Texto originalmente publicado no livro: Vitrais: Contos do Invitro, produzido por um grupo deescritores ligados à FURG: Invitro.
Prof.
Dr. Oscar Luiz Brisolara
Uma iniciativa alvissareira brotou, de há algum tempo, nos meios acadêmicos da FURG e deixa seus frutos na presente produção literária. Do mito de Eros, o eterno desejo, que fecundou a alma grega e espargiu-se pelo universo e pelos tempos sem conta, uma flama crepita nos campi da FURG.
Eros é fruto do amor entre seu pai, o divino Poros, a abundância, e sua mãe humana, Penia, a miséria, a necessidade, a carência, a falta. É gerado no Olimpo exatamente no dia em que se festejava o nascimento de Afrodite.
Seu pai, Poros, era filho de Zeus e Metis, gerado num tempo primordial, pré-olímpico, em que ainda imperava o matriarcado, período em que o homem venerava a mulher como um ser superior pela sua capacidade de gerar, e se submetia ao seu governo matriarcal e terno.
Zeus aproxima-se de Metis, quase suplicante, e gera Poros em seu ventre, diferentemente do que faria depois de implantado o patriarcalismo a partir do Olimpo e, depois, instaurado nos reinos humanos. Desde esse tempo, ele se tornaria um machista enganador e promíscuo.
Porém, por ocasião dos festejos do nascimento de Afrodite, que era a deusa do amor e da fecundidade, Penia, esmolado, encontrara Poros e, com ele, nos jardins do Olimpo, fugindo aos olhares indiscretos, gerara Eros. Dessa fusão da abundância divina e da extrema carência humana, surge, então, o deus que está na raiz de todas as artes, especialmente nas artes e nas ciências da linguagem.
Eros é a raiz primeira da curiosidade e do desejo, que engendraram as ciências, e a mais recôndita e insondável delas todas, a linguagem, que cingiu os homens entre si e elevou-os, pela razão e pelo diálogo, ao universo dos deuses.
Toda a metáfora é fruto dessa carência essencial que Penia conferiu, de sua natureza mais profunda, à linguagem. Na fome da expressão, na ausência do termo próprio do gene de Penia, cai a abundância de Poros e traz uma palavra que, em não sendo termo positivo e fechado, é o suprimento abundante do vazio, que a incompletude humana busca na plenitude divina.
Portanto, a metáfora, a essência da linguagem e do literário, é sempre fruto de um vazio, que é preenchido por um termo proveniente de fora, que não é dali, como o demonstra sua etimologia grega, μεταφορά (metaforá), (μετά = além, de outra parte e φέρω, transportar), portanto, há algo que se transporta de fora, para compor a plenitude extrapolante do sentido.
Mas, de certo modo, toda a linguagem é eterna metáfora, é suprimento da carência essencial do espírito humano na busca do dizer e do sentido, no encontro do outro, também carente e faminto de linguagem, cujo rosto diante mim me interroga e desafia. Assim, no dizer de Pessoa, “Deus quere, o homem sonha e a obra nasce.”
Pois, na comunidade da FURG, entre acadêmicos, servidores e docentes, na dialética essencial que os opõe e congrega a um só tempo, gestou-se um grupo: Invitro, cujos encontros literários produziram estes Vitrais: Contos Invitro. Dessa forma, no face a face dos debates do grupo literário, Tammie Faria Sandri, Suellen Rodrigues Rubira, Luciano Teixeira Cáceres, Lilian Ney, Joselma Noal, Diogo Souza Madeira, Daniel Baz dos Santos, Cristiano Vaniel e Andréia Pires, fustigados pela fome oriunda do vazio metafórico existencial, que o estar-no-mundo provoca, beberam da abundância divinizante, para orientar seu destino na senda da luz, que nos faz tatear e descobrir a forma adequada ao pensamento fugitivo, da nuvem que foge à mão que se levanta.
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