terça-feira, 14 de abril de 2015

GÜNTER GRASS E A FILOSOFIA DO ABSURDO

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Umbu - Pelotas - abril de 2015
Günter Grass (Günter Graß, em alemão)[1](Danzig, 16 de outubro de 1927 - Lübeck, 13 de abril de 2015), que acaba de falecer, foi um dos mais importantes escritores alemães e mesmo mundiais de nossa contemporaneidade. Teve uma infância sofrida de filho de operários, nascido na Polônia, em Gdansk, no seio de uma família pobre.
Era um período complicado tanto política quanto economicamente. Em 1871, Otto von Bismarck assumiu o cargo de chanceler, unificando a Alemanha, formando o Império Alemão, que ficou conhecido como 2º Reich.
Porém, no início do século XX, mais precisamente em 1914, houve um conflito de interesses entre o Império Alemão, apoiado pelos turcos otomanos, e os demais países da Europa. Com a derrota germânica de 1918, a deposição de Guilherme II, e o malfadado Tratado de Versailles, toda a região dos germanos foi assolada por gravíssimos problemas econômicos, que geraram todo o tipo de problema social, a partir da miséria.
Aconteceu, então, o movimento nazista (Nationalsozialist) do NSDAP (Nationalsozialistische Deutsche Arbeitpartei) Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Günter, então jovem de 15 anos, filiou-se voluntariamente ao Partido dos Trabalhadores Alemães e participou da Segunda Guerra Mundial.
Com a derrota alemã, foi preso durante quase um ano. Libertado, exerceu uma série de profissões pesadas, desde a mineração, para enfrentar a vida. A seguir, retomou a vida acadêmica interrompida pela guerra, estudando na Academia de Artes de Düsseldorf e depois na Academia de Belas Artes de Berlim.
Somente depois de alguns anos e seu casamento com Anna Schwarz, uma bailarina, e ter com ela quatro filhos, passou a dedicar-se à literatura, compondo poemas e peças teatrais em seu início de carreira. Ao mesmo tempo dividia suas atividades literárias com a escultura.
Porém, somente quando se transferiu para Paris, em 1956, e com a publicação de “Die Blechtrommel” (O Tambor), segundo algumas traduções “O Tambor de Lata”, passou a ser conhecido mundialmente como literato, chegando a receber o Prêmio Nobel de Literatura em 1999.
Essa obra é interessantíssima. É uma trilogia (Primeiro Livro, Segundo Livro, Terceiro Livro). Como ele mesmo afirma, tenta revelar o rosto esquecido da história.
Trata-se de um romance em linguagem altamente figurativa. Publicado em 1959, é a estreia de Günter no romance e já se tornou uma das obras mais importantes do século XX.
O autor cria um bizarro narrador, Oskar Matzerath, que persiste em permanecer na infância. Na sua perspectiva infantil, ele descreve o mundo adulto. Fixa-se nos três anos de idade.
De um hospital psiquiátrico onde está internado, escreve a história de sua vida e de sua família. Nega-se a integrar o mundo dos adultos e permanece criança, olhando o mundo e a vida a partir desse ângulo. Somente se expressa através de um tambor de lata que emprega obsessivamente para toda a comunicação.
Sua voz é tão aguda e estridente que faz com que os vidros se estilhassem. Usa dessa capacidade diante de qualquer ameaça e até mesmo para favorecer roubos. Somente seu poder não produz efeito algum sobre os vidros da igreja, ressaltando o poder da igreja católica.
 Com a constante aparência de menino, Oskar passa pela fundação do 3º Reich, pela Segunda Guerra Mundial, pelo pós-guerra,  menosprezando tudo e todos os processos. Porém, num determinado momento, é recolhido a um asilo, sob a acusação de um crime de assassinato.
Parece-me uma forma encontrada pelo autor para suportar as recordações de guerra de um Günter que fora membro da Luftwafffe, a poderosa força aérea alemã e presenciara os horrores dos combates e bombardeios.
Ocorre que somente o esquecimento é que torna a memória possível, pois recordar tudo seria tão longo e inútil, que seria absolutamente impossível, como diz Paul Ricoeur em seu livro de hermenêutica “A história, a memória, o esquecimento”. A memória necessariamente tem de ser seletiva. Daí a obrigação de apagar. “O tambor”, como afirma o próprio autor, é um livro de memórias, porém, muito mais, é um livro de apagamentos.
Günter é acusado por muitos de ter assumido e apoiado o nazismo na juventude e participado da SS e depois, na maturidade, condenado o nazismo e instigado o povo alemão a assumir a culpa do que ocorreu.
Na seguinte passagem de sua obra “Nas peles da Cebola”, de 1975, admite sua culpabilidade: “O tempo passou até que compreendi aos trancos e barrancos, admitindo hesitantemente comigo mesmo, que eu tinha parte sem saber, ou melhor, sem querer saber, em um crime, que com os anos não se tornou melhor, que não quer prescrever, e que ainda hoje me faz padecer.” (Günter Grass, “Nas Peles da Cebola”, p. 175).
“O Tambor” é, em última análise, uma denúncia da hipocrisia e do absurdo do procedimento dos adultos. Essa concepção está mais manifesta na dramaturgia do autor, que se aproxima muito do pensamento do escritor argelino-francês Albert Camus.






[1]  Günter Wilhelm Graß, com trema no ü. Costumo dizer que, para pronunciar esse ü tremado, em alemão, deve-se arredondar os lábios como se faz para pronunciar o u, e pronunciar i. Por fim, o nome termina com a consoante ß (Eszett), letra do alfabeto gótico, que tem a forma do β (beta), do alfabeto grego. Porém, enquanto o beta equivale ao nosso b, o Eszett equivale ao s, ou duplo ss. Por isso, na maioria dos idiomas o nome de é grafado como Günter Grass. Tem sum segundo nome, Wilhelm, que corresponde ao William inglês, e ao nosso nome português Guilherme.

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