredita na força do amor, já que "o amor crê em tudo": credula res amor est (Her. 6,21).152. O
roteiro e quase todos os trechos traduzidos que estampamos nesta carta são
extraídos da edição das Heroides do Prof. Walter Vergna, por nós prefaciada e
mais de uma vez citada.
189
Embora tenha feito promessa solene de voltar a
Lemnos, a rainha sabe que "ele é volúvel e mais indeciso que as auras
primaveris" e que não cumprirá o compromisso assumido.
Em todo caso, serve-lhe de lenitivo o saber que
"Medeia lhe ganhou o namorado com ervas feiticeiras, quando o amor deve
ser conquistado com beleza e dignidade":
...
Male quaeritur
herbis,
Moribus
et forma conciliandus,
amor (Her. 6,93-94).
Ameaça vingar-se, "prometendo ser
para Medeia mais cruel do que a própria Medeia": Medeae
Medea
forem... (Her. 6,151).
Mas a promessa de vingança fica apenas na promessa.
Na citada edição das Heroides o Prof. Walter Vergna acentua que "Mais uma
vez a vingança, através de ameaças, é ofuscada pela força do amor"; e
transcreve a seguir dois versos que em algumas edições antecedem o texto
original. Trata-se de um dístico muito significativo, que põe a descoberto o
grande amor da neta de Dioniso pelo ingrato e volúvel herói dos argonautas:
Lemnias
Hypsipyle,
Bacchi
genus, Aesone
nato
Dicit,
et in uerbis
pars
quota mentis erat.
— Hipsípila de Lemnos, descendente de
Baco, dirige-se ao filho de Esão e em cada palavra põe um pedaço de sua alma.
A carta 12, Medea Iasoni, de "Medeia a Jasão",
é uma missiva bem ao estilo da tragédia euripidiana: a princesa da Cólquida,
abandonada pelo marido, que se enamorou de Creúsa ou do trono de Corinto,
explode primeiro em saudades e paixão... Depois contrapõe seu amor total à
ingratidão do marido e passa dos gemidos às mais terríveis ameaças: enquanto
houver ferro, fogo e ervas venenosas sua ira e vingança não se extinguirão. Em
suas palavras, os vocábulos "fogo e chamas" mudam de acepção, quando
soprados pelo amor ou pelo ódio:
Est
aliqua ingrato meritum exprobrare uoluptas;
Hac
fruar: haec de te gaudia sola feram (Her. 12,21-22).
—É como que um prazer censurar o ingrato pelo
prazer recebido; deixa-me gozar este prazer, o único que ainda obterei de ti.
Apesar de tudo, apesar de todo ressentimento, o
amor e as chamas não se apagam, porque não se podem ocultar:
Perfide,
sensisti,
quis enim
bene celat
amorem?
Eminet indicio prodita
flamma
suo (Her.
12,37-38).
—Tu, infame, percebeste minha paixão. Quem é capaz
de ocultar o amor? É uma chama que irrompe, traída por seus próprios indícios.
Tudo fizera por ele: traiu o pai, abandonou mãe e
irmã, matou o próprio irmão. E mais: entregou-se a ele.
O marido, que ela salvara, agora está sendo
acariciado por outra mulher. É contra Glauce primeiramente que se ergue a ira
de Medeia, mas, enquanto existirem chamas e ervas venenosas, ninguém escapará a
seu ódio e vingança:
Rideat
et Tyrio
iacet
sublimis
in ostro:
Flebit
et ardores uincet
adusta meos!
Dum ferrum
flammaeque
aderunt
sucusque
ueneni,
Hostis
Medeae
nullus
inultus
erit (Her. 12,179-182).
— Que ela se ria e permaneça sobranceira na
púrpura de Tiro. Um dia chorará, consumida por um fogo mais abrasador do que
este que me devora!
Enquanto houver ferro, chamas e ervas venenosas, nenhum
inimigo de Medéia escapará à sua vingança!E jura, por fim, que irá até onde o
ódio puder conduzi-la:
Quo feret
ira sequar...
Viderit ista
deus, qui
nunc mea
pectora
uersat. (Her. 12,209.211).
— Irei até onde me arrastar o ódio, seja disto
testemunha o deus que agora revolve os tormentos no meu peito!
Medea7 - John William Waterhouse |
Consoante alguns mitógrafos, Jasão pereceu
tragicamente em Corinto.
Um dia de muito calor, descansava sob a nau Argo, que
havia sido retirada do mar para conserto e uma viga da nau, caindo sobre ele, o
matou. Duas ilhas, certamente, o choraram: Lemnos e Avalon...
191
Comentando o mito dos argonautas, Yves Bonnefoy
faz duas observações importantes: a primeira sobre o espaço geográfico
percorrido pela nau Argo e a segunda acerca de Medéia. Vamos sintetizá-las,
antes de se passar com Paul Diel a uma visão simbólica do conjunto, sobretudo a
um enfoque de Jasão e Medeia.
Para o poeta e mitólogo francês, "a história
dos argonautas oscila entre a Demanda do Graal e as Instruções Náuticas, mas
ambas acabam por confundir-se no emaranhado das narrativas de caráter erudito,
através das quais seguimos as gestas de Jasão na leitura das epopeias de
Apolônio de Rodes ou de Valério Flaco. A análise estatigráfica discute a
quantidade de recifes, desde as vias comerciais pré-helênicas, assinaladas
pelos arqueólogos, do Ponto Euxino ao Báltico, até as crônicas da derradeira
colonização que empreenderam as cidades gregas em direção ao horizonte de
Tânais, isto é, do rio Don, o maior mercado dos bárbaros além de Panticapéion,
como afirma Estrabão, 7,4,5. As viagens de Ulisses recordam a altaneira nau
Argo, conhecida de todos e, quando a mágica Circe traça para o herói da Odisseia
e seus companheiros o longo caminho do retorno, o terror das Planctas já havia
feito congelar o sangue nas veias dos argonautas e foi com o auxílio de Hera
que Jasão conseguiu ultrapassar a passagem tortuosa, a via intransponível, onde
se confundem água e fogo, céu e terra. A geografia, no entanto, não possui no
mito dos argonautas um plano de significação, que seria, aliás, hipertrofiado:
a busca do velocino de ouro se inscreve num périplo, num percurso de espaço em
que a viagem de retorno estrutura o itinerário de ida e estimula o trabalho da
memória, que assinala para cada gesta o seu local exato e sua posição no espaço
organizado".153
Jasão e Medeia - JohnWilliamWaterhouse |
Quanto a Medéia, Bonnefoy tem a respeito da mesma
um enfoque muito original. "A proteção de Hera ao herói se exerce através
de Medéia, sem a qual Jasão não teria executado as tarefas impostas pelo rei da
Cólquida. Filha de Eetes confundem-se nela o poder de Hélio, o Sol, e as forças
da noite. A princesa da Cólquida pertence a um elenco de mulheres versadas em
magia e em poderes ocultos. Como Agamede, Hecamede ou Perimede, é imaginosa,
dotada de uma inteligência solerte e astuciosa, graças à qual todas forças, por
maiores que sejam, são vencidas.
192
Uma inteligência que age não por dissimulação ou
embustes, visando à eficácia imediata, mas pelos meandros da magia, pelo
emprego de ervas e de filtros, pela mobilização dos poderes da noite. Medeia é
uma mulher com a força da mêtis, mas sua aliança com Jasão não é o casamento de
Zeus com Mêtis, sua primeira esposa, que lhe outorgou o poder. As magias de
Medéia abrem a Jasão o caminho para a conquista do velocino de ouro, talismã
cuja perda significa para Eetes a destruição do poder real (Diodoro, 4,47), mas
que não confere de imediato ao herói o acesso ao poder, usurpado por Pélias.
Sem Medéia, porém, Jasão jamais reporia o trono de Iolco nas mãos dos filhos de
Éolo. A aliada, todavia, pode tornar-se uma inimiga tanto mais perigosa quanto
para ela o casamento é algo contra a natureza.
Em algumas tradições (Diodoro, 4,45sq.) Medeia tem
por mãe Hécate, filha de Perses, nascida nas montanhas do Tauro e que sempre
viveu longe da cultura e da civilização, nas extensões desérticas, perseguindo
o homem e recolhendo mil ervas venenosas, geradas pela terra. Como sua mãe, que
é igualmente a de Circe, Medéia só pode reinar nos desertos, nas montanhas, nas
florestas selvagens. As terras incultas são o domínio que lhe fornece os
instrumentos de seu poder: venenos e remédios. Trata-se de uma feiticeira,
dotada de uma violência inquieta, de paixões que queimam, de mudanças súbitas
de humor, de uma constante melancolia e de uma duplicidade criminosa, que se
volta contra aqueles aos quais ela mais ama.
Uma das características mais salientes desta
mágica é a de dedicar-se a perigosas operações culinárias. Seu instrumento de
trabalho, sua arma, no entanto, não é o espeto, mas o caldeirão, a panela, onde
se colocam para ferver os pedaços de carne que se separam da vítima do
sacrifício. A contradição, porém, é dupla: primeiramente, porque na Grécia a
preparação da carne não era ofício de mulher; segundo, porque só os homens
podiam ser cozinheiros e sacrificadores; a panela pertence, portanto, àquele
que possui o espeto e a faca.
Medeia, desse modo, arroga-se um privilégio
masculino. Sua cozinha tem uma aparência de altar de sacrifício, mas se
apresenta sob a forma inversa do local em que se abate um animal. É a vida que
deve sair de seu caldeirão, como de um ventre feminino, uma vida renovada, como
aquela que ela própria prometeu às filhas de Pélias, mostrando-lhes um cordeirinho
saído do caldeirão de bronze, onde fora colocado em pedaços. O caldeirão,
todavia, foi o meio usado para matar a Pélias e escondê-lo no ventre da terra.
193
Assim como a feiticeira é uma cozinheira perigosa,
da mesma maneira ela parece incapaz de gerar. Em Corinto, a filha de Hécate se
apresenta como a Errante, a que se deixa levantar nos ares, como se o ter vindo
de um mundo selvagem lhe interditasse qualquer fixação, qualquer afinidade com
a terra cultivada e o espaço consagrado à família. Seus filhos são feridos de
maldição: a mãe os escondeu no santuário de Hera, ou antes, eles já nasceram
mortos, ou por outra, cada vez que Medéia dava à luz um filho, ela se apressava
em enterrá-lo. O degolamento dos meninos na versão de Corinto renova o sacrifício
monstruoso de seu irmão Apsirto".154
Jason and Medea - by Carle van Loo |
Como fez com relação a Teseu, segundo se mostrou
no Capítulo anterior, Paul Diel analisa as façanhas e o comportamento de Jasão
como uma progressiva banalização (veja-se, no que respeita à significação deste
termo, a nota 132 supra). Em outras palavras: buscando o velocino de ouro,
símbolo do poder espiritual, o herói acabou por destruir-se, porque, usando
egoística e cinicamente do poder mágico de Medéia, voltou-se para a intriga e
para a perversão. Apegou-se aos valores da terra em vez de buscar os méritos do
espírito. Reprimiu-se ao invés de purificar-se, substituindo a anagnórisis pela
hýbris.
Vejamos, com alguns enxertos nossos, o que mais
tem Paul Diel a dizer sobre a interpretação do mito de Jasão.155
Observa o autor citado que na busca do velocino de
ouro está congregada a maioria dos heróis ameaçados de banalização. Entre eles
se destacam Orfeu, Héracles, Teseu e Jasão. Embora nenhum deles apresente a
vaidade excessiva dos heróis sentimentais, a ameaça que pesa sobre os mesmos é
o impulso da dominação perversa e a intemperança, isto é, a incapacidade de
escolha justa e de ligação durável. E exatamente esse perigo que,
sobressaltando a cada um em particular, os uniu numa empresa comum de
liberação. A importância do cometimento encontra-se expressa no significado do
próprio nome argonautas, "marinheiros de Argo" e, sendo Argo a nave
branca, este símbolo branco, a pureza, deveria conduzi-los à catarse, à
purificação. Reunindo, pois, o ouro do velocino e o branco de Argo tem-se que o
objetivo da empresa é a conquista da força do espírito, a verdade, e da pureza
da alma. Some-se ao dourado e ao branco o carneiro, que é o mesmo que o
cordeiro, configuração da ternura, da bondade, do amor e também da pureza em
seu mais alto grau.
194
O velo de ouro está suspenso numa árvore, imagem
da vida, mas é guardado por um dragão: é preciso matar a perversão, para que se
tenha a posse do tesouro sublime. O dragão é um monstro que possui a força
brutal do leão ou do touro. Aos indícios de vaidade e de perversão, que lhe são
inerentes, acrescente-se a perversão sexual: com frequência o monstro aparece
como guardião de uma virgem ou está prestes a devorá-la.
Carle van Loo - Medea und Jason |
Para conquistar a força da alma que determina uma
escolha justa, indício de uma ligação duradoura, o herói terá que superar o seu
"dragão interno", o perigo existente nele mesmo, a exaltação
imaginária dos desejos dispersos, ameaça configurada externamente pelo dragão,
que impede o acesso à virgem.
Constantemente no mito o dragão é também o guarda
de um tesouro. No símbolo "tesouro" se reencontra a significação
sublime do dourado, o que faz que, no mito dos argonautas, o ouro-tesouro seja
substituído pelo velo de ouro. A cor dourada é um símbolo solar, mas o ouro-moeda
é um sinal de perversão, da exaltação impura dos desejos. Matando o dragão, o
herói poderá encontrar o tesouro sublime, mas pode igualmente arrebatá-lo sob
sua significação perversa. Em síntese, é assim que se apresenta o tema secreto
em torno do qual se encontram centrados todos os índices simbólicos do mito. Enfrentando
o dragão fabuloso, em busca do velo de ouro, os argonautas devem superar suas
próprias ameaças, retratadas pelo monstro ou, apesar de uma vitória aparente,
correrão o risco de cair na tentação que deveriam combater.
Substituindo o velo de ouro, imagem da pureza,
pelo símbolo mais geral do tesouro em sua significação equívoca, surge
claramente a ameaça: os argonautas expor-se-ão ao fracasso quanto ao plano
essencial de sentido oculto e, ao invés de conquistarem o tesouro sob sua
configuração sublime, encontrá-lo-ão em seu significado pervertido.
O chefe dos heróis da Argo é Jasão. Seu objetivo
inicial não é a busca do velo de ouro. Essa demanda é somente uma condição a
ser cumprida, a fim de recuperar o trono de seu pai. Mas, se o velo é de ouro,
surge, de imediato, um problema: conquistado o "tesouro", com que
espírito o herói exercerá o poder? Se encontrar o velocino de ouro sob seu
sentido sublime, purificando-se de sua aspiração dominadora, seu reinado será
justo; se, ao revés, descobri-lo sob seu signo pervertido, isto é, se ceder a
tentação perversa, seu reino será marcado pela injustiça.
195
Do êxito ou do fracasso essencial do herói
dependerá a sorte de seu país e este é, sob o plano simbólico, a configuração
do mundo inteiro. Jasão, pretendente ao trono, torna-se, desse modo, uma figura
representativa, um símbolo, cuja significação é de importância fundamental: a
sorte do mundo entregue ao governo dos homens, cujas atitudes podem ser justificáveis
ou injustificáveis, uma vez avaliadas de acordo com as exigências essenciais da
vida.
O reino injusto e injustificável se apresenta
diante do espírito, do ponto de vista simbólico, como uma usurpação e a tarefa
heroica de Jasão pode ser assim formulada: combater de modo sublime o
usurpador, buscando o velo de ouro, a fim de não tornar-se ele próprio um
tirano.
Esão, o rei legítimo, foi destronado por Pélias.
Ainda menino, salvo do tio intruso, foi entregue ao centauro Quirão, símbolo da
banalização. Adulto, o herói retornou a Iolco, com o fito de recuperar o trono,
ocupado por um rei usurpador. A situação do jovem príncipe é análoga à de
Édipo: quer governar o mundo, apesar de sua tendência à banalização, devida em
parte à sua educação.
O oráculo havia predito ao rei que desconfiasse do
homem que usasse apenas uma sandália. Com um pé descalço, Jasão apresentou-se
ao tio.
A sandália que falta é a tradução do espírito
desprotegido, de uma incompletude. O pé descalço do herói é uma nova imagem do
homem "coxo", deformado pela educação. Assim caracterizado, não
poderá ele ascender ao poder legítimo, a não ser que supere essa carência.
Pélias declara-se disposto a abdicar, desde que o sobrinho lhe traga o velo de
ouro, símbolo da banalidade vencida.
Tal exigência do rei significa que o herói deverá
provar que é digno do poder a que aspira. Deverá superar a "desordem
física", o pé descalço, e adquirir a insígnia da vitória espiritual e
sublime. É verdade que a exigência de Pélias, que é um usurpador, estabelece
tal condição por deslealdade, pois espera que o sobrinho morra na empresa, mas
a conquista do troféu possui um aspecto simbolicamente sublime. Na realidade, a
incumbência imposta corresponde a uma dupla significação do rei: se Pélias nada
exigisse além de uma tarefa qualquer, supostamente perigosa e irrealizável,
estaria se declarando
apenas um tirano usurpador, o homem intrigante. O trabalho exigido, todavia, é
o combate heroico, que em todos os mitos é impingido pelo rei simbólico, o
espírito. O rei Pélias, que por traição estabelece tal prova, apresenta-se, no
plano mítico, substituído pela exigência sublime, suscetível de caracterizar a
situação essencial.
196
Não se
sentindo suficientemente forte para realizar sozinho o feito excepcional, Jasão
mandou convocar outros heróis e, sobre a nau Argo, navegaram rumo à Cólquida.
Mas o caminho do mar é a rota da vida e os perigos estão à vista. A nau Argo
deverá encontrar exatamente o centro, ao atravessar as terríveis Simplégades,
ou dois recifes móveis, que se chocam contra tudo que ouse passar entre eles.
As Sindrômades são o Cila e o Caribdes da existência. A terra esmagadora,
estampada no rochedo, sendo o símbolo da banalização, os dois recifes espelham
a dupla ameaça que paira sobre qualquer empresa: a intemperança e a tirania. A
nau Argo escapa por pouco da emboscada, mas, presságio funesto, uma parcela da
popa é arrancada.
Medea - Henri Klagmann |
Eetes,
soberano da Cólquida, novo representante do rei mítico, recebe Jasão
cordialmente, mas condiciona a entrega do velo de ouro à vitória sobre o
dragão. A autorização para enfrentar o monstro, todavia, está subordinada a
tarefas preliminares, que esclarecem ainda mais a situação do herói e a
natureza do empreendimento. O rei entrega ao herói os dentes de um dragão, o
primeiro a ser eliminado por Cadmo, um herói vencedor. Jasão deverá atrelar a
uma charrua dois touros de pés de bronze, que vomitam chamas pelas narinas e
com eles arar um campo, onde serão semeados os dentes do dragão de Cadmo.
A colheita
dessa semeadura só podendo ser funesta, o herói deverá mostrar-se capaz de
dominar o perigo.
O conjunto
destas tarefas preliminares representa uma imagem bem específica da luta contra
a tendência à dominação perversa, de que o aspirante ao trono terá primeiro que
purificar-se. O herói deverá mostrar não apenas que tem méritos para se apossar
do velo de ouro e assumir o poder, mas ainda, em razão da força que o anima, de
permanecer como um digno detentor do troféu conquistado. Desse modo, o
comportamento do pretendente ao trono na realização dessas provas simbólicas
hão de caracterizar-lhe não somente a atitude atual, mas também suas intenções
secretas que, sublimes ou perversas, nortearão sua vida inteira e seu reino
futuro.
197
"Arar a terra" significa "torná-la fecunda", quer
dizer, governar de maneira fecunda a terra, o país. "Arar a terra com a
ajuda de touros domados" significa fazer prova de força sublime, de
sabedoria, que por si só assegura o reino fecundo, uma vez que a sabedoria
"doma" o perigo e a tentação do abuso brutal, inerentes ao poder.
Representações da força brutal, os touros traduzem a dominação perversa. Seu
sopro é a chama devastadora. O atributo "bronze acrescentado ao símbolo
pé" é uma imagem constante no mito grego, que serve para espelhar um estado
anímico. Atribuídos aos touros, os pés de bronze retratam o traço marcante da
tendência dominadora, a ferocidade e o endurecimento do espírito.
Com auxílio de Medeia, que por ele se apaixonara, como Ariadne por
Teseu, e que lhe deu um bálsamo maravilhoso, que o tornou invulnerável, o que
configura o próprio amor da princesa, Jasão consegue domar os touros, arar a
terra e semear os dentes do dragão. O amor converteu o impossível em possível,
mas é necessário examinar as "intenções" de Jasão para com Medéia.
Prometeu-lhe casamento, mas até onde se confundiriam no herói o amor e o
"servir-se" do amor? As tarefas ainda a ser executadas responderão a
essa inquietante interrogação. De outro lado, a filha de Eetes e de Hécate é
uma bruxa, uma feiticeira, ligada à noite e aos poderes malignos da terra, às
ervas venenosas. Com essa união, com esse tipo de sizígia, o egoísmo e a
intriga perversa conjugados aos poderes ctônios, o reino de Jasão é o prenuncio
de um grande fracasso da justiça e do espírito e seu casamento com a princesa
da Cólquida pressagia a tragédia.
Medeia - Ansem Feuerbach |
Dotado de forças heroicas, mas com o respaldo das "forças
ctônias", Jasão domina os touros, mas a prova só está cumprida pela metade
e, a fim de traduzir com exatidão as intenções e as atitudes do herói, o mito
repete a exigência sublime expressa em sua totalidade por nova imagem. O reino
futuro do filho de Esão só será fecundo na medida em que ele procure
assegurar-lhe a paz e a justiça. A força sublime do herói, ainda não
manifestada, deverá vencer não apenas a força brutal dos touros, mas igualmente
a dos gigantes, dos "homens de ferro" que nascerem dos dentes
semeados do Dragão.
Todo reino, uma vez estabelecido e governado com justiça, torna-se
inevitavelmente objeto de ciúme, "semeia" a inveja, os dentes do
dragão. Desta semente nasce a colheita monstruosa, os "homens de
ferro", que se erguem contra o pacificador, ansiosos por estabelecer a
dominação perversa à custa do governante. Semelhante tendência se revelará
tanto mais ameaçadora quanto mais marcado pela sabedoria for o reino: a justa
medida e a moderação dele emanadas são interpretadas como fraqueza, suscetível
de encorajar os adversários.
198
Semeando os
dentes do dragão, outrora heroicamente vencido, e liquidando os "homens de
ferro", Jasão deverá provar que está igualmente capacitado para tornar-se
um rei vencedor e que tem fibra para usar de energia e justiça contra qualquer
germe de desordem e sedição. Mas, prognóstico sinistro, o herói se mostra
combalido nesta terceira parte das provas. Seu triunfo sobre a evidência
ameaçadora não se concretiza graças à sua força sublime. Em lugar da justiça,
ele usa, aconselhado pelo poder ctônio de Medéia, a intriga. Faz o que em todos
os tempos realizaram os tiranos com o fito de vencer os adversários: dividir e
desunir para reinar.
O mito
expressa bem o fato, narrando que Jasão lançou uma pedra no meio dos gigantes,
que não tardaram a se massacrar, alegando cada um estar sendo atacado pelo
outro. O símbolo traduz a mais diáfana das realidades: a pedra, a terra petrificada,
o rochedo são igualmente símbolos da banalização, consequência da exaltação intrigante
das aspirações terrenas. Os adversários são surpreendidos pelo obstáculo
imprevisto, indício das falsas promessas que, "lançadas" com astúcia,
exasperam a inveja. Nesse fogo de massacre, cada um se sente ameaçado pela
inveja exaltada do outro, esperando cada qual tirar proveito da querela
nascente. Não é raro que adversários temíveis, mordidos de raiva e de emulação,
se lancem uns contra os outros e se destruam. Semelhante vitória de
"intrigante", de Jasão, que arremessa as pedras ou que, consoante a
significação oculta, se propõe a assegurar o reino futuro pela intriga, uma tal
vitória possui apenas um valor efêmero e banal. A maquinação não pode vencer a
violência em caráter definitivo. Trata-se de um emaranhado perverso que reina
sobre o mundo e que, incessantemente, conduz às explosões de violência.
A ideia que se
tem das três tarefas iniciais é a de que Jasão percorreu muito rapidamente o
caminho que, da intenção sublime, ameaça arrastá-lo para uma futura realização
banal. A advertência que desde o início pesa sobre suas façanhas tornou-se
clara, sobretudo na vitória duvidosa do herói sobre os "homens de
ferro". O perigo que o ronda, no entanto, não se tornou insuperável, uma
vez que as três provas preliminares têm unicamente o sentido de um presságio em
relação ao comportamento futuro e não o determinam em definitivo.
199
A derrota
essencial do filho de Esão, que encerrou as tarefas iniciais, se apresenta sob
o aspecto de um êxito exterior, o que lhe assegura o direito de tentar
apoderar-se do velocino de ouro. As portas para a vitória decisiva e essencial
continuam abertas. Tudo depende da maneira como ele há de enfrentar o último
prélio.
Vencendo em
combate heroico o monstro, guardião que impede qualquer aproximação com a
sublimidade, bem como sua fraqueza secreta, a tentação dominadora do dragão não
mais poderá se realizar. É que, sendo ele o símbolo supremo de sua própria
perversidade, se morto heroicamente, há de transformar-se no símbolo da
libertação total.
Jasão,
todavia, se limitará uma vez mais a lutar contra o monstro com o expediente da
astúcia. O mito não faz referência alguma a armas que lhe tenham sido
emprestadas pelas divindades, imagens da força da alma, para sua justa com o
dragão. Nada indica também que o herói tenha solicitado o concurso de seus
companheiros. Confiando muito pouco em suas próprias forças, recorre mais uma vez
ao auxílio da mágica Medeia. Semelhante consórcio nem é uma escolha justa nem
tampouco uma ligação da alma. A impureza se escamoteia nesse episódio sob a
forma de cálculo. Unindo-se à feiticeira, o argonauta deixa-se subjugar pelas
forças ctônias. É exatamente esse tipo de dominação que ele deveria evitar a
qualquer preço. Sucumbindo aos sortilégios da mágica e à tentação de lutar com
sua ajuda, o herói prepara-se para assegurar o reino e a autoridade, com o
respaldo das forças "demoníacas" de seu inconsciente e não pelo
combate da purificação. A partir dessa resolução, o resultado do empreendimento
está fadado à ruína. Enfraquecido, o pretendente ao trono não mata o monstro em
luta heroica, imagem de sua própria perversão, que ele deveria vencer. Medéia,
com seus filtros, o adormece e ingloriamente Jasão o liquida e se apossa do
velo de ouro. O poder mágico detido e utilizado por Medéia é a imagem da
insolência face ao espírito e às suas exigências, bem como a pretensão de
realizar as intenções mais exaltadas, a perversão dominadora, graças ao
desencadeamento inescrupuloso dos desejos. Diametralmente oposto à vitória heroica,
este êxito perverso implica, falando de maneira simbólica, um "pacto"
com os demônios, aos quais é preciso vender a alma.
200
O sentido da
expedição converteu-se num gracejo. O troféu que confere o direito ao trono é
subtraído, em vez de ser conquistado com denodo. Aparentemente, em sentido
verbal, Jasão cumpriu as tarefas impostas, mas, em sentido simbólico, ele se
esquivou do trabalho interior e heroico: a catarse. O fecho do mito só pode
traduzir esse estado interior culpável do herói decaído. As imagens finais
materializam o castigo.
Eetes,
exigindo as tarefas-provas, configurou o rei mítico e, como tal, nega a Jasão o
direito de levar o troféu da sublimidade.
Rebelando-se
contra o interdito real, foge com Medeia, conduzindo o velo de ouro.
O rei acossa
os ladrões do tesouro espiritual, mas sendo ele um símbolo do espírito
vingador, a perseguição simbólica, consoante sua verdade profunda, não se passa
no plano exterior: realiza-se espiritualmente no foro íntimo de Jasão, como um
sentimento de culpabilidade. Seguindo esta linha de raciocínio, a fuga diante
de Eetes significa a repressão da culpa, pois o recalque nada mais é do que a
escusa face ao espírito acusador. Tal significação se ajusta igualmente ao
rapto do velo de ouro. "Recalcar sua falta" é "sinônimo de se
vangloriar com a sublimidade imerecida, extorquida. Todos os pormenores da
imagem simbólica da fuga devem contribuir para ratificar este significado
oculto: a culpa e sua repressão.
Para ajudar o
falso herói a escapar, Medéia usa de uma astúcia monstruosa: assassina seu
próprio irmão Apsirto e lança-lhe os pedaços no mar. Eetes, ocupado em
recolhê-los, se atrasa na perseguição aos fugitivos. Na medida em que o rei da
Cólquida configura o espírito acusador, Apsirto traduz simbolicamente o
"filho do espírito", que é a verdade. Na imagem da fuga, a verdade em
pauta concerne ao estado da alma de Jasão e esse estado é a culpa e a tentativa
de reprimi-la.
O homicídio de
Apsirto é uma variante do símbolo típico do "filho sacrificado". O
sacrifício expiatório do "filho do espírito" é uma imagem de extrema
complexidade, que encontra sua expressão mais alta no relato histórico cristão,
quando o mundo inteiro, configurado no povo eleito e culpado, sacrificou
criminosamente o "filho do espírito", o homem inocente, espelho da
verdade, cuja vida era sentida como uma censura insuportável. É claro que o
mito em questão nada possui em comum com a verdade cristã, infinitamente mais
vasta e profunda, a não ser o fato de espelhar igualmente a iniquidade que
reina no mundo. Não se trata de estabelecer um paralelismo, que só poderia ser
artificial, mas unicamente de ressaltar que o episódio da fuga do casal
assassino contém uma alusão ao sacrifício monstruoso.
201
Este não é
mais executado pelo mundo culpado, que vive sob o reino do demônio, mas pela feiticeira,
inspiradora das tentações "demoníacas" do inconsciente e que se
mostra ansiosa por assegurar o reino do herói humilhado, como, aliás, diga-se
de caminho, agiu com o rei de Atenas, Egeu. Medeia arrasta o amante a
sacrificar o inocente, o filho do espírito acusador, a verdade. Culpado, o
herói humilhado não se curva ao espírito da verdade, não toma conhecimento de
sua falta, não sacrifica ao espírito sublime. Lança e projeta sua culpa sobre o
inocente que deve resgatá-la como bode expiatório. Espera, desse modo, poder
escapar, por força dessa evasiva imaginária, às consequências de seus atos.
Medéia corta o
"filho" assassinado, a verdade sacrificada, em pequenos pedaços:
fragmenta a verdade sobre a culpa de Jasão e oferece ao espírito acusador um
punhado de pequenas escusas mentirosas, imagens da repressão, acreditando,
destarte, retardar a "perseguição" e silenciar o delito do amante,
através de seus conselhos e encorajamentos. A mágica incita-o a usar, excessiva
e monstruosamente, de processos perversos de evasão, isto é, a projeção de
culpa e a repressão. Assim agindo, consegue destruir-lhe o espírito sob a forma
de remorso, o único que poderia salvá-lo, condenando-o, em definitivo, à
perdição.
Assim como o
simbolismo dos trabalhos escamoteados retratam a futura atitude perversa de
Jasão, que há de caracterizar-lhe o reino, igualmente a fuga traduz, em sua
verdade profunda, os efeitos da derrota essencial da expedição catártica,
consequências que hão de marcar toda a vida futura do herói humilhado.
Jasão entrega
o velo de ouro a Pélias e assume o poder. Suas falhas e deficiências no
cumprimento das condições impostas fazem prever a natureza perversa e
dominadora de seu reino, o que não impede a possível realização externa de uma
hábil administração, ao menos por algum tempo.
Medea - Anselm Feuerbach |
A história
testemunha, através de inúmeros exemplos, aliás sempre repetidos, o sentido
secreto do mito, cujo herói mais representativo é Jasão. Sua perversidade
converte-se, no plano essencial, em flagelo que devasta o país, o mundo: as
astúcias, de que tanto se aproveitou, voltaram-se contra ele próprio. Vítima de
intrigas foi afinal expulso de Iolco.
202
Todo o seu
governo, no entanto, foi caracterizado pela influência nefasta e crescente da
feiticeira, símbolo da perversão banal. Os delitos se acumularam. É bastante
relembrar aquele bem conhecido, que tanto concorreu para acelerar o fim
desastroso do herói derrotado. Para fugir à bruxaria funesta, Jasão tentou
abandonar Medéia. A mágica, transmutada em Erínia, matou seus próprios filhos.
Já que todas as personagens do mito possuem, em última análise, valor
simbólico, pode-se ver nesse crime hediondo, consoante o simbolismo
"criança, fruto da atividade sublime ou perversa", a imagem da
desolação e do aniquilamento, que são os únicos a subsistir, uma vez passada a
dominação pervertida. Configurando as forças destruidoras do inconsciente, a
mágica, de que Jasão se quis servir para alcançar a vida sublime, é o
instrumento fatal de sua punição e de seu sofrimento.
Jasão morreu
quando descansava sob a nau Argo, atingido por uma viga, caída do próprio
barco, que deveria tê-lo conduzido a uma vida heroica.
A nau é o
símbolo das promessas juvenis de sua vida, das gestas de aparência heroica, que
lhe conquistaram a glória. O herói vencido desejou repousar à sombra de sua
glória, por acreditar que ela seria suficiente para justificar-lhe a vida
inteira. Caindo em ruínas, a Argo, símbolo da esperança heroica da juventude de
Jasão, converte-se em símbolo da ruína final de sua vida. A viga é uma
transformação da clava. É o esmagamento sob o peso morto, o castigo da
banalização.
Ao passar em
revista o pensamento de Diel sobre o mito de Jasão, convém insistir em que o
mito é um feixe de símbolos e uma interpretação é apenas uma das
interpretações. Outras que surjam só podem concorrer para o enriquecimento do
mitologema, neste caso tão vasto e tão doloroso.
Bibliografia
BRANDÃO, JUNITO DE SOUZA. Mitologia Grega, vol 3. Petrópolis: Vozes, 1990.
Bibliografia
BRANDÃO, JUNITO DE SOUZA. Mitologia Grega, vol 3. Petrópolis: Vozes, 1990.
Nenhum comentário:
Postar um comentário