A Revelação Templária – 6B – A Herança dos Templários
Capítulo VI – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS
Certamente
que Leonardo viveu numa época em que os grandes movimentos intelectuais
e místicos representavam um ímã para os que estavam ávidos de
conhecimento e de poder.
Devido
às hostilidades e perseguição da Igreja romana, estes movimentos
tiveram de se manter secretos, mas os três principais ramos, que
floresceram secretamente, foram a alquimia, o hermetismo e o
gnosticismo. O hermetismo, que foi um impulso tão importante para o
iluminismo renascentista/rosacruz, e o gnosticismo, que deu origem aos
cátaros, são dois desenvolvimentos das mesmas idéias cosmológicas.
Edição e imagens: Thoth3126@gmail.com
Capítulo 06B – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS – Livro “The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de Lynn Picknett e Clive Prince.
CAPÍTULO VI – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS
O mundo da
matéria é o mais inferior de uma hierarquia de «mundos» – «esferas», em
termos cosmológicos, «planetas» ou «dimensões», na terminologia atual –
na qual o grau mais elevado e final é Deus.
O homem é
um ser, outrora divino, que está «prisioneiro» do seu corpo material mas
ainda retém uma centelha divina. (Uma frase hermética muito citada era:
«Não sabeis que sois deuses?») É possível – na verdade é o dever do
Homem – tentar a reunião com o divino. Os gnósticos expressavam esta
ideia em termos religiosos (considerando a reunião com o divino como a
salvação), ao passo que os herméticos a consideravam em termos mágicos,
mas a idéia básica é a mesma.
É
impossível traçar uma linha entre o gnosticismo e o hermetismo, tal como
é impossível traçar uma linha divisória entre religião e magia. Além
disso, tanto o gnosticismo como o hermetismo remontam à mesma época e
lugar – o fermento de ideias que se verificou no antigo Egito, e mais
próxima e particularmente em Alexandria, no primeiro e segundo séculos
antes de Cristo.
Este
enorme cadinho de ideias religiosas e filosóficas valeu-se de crenças de
muitas culturas – grega, persa, hebraica, do antigo Egito, e mesmo de
religiões do Extremo Oriente – para criar ideias que sustentam toda a
nossa cultura. (A estreita relação entre gnosticismo e hermetismo é
ilustrada pelo fato de os «Evangelhos gnósticos», encontrados em Nag
Hammadi, incluírem tratados que contêm diálogos de Hermes Trismegisto –
Thoth).
A
cosmologia de Pistis Sophia – o Evangelho gnóstico, em que Maria
Madalena tem um papel tão importante – não difere, no essencial, da
cosmologia dos magos renascentistas, como Marsílio Ficino, Cornélio
Agripa ou Robert Fludd. As mesmas ideias, a mesma cultura, época e lugar
deram origem à alquimia. Embora também se valesse de conceitos muito
mais antigos, a alquimia era – no sentido em que é, atualmente,
entendida – um produto do Egito dos primeiros séculos da era cristã. As
raízes da alquimia e os seus paralelos com o hermetismo e o gnosticismo
são explorados em The Origins of Alchemy in Graeco-Roman Egypt (1970) de Jack Lindsay.
Não é
difícil compreender o fascínio do gnosticismo, embora ele não fosse uma
opção fácil – dada a ênfase na responsabilidade pessoal das ações
individuais -, mas a ameaça para a Igreja de Roma é óbvia. Como
supostamente Hermes Trismegisto escreveu: «Oh! Que milagre é o Homem!»,
uma exclamação que encerra a ideia de que a Humanidade contém a centelha
divina. Nem os gnósticos nem os herméticos se humilhavam ante o seu
deus. Ao contrário dos católicos, eles não se consideravam criaturas
inferiores e perversas destinadas ao Purgatório, se não mesmo ao
Inferno.
O
reconhecimento da sua centelha divina conferia-lhes, automaticamente, o
que hoje chamaríamos «auto-estima» ou confiança – o ingrediente mágico
do processo de realização do potencial individual. Esta foi a chave no
período do Renascimento no seu todo, e a coragem, que ela motivou, pode
ser constatada na súbita abertura ao mundo através das explorações
marítimas e da exploração de novas terras.
Pior
ainda, no que diz respeito à Igreja, esta ideia de potencial individual
de divindade implicava que as mulheres estavam em pé de igualdade com os
homens, em todos os sentidos. As mulheres gnósticas sempre tiveram voz e
celebravam mesmo cerimônias religiosas: esta foi uma das maiores
ameaças que o gnosticismo colocou à ortodoxia patriarcal da Igreja
Católica. Além disso, a ideia do status essencialmente divino da
Humanidade (homem e mulher) não estava de acordo com a ideia católica de
«pecado original» – a ideia de que todos os homens e mulheres nascem
pecadores, devido à queda de Adão e Eva (especialmente da última).
Porque
todas as crianças são resultado do ato sexual «indigno», esta ideia
associava as mulheres e as crianças, de forma inextricável, a uma
espécie de conspiração perpétua contra os homens puros e um deus
vingativo. Os gnósticos e os herméticos, de modo geral, não tinham nada a
ver com «pecado original».
Cada
indivíduo era encorajado a explorar os seus mundos interior e exterior
por si próprio – experimentando a gnosis, conhecimento do divino.
Esta insistência na salvação individual era totalmente contrária à
insistência da Igreja de que apenas os sacerdotes eram os canais através
dos quais Deus podia se comunicar com a Humanidade. A ideia gnóstica de
uma ligação direta com Deus, por assim dizer, ameaçava a própria
existência da Igreja romana.
Sem o domínio sacerdotal sobre o rebanho, que possibilidade tinha a Igreja de manter o seu controle sobre tudo e todos?
Como no caso da alquimia, foi prudente manter o gnosticismo e o
hermetismo ocultos dos olhos da Igreja romana. A combinação de ciência
proibida e de filosofia (conhecimento verdadeiro) excomungada
significava que os praticantes destas crenças estavam para além dos
limites aceitáveis, e foi inevitável a sua associação em sociedades
e redes secretas.
Muitas
destas pessoas (e os alquimistas renascentistas incluíam mulheres)
tinham crenças invulgares relativamente a questões como a arquitetura e a
matemática, além de alimentarem idéias teológicas, excepcionalmente
heterodoxas. Estas pessoas eram perigosas e tornadas duplamente
perigosas pelo poder do segredo que é hábito das heterodoxias. Uma
manifestação importante desta heresia foi o movimento da Ordem Rosacruz.
O termo
«rosacruz» data apenas do início do século XVII, mas foi certamente
criado para descrever um movimento que, nessa altura, já estava bem
implantado. O seu primeiro florescimento importante, como o de tantos
outros movimentos relevantes, verificou-se durante a Renascença – de
fato, não é exagero dizer que a Ordem Rosacruz era a própria Renascença.
A segunda metade do século XV conheceu uma explosão de interesse no
hermetismo e nas ciências ocultas em toda a Europa.
Muito
pouco da verdadeira informação envolvida era, de fato, nova, embora
existissem muitas influências e personalidades contemporâneas, e esta
época conheceu um desejo sem precedentes de explorar as implicações mais
vastas do hermetismo. Subitamente, este foi considerado como tema de
debate intelectual, para além dos enclaves secretos que, até então,
tinham sido os seus guardiães. Se dependesse dos entusiastas
renascentistas, o hermetismo deixaria de ser secreto.
O aumento súbito do fascínio por tudo o que era hermético centrava-se, nesta época, na corte dos Médici, em Florença
(onde teve uma poderosa influência sobre Leonardo da Vinci, entre
muitos outros grandes pensadores). Sob o patrocínio dos Medici –
especialmente, Cosimo, o Velho (1389-1460) e seu neto Lourenço, o
Magnífico (1449-1492) – empreendeu-se a primeira grande síntese de
muitas e diversas ideias ocultistas.
Não só
Cosimo enviou emissários em busca de pergaminhos, escritos e tomos
lendários, como o Corpus Hermeticum, alegadamente escrito pelo próprio
Hermes (Thoth) Trismegisto, como também patrocinou a sua tradução. A
corte dos Medici era um salão para famosos – e talvez com má reputação –
pensadores ocultistas, como Marsilio Ficino (1433-1499), tradutor de
Corpus Hermeticum, e Pico della Mirandola (1463-1494). A maior
contribuição deste último foi a introdução da teoria e da prática
cabalística neste cadinho de ideias ousadas.
Mirandola,
talvez devido a um falso sentido de segurança que lhe oferecia o seu
aristocrático patrono, foi demasiado explícito nas suas ideias
ocultistas e, em breve, viu os seus livros incluídos no Index papal, e a
si próprio sob a ameaça do papa Inocêncio VIII. Durante algum tempo,
pareceu que Mirandola seguiria o caminho dos que se opunham ao Vaticano,
mas aconteceu uma coisa estranha.
O novo
papa, Alexandre VI – membro da família Bórgia -, misteriosamente, deixou
cair todas as acusações e ameaças contra ele, dirigindo-lhe uma carta
pessoal de apoio – mas por quê? Talvez uma pista resida no fato de este
papa ter decorado o seu apartamento privado do Vaticano com murais
representando antigos temas egípcios, incluindo a deusa ÍSIS.
Os “historiadores (eruditos) modernos” tendem a menosprezar o poder e a influência do oculto.
Se chegam a discuti-lo, é apenas para sublinhar, por comparação, o
triunfo da Idade das Luzes, quando estes «absurdos supersticiosos» foram
rejeitados por todos os que tinham o sentido da razão. Mas o ocultismo
sobreviveu e, de fato, tomou-se a força que maior influência exerceu
sobre a Renascença. O fascínio com o ocultismo não foi apenas um sintoma
da nova abertura às ideias, mas foi, de fato, a causa.
D. Frances A. Yates,
numa série de livros, fez o levantamento da história do verdadeiro
papel do ocultismo no surgimento da Renascença. Como ela demonstra, a
nova filosofia ocultista expandiu-se do norte da Itália para o resto da
Europa, culminando na campanha européia do grande pregador hermético Giordano Bruno
(1548-1600), queimado pela igreja romana por heresia. Fazendo largas
viagens por países como a Alemanha e a Inglaterra, ele pregava um
retorno ao que era essencialmente a antiga religião egípcia e foi
caracteristicamente explícito em relação ao que ele considerava o mal da
corrente dominante do catolicismo romano.
Como
vimos, pensava-se que o hermetismo tinha sido fundado pelo próprio
«Hermes três-vezes-grande», via fragmento da Tábua da Esmeralda, na qual
estavam inscritos vários e profundos segredos. Embora poucos herméticos
acreditassem, de fato, neste mito, eles acreditavam no continuado
significado do panteão
egípcio. Mas, apesar de a maioria dos herméticos acreditar que os seus
segredos provinham do Egito faraônico anterior à época de Moisés, eles
provinham de uma época mais próxima da era de Jesus.
As raízes
das suas idéias podem ser reconstituídas até ao Egito dos séculos I-III:
para além dessa época, temos de admitir a influência de muitas
culturas. Contudo, estudos recentes reconheceram que, enquanto gerações
anteriores tinham tendência para acentuar a influência da filosofia
grega, as ideias, que acabaram por fazer remontar essa influência aos
antigos egípcios, tiveram mais influência no desenvolvimento das ideias
herméticas do que se pensava até então.
Os herméticos reconheceram que, embora a antiga Grécia tivesse muito a oferecer aos pensadores, era sobretudo o Egito que (sempre) detinha as chaves do conhecimento que eles procuravam.
Também perceberam que esse conhecimento não estava lá pronto a ser
apreendido: o sistema egípcio fora codificado numa escola de mistério, e
os segredos exigiam que o estudante dedicado os adquirisse pelo esforço
e dedicação nos estudos, através de fases árduas de iniciação
progressiva.
Giordano
Bruno chegou a Inglaterra em 1583 e, rapidamente, travou conhecimento
com pessoas ilustres como Sir Philip Sidney, autor – entre várias obras
– de Arcadia. Sidney, que fora aluno do
grande ocultista inglês Dr. John Dee (1527-1606), que era uma figura
importante deste mundo misterioso porque Bruno dedicou-lhe duas das
suas obras, enquanto esteve na Inglaterra.
Também é
possível que uma outra figura destes círculos entrecruzados da sociedade
isabelina e do ocultismo estivesse presente, quando Bruno e Sidney se
encontraram – um certo William (n.t. Francis Bacon-Saint Germain) Skakespeare.
(É significativo que o original Globe Theatre de Londres fosse
construído segundo os princípios da geometria sagrada e também que o
último drama de Shakespeare, The Tempest, seja considerado relativo ao
Dr. Dee, encarnando muitos conceitos rosacruzes.)
Em Bruno,
temos uma figura de estatura semelhante a Lutero ou a Calvino, mas o seu
nome raramente é mencionado na história que é ensinada nas escolas.
Como eles – e, na verdade, como os grandes nomes da Contra-Reforma -,
ele foi intransigente e implacável, à maneira da sua época. Mas, ao
contrário deles, Bruno não pregava qualquer versão de um cristianismo
oficial, e, apenas por essa razão, os seus dias estavam contados.
Acrescentemos
a isto a sua natureza bombástica, e é demasiado fácil prever o seu
destino. Bruno foi condenado à fogueira em 1600, em Roma, depois de ter
sido traído e denunciado à Inquisição por um discípulo
desencantado. Bruno fundou a sua sociedade secreta, a Giordanisti, na
Alemanha. Pouco se sabe sobre ela, mas ela tornou-se uma das principais
influências no desenvolvimento da Ordem Rosacruz na Europa.
Mas igual
crédito deve ser concedido ao já citado Dr. John Dee, um verdadeiro
mago galês. Homem de muitos talentos, não foi apenas astrólogo e
conselheiro de Isabel I (n.t. mãe de Francis Bacon) mas também chefe de
espionagem – além de alquimista e necromante. (É um fato que não é
muito conhecido: o número de código do Dr. Dee, como espião, era 007
!). Destas raízes ocultistas nasceu a Ordem Rosacruz, um dos movimentos
mais misteriosos da história.
A sua existência tornou-se conhecida quando dois panfletos anônimos, Fama et Fraternitatis, ou Uma Descoberta da Fraternidade da Muito Nobre Ordem da Rosacruz e Confessio Fraternitatis,
ou A Confissão da Louvável Fraternidade da Honorável Ordem da Rosacruz,
circularam na Alemanha, em 1614 e 1615. Estas publicações anunciavam a
existência de uma irmandade secreta de conhecedores de magia – os
rosacruzes, que tomaram o nome do seu mítico fundador, Christian Rosenkreutz (Cristão Rosa Cruz).
Supostamente,
este herói viajou pelo Egito e pela Terra Santa, coligindo conhecimento
secreto e ocultista, que transmitiu a uma nova geração de adeptos na
Europa. Mas se a sua vida foi invulgar, a sua morte e enterro ainda
foram mais bizarros. Diz-se que Rosen Kreutz morreu aos 106 anos, em
1484, e foi enterrado num lugar secreto que se mantinha iluminado por
um «sol interior». Também se dizia que o corpo se manteve incorrupto –
permaneceu com o aspecto de vivo e não se decompôs (um fenômeno que
parece acompanhar os estados pós- morte de um número surpreendente de
pessoas, principalmente de santos católicos).
Estes
manifestos rosacruzes, como as publicações se tornaram conhecidas, não
revelavam qualquer segredo novo, mas, ao anunciar a existência da
irmandade, eles também sugeriam que qualquer pessoa que desejasse obter
mais informações entrasse em contato com eles. Provavelmente, este era
um tipo de teste de iniciativa, porque não se indicava qualquer
endereço para a correspondência. Este processo foi suficiente para que
os manifestos merecessem o desprezo de todos os “historiadores (os
“eruditos”) importantes”, que os consideraram um gênero de mistificação
incompreensível.
Mas, como
demonstrou Frances Yates, os autores dos manifestos revelaram um
profundo e genuíno conhecimento da sabedoria hermética, ocultista e
alquímica. Curiosamente, os manifestos consideravam a alquimia como uma
disciplina espiritual, de modo algum relacionada com a criação de ouro,
que eles designaram de «ímpio e maldito».
Seja qual
for a verdade relativamente às origens dos rosacruzes, eles
influenciaram muitos pensadores famosos, como Robert Fludd (1574-1637) e
Sir Isaac Newton. Mesmo, surpreendentemente, o famoso racionalista Francis (Saint Germain) Bacon
foi, essencialmente, um rosacruz. No entanto, isto faz sentido porque o
movimento Rosacruz era uma síntese de todos os conceitos herméticos e
ocultistas: a única coisa verdadeiramente nova era o fato de agora
terem um nome.
E Francis
Yates não tem escrúpulos em descrever Leonardo – precisamente ele –
como «um rosacruz precoce». Como vimos, o nome de Leonardo figura na
lista dos grão-mestres do Priorado de Sião, mas ele não se teria
intitulado um rosacruz porque, na sua época, o termo ainda não fora
criado. Contudo, outros nomes daquela lista não têm esse problema – como
Johann Valentin Andraea (1586-1645), o dramaturgo e poeta alemão que
fora também pastor luterano. Os Arquivos Secretos afirmam que ele
esteve ao leme do Priorado de Sião entre 1637 e 1654, mas é muito mais
largamente aceito que foi ele o autor dos manifestos rosacruzes ou, pelo
menos, o seu inspirador.
Em
definitivo, Andrea escreveu o que, essencialmente, foi o terceiro
manifesto, O Casamento Químico de Christian Rosenkreutz, em 1616,
muitos anos antes de, alegadamente, se ter tornado mestre do Priorado.
Talvez fosse o seu papel de líder da Ordem Rosacruz que lhe assegurou o
cargo. Parece que o tema da Rosacruz era o fio comum que uniu os
quatro alegados grão-mestres, cujo exercício do cargo abrangeu todo o
século XVII. Em certo sentido, este fato aumenta a credibilidade da
lista porque foi apenas a partir de 1970 que Frances Yates provou a
existência e a influência do legado rosacruz.
A sucessão
rosacruz entre os grão-mestres do Priorado começou, no mínimo, com
Robert Fludd, o alquimista inglês que exerceu o cargo entre 1595 e
1637. Fludd afirmou que tentara encontrar os rosacruzes depois de ler
os manifestos, mas não conseguira. No entanto, ele escreveu muito sobre o
tema e incorporou ideias dos manifestos nas suas obras extremamente
influentes, como Utriusque Cosmi Historia (História de Dois Mundos)
(1617) . (Curiosamente, o comentador ocultista Lewis Spencer observou
que Robert Fludd, escrevendo por volta de 1630, usa «linguagem que
sugere fortemente a Maçonaria» e que organizou a «sua sociedade» em
graus.) A Fludd sucedeu o próprio Andraea, que foi grão-mestre até à
morte, em 1654, a quem, por sua vez, sucedeu Robert Boyle, o químico de
Oxford.
Tanto
quanto se pode averiguar, Boyle nunca mencionou a palavra «rosacruz» nos
seus escritos, mas eles revelam mais do que uma familiaridade
passageira com o conteúdo dos manifestos. E quando Boyle fundou o que
se tornaria a Royal Society, sob o nome de «O Colégio Invisível», este
foi uma referência irônica à descrição comum que os rosacruzes faziam
de si próprios: uma sociedade «invisível».
Depois
surgiu Isaac Newton, alegado grão-mestre do Priorado entre 1691 e 1727.
Há muito conhecido como praticante de alquimia, também possuía um
exemplar da tradução inglesa dos manifestos, embora haja provas de que
reconhecia a história de Rosenkreutz como o mito que se destinava a
ser. (Os comentadores esotéricos, pelo menos, sempre compreenderam que
ele não se destinava a ser considerado como verdade literal.) Só
recentemente foi reconhecido o grau de envolvimento de Newton com o
ocultismo: mais de 10% dos seus livros eram tratados alquímicos. E o
mais significativo, talvez, é que ele também desenhou uma planta
reconstruída do Templo de Salomão.
A Ordem
Rosacruz também teve uma forte ligação com o florescimento da Maçonaria.
Os primeiros dois maçônicos ingleses conhecidos – Elias Ashmole e o
alquimista Sir Robert Moray – estavam ligados ao movimento Rosacruz.
Ashmole, em particular, era um conhecido rosacruciano, enquanto Moray,
segundo Frances Yates, «fez mais, provavelmente, do que qualquer outro
indivíduo para encorajar a fundação da Royal Society».
Também
existem várias referências na primitiva literatura maçônica que,
explicitamente, associam «os Irmãos da Ordem Rosacruz» aos maçônicos,
embora elas pareçam indicar que as duas irmandades se mantinham
sociedades relacionadas – mas distintas. A interligação entre Rosacruz,
Maçonaria, hermetismo e alquimia – prévia e cuidadosamente reconstruída
por historiadores como Frances Yates – foi dramaticamente confirmada,
em anos recentes, pela descoberta de uma colecção de documentos que
ilustram o grau de interligação destes movimentos e temas.
Em 1984,
Joy Hancox, uma professora de Música de Manchester, em consequência da
investigação da história da casa em que vivia, deparou com uma coleção
de papéis, sobretudo diagramas e desenhos geométricos, que tinham sido
reunidos por John Byrom (1691-1763) e conservados pelos seus
descendentes, que desconheciam a sua importância. Estes documentos, que
são mais de 500, estão relacionados, principalmente, com geometria
sagrada, arquitetura e símbolos cabalísticos, maçônicos e alquímicos.
A
importância da «Coleção Byrom» reside na luz que lança sobre a relação
entre estes temas e sobre os indivíduos – a nata da comunidade
intelectual e científica da época – que se preocupavam com eles. Byrom,
uma figura importante do movimento jacobita, que pretendia repor os
Stuarts no trono de Inglaterra, era membro da Royal Society e um
maçônico. Fazia parte do «Cabala Club», também conhecido por «Sun
Club», que se reunia num edifício de St. Paul’s Churchyard e que também
albergava uma das quatro primeiras lojas maçônicas da Grande Loja da
Maçonaria Inglesa. O seu diário revela que ele estava em contato com os
mais importantes intelectuais da sua época.
O
trabalho, incorporado na sua coleção, foi deduzido a partir de todas as
sociedades e indivíduos que já discutimos, incluindo os rosacruzes John
Dee (com quem Byron estava relacionado pelo casamento), Robert Fludd,
Robert Boyle – e mesmo os Cavaleiros Templários.
A coleção
inclui diagramas que especificam a geometria sagrada de numerosos
edifícios de muitas épocas e, por conseguinte, revela a continuidade do
conhecimento dos princípios subjacentes a estes edifícios. Por
exemplo, um diagrama mostra que o desenho da capela de King’s College,
em Cambridge, de meados do século XV – «uma das últimas grandes
estruturas góticas deste país» – era baseado na Árvore da Vida
cabalística (uma conclusão a que Nigel Pennick, uma autoridade em
simbolismo esotérico, já chegara).
Aparentemente,
o desenho da capela foi inspirado na catedral de Albi, do século XIV,
no Languedoc, um antigo centro cátaro. A coleção também inclui um
diagrama da Temple Church de Londres, assim como de outros edifícios
dos Cavaleiros Templários, demonstrando que todos estes edifícios
faziam parte de uma tradição contínua e que os membros das irmandades
rosacruz/maçônica do século XVIII tinham consciência dela. A coleção Byrom inclui também elementos relativos ao Templo de Salomão e à Arca da Aliança.
Se, como
parece ser o caso, os maçônicos são descendentes dos Templários, seria
possível que os rosacruzes também pertencessem à mesma linhagem? O
próprio nome «rosacruz» transmite uma forte sugestão daqueles
cavaleiros, com o seu emblema de uma cruz vermelha ou rosa. Em Chemical
Wedding de Andraea, a cruz vermelha sobre fundo branco é um tema
recorrente e a sua obra, de modo geral, transmite fortes conotações com
as histórias do Graal – e, por conseguinte, com os Templários. E a
presença de elementos templários nos documentos de Byrom,
predominantemente rosacruz, sugere que esta fraternidade e os maçônicos
partilhavam uma origem comum, a Ordem dos Cavaleiros Templários.
Contudo,
enquanto os maçônicos eram, e são, uma organização definida, com membros
e lugares de reunião conhecidos, a Ordem Rosacruz tem sido considerada
bastante mais elusiva, a ponto de a palavra «rosacruz» ser tomada mais
como referência a um ideal do que à descrição da qualidade de membro
daquela associação – na verdade, os próprios manifestos referem a Ordem
Rosacruz como uma «sociedade invisível».
Mas a
primeira sociedade rosacruz «concreta e visível» foi a Ordem da Cruz
Ouro e Rosa, fundada na Alemanha, em 1710, por Sigmund Richter, cujo
principal objetivo era a investigação alquímica. Contudo, sessenta anos
mais tarde, esta ordem transformou-se numa loja maçônica da Estrita
Observância Templária,
embora conservasse a sua natureza alquímica. Sob esta forma, teve
membros muito influentes, incluindo Franz Anton Mesmer (1734-1815), que
descobriu o «magnetismo animal» (embora não fosse, como é
frequentemente afirmado, o pioneiro do hipnotismo). O próprio fato de
uma sociedade rosacruz se poder transformar, tão facilmente, numa loja
da Estrita Observância Templária revela a sua herança comum.
Depois de
1750, a história torna-se irremediavelmente confusa. Onde outrora
existiam claras distinções entre maçônicos, rosacruzes e outras
organizações que reclamavam ser de origem templária, subitamente, todos
estes grupos se tornam tão intimamente entrelaçados que parecem
virtualmente idênticos. Por exemplo, nalgumas formas de maçonaria, os
iniciados tomam o título de «Cavaleiro Templário» e de «rosacruz», e é
impossível concluir se isto acontece porque existia uma genuína linha de
descendência ou, simplesmente, porque estes títulos tinham para eles
uma ressonância grandiosa. Calcula-se que mais de 800 graus e rituais
foram acrescentados à Maçonaria entre 1700 e 1800.
As
tentativas para encontrar uma linha direta de sucessão templária na
Maçonaria e na Ordem Rosacruz, depressa se malograram devido à enorme proliferação de ritos e sistemas maçônicos.
Esta situação é particularmente confusa porque, em muitos casos, é
impossível determinar quais os sistemas que são inovações do século
XVIII e quais são os genuinamente mais antigos.
Contudo, é
possível encontrar um fio comum entre certos sistemas maçônicos, que
foram renegados ou rejeitados pela Maçonaria oficial. Existem variações
da Maçonaria «ocultista», e todas remontam à Estrita Observância
Templária do barão Von Hund, cujo desenvolvimento ocorreu
principalmente na França. A chave desta situação é um sistema maçônico,
conhecido por Rito Escocês Retificado, que se dedica especificamente a
estudos ocultistas e que atribui maior importância às suas origens
templárias. É também esta a forma de Maçonaria que tem ligações mais
próximas com as sociedades dos rosacruzes.
O uso da
palavra «Templário» tornou-se um problema para esta escola de Maçonaria.
Existe um atrito entre os seus membros e a corrente dominante dos
maçônicos, que, oficialmente, rejeitam a sugestão de origens templárias
– ficando especialmente irritados com a seguinte declaração de Von
Hund: «Todo maçônico é um Templário.» Mais preocupante era a suspeita
que eles despertavam às autoridades, porque corriam numerosos rumores
sobre o plano secreto dos Templários para se vingarem da monarquia
francesa e do papado pela extinção da sua ordem e pela excomunhão e
queima na fogueira de seu último Grão Mestre conhecido, Jacques de
Molay.
Por isso,
realizou-se em Lyons, em 1778, uma convenção de «maçónicos
templaristas» na qual foi criado o Rito Escocês Retificado, com uma
ordem interior chamada o Chevalier Bienfaisant et la Cité Sainte. Esta
ordem, no entanto, era apenas outra designação de «Templários».
Continua …
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