A Grécia antiga produziu escritoras desde eras muito
distantes, como é o exemplo de Safo de Mitilene e Aspásia de Mileto.
Self-portrait Marie Bouliard, as Aspasia, 1794. |
Mileto, Μίλητος
em grego clássico, situava-se na Ásia Menor e gerou importantes pensadores como
Tales, um dos matemáticos mais renomados de todos os tempos. A região onde
estava Mileto hoje pertence à República Turca.
Mileto, ao lado de Troia, Esmirna, Sardes e Éfeso faziam
parte do antigo reino da Lídia, em grego Λυδία. Esse reino situava-se na atual Anatólia turca, isto é, no
limiar continente asiático, uma vez que a Turquia tem uma província europeia, a
antiga Trácia.
Essa região pertenceu, depois da queda do reino da Lídia, ao
Império Grego Bizantino, depois ao Império Romano do Oriente, com o reinado de
Constantino, ainda fez parte do Império Otomano, estando hoje sob o domínio da
República Turca.
Pois Mileto era uma rica cidade, mantendo comércio com o
Oriente e também como o Egito. Situada na costa do Mar Egeu, voltava-se para a
Grécia continental, com quem comercializava também.
Aspásia era filha da cidade de Mileto e migrou para Atenas, em situação desconhecida. Notabilizou-se,
primeiramente, por ter sido amante do grande estadista grego Péricles (Περικλῆς), que se tornou célebre por sua
administração da cidade de Atenas. Como o grande administrador havia sido casado
por dez anos com uma mulher cujo nome a história parece não ter registrado, não
se pode casar com Aspásia. Assim, ela é sempre citada como grande cortesã, como se verá adiante.
Aspasie - Pio-Clementino |
Péricles teve com ela um filho. Porém, a importância de Aspásia está em seus dons artísticos e literários, especialmente na arte oratória. Seus textos aparecem, especialmente, na Suda, uma
espécie de enciclopédia literária bizantina. Ela viveu em uma das eras mais
grandiosas da história do mundo, quando as civilizações clássicas floresceram
na Grécia antiga. Foi conterrânea de homens ilustres, quais sejam, Sócrates,
Platão, Aristóteles e os dramaturgos Ésquilo, Sófocles, Eurípedes e Aristófanes.
Chegou a Atenas por volta de 450 a. C. Sendo estrangeira,
não se podia casar com cidadão grego; tornou-se então, uma das mulheres do
grupo conhecido como hetera (ἑταίρα)
– mulheres de excelente educação e que, por serem solteiras, tinham liberdade
para estudar, assistir a palestras e até participar de debates com homens. Muitas
delas envolviam-se amorosamente com seus patrocinadores, mas não eram
consideradas prostitutas.
Na sociedade grega antiga, as hetairai, plural de hetera,
eram independentes e, por vezes, mulheres influentes, que usavam vestidos
distintos e tinham mesmo de pagar impostos como os homens.
Algumas eram ex-escravas de outras cidades, e se tornavam
famosas por suas realizações na dança e na música, bem como muitas se
distinguiam por seus talentos físicos e intelectuais. Diferentemente da
maioria das outras mulheres na sociedade grega na época, as hetairai eram educadas. Eram
também as únicas mulheres que tomaram parte ativa nos simpósios, onde o
seu parecer era acolhido e respeitado pelos homens.
Jean-Léon Gerôme (1824-1904): Sócrates
buscando a Alcibíades en la casa de Aspásias, 1861.
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As hetairai foram também a única classe de mulheres na
Grécia antiga, com acesso e controle independente sobre uma quantidade
considerável de dinheiro. Não devem ser confundidas com as pornai (πόρναι), prostitutas, que viviam da venda de sexo
nas ruas ou nos bordéis. Porém, as hetairai, muitas vezes, tornavam-se amantes de
homens importantes, como é o caso de Aspásia em relação a Péricles.
Veja-se que na Grécia imperava um machismo consagrado em
relação às mulheres de família e donas de casa. Para completar as classes
femininas na Grécia antiga veja-se a categoria das pallakai (παλλακαί), era o nome genérico dado a uma
concubina ou amante. O status dessas mulheres foi o de escravas, geralmente
capturadas na guerra, e trazidas à Grécia, seja para o uso de seu captor, ou
para serem vendidas. Eram compradas e vendidas como qualquer outro escravo
no mundo grego.
Porém, as mulheres mais prestigiadas na família grega eram as
esposas, γυναῖκες, em grego, embora, especialmente
em relação a elas, havia um tratamento altamente machista. Comprovando este
ponto de vista machista, vejam-se as palavras do grande orador Demóstenes: “Temos
as hetairai por prazer, as pallakai para cuidar de necessidades de nosso corpo
diariamente e as esposas (γυναῖκαι)
para terem filhos e serem as guardiãs fiéis de nossas famílias.”
Conhecida por sua
grande genialidade e por sua deslumbrante beleza, Aspásia criou uma escola de
filosofia e retórica, no período em que os sofistas multiplicavam esse tipo de
instituição por todas as grandes cidades gregas.
Aspasia y Pericles por José Garnelo y Alda |
Revestiu-se,essa escola, de tamanho renome que teve como
alunos os grandes filósofos Sócrates e Platão. O próprio Platão afirmou que com
a mestre havia aprendido a teoria do amor, ele que era homossexual confesso.
Sócrates disse ter aprendido com ela a arte da eloquência. Foi como seu
discípulo de retórica que Péricles por ela se apaixonou.
Durante os trinta anos em que Atenas esteve sob a
administração do eminente político, a era de Péricles, essa cidade esteve sob um
regime democrático. Era uma democracia da elite, onde apenas os considerados
cidadãos atenienses tinham direito a voto. Numa cidade que congregava em torno
de quatrocentos mil habitantes, apenas dez por cento desse todo preenchia essas
condições, ou seja, um grupo que se aproximava dos quarenta mil cidadãos.
Péricles não se podia casar com Aspásia por ser ele já
casado, embora se havendo divorciado, e também por ela ser estrangeira. Por isso, fê-la
sua consorte, uma espécie de esposa ilegal. Ela era tão brilhante que alguns
lhe atribuem a redação do discurso feito por Péricles às tropas ao final da
guerra do Peloponeso. O general era tão apaixonado por ela que, após a
morte de seus filhos legítimos, tonou seu filho com ela, que também tinha o
nome de Péricles, cidadão ateniense.
Parabéns, professor Oscar, excelente seu texto como sempre e revelador, pois as informações aqui contidas não estão na maioria dos manuais de filosofia que comumente usamos em sala de aula. Uma injustiça para com as mulheres, infelizmente!
ResponderExcluirÓtimo texto!
ResponderExcluirObrigado pelo por prestigiar minhas publicações com teus interessantes comentários.
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