quarta-feira, 29 de abril de 2015

PENSAMENTO SOBRE A ESSÊNCIA DO SER MESTRE

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara




O professor não é apenas um profissional. É também um amigo que caminha ao lado. Não apenas leva saberes. Ajuda a aprender a viver. Chora junto com o aluno, se preciso for. Não há um saber que migra da mente de um para o outro. O aluno constrói seu saber com a acolhida afetuosa do mestre. Saberes sólidos somente podem ser construídos com afeto, condição que não impede seja o mestre, muitas vezes, em seu papel paternal, obrigado a colocar limites e manifestar exigências.

terça-feira, 28 de abril de 2015

LIÇÃO DE SABEDORIA DAS EXIGÊNCIAS PARA AS EXÉQUIAS DE ALEXANDRE MAGNO

Ruínas de Éfeso
Atual Turquia
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
O sábio Alexandre da Macedônia, conhecido como Alexandre Magno, aos 32 anos, já havia conquistado todo o mundo de seu tempo: Europa, norte da África, Oriente Médio até o Afeganistão.Porém, por presunção, ao ferir-se com uma espada oxidada e recusar tratamento médico, contraiu o letal tétano que veia vitimá-lo. Diante da morte inevitável, o sábio rei, que fora aluno de Aristóteles e discípulo de Diógenes, o cínico, fez três exigências para suas exéquias:
1. Quero que os mais iminentes médicos carreguem meu caixão para mostrar que eles NÃO têm poder de cura perante a morte;
2. Quero que o chão seja coberto pelos meus tesouros para que as pessoas possam ver que os bens materiais aqui conquistados, aqui permanecem;
3. Quero que minhas mãos balancem ao vento para que as pessoas possam ver que de mãos vazias viemos.
Essas sábias exigências fazem-me perceber o quanto é infantil a luta para acumular imensas fortunas, tão inúteis ao indivíduo em sua caminhada derradeira. Assim, forçam a todos, num frenesi louco de produção e consumo, gerando uma multidão de miseráveis apenas pela vaidade de ostentar.

segunda-feira, 27 de abril de 2015

ALLAN KARDEC – O MAGO DOS ESPÍRITOS

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Túmulo de Alan Kardec 
Cimetière Père-Lachaise - Paris
Nascido na França, nos primórdios do século XIX, mais precisamente em 1804, na cidade de Lyon. Seu nome de batismo era Hippolyte Léon Denizard Rivail, porém, adotou o pseudônimo de Allan Kardec. Por longos anos, dedicou-se ao magistério e aos estudos filosóficos.
Somente aos 50 anos iniciou seus estudos sobre os espíritos, suas influências na vida e no comportamento humano e suas manifestações. Porém, de profunda formação acadêmica, jamais permitiu que os estudos dos espíritos entrassem em contradição com o saber acadêmico e a ciência de modo geral.
No monumental cemitério Père-Lachaise, em Paris, está sepultado o eminete estudioso, num túmulo em formato de um dólmen. Esse campo santo é imenso. Ocupa 19ha, em torno de 19 quarteirões. No túmulo rústico há dfuas inscrições que resumem a crença espírita. A primeira afirma:  
TOUT EFFET A UNE CAUSE TOT EFFET INTELLINGENT A UNE CAUSE INTELLIGENTE. (Todo efeito tem uma causa. Todo efeito inteligente tem uma causa inteligente)
E a segunda inscrição diz: LA PUISSANCE DE LA CAUSE EST EN RAISON DE LA GRANDEUR DE L'EFFET. (O poder da causa está na razão da magnitude do efeito).
A tumba do mestre do espiritismo é a mais enfeitada e florida de todo o magnífico cemitério parisiense. Ocorrem fenômenos estranhos durante as visitas. Em nossa visita, havia um homem muito estranho, meio mendigo, que nos seguia sem falar e desapareceu quando nos afastamos da sepultura de Kardec.
Sua primeira obra na área do espiritismo vai surgir para o público na maturidade do autor, que contava com mais de 50 anos ao lançar o “Livro dos Espíritos”.
Ainda o Père-Lachaise

Trata-se de um conjunto de perguntas e respostas que, de certa forma, aproxima-se do método platônico de abordagens temáticas. A primeira versão tem 501 itens, porém, a segunda, escrita alguns anos após, tem 1019 perguntas. Esse livro está fundado em revelações psicografadas por um grupo de moças que assessorava o pensador espírita. Seu próprio pseudônimo foi-lhe revelado por um espírito conhecido como espírito familiar que afirmou conhecê-lo desde o tempo das Gálias, em que se chamava Allan Kardec.
Além desse livro, publicou diversos outros, todos eles versando sobre a doutrina e realidade dos espíritos. De acordo com Alexander Moreira Almeida: “Kardec foi um dos pioneiros a propor uma investigação científica, racional e baseada em fatos observáveis, das experiências espirituais. Desenvolveu todo um programa de investigação dessas experiências, ao qual deu o nome de Espiritismo.”
As principais obras publicadas por Kardec são: O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho segundo o Espiritismo, O Céu e o Inferno e A Gênese.
Escreveu também uma série de obras complementares, algumas póstumas: A Prece segundo o Evangelho, Conselhos, reflexões e máximas de Allan Kardec, Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas, O Espiritismo em sua mais simples Expressão, O Principiante Espírita (parte da obra “O que é o Espiritismo”), O que é o Espiritismo e as obras Póstumas: Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas, Revista Espírita (doze volumes anuais – 1858 a 1869) e Viagem Espírita.
Segundo Carlos afirma Imbassahy: “Saúde física, estima pública, paz em família, florescentes condições econômicas, dignidade social, satisfações e triunfos, nada do que nos ocupa e preocupa todos os dias e por que lutamos como por coisas sem as quais a vida seria um tormento, nada pode representar o valor que há em saber-se o que nos sucederá depois da morte.
Kardec no Père-Lachaise










Para mostrar o que há depois da morte é que manifestam-se os Espíritos, e entre eles manifestaram-se os pioneiros da Mensagem, que vieram trazer os seus ensinos a Allan Kardec. Esses ensinos, sob a garantia da prova, no fenômeno paranormal, explicam as dúvidas que pairam no espírito humano. Na parte filosófica ilumina-se o problema do ser, justifica-se a dor, companheira inseparável da criatura, e Deus nos aparece sob outro prisma, no verdadeiro esplendor dos seus atributos divinos.
Finalmente, trouxeram-nos eles a Moral que nos deve encaminhar, pelo Bem, à suprema felicidade.”


domingo, 26 de abril de 2015

RASPUTIN, O EXÓTICO MONGE DA CORTE RUSSA DOS ROMANOV - Распутин, Григорий Ефимович

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Para entender o papel de Rasputin na corte russa, cujo reinado cocorreu no momento final da dinastia dos Romanov, em inícios dom século XX, é antes necessário olhar um pouco para o modo como se desenhava a política e a economia na Rússia, na Europa e no mundo, nesse período de grandes alterações das configurações da política e da economia internacional.
A Inglaterra despontava como a principal potência industrial europeia, com apoio de sua poderosa frota de guerra que lhe permitia o controle dos mares e consequentemente do comércio internacional.
Porém, a vitória alemã na guerra franco-prussiana de 1870/71, embora enfraquecesse a França com a perda das ricas províncias da Alsácia e da Lorena para o Império Austro-Húngaro e condenasse os franceses a pesada indenização, favoreceu a unificação alemã por Otto Von Bismarck e a criação do Segundo Reich, sob o comando do imperador Guilherme II, que reinaria até 1919. Seria  também um forte opositor econômico à Inglaterra. O estado prussiano era absolutista e burocrático, altamente militarizado.
Nesse contexto, a casa dos Romanov estava em decadência. Instalada por Mikhail I, ainda no longínquo século XVI, confirmada pelo Poderoso Pedro Romanov, o grande, e modernizada pela sofisticada Catarina Romanov, a grande, a dinastia Romanov encontrava-se, nos primeiros anos do século XX, com Nicolau Romanov II, em situação econômica e militar inferior em relação aos mais poderosos países europeus, mais especificamente Inglaterra, Alemanha (Áustria-Hungria) e França. Desde os tempos de Catarina, na corte de São Petersburgo falava-se francês.
Rasputin

Nicolau (Nicolau Alieksandrovich Romanov, em russo Николáй Алексáндрович Ромáнов) era filho do czar Alexandre III, e foi consagrado imperador de todas as Rússias, rei da Polônia e grão-príncipe da Finlândia, em primeiro de novembro de 1894, cargo que ocupou até 15 de março de 1917. Tinha como esposa Alexandra Feodorovna, com a qual gerou cinco filhos: Olga, Maria, Tatiana, Anastácia e Alexei.
Sob o reinado de Nicolau II, a Rússia decai de uma das maiores potências da Europa e do mundo, para um reino desastrado tanto militar quanto economicamente. Em 1917, depois do fracasso contra os revolucionários, abdica em favor de seu irmão grão-duque Miguel Alexandrovich Romanov.
Foi um rei sanguinário, moveu grandes perseguições políticas. Já na cerimônia de sua posse, nos festejos nos campos, uma desordem provocou enorme reação policial que teria assassinado em torno de mil e quinhentas pessoas e ferido por volta de vinte mil, fato que ficou conhecido como Tragédia de Khodynka. Seus crimes culminaram com os fatais pogroms antissemitas, que consistiam em ataques simultâneos a residências, empresas, templos e cemitérios judaicos a um só tempo.
Sua derrocada final ocorreu quando da tentativa de retomada de seu quartel-general durante a revolução russa de 1917, seu comboio foi detido em Pskov e Nicolau forçado a abdicar. Foi aprisionado com juntamente com toda a família no palácio de Tsarskoye Selo, a 26 km de São Petersburgo.
Nicolau II e sua família
 (da esquerda para a direita):
 Olga, Maria, Nicolau, Alexandra,
Anastásia, Alexei e Tatiana.

Em agosto de 1917, a família prisioneira foi transferida para os montes Urais, para a casa do governador, em Tobolsk. Finalmente, foram todos confinados na Casa Ipatiev, uma instituição comercial, também nos Urais, em Ekaterimburgo. Aí a família foi executada pelos bolcheviques, nos porões da casa, na madrugada de 16 para 17 de julho de 1918, juntamente com seu médico pessoal Eugene Botkin, o serviçal da corte Alexei Yegorovich Trupp, o cozinheiro da família Ivan Mikhailovich Kharitonov e a camareira da imperatriz Anna Stepanovna Demidova.
Todo seu reinado foi marcado por fraquezas e excessos. Seu pai falecera inesperadamente, aos 49 anos, quando tinha 26 anos e não se havia ainda preparado para governar.
Não apenas não estava preparado para governar, como não o desejava.
Afirma-se que, chorando, teria afirmado ao primo Alexandre: "O que será de mim e da Rússia? Eu não estou preparado para ser Czar e nunca o quis ser. Não percebo nada dos negócios do governo. Não sei nem sequer como hei de falar com os ministros".
Logo após a morte do pai e assumir o reino, uniu-se em casamento com a princesa alemã Alexandra de Hesse. Ela, segundo muitos historiadores, tinha enorme ascendência sobre ele. Provavelmente, por perceber-lhe as fraquezas, passou a dominá-lo.
Por essas razões, seu governo foi extremamente ineficiente, não oferecendo condições aos empresários para o desenvolvimento industrial do reino. Também não modernizou o atrasado sistema agrícola da Rússia, ainda suatentado por moldes feudais.
Todos esses atrasos, somados a um sistema absolutista de governar, criaram um descontentamento generalizado que começava nas elites da nobreza, atingia e proletariado urbano, os bolcheviques, e acabava nos servos da agricultura, os pobres mencheviques.
É nesse reinado e nessa situação histórica que surge Grigori Iefimovitch Novykh, popularmente conhecido como Rasputin. Era um ambiente propício para a ascensão de uma figura tão ímpar e tão controvertida quanto a dele.
Rasputin era uma figura estranha. De procedência rural, filho de pobres mujiques, que haviam sido escravos, servos da gleba, como se classificavam no período feudalista, era um mago sujo e grosseiro. De barba desgrenhada, cabelos compridos, sujos e engordurados, no entanto, impressionava tanto o populacho quanto alguns membros da nobreza, incluída nesses a própria família dos imperadores.
Mal sabendo ler e escrever, causava mais temor do que afeto. Era, porém, odiado por uma grande parte da nobreza, que o acusava de amante da czarina, além de o responsabilizarem pelo grande fracasso russo na primeira guerra mundial. O fato relevante é que exercia influência nas decisões do czar, como a nomeação de mandatários para cargos importantes, até mesmo para a função de ministros de estado. Tinha também influência decisiva na escolha dos líderes da religião ortodoxa russa.
Malgrado sua figura execrável e seus hábitos de higiene e postura pouco recomendáveis, exercia inegável influência sobre os czares, jamais negada por ninguém. Em função disso, houve mutos movimentos contra ele e mesmo algumas tentativas de assassinato contra ele, o que o rude mago não ignorava.
Uma carta profética foi elaborada por ele em dezembro 1916 e encaminhada ao czar Nicolau II. Este é o texto do documento:
“Czar de todas as Rússias, tenho o pressentimento de que até o final do ano eu deixarei este mundo. Serei assassinado, já não estarei entre vós. Se eu for morto por gente do povo, gente como eu, tu não tens nada a temer, continuarás no trono. Mas, se eu for morto por nobres, as mãos deles ficarão manchadas pelo meu sangue. Eles se odiarão e matarão uns aos outros. Dentro de 25 anos não restará um único nobre neste país. Nenhum parente teu, nenhum de teus filhos sobreviverá mais de dois anos. O povo russo dará cabo de todos. Assim, depois que eu desaparecer, tem cuidado, pensa bem, protege-te. Diz a todos os teus que derramei meu sangue por eles. Reza, reza, sê forte, pensa em tua família.”
Poucos dias depois da publicação da profética carta, teria Rasputin recebido um telefonema anônimo de advertência para que tomasse cuidado, pois um perigo iminente o aguardava. Lacônico, sem mais detalhes, o ameaçador telefonema não fornecia mais detalhes sobre o tipo de perigo contra o qual o mago se deveria precaver. A seguir, o próprio Ministro do Interior do czar, Alexander Dmitriyevich Protopopov, foi pessoalmente à sua residência a fim de adverti-lo para que permanecesse em casa, trancado, e tivesse as mais cuidadosas precauções.
Rasputin não levou em consideração nenhuma dessas advertências. À meia-noite, bufonescamente vestido, camisa azul celeste bordada de girassóis, calça preta de veludo e botas de cano alto de verniz, dirige-se ao palácio Iussupov, o ambiente mais requintado e luxuoso de São Petersburgo.
O próprio príncipe Félix Iussupov enviou-lhe seu carro particular, em que o mago, todo perfumado, dirigiu-se ao palácio. Rasputin conheceria a jovem esposa do anfitrião, a princesa Irina, depois do que participariam, em local fora do palácio, de festejos ciganos.
Tratava-se, no entanto, de uma cilada. A princesa encontrava-se, de fato, na residência dos príncipes na Crimeia. Quatro cúmplices do príncipe aguardavam Rasputin, acompanhados de algumas amigas e de uma bailarina do Bolshoi. O príncipe havia encomendado doces envenenados e havia também envenenado com cianeto o copo que estava destinado ao mago.
O convidado, por não apreciar doces, primeiramente os recusou, mas acabou consumindo alguns, por insistência do anfitrião. Quando o príncipe passou-lhe o vinho, que o convidado apreciava sobejamente, o dono da casa já se preocupava pela ausência de efeito do veneno inserido nos doces. O mago bebeu e repetiu do vinho envenenado com cianeto, sem manifestar qualquer efeito do poderoso tóxico.
Desconcertado pela ausência de efeito do veneno sobre o desafeto mago, o príncipe solicitou licença ao convidado e afastou-se para consultar os cúmplices diante do imprevisto. Rasputin parecia adivinhar-lhes as intenções e sorria diante do desconforto deles, repetindo sucessivas taças de vinho envenenado. Isso levou os conspiradores à conclusão de que o mago tinha pacto com satanás.
Rasputin os contemplava com olhar zombeteiro que os comparsas do príncipe interpretavam como diabólico. Iussupov, depois de muito discutir, no andar de cima, com os amigos que aí o aguardavam, as alternativas que tinha para livrar-se do indesejável mago, retorna à sala onde estava Rasputin com os demais convivas, levando no bolso seu revólver.
Ao chegar à sala, enquanto o distraía mostrando-lhe um crucifixo, atira-lhe sorrateiramente no peito, deixando-o caído no assoalho, contorcendo-se. Ato contínuo, os comparsas do príncipe entram na sala e carregam o corpo ainda dando sinais de vida. O corpo ainda vivo foi jogado no rio Neva, então congelado pelo inverno russo, tendo aparecido o cadáver mutilado, nas margens mais abaixo, alguns dias depois. A polícia identificou os assassinos, pelas múltiplas pistas que deixaram.
O povo, sabedor do assassinato, considerou o monge como santo e passou a recolher a água que tinha entrado em contato com o corpo dele, atribuindo-lhe poderes sobrenaturais.
Daí por diante, enquanto grande parte da nobreza considerava a morte do mago uma vitória da pátria sobre um usurpador, a maioria do povo simples passou a considerá-lo um mártir, provindo da classe miserável, que defendia os interesses do povo sofrido junto ao czar e assassinado pela nobreza. O rei, temendo uma reação maior da nobreza caso aprofundasse as investigações sobre os criminosos, apenas expulsou os assassinos da cidade e mandou encerrar o processo.
Porém, o nome de Rasputin tornou-se santo entre o povo simples, embora sua história de vida seja obscura e pesassem sobre ele acusações de assédio a mulheres em sua juventude na Sibéria, de onde se acreditava originário, mais precisamente de um vilarejo da região de Tobolsk. Segundo alguns, teria recebido, na infância, uma aparição da virgem Maria. Depois, teria feito uma longa peregrinação na qual teria ido mesmo até a Grécia. Nessa viagem, teria passado por muitos mosteiros, onde aprendera muito do que divulgava em suas falas.
A fé que a czarina tinha nas palavras e conselhos do mago se deviam à cura do filho dos reis Alexei que seria hemofílico. Isso gerou na família real uma confiança absoluta no monge, que acabaram por considera-lo o mensageiro de Deus.

Tempos depois, o mito foi crescendo. Atribuiu-se mesmo seu assassinato ao serviço secreto britânico. Nunca se soube exatamente o ocorrido, nem as verdadeiras intenções e o verdadeiro papel desse monge junto à corte russa.

sábado, 25 de abril de 2015

POESIA ROMÂNTICA PORTUGUESA DE JOÃO DE DEUS

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Diferentemente do olhar realista de Machado de Assis, o poeta romântico português João de Deus de Nogueira Ramos contempla o mundo que o cerca sob o vezo da subjetividade e do sonho:

A VIDA

A vida é o dia de hoje,
A vida é ai que mal soa,
A vida é sombra que foge,
A vida é nuvem que voa;
A vida é sonho tão leve
Que se desfaz como a neve
E como o fumo se esvai:
A vida dura num momento,
Mais leve que o pensamento,
A vida leva-a o vento,
A vida é folha que cai!
A vida é flor na corrente,
A vida é sopro suave,
A vida é estrela cadente,
Voa mais leve que a ave:
Nuvem que o vento nos ares,
 Onda que o vento nos mares,
 Uma após outra lançou,
 A vida – pena caída
Da asa da ave ferida
De vale em vale impelida
A vida o vento levou!

João de Deus compôs uma singela e encantadora versão da oração do Pai Nosso, num poemeto muito sonoro, com tom de reverente prece:

Padre Nosso
   Pai nosso, de todos nós,
Que todos somos irmãos;
A Ti erguemos as mãos
E levantamos a voz:

   A Ti, que estais no Céu,
E nos lanças com clemência,
Do vasto estrelado véu
Os olhos da Providência!

   Bendito, santificado
Seja o Teu nome, Senhor!
Inviolável, sagrado
Na boca do pecador!

   E venha a nós o Teu reino!
Acabe o da vil cobiça!
Reine o amor, a justiça
Que pregava o Nazareno;

   De modo que seja feita
A Tua santa vontade,
Sempre a expressão perfeita
Da justiça e da verdade!

   Seja feita assim na terra
Como no Céu onde habita
Esse, cuja mão encerra
A criação infinita!

   O pão nosso nesta lida
De cada dia nos dá…
Hoje, e basta; a luz da vida
Quem sabe o que durará!

   E perdoa-nos, Senhor,
As nossa dívidas; sim!
Grandes são, mas é maior
Essa bondade sem fim!

   Assim como nós (se é dado
Julgar-nos também credores),
Perdoamos de bom grado
Cá aos nossos devedores.

   E não nos deixes, bom Pai,
Cair, nunca, em tentação;
Que o homem, por condição,
Sem o teu auxílio cai!

   Mas tu, que não tens segundo
E muito menos igual,
Dá-nos a mão neste mundo,
Senhor! Livra-nos do mal!


A POESIA FILOSÓFICA DE MACHADO DE ASSIS

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Machado é reconhecido internacionalmente pelas suas narrativas, cujas tramas foram urdidas com tamanha sabedoria e sutileza, que provocam discussões até mesmo hoje.
Porém, eu aprecio também a poesia de cunho filosófico que o mestre e bruxo do Cosme Velho produziu.
O poema a seguir reproduz a constante insatisfação do ser humano com a sua realidade.


CÍRCULO VICIOSO

Bailando no ar, gemia inquieto vagalume:
"Quem me dera que eu fosse aquela loira estrela
Que arde no eterno azul, como uma eterna vela!"
Mas a estrela, fitando a lua, com ciúme:

"Pudesse eu copiar-te o transparente lume,
Que, da grega coluna à gótica janela,
Contemplou, suspirosa, a fronte amada e bela"
Mas a lua, fitando o sol com azedume:

"Mísera! Tivesse eu aquela enorme, aquela
Claridade imortal, que toda a luz resume"!
Mas o sol, inclinando a rútila capela:

Pesa-me esta brilhante auréola de nume...
Enfara-me esta luz e desmedida umbela...
Por que não nasci eu um simples vagalume?"...

A seguir, este outro poema do grande pensador revela a inquietação do mestre diante dos fenômenos mais fundamentais da existência, ou seja, a vida e a morte:

UMA CRIATURA

Sei de uma criatura antiga e formidável,
Que a si mesma devora os membros e as entranhas
Com a sofreguidão da fome insaciável.

Habita juntamente os vales e as montanhas;
E no mar, que se rasga, à maneira de abismo,
Espreguiça-se toda em convulsões estranhas.

Traz impresso na fronte o obscuro despotismo;
Cada olhar que despede, acerbo e mavioso,
Parece uma expansão de amor e de egoísmo.

Friamente contempla o desespero e o gozo,
Gosta do colibri, como gosta do verme,
E cinge ao coração o belo e o monstruoso.

Para ela o chacal é, como a rola, inerme;
E caminha na terra imperturbável, como
Pelo vasto areal um vasto paquiderme.

Na árvore que rebenta o seu primeiro gomo
Vem a folha, que lento e lento se desdobra,
Depois a flor, depois o suspirado pomo.

Pois essa criatura está em toda a obra:
Cresta o seio da flor e corrompe-lhe o fruto;
E é nesse destruir que as suas forças dobra.

Ama de igual amor o poluto e o impoluto;
Começa e recomeça uma perpétua lida,
E sorrindo obedece ao divino estatuto.
Tu dirás que é a Morte; eu direi que é a Vida.


quinta-feira, 23 de abril de 2015

Los Brizolara - Origen y Descendientes en Uruguay

Sinto-me imensamente honrado com a inclusão neste seleto grupo. 

Obrigado pela generosidade do convite. 

Será um prazer enorme fazer parte de "Los Brizolara".

 https://www.facebook.com/groups/1556173294615433/?pnref=story

quarta-feira, 22 de abril de 2015

O INUSITADO CEMITÉRIO JUDEU DA CIDADE DE PRAGA – MARCA DA PRESENÇA JUDAICA NO LESTE DA EUROPA

No centro de Praga
"Sinto um certo embaraço ao começar a escrever como se pusesse minha alma a nu, por ordem — não, Deus do céu!, digamos por sugestão — de um judeu alemão (ou austríaco, mas dá no mesmo). Quem sou? Talvez seja mais útil me interrogar sobre minhas paixões do que sobre os fatos da minha vida." (Umberto Eco - O Cemitério de Praga). 

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
O Cemitério judeu de Praga envolve uma história particular e inusitada. A visão de todas aquelas lápides, sem sepultura, postas umas ao lado das outras, naquele campo santo, causam estranheza. O visitante logo se interroga da razão daquilo. Não se deve esquecer que este cemitério emprestou seu nome à famosa obra de Umberto Eco.
Pensa-se em uma reforma. No resgate de sepulturas de outros locais. O simples olhar pelos arredores não oferece nenhuma resposta. Somente uma investigação histórica traz uma explicação plausível, para aquelas cenas insólitas.
Primeiramente, vou abordar o cemitério atual da capital da República Checa, a maravilhosa Praga, a Paris do Leste, com seus prédios coloridos em oposição ao tom cinza da cidade luz. Depois, farei uma explanação da história que levou à atual situação do cemitério.
Situa-se, o cemitério de Praga, no Josefov, o conhecido bairro judeu da cidade, onde se encontra o mais antigo cemitério judaico do mundo.
No século X, migrantes judeus começaram a se estabelecer na bela cidade do leste. Porém, após o primeiro pogrom, ou seja, o primeiro ataque em massa, simultaneamente, a pessoas, casas, negócios e centros religiosos, o povo judeu concentrou-se num único bairro da cidade de Praga, com a evidente intenção de autoproteger-se.
Esse bairro passou a abrigar também o cemitério particular do povo judeu. Como, em curto tempo, o espaço do campo santo esgotou-se, a solução foi remover as lápides, para que uma nova camada de terra encobrisse os antigos túmulos e o espaço ficasse disponível para novas sepulturas.
Assim, sucessivas camadas foram sendo sobrepostas umas às outras de tal forma que o pequeno espaço abriga em torno de doze mil sepultos. Segundo se crê, há doze camadas sobrepostas nesse insólito cemitério. Desse modo, permanecendo todas as lápides na superfície, essas encontram-se quase amontoadas.
Cemitério de Praga

Hoje, para a visita, paga-se uma taxa que inclui também a visita a algumas sinagogas locais. Existe um itinerário prefixado para as visitas, para que, sendo o espaço muito exíguo e muitos os visitantes, seja mais rápida a participação de cada indivíduo e não sejam quase possíveis as fotografias.
Mas, vista a história particular e peculiar do cemitério da capital checa, voltemos a uma recuperação da história do povo judeu, que conduziu à situação das grandes perseguições, cuja culminância foi o holocausto nazista do século passado.
 Os judeus sofreram diversos processos de diáspora (dispersão) por sucessivas vezes, através da história. A primeira diáspora de que se tem notícia, ter-se-ia dado no governo de Nabucodonosor, rei da Babilônia, no ano 587 a. C., em que grandes levas de judeus foram deportados para a Mesopotâmia e escravizados pelos caldeus.
Depois, durante o primeiro período de grande instabilidade do Império Romano, que culminou com o governo de Nero, sob a acusação de rebeldia, o general Vespasiano cercou Jerusalém pelo longo período de dez anos. Depois da morte do imperador Augusto, a famosa “pax augustiana” principia a desgastar-se.
Tibério, o controvertido enteado do imperador, fez um governo cruel e ao mesmo tempo displicente: o imperador afastou-se de Roma, em seu longo exílio na ilha de Capri, de 26 a 37 d. C., por aversão ao cargo e por temor ao assassinato. Estabeleceu seu ministro Sejano como mandante de Roma em seu nome. Esse distanciamento favoreceu as injustiças e a corrupção e colaborou para o enfraquecimento do poder romano sobre as províncias.
Com a posterior desastrosa administração de Calígula, o tendencioso governo do epilético Cláudio e a criminosa administração de Nero, a derrocada parecia próxima. Isso favoreceu a revoltas como a da Judéia. Foram dez anos de cerco cruel, especialmente narrados por Flávio Josefo, historiador judeu-romano dessa época.
Pois, no período final do cerco, nos anos 69 e 70 d. C., foram assassinados nada menos do que quatro imperadores. Primeiramente Nero, a seguir Galba, Otão e Vitélio foram assassinados ou obrigados a suicidar-se, como querem alguns historiadores.
Foi então que o general Vespasiano, apoiado pelas tropas com sede no Egito, seguido por todas as tropas do oriente, deixou seu filho Tito para concluir a destruição de Jerusalém e restabeleceu a ordem no Império, tornando-se o primeiro imperador da dinastia dos Flavianos, encerrando a dinastia das famílias Júlio-Claudianas.
Lápides do cemitério de Praga

Esse restabelecimento da ordem foi a danação das pretensões judaicas de liberdade. Tito tratou a cidade com extremo rigor, destruíu-lhe o templo e todas as residências, bem como as muralhas e dispersou o povo judeu pelo império. Em 135 d. C, durante o império de Adriano, houve nova rebelião judaica. Essa derrota definitiva dos judeus levou o imperador a dispersá-los pelo mundo. Muitíssimos foram levados como escravos pelas tropas romanas e vendidos nos mais diferentes pontos do império. Os demais migraram para onde melhor lhes aprouvesse. Desse modo, praticamente não restaram judeus na palestina.
Nos primeiros séculos da era cristã, ainda com a germânia sob o domínio romano, chegaram os primeiros judeus à região onde hoje se situa a Alemanha. Mesmo antes de se formarem comunidades alemãs, os judeus já formavam um povo nessas regiões, especialmente nas cidades do Reno e do Danúbio. Dedicavam-se ao comércio, ao artesanato, à medicina e ao estudo do Talmude.
A partir do século XI, começaram a surgir comunidades judaicas conhecidas como judiarias, na região da Alemanha. Porém, já a partir dos concílios de Elvira, cidade da Hispania Romana, em 306 d. C., e Arles na Gália, atual França, em 314 d. C., iniciaram-se as edições de um conjunto de normas disciplinatórias em relação à conduta dos povos cristãos.
Essas normas regulamentavam, de modo mais específico, as relações entre cristãos e não cristãos. Entre os não cristãos, três tipos de cidadãos eram especialmente marcados: os politeístas, que recebiam a classificação de, os judeus e os hereges, ou seja, os que não possuíssem crença divindade ou religião alguma.
A primeira proibição aí estabelecida era o casamento entre cristãos e não cristãos. Quem não obedecesse a essa norma era considerado impuro, portanto, interditado à comunhão, e excluído da salvação eterna.
Acusavam os judeus pela crucificação de Jesus Cristo, embora os próprios evangelhos afirmem que essa fora obra dos romanos. Isso consistia num absurdo de fundo excludente e racista, pois, se, levada às últimas consequências, essa condenação atingiria os apóstolos, não esquecendo que mesmo Cristo era judeu.
Veja-se esta norma absurda do Concílio de Elvira: “Se algum clérigo ou batizado come com judeus, concordou-se que se abstenha da comunhão, para que se emende (ut debeat emendari )” ( Concílio de Elvira , c. 50).
Esse separatismo entre cristãos e judeus se foi agravando de tal maneira que, a partir do século XIV, os judeus começaram a em comunidades isoladas. Já no século XI, o antissemitismo principia a agravar-se na Alemanha, provindo da França, pois o concílio de Clermont (1095), convocado pelo Papa Urbano II, estabelece a primeira cruzada para a libertação da Terra Santa.
O lema das cruzadas consistia no seguinte: Quem matar um judeu obterá perdão de todos os pecados. Assim, quem não queria ou não podia participar das cruzadas, atacava os judeus locais.
Há crônicas judaicas dessa época que relatam massacres nas regiões de Speyer, Worms, Mainz, Trier e Köln. Por toda a Europa, havia um sentimento de inveja relativamente à boa situação financeira dos Judeus. Sucederam-se os pogroms em vários países. Alguns bispos, no entanto, por interesses econômicos, tentaram ajudar os judeus. Alguns judeus, para evitar as perseguições, passaram a receber o batismo. Esses ficaram conhecidos como cristãos novos.
Em 1146, depois da segunda cruzada, diminuíram as perseguições e massacres, mas aumentaram as multas aos membros judeus das comunidades. A seguir, criou-se o sagrado tribunal da inquisição, que condenou milhares de judeus à morte. Instituíram-se os ignominiosos autos de fé, em que os acusados, depois de humilhados e torturados pelas ruas da cidade, eram queimados vivos em locais públicos.
A inquisição não perseguia exclusivamente os judeus, mas eles foram o alvo mais importante de sua ação e tribunais. Acontecia também que, muitos cristãos novos, mesmo convertidos ao cristianismo, acabaram condenados pelos sacros tribunais.
Quando surgiu a peste negra, entre 1348 e 49, foram novamente os judeus acusados de serem os responsáveis por ela. Foram eles também acusados de envenenamento de poços. Por isso, algumas aldeias judaicas foram incendiadas e seus cemitérios destruídos.
Todavia, no século XVI, com o surgimento do luteranismo, houve um afrouxamento nas medidas antissemitas. Assim, no século XVII, alguns abastados judeus portugueses estabeleceram-se em Hamburgo, com alguns poderosos estabelecimentos bancários, cujas filiais se estabeleceram em outros países, até mesmo na América.
Porém, a grande maioria dos judeus do leste europeu ainda vivia em guetos, regidos pelas leis religiosas dos rabinos. Porém, eles tinham acesso à escola e, especialmente, à alfabetização, o que lhes proporcionava maior desenvolvimento econômico em relação a outros povos. Muitos judeus dessa região falavam ídiche, um dialeto formado do alemão, do hebraico e de línguas eslavas.
Com a ascensão da burguesia, houve a possibilidade de emancipação dos judeus, porém sob um alto preço, ou seja, sob a exigência do abandono de sua religião e crenças.
Vieram, então, os racismos, especialmente na Europa. Muitos teóricos estabeleciam critérios para a classificação das raças entre superiores e inferiores. Um dos maiores teóricos da supremacia de certas raças, de modo especial a raça ariana, é o sociólogo francês Joseph Arthur de Gobineau. Outro conceituado racista europeu foi o pensador inglês Houston Stewart Chamberlain, cujo pensamento serviu de suporte para Hitler e Goebels.
Esse racismo europeu teve como consequências as barbaridades praticadas contra o povo judeu durante o segundo grande conflito mundial, que, por demasiadamente conhecido, abstenho-me de descrever no presente texto. Creio que esta breve explanação seja suficiente para se entender a realidade que teve como resultado a construção do inusitado cemitério juddeu da cidade de Paga.



sábado, 18 de abril de 2015

DE MEU QUASE AMIGO EDUARDO GALEADO - DE SEU LIVRO - ESPEJOS: UNA HISTORIA CASI UNIVERSAL

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
INVENTARIO GENERAL DEL MUNDO
Eduardo Galeano

Arthur Bispo do Rosario fue negro, pobre, marinero, boxeador y artista por
cuenta de Dios.

Vivió en el manicomio de Río de Janeiro.
Allí, los siete ángeles azules le trasmitieron la orden divina: Dios le
mandó hacer un inventario general del mundo.
Monumental era la misión encomendada. Arthur trabajó noche y día, cada día,
cada noche, hasta que en el invierno de 1989, cuando estaba en plena tarea,
la muerte lo agarró de los pelos y se lo llevó.

El inventario del mundo, inconcluso, estaba hecho de chatarras,
vidrios rotos,
escobas calvas,
zapatillas caminadas,
botellas bebidas,
sábanas dormidas,
ruedas viajadas,
velas navegadas,
banderas vencidas,
cartas leídas,
palabras olvidadas y
aguas llovidas.
Arthur había trabajado con basura. Porque toda basura era vida vivida, y de
la basura venía todo lo que en el mundo era o había sido. Nada de lo intacto
merecía figurar. Lo intacto había muerto sin nacer. La vida sólo latía en lo
que tenía cicatrices.




quinta-feira, 16 de abril de 2015

EM MEMÓRIA DE MEU TIO PEDRINHO, FALECIDO AOS SEIS ANOS, HÁ MAIS DE UM SÉCULO

Cemitério do Morro Redondo
Não conheci meu tio Pedrinho. Minha mãe também não. A dor da sua partida foi tamanha, que sempre senti no coração e nas palavras de minha mãe uma imensa sombra dele, irmão um pouco mais velho, o único homem, entre nove mulheres. E se foi tão inocente. E a dor se repetia no coração de minha avó. Sempre amei o Pedrinho, sem jamais tê-lo visto. Porém, no domingo que passou, fui ao cemitério onde ele foi enterrado aos seis aninhos e nada encontrei mais. Muitas campas sem nome. Pedras e tijolos esverdeados pelo tempo num lugarzinho pequeno. Eu havia visto este tumulozinho há muitos anos. Como não há nome algum, nem curz marcada, nem lápide alguma, não fui capaz de encontrá-lo. Todos os que haviam ouvido falar nele devem já ter partido. Então, escrevi este pequeno réquiem para ele. Eu sempre o amei, porque todos os que me falavam dele o amavam. Requiescat in pace!
Ainda o Morro Redondo

PEDRINHO NINGUÉM

Houve um tempo em que me atormentavam
Temores  e sestros noturnos de espíritos finados.
Aos pucos, no entanto, essas visitas constantes
tornaram-se aprazíveis devaneios.
Tantos espiraram a meu lado,
Mesmo comigo falando.
Pois, nessa noite, um cão longínquo
Ladrava na madrugada,
Longos uivos tão plangentes
Que enchiam a noite lânguida.
As velhas pedras e tijolos, 
As lápides enegrecidas das umidades de tantos outonos,
As flores de painera enfeitavam o chão atapetado de rosa.
Naquele ermo recanto de colina,
Não era possível...
Dele nada restara:
Nem minúscula tumba,
Uma cruz esverdeada,
Uma lápide,
Nada...
Somente a mesma sombra de ciprestes...
Os mesmos muros caiados...
Fora-se tão cedo,
Seis aninhos, disseram, 
Pedro, tio Pedrinho,
Ora pro nobis!
Quando eu também me for,
Somente restarão estes versos,
Que te poderão ressuscitar, um dia,
Nas almas de incautos leitores,
Se os houver...
Per omnia saecula saeculorum.

quarta-feira, 15 de abril de 2015

POESIA POLITICAMENTE ENGAJADA DE GÜNTER GRASS

Em Frankfurt - setembro de 2013
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara


Günter faz parte de um grupo de poetas e dramaturgos policamente engajados, que especialmente no período do pós-guerra criticam atitudes políticas incorretas. Veja-se o que já dizia B. Brecht sob essa perspectiva:
"Que tempos são esses, em que
falar de árvores é quase um crime
Pois implica silenciar sobre tantas barbaridades?"
No mesmo tom, Grass compôs o poema abaixo, como crítica à política da Europa em relação à Grécia, uma nação irmã.



"A Vergonha da Europa”
(poema de apoio à Grécia)


À beira do caos porque fora da razão dos mercados,
Tu estás longe da terra que te serviu de berço.
O que buscou a Tua alma e encontrou
rejeitá-lo Tu agora, vale menos do que sucata.
Nua como o devedor no pelourinho sofre aquela terra
a quem dizer que devias era para Ti tão natural como falar.
À pobreza condenada a terra da sofisticação
e do requinte que adornam os museus: espólio que está à Tua cura.
Os que com a força das armas arrasaram o país de ilhas
abençoado levavam com a farda Hölderlin na mochila.
País a custo tolerado cujos coronéis
toleraste outrora na Tua Aliança.
Terra sem direitos a quem o poder do dogma aperta o cinto mais e mais.
Trajada de negro, Antígona desafia-te e no país inteiro
o povo cujo hóspede foste veste-se de luto.
Contudo os sósias de Creso foram em procissão entesourar
fora de portas tudo o que tem a luz do ouro.
Bebe duma vez, bebe! grita a claque dos comissários,
mas Sócrates devolve-Te, irado, a taça cheia até à borda.
Os deuses amaldiçoarão em coro quem és e o que tens
se a Tua vontade exige a venda do Olimpo.
Sem a terra cujo espírito Te concebeu, Europa,
murcharás estupidamente.
Günter Grass
(traduzida do alemão por Carlos Leite)
disponível em:oarforadaasa.blogspot.com.br/2015/04/a-vergonha-da-europa-gunter-grass.html

O DIABO NA LIVRARIA DO CÔNEGO – INCONFIDÊNCIA MINEIRA

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
No campo que pertenceu a meu avô
Eduardo Frieiro, um ilustre professor da Universidade Federal de Minas Gerais, já falecido escreveu um livro em que analisa a Inconfidência Mineira, que culminou com a condenação de Tiradentes e muitos de seus colegas. Em livro memorável, intitulado “O Diabo na Livraria do Cônego”, aborda especialmente a presença de um cônego incluído entre os inconfidentes.
Trata-se do cônego Luís Vieira da Silva, condenado como conspirador. Pouco se sabe sobre esse pobre cônego. O que restou na devassa feita pelos inspetores da rainha é quase um milheiro de livros. Era, possivelmente, a maior biblioteca do Brasil. Para se entender melhor esse fato, observemos que Immanuel Kant, o maior filósofo desses tempos, que vivia na Alemanha culta, não possuía mais de trezentos livros.
Fazendo uma retrospectiva, era um período de grandes transformações sociais. Vivia-se a época mais dura dos expurgos da Revolução Francesa. Em 1776, houvera a declaração de independência dos Estados Unidos do domínio inglês. E, certamente, havia um clima de insatisfação com a submissão do Brasil a Portugal.
Aqui, as descobertas de ouro e diamantes geravam rendimentos fantásticos a Portugal. Porém, a progressiva diminuição do produto das minas conduziu ao aumento de impostos.
Esse aumento provocou um movimento conhecido como Inconfidência Mineira. Seria um movimento que incluía mineradores, intelectuais e escritores. Há mesmo quem afirme não ter havido uma inconfidência formal, pelo menos, o movimento, se de fato aconteceu, teria sido de muito menor vulto do que aquele apresentado pelos inspetores do reino. A rainha D. Maria I, sofria de ataques nervosos, sendo mesmo considerada demente por parte da corte lisboeta. Sentia-se insegura diante da administração de um reino tamanho. Por outro lado, crescia o papel do Marquês de Pombal junto à corte.
Concluem alguns que, de fato, havia uma insatisfação generalizada com a administração portuguesa. Porém, há mesmo pesquisadores que acreditam não ter havido inconfidência alguma. Tiradentes seria um líder muito insignificante para congregar um grupo de intelectuais, juízes, advogados, ricos proprietários de empresas de mineração, a elite local em prestígio e poder.
Numa tentativa de mostrar serviço à rainha, teriam juntado em seus relatórios todos os potenciais conspiradores e colecionado provas reais e outras tantas forjadas, como sói acontecer até hoje, de tal forma que a grande conspiração tomou uma aparência de realidade. Depois, a condenação e execução de Tiradentes, bem como o exílio de outros tantos, reprimiram, por longo tempo, os movimentos separatistas.
Assim, o cônego Luís Vieira da Silva provavelmente tenha sido apenas um intelectual e alfarrabista de seu tempo, cujo maior crime teria sido possuir uma das maiores bibliotecas particulares de seu tempo. Como intelectual, provavelmente não estivesse conformado com a administração portuguesa. Mas daí até sua inclusão entre os inconfidentes formais, se é que os houve, vai um exagero próprio dos sistemas arbitrários e opressores.

terça-feira, 14 de abril de 2015

A CONTROVERSA POESIA DE GÜNTER GRAS

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Berlim - Reichtag - inverno de 2009
Günter sempre foi polêmico. Agora mesmo, há poucos anos, em 2012, por ocasião da venda de um submarino nuclear pela Alemanha a Israel, ele escreveu o poema que transcrevo abaixo, criticando o negócio. É excelente poeta, não há dúvidas. Não encontrei tradução portuguesa e poucos leem alemão.






LO QUE HAY QUE DECIR
Por qué guardo silencio, demasiado tiempo,
sobre lo que es manifiesto y se utilizaba
en juegos de guerra a cuyo final, supervivientes,
solo acabamos como notas a pie de página.

Es el supuesto derecho a un ataque preventivo
el que podría exterminar al pueblo iraní,
subyugado y conducido al júbilo organizado
por un fanfarrón,
porque en su jurisdicción se sospecha
la fabricación de una bomba atómica.

Pero ¿por qué me prohíbo nombrar
a ese otro país en el que
desde hace años –aunque mantenido en secreto–
se dispone de un creciente potencial nuclear,
fuera de control, ya que
es inaccesible a toda inspección?

El silencio general sobre ese hecho,
al que se ha sometido mi propio silencio,
lo siento como gravosa mentira
y coacción que amenaza castigar
en cuanto no se respeta;
“antisemitismo” se llama la condena.

Ahora, sin embargo, porque mi país,
alcanzado y llamado a capítulo una y otra vez
por crímenes muy propios
sin parangón alguno,
de nuevo y de forma rutinaria, aunque
enseguida calificada de reparación,
va a entregar a Israel otro submarino cuya especialidad
es dirigir ojivas aniquiladoras
hacia donde no se ha probado
la existencia de una sola bomba,
aunque se quiera aportar como prueba el temor...
digo lo que hay que decir.

¿Por qué he callado hasta ahora?
Porque creía que mi origen,
marcado por un estigma imborrable,
me prohibía atribuir ese hecho, como evidente,
al país de Israel, al que estoy unido
y quiero seguir estándolo.

¿Por qué solo ahora lo digo,
envejecido y con mi última tinta:
Israel, potencia nuclear, pone en peligro
una paz mundial ya de por sí quebradiza?

Porque hay que decir
lo que mañana podría ser demasiado tarde,
y porque –suficientemente incriminados como alemanes–
podríamos ser cómplices de un crimen
que es previsible, por lo que nuestra parte de culpa
no podría extinguirse
con ninguna de las excusas habituales.

Lo admito: no sigo callando
porque estoy harto
de la hipocresía de Occidente; cabe esperar además
que muchos se liberen del silencio, exijan
al causante de ese peligro visible que renuncie
al uso de la fuerza e insistan también
en que los gobiernos de ambos países permitan
el control permanente y sin trabas
por una instancia internacional
del potencial nuclear israelí
y de las instalaciones nucleares iraníes.

Sólo así podremos ayudar a todos, israelíes y palestinos,
más aún, a todos los seres humanos que en esa región
ocupada por la demencia
viven enemistados codo con codo,
odiándose mutuamente,
y en definitiva también ayudarnos.

Fonte: El País, 4 de abril de 2012
Tradução de Miguel Sáenz