segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

A MULHER NA LITERATURA DA GRÉCIA NA ANTIGUIDADE – ASPÁSIA DE MILETO

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
A Grécia antiga produziu escritoras desde eras muito distantes, como é o exemplo de Safo de Mitilene e Aspásia de Mileto. 
Self-portrait Marie Bouliard, as Aspasia, 1794.

Mileto, Μίλητος em grego clássico, situava-se na Ásia Menor e gerou importantes pensadores como Tales, um dos matemáticos mais renomados de todos os tempos. A região onde estava Mileto hoje pertence à República Turca.
Mileto, ao lado de Troia, Esmirna, Sardes e Éfeso faziam parte do antigo reino da Lídia, em grego Λυδία. Esse reino situava-se na atual Anatólia turca, isto é, no limiar continente asiático, uma vez que a Turquia tem uma província europeia, a antiga Trácia.
Essa região pertenceu, depois da queda do reino da Lídia, ao Império Grego Bizantino, depois ao Império Romano do Oriente, com o reinado de Constantino, ainda fez parte do Império Otomano, estando hoje sob o domínio da República Turca.
Pois Mileto era uma rica cidade, mantendo comércio com o Oriente e também como o Egito. Situada na costa do Mar Egeu, voltava-se para a Grécia continental, com quem comercializava também.
Aspásia era filha da cidade de Mileto e  migrou para Atenas, em situação desconhecida. Notabilizou-se, primeiramente, por ter sido amante do grande estadista grego Péricles (Περικλς), que se tornou célebre por sua administração da cidade de Atenas. Como o grande administrador havia sido casado por dez anos com uma mulher cujo nome a história parece não ter registrado, não se pode casar com Aspásia. Assim, ela é sempre citada como grande cortesã, como se verá adiante.
Aspasie - Pio-Clementino

Péricles teve com ela um filho. Porém, a importância de Aspásia está em seus dons artísticos e literários, especialmente na arte oratória. Seus textos aparecem, especialmente, na Suda, uma espécie de enciclopédia literária bizantina. Ela viveu em uma das eras mais grandiosas da história do mundo, quando as civilizações clássicas floresceram na Grécia antiga. Foi conterrânea de homens ilustres, quais sejam, Sócrates, Platão, Aristóteles e os dramaturgos Ésquilo, Sófocles, Eurípedes e Aristófanes.
 Chegou a Atenas por volta de 450 a. C. Sendo estrangeira, não se podia casar com cidadão grego; tornou-se então, uma das mulheres do grupo conhecido como hetera (ταίρα)  – mulheres de excelente educação e que, por serem solteiras, tinham liberdade para estudar, assistir a palestras e até participar de debates com homens. Muitas delas envolviam-se amorosamente com seus patrocinadores, mas não eram consideradas prostitutas.
Na sociedade grega antiga, as hetairai, plural de hetera, eram independentes e, por vezes, mulheres influentes, que usavam vestidos distintos e tinham mesmo de pagar impostos como os homens. 
Algumas eram ex-escravas de outras cidades, e se tornavam famosas por suas realizações na dança e na música, bem como muitas se distinguiam por seus talentos físicos e intelectuais. Diferentemente da maioria das outras mulheres na sociedade grega na época, as hetairai eram educadas. Eram também as únicas mulheres que tomaram parte ativa nos simpósios, onde o seu parecer era acolhido e respeitado pelos homens. 
Jean-Léon Gerôme (1824-1904): Sócrates
buscando a Alcibíades en la casa de Aspásias, 1861.

As hetairai foram também a única classe de mulheres na Grécia antiga, com acesso e controle independente sobre uma quantidade considerável de dinheiro. Não devem ser confundidas com as pornai (πόρναι), prostitutas, que viviam da venda de sexo nas ruas ou nos bordéis. Porém, as hetairai, muitas vezes, tornavam-se amantes de homens importantes, como é o caso de Aspásia em relação a Péricles.
Veja-se que na Grécia imperava um machismo consagrado em relação às mulheres de família e donas de casa. Para completar as classes femininas na Grécia antiga veja-se a categoria das pallakai (παλλακαί), era o nome genérico dado a uma concubina ou amante. O status dessas mulheres foi o de escravas, geralmente capturadas na guerra, e trazidas à Grécia, seja para o uso de seu captor, ou para serem vendidas. Eram compradas e vendidas como qualquer outro escravo no mundo grego.
Porém, as mulheres mais prestigiadas na família grega eram as esposas, γυνακες, em grego, embora, especialmente em relação a elas, havia um tratamento altamente machista. Comprovando este ponto de vista machista, vejam-se as palavras do grande orador Demóstenes: “Temos as hetairai por prazer, as pallakai para cuidar de necessidades de nosso corpo diariamente e as esposas (γυνακαι) para terem filhos e serem as guardiãs fiéis de nossas famílias.”
 Conhecida por sua grande genialidade e por sua deslumbrante beleza, Aspásia criou uma escola de filosofia e retórica, no período em que os sofistas multiplicavam esse tipo de instituição por todas as grandes cidades gregas.
Aspasia y Pericles por José Garnelo y Alda

Revestiu-se,essa escola, de tamanho renome que teve como alunos os grandes filósofos Sócrates e Platão. O próprio Platão afirmou que com a mestre havia aprendido a teoria do amor, ele que era homossexual confesso. Sócrates disse ter aprendido com ela a arte da eloquência. Foi como seu discípulo de retórica que Péricles por ela se apaixonou.
Durante os trinta anos em que Atenas esteve sob a administração do eminente político, a era de Péricles, essa cidade esteve sob um regime democrático. Era uma democracia da elite, onde apenas os considerados cidadãos atenienses tinham direito a voto. Numa cidade que congregava em torno de quatrocentos mil habitantes, apenas dez por cento desse todo preenchia essas condições, ou seja, um grupo que se aproximava dos quarenta mil cidadãos.
Péricles não se podia casar com Aspásia por ser ele já casado, embora se havendo divorciado, e também por ela ser estrangeira. Por isso, fê-la sua consorte, uma espécie de esposa ilegal. Ela era tão brilhante que alguns lhe atribuem a redação do discurso feito por Péricles às tropas ao final da guerra do Peloponeso. O general era tão apaixonado por ela que, após a morte de seus filhos legítimos, tonou seu filho com ela, que também tinha o nome de Péricles, cidadão ateniense.



3 comentários:

  1. Parabéns, professor Oscar, excelente seu texto como sempre e revelador, pois as informações aqui contidas não estão na maioria dos manuais de filosofia que comumente usamos em sala de aula. Uma injustiça para com as mulheres, infelizmente!

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  2. Obrigado pelo por prestigiar minhas publicações com teus interessantes comentários.

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