Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
As chamadas guerras de religião, na Europa, tiveram sempre o
mote religioso como pano de fundo, porém, desenvolveram-se por trinta anos,
durante o século XVII. São conhecidas também pelo nome genérico de
Guerra dos Trinta Anos, que considero impróprio, pois não se constituíram em um
único conflito e envolveram diferentes povos em seu desenrolar.
Martinho Lutero tinha promovido, na primeira metade do
século XVI, o movimento que ficou conhecido como Reforma Protestante, a partir
do catolicismo da Alemanha, vindo a atingir, posteriormente, também parte da França,
do Reino Unido, dos Países Baixos (BENELUX), parte dos países escandinavos e do
leste europeu.
Em 1517, nas portas da igreja do castelo Wittenberg,
protestou contra diversos pontos da doutrina da Igreja Católica Romana,
divulgando seus princípios fundamentais que passaram a ser conhecidos como
Cinco Solas. Eram elas representadas por cinco expressões latinas: Sola Fide (somente a fé); Sola scriptura (somente a
escritura); Solus Christus (somente
Cristo); Sola gratia (somente
a graça) e Soli
Deo gloria (glória
somente a Deus).
Como reação à proposta protestante, aconteceu o massacre da
noite de São Bartolomeu. Os reis da França apoiavam o catolicismo romano e
promoveram um massacre de partidários do protestantismo em Paris, na noite de
23 para 24 de agosto de 1572, dia de São Bartolomeu. Na realidade, esses
massacres se prolongaram pelos meses seguintes.
Uma manhã nos portões do Louvre, pintura de Édouard Debat-Ponsan. |
Na realidade, a Reforma escondia conflitos entre a Igreja de
Roma e diversas cortes europeias de então. Havia uma concepção geral cristã de
que o poder provinha de Deus. Quem oficializava a divina legitimidade do poder era o papa. Muitos conflitos populares se deram por toda a
Europa e o resultado prático foi a divisão do continente em dois blocos: o
católico e o protestante.
Em 1545, a Igreja Romana convoca o Concílio de Trento que
toma medidas para se opor ao protestantismo, especialmente restabelecendo o
Tribunal do Santo Ofício, conhecido como sagrada inquisição. Criou-se um Index Librorum Prohibitorum (conhecido depois
apenas como Index), que
trazia uma listagem de obras cuja leitura era proibida aos cristãos. Sugem
novas ordens religiosas, sendo a mais importante delas a Companhia de Jesus,
cujos membros passaram a ser conhecidos como jesuítas.
A ordem é fundada por um grupo de estudantes de Paris,
liderados pelo jovem basco espanhol Iñigo López de Loyola, que se
consagraria na história como Inácio de Loyola. Inácio, num combate contra os
luteranos em Pamplona, é ferido e confinado por longa convalescência em que
passa a ler “Flos Sanctorum”,
de Jacopo de Varazze, uma coleção de vidas de santos de diversos países daquele
tempo.
Castelo de Warttenburg - Turígia |
A partir dessas leituras, Inácio chega à conclusão que a
melhor forma de se combater o protestantismo era através do ensino e não
através da espada, como iniciara em sua carreira. Em vez de soldados, cria uma ordem
religiosa de professores e uma rede mundial de escolas. Recebe, então, como
adeptos à sua ordem, uma legião de sábios de todas as áreas, desiludidos com a
situação social de seu tempo. Assim, forma uma das ordens religiosas mais
influentes em todo o mundo. Quase todos os grandes homens, desde os meados do
século XVI, receberam influência ou formação jesuíta. Aliás, nosso Papa
Francisco é jesuíta.
Porém, esse não foi o único, nem o mais importante movimento
desses tempos. Passados os primeiros conflitos religiosos originados da reforma
protestante, assinou-se a Paz de Augsburgo. Esse acordo foi assinado entre
Carlos V, da Espanha, e a Liga de Esmalcalda, que reunia os reis luteranos do
Sacro Império Romano.
Acontece que os reis germânicos protestantes, que estavam em
conflito com o Império de Habsburgo, em Viena, que viria a formar o futuro
Império Austro-Húngaro, tinham de enfrentar a invasão dos turcos do Império
Otomano. Carlos V, católico, faz um acordo com a França, também católica, e com
os reis protestantes do Sacro Império, e com o Papa Paulo III, reúnem um
poderoso exército e vencem os otomanos.
Essa aliança gerou uma tolerância ao protestantismo dentro
do Sacro Império Germânico, que tinha sede em Paris, mas que incluía grande
parte da Germânia. Criou-se um princípio que cada rei teria sua religião.
Porém, com o surgimento do calvinismo, um grupo radical que
acreditava ter Deus eleito um grupo de privilegiados para o paraíso, ficando os
demais destinados ao inferno, reacenderam-se as guerras de religião por toda a
Europa. Geralmente, o sucesso na profissão e o sucesso financeiro seriam sinais
de que esses cidadãos pertenciam ao número dos escolhidos. Há quem diga que
João Calvino, com sua obra Instituição da Religião Cristã, de 1534, é o
verdadeiro criador do capitalismo.
Com Fernando II de Habsburgo, educado pelos jesuítas, começa
o projeto expansionista dos Habsburgos. Esse expansionismo era uma ameaça tanto
para os protestantes vizinhos, como para a França. Os conflitos internos entre
os reis germanos favoreciam os propósitos de Fernando. Um exemplo disso é a
Boêmia, atual República Checa, em que a disputa pelo trono colocou, frente a
frente, católicos e protestantes. Fernando buscou o apoio da Espanha e do Papa
para defender os católicos. Os exércitos de Fernando, católico, atacaram a
maioria protestante e dominaram a Boêmia e a Morávia, defenestraram ministros e
deputados, destruíram igrejas protestantes e impuseram o domínio dos Habsburgos
na região.
Aumenta ,então, o atrito entre os franceses o os Habsburgos. Fernando
II foi imperador do Sacro Império Romano de 1619 a 1637, quando faleceu. As
guerras de religião empobreceram comprometedoramente a Alemanha, pois, os conflitos, em sua
maioria, desenvolveram-se em seu território. Criaram-se muitas divisões internas. Em 1648,
quando são feitos os acordos finais, a França sai altamente favorecida,
consolidando sua influência econômica em toda a Europa.
As guerras de religião, muito mais do que conflitos
religiosos, escondiam os interesses pessoais de reis, tanto católicos quanto
protestantes, que usavam da fé popular para consolidar seu poder e riqueza. É o
que ocorre especialmente com a casa dos Habsburgos, que se valeu do apoio papal
e espanhol para construir um poderoso império que desaguaria no Império
Austro-Húngaro.
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