Dicas de Linguagem
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
CROISSENT - ETIMOLOGIA E HISTÓRIA
CROISSANT - etimologia da famosa iguaria. A palavra tem sua origem no verbo francês croître, cujo significado é crescer. É a forma verbal do particípio presente "croissant", significando crescente, constituindo-se uma metáfora de forma em que a iguaria tem a forma da lua crescente. Por essa razão, a mesma iguaria recebe, em espanhol, o nome de "medialuna". A meia lua possui também o formato da letra C. Porém, a origem primeira do termo se dá na língua alemã, mais precisamente na Áustria.
Reza pois a lenda que esta especialidade foi inventada por volta de 1683 em Viena de Áustria. Nesse tempo, o Império Turco Otomano tentava aumentar as suas possessões na Europa. Como não conseguisse entrar nas portas da cidade de Viena, o exército turco decidiu que, durante algumas noites iriam escavar um túnel até ao centro da cidade.
Todavia, não contavam com os padeiros de Viena, que permaneciam acordados durante a noite para que de manhã houvesse pão fresco em todas as mesas. Ora, os padeiros ouviram barulho dos escavadores e deram o alarme, o que fez com que os turcos não tivessem êxito na sua tentativa de conquistar a cidade.
Os padeiros não quiseram nenhuma recompensa a não ser o direito exclusivo a criar algo que comemorasse a vitória sobre o inimigo. Decidiram criar uns pãezinhos folhados em forma de meia-lua, símbolo representado na bandeira turca: assim, os vienenses tinham a oportunidade de, ao comer este pão, poderem destruir o símbolo dos inimigos. Este pãozinho ficou conhecido em alemão por Mondsichel (em que Mond é lua e Sichel é foice), portanto, lua em forma de foice. A metáfora fazia também uma alegoria zombeteira à bandeira do Império Turco que representava uma lua crescente e uma estrela.
No entanto, somente com Maria Antonieta, rainha da França, que era austríaca, por volta de 1770 é que o croissant chegou à território francês. Este era um pãozinho que a rainha adorava e como tal levou-o consigo para o país que a acolheu. Por lá, rapidamente se tornou popular e foi por essas terras que tomou o nome de croissant, pelo qual ficou conhecido em todo o mundo.
PICANHA - ETIMOLOGIA
Boiadeiros com aguilhada |
Picanha é um corte de carne que se origina, historicamente, do uso do aguilhão ou guilhada para fustigar os bois em tração de instrumento rural, principalmente a carreta. Esse instrumento consistia de um prego apontado, fixado na ponta de um bambu que era cravado na região traseira do boi, perto do rabo, para instigá-los a andar mais rápido. Esse instrumento, em espanhol, era chamado de picaña. Portanto, esse corte de carne situa-se na região em que era cravada a picaña.
FORQUILHA - uma certa etimologia. Além do sentido que os dicionários geralmente apresentam, forquilha traz o sentido de pequena forca. Esse percurso semântico passa pela morfologia hispânica. Os sufixos diminutivos -ilho, -ilha são importados da língua espanhola. O diminutivo lusitano específico para esses casos seria -inho, -inha. Na língua espanhola, grafa-se -illa, -illo. Esse percurso luso gerou diminutivos como forquinha. Forquilha, por sua origem hispânica, poderia designar uma pequena forca. Assim, denomina-se também de forquilha uma bifurcação de galhos de árvore. Usavam-se as forquilhas de árvore para enforcar pessoas ou animais. Havia também casos de suicidas que se valiam das forquilhas de árvore para tirar-se a própria vida. Essa trajetória morfológico-semântica contribui para apontar a outras possibilidades de sentido.
CAPELA - ETIMOLOGIA DA PALAVRA
CAPELA - etimologia da palavra. A palavra 'capela' tem ligações com a palavra latina 'caput', que significa, em latim, cabeça. 'Caput' originou 'cappa', cujo sentido original era algo para cobrir a cabeça, proteger a cabeça. Aplicou-se, posteriormente a um tipo de construção para cobrir as pessoas. Os templos das antigas divindades eram apenas bosques, geralmente de carvalhos. Como os devotos ficavam expostos às intempéries, começou-se a construir coberturas a que se denominava 'cappa',em latim, para cobrir as cabeças. Segundo, outra vertente, o imperador Carlos Magno seria grande apreciador de 'capas religiosas'. Teria mandado construir para guardar uma das mais belas peças de sua coleção, que era a capa de São Martinho (pelo menos metade dela, já que conta a lenda que a outra parte o santo deu a um mendigo friorento na rua). Para abrigar este tecido sagrado, Carlos Magno teria mandado construir em seu castelo um lugar de culto e devoção: uma “Chapelle” (capela), termo derivado do latim cappa (capa). A palavra então entrou na linguagem corrente e a partir daí, capela (“lugar que guarda a capa”) é o que conhecemos hoje em dia. Capela, seria, então, diminutivo de capa. Daí, originou-se a palavra espanhola 'capilla', aportuguesada para capilha.
ESPIRITEIRA - ETIMOLOGIA DA PALAVRA
Dionysus |
Baco |
Em sendo o álcool volátil como os espíritos, também penetrava o espírito humano. Todos os que bebiam em homenagem a Dionísio ou Baco sentiam-se em comunhão com essas divindades e, por consequência, em comunhão entre si. A bebedeira era considerada um estado mútuo de comunhão, nesse cultos. Esse era um espírito de comunhão muito anterior ao dos cristãos. Por outro lado, o termo álcool, na língua árabe, transliterada para os caracteres latinos, é 'al-kuhl', em que 'al' corresponde ao nosso artigo 'o' e 'kuhl' ao substantivo propriamente dito. Esse, no entanto, é o étimo que veio a formar a palavra álcool em quase todos os idiomas modernos, nada tendo a ver com a evolução greco-romana.
Porém, algumas palavras contemporâneas de nossos idiomas apontam para esse percurso semântico de significação. É o caso concreto da palavra espiriteira.
espiriteiras antigas |
GRAMÁTICA DA LÍNGUA PORTUGUESA - FORMAS VERBAIS COMO PODER, PUDER, SER, FOR, FAZER, FIZER, ETC. - INFINITIVO E FUTURO DO SUBJUNTIVO
A gramática oficial da língua portuguesa apresenta algumas particularidades, mormente no que diz respeito aos verbos. O que apresento aqui é uma sofisticação, mas ainda é o emprego de prestígio de algumas formas verbais.Quem jamais teve dúvidas em situações como: Se eu (fazer) esta mudança...
Quando eu (poder), contribuo contigo.
A forma gramatical de prestígio é Se eu FIZER esta mudança...
Quando eu PUDER, contribuo contigo.
Mas por quê? Como se chega a esta forma?
FAZER e PODER correspondem à forma do INFINITIVO dos seus verbos, forma pela qual os verbos são apresentados nos dicionários do idioma.PUDER e FIZER são as formas do FUTURO DO SUBJUNTIVO.
A diferença morfológica e sintática entre essas formas consiste no fato de o INFINITIVO ser atemporal e o FUTURO DO SUBJUNTIVO, como o próprio nome afirma, situa o verbo no futuro, e como toda forma SUBJUNTIVA, numa situação de incerteza ou dúvida.
Voltando aos exemplos acima, ambos no futuro do subjuntivo, veja-se por quê. "Se eu fizer esta mudança..." A mudança ainda não ocorreu, existe mesmo uma incerteza quanto à sua ocorrência. O mesmo ocorre com "Quando eu puder, contribuo contigo." O falante ainda não contribuiu, nem dá certeza se irá fazê-lo.
Veja-se agora como se obtém essa forma verbal. Nos verbos regulares, que são a grande maioria, INFINITIVO e FUTURO DO SUBJUNTIVO possuem formas morfológicas exatamente iguais. Assim os exemplos a seguir confirmam isso.
Para AMAR, é preciso fazer renúncias. (Infinitivo).
Se ela de fato me AMAR, não terá hesitações sobre como proceder. (Futuro do subjuntivo).
Em todas as formas regulares das três conjugações haverá coincidência entre as formas morfológicas do INFINITIVO e do FUTURO DO SUBJUNTIVO.
As diferenças formais morfológicas acontecem somente em todos os verbos que tenham irregularidades no PRETÉRITO PERFEITO DO INDICATIVO. A regularidade constante das formas regulares induz o indivíduo a unificá-las nos verbos irregulares.
HÁ UMA DICA IMPORTANTE PARA ESTABELECER A FORMA DO FUTURO DO SUBJUNTIVO. A primeira pessoa do singular do FUTURO DO SUBJUNTIVO forma-se da terceira pessoa do plural do PRETÉRITO PERFEITO DO INDICATIVO, retirando-se a desinência -AM final.
Façamos a análise da formação do FUTURO DO SUBJUNTIVO dos verbos presentes nos exemplos acima. Frase 1 - Se eu fizer esta mudança...
FAZER é a forma do INFINITIVO.
FORMAÇÃO DO FUTURO DO SUBJUNTIVO:
PRETÉRITO PERFEITO -
FIZ
FIZESTE
FEZ
FIZEMOS
FIZESTES
FIZERAM - Excluindo o -AM final Teremos FIZER
O mesmo ocorre com o exemplo 2:
Quando eu puder, contribuo contigo.
PRETÉRITO PERFEITO
PUDE
PUDESTE
PODE
PUDEMOS
PUDESTES
PUDERAM - Excluída a desinência verbal -AM, teremos PUDER.
ASSIM com SER
FUI... FORAM - FOR
IR
FUI - FORAM - FOR (assim temos formas iguais, com diferentes sentidos entre ser e ir).
TER
TIVE - TIVERAM - TIVER
QUERER
QUIS - QUISERAM - QUISER
DIZER
DISSE - DISSERAM - DISSER
ESTAR
ESTIVE - ESTIVERAM - ESTIVER
HAVER
HOUVE - HOUVERAM - HOUVER
SABER
SOUBE - SOUBERAM - SOUBER
NO ENTANTO FICAM IGUAIS AS FORMAS DOS VERBOS REGULARES
AMAR
AMEI - AMARAM - AMAR
CORRER
CORRI - CORRERAM - CORRER
PARTIR
PARTI - PARTIRAM - PARTIR
Espero que esta exposição tenha contribuído para alguns usuários de nosso idioma.
MOCHINHO - ETIMOLOGIA DA PALAVRA
LINGUAGEM – O PORQUÊ DO NOME MOCHINHO DADO A UM TIPO DE BANCO
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Mochinho é o nome aplicado a um tipo de banco sem espaldar. Segundo me parece, é regionalismo gaúcho, ou do sul.
A relação metafórica que se estabelece encontra no gado, símbolo da cultura regional, o ponto de comparação. A linguagem é marcada pela incompletude. Ao estabelecer-se o nome desse banco, buscou-se no gado mocho, ou seja, sem aspas, o ponto metafórico para a designação.
Como o gado mocho não possui aspas, e o banco (mochinho) não tem espaldar, o nome se justifica pela transferência de traços semânticos.
Segundo a mitologia grega, a metáfora surge de Eros, divindade do amor, mas também do desejo, da curiosidade, da procura e da busca. Era filho de Poros, a divindade da abundância, e de Penia, uma mendiga. Vive entre a carência da mãe que busca completude na abundância, na sobra que é a essência de seu pai. Assim, a metáfora, para suprir a ausência de uma palavra que complete um significado mais pleno para determinado ser ou circunstância, busca uma palavra de outro contexto e a enxerta em nova situação de emprego, excedendo em abundância a carência da lacuna semântica. Ao chamar uma jovem de flor, o que ela estritamente falando não é, mas em não encontrando um termo suficientemente elucidativo para designá-la, busca-se a completude do termo flor, cuja abertura semântica nesse contexto permite ao sujeito interpretante um espaço amplo de re-significação.
A incompletude faz parte da essência humana e a metáfora é a forma mais rica de preenchimento desse vazio que, em dizendo outro termo, apenas sugere a completude necessária à razão e ao espírito do leitor.
Todos nós somos eternos filhos de Eros, portanto eróticos, na eterna busca de completude de todos os sentidos possíveis.
O EMPREGO DO ARTIGO DEFINIDO E INDEFINIDO NA NARRATIVA
Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
À beira do Sena, no anoitecer |
Uma dúvida atormenta muita gente na hora de empregar os artigos indefinidos (um, uma) ou definidos (o, a), especialmente no interior de uma narrativa.
Para esse emprego, há uma norma geral: Sempre que se introduz um elemento novo na narrativa, esse deve vir precedido de artigo indefinido. Exemplificando: “ ‘Um’ homem saiu de Jerusalém para Jericó e caiu na mão de ‘uns’ ladrões, ...” O artigo é ‘um’, indefinido, porque se trata de um homem qualquer, até então desconhecido na narrativa. Seguindo a narrativa, aparece: “Por acaso, a seguir ‘um’ sacerdote passou pela mesma estrada...”. Também o artigo é o indefinido ‘um’, porque também o sacerdote é novo na história.
Porém, na sequência da narrativa, o narrador afirma: “... ‘o’ sacerdote viu ‘o’ infeliz, olhou-o, sentiu compaixão dele, mas seguiu seu caminho...”. Agora, na narrativa, aparece o artigo indefinido ‘o’. Quando o artigo ‘o’ precede sacerdote, deve-se empregar este definido porque se trata do mesmo sacerdote já apontado na parábola. Da mesma forma, o artigo ‘o’, que precede o termo infeliz, refere-se a um elemento conhecido na história, porque o emprego do artigo não se fixa a um termo e, sim, à sua representação no texto. Infeliz é uma anáfora de homem, já empregado anteriormente nessa narrativa. (Para quem não é da área da linguagem, lembremos que a anáfora é a retomada de um mesmo elemento já citado com um termo diferente, com o intuito de deixar a narrativa menos monótona.). Esse é apenas um princípio geral: não é absoluto, nem observado por todos os grandes narradores, como se verá mais adisnte.
Abaixo, exponho uma narrativa minha, já publicada em outro espaço, com os artigos em destaque através de aspas:
Minha avó me contava, e isso por vezes sem conta, como o exigem as crianças, a lenda de ‘uma’ menina que ia para ‘o’ armazém, com ‘um’ pote de leite à cabeça, como o faziam todas ‘as’ meninas desses velhos tempos. E eu visualizava ‘a’ garota... ‘os’ pés descalços... ‘os’ cabelos ao vento... ‘o’ pote... ‘o’ leite branco...
Sonhava, dizia vovó, que eu sei, também sonhava muito com seus mais de setenta, pois venderia ‘o’ leite, compraria vinte ovos, chocaria n‘a’ carijó, teria em breve vinte pintinhos doirados, trocaria ‘os’ frangos por ‘um’ roliço leitão... e, em breve, teria ‘uma’ vaca com ‘um’ lindo bezerrinho... e apressava ‘o’ passo, acelerando ‘o’ sonho...
De repente, ‘um’ desnível do caminho, e lá se foram pote e sonho... e assim quantas meninas e meninos quebraram seus potes vida afora pelos séculos dos séculos...
O primeiro ‘uma’, referindo-se a menina é indefinido porque essa menina é um elemento novo em minha história. Veja-se que a palavra avó, se viesse precedida de artigo, deveria ser o definido ‘a’, pois ela é avó, do narrador, portanto definida em relação a ele. O artigo ‘o’, precedendo armazém, esta definido pela menina, pois ancora-se no fato de ser armazém frequentado por ela.
Mas vejamos mais adiante: ‘os’, precedendo pés e cabelos, são definidos porque estão contidos na menina; uma vez definida a menina, define-se tudo o que está nela, são definidos ancorados na palavra menina. O mesmo vai ocorrer com ‘o’ referente a leite, ‘a’ referente a carijó, e ‘os’ referentes a frangos.
Já, ‘um’ leitão, ‘uma’ vaca, ‘um’ bezerrinho, são elementos novos introduzidos na narrativa.
Temos, porém, o espaço do contraditório. A narrativa acima insere-se no modelo tradicional do gênero narrativo. No entanto, há autores contemporâneos, como Luis Fernando Verissimo e Millôr Fernandes, que não seguem esses princípios e constroem narrativas de enorme prestígio. Veja-se a fábula abaixo de Millôr, em Novas Fábulas Fabulosas: (O menininho... Este emprego já não está de acordo com o que a regra propõe).
A MORTE DA TARTARUGA - Millôr Fernandes
O menininho foi ao quintal e voltou chorando: a tartaruga tinha morrido. A mãe foi ao quintal com ele, mexeu na tartaruga com um pau (tinha nojo daquele bicho) e constatou que a tartaruga tinha morrido mesmo. Diante da confirmação da mãe, o garoto pôs-se a chorar ainda com mais força. A mãe a princípio ficou penalizada, mas logo começou a ficar aborrecida com o choro do menino. "Cuidado, senão você acorda o seu pai". Mas o menino não se conformava. Pegou a tartaruga no colo e pôs-se a acariciar-lhe o casco duro. A mãe disse que comprava outra, mas ele respondeu que não queria, queria aquela, viva! A mãe lhe prometeu um carrinho, um velocípede, lhe prometeu uma surra, mas o pobre menino parecia estar mesmo profundamente abalado com a morte do seu animalzinho de estimação.
Afinal, com tanto choro, o pai acordou lá dentro, e veio, estremunhado, ver de que se tratava. O menino mostrou-lhe a tartaruga morta. A mãe disse - "Está aí assim há meia hora, chorando que nem maluco. Não sei mais o que fazer. Já lhe prometi tudo mas ele continua berrando desse jeito". O pai examinou a situação e propôs: - "Olha, Henriquinho. Se a tartaruga está morta, não adianta mesmo você chorar. Deixa ela aí e vem cá com o papai". O garoto depôs cuidadosamente a tartaruga junto do tanque e seguiu o pai, pela mão. O pai sentou-se na poltrona, botou garoto no colo e disse: - "Eu sei que você sente muito a morte da tartaruguinha. Eu também gostava muito dela. Mas nós vamos fazer para ela um grande funeral". (Empregou de propósito a palavra difícil). O menino parou imediatamente de chorar. "que é funeral?" O pai lhe explicou que era um enterro. "Olha, nós vamos à rua, compramos uma caixa bem bonita, bastante balas, bombons, doces e voltamos para casa. Depois botamos a tartaruga na caixa em cima da mesa da cozinha e rodeamos de velinhas de aniversário. Aí convidamos os meninos da vizinhança, acendemos as velinhas, cantamos o "Happy Birth-Day-To-You"pra tartaruguinha morta e você assopra as velas. Depois pegamos a caixa, abrimos um buraco no fundo do quintal, enterramos a tartaruguinha e botamos uma pedra em cima com o nome dela e o dia em que ela morreu. Isso é que é funeral! Vamos fazer isso?" O garotinho estava com outra cara. "Vamos papai, vamos! A tartaruguinha vai ficar contente lá no céu, não vai? Olha, eu vou apanhar ela". Saiu correndo. Enquanto o pai se vestia, ouviu um grito no quintal. "Papai, papai, vem cá, ela está viva!" O pai correu pro quintal e constatou que era verdade. A tartaruga estava andando de novo, normalmente. "Que bom, hein?" - disse - "Ela está viva! Não vamos ter que fazer o funeral!" "Vamos sim papai" disse o menino ansioso, pegando uma pedra bem grande - "Eu mato ela!"...
************************************
Veja-se, quem escreve bem, ultrapassa padrões, modelos e regras. Parece-me que o ‘o’, artigo definido que inicia a narrativa de Millôr cria a sensação de que é uma sequência narrativa que se iniciou anteriormente, sendo, essa introdução aparente, um segmento dando continuidade à fala.DIFICULDADES DA LÍNGUA PORTUGUESA
QUAL A LÍNGUA MAIS DIFÍCIL? A MAIS DIFERENTE DA NOSSA
Ouvem-se seguidamente comentários em que se afirma que a língua portuguesa é mais difícil do que as demais. Não concordo com isso. Comecei minha vida com minha avó que falava italiano comigo. Todas as línguas possuem certas nuanças e detalhes, que somente na fala diária, quando se entra nas coisas da alma ou mesmo quando se aborda um tema complexo, se apresentam. E agora, como digo isso sem ofender ou sem ser mal comprendido? Em todo o idioma acontecem esses mistérios de como dizer.
Para um chinês, que tem uma língua estremamente simples o português é uma língua muito difícil. Todos os verbos em chinês somente possuem uma forma única para todas as pessoas. O verbo ser é SHI (是), escreve-se assim. Eu sou homem. (我是我人。) Lê-se wo shi nan ren. Eu era homem. (我是個男人。 ) wǒ shì gè nán rén 。(o que indica o passado é o prefixo ge). Somente em não ter essa variedade de tempos, pessoas e modos, já se torna extremamente mais simples.
Dessa forma, a gramática da língua chinesa padrão compartilha muitas características com outras variedades do chinês. A língua praticamente não apresenta flexões de modo que as palavras têm tipicamente uma única forma.
Funções como número e gênero gramatical nos substantivos e tempo e modo em verbos são expressas pela ordem dos constituintes na frase ou por partículas (como sufixos e prefixos) que se escrevem separados. A ordem básica dos constituintes é “Sujeito-Verbo-Objeto” e a maioria dos modificadores, como adjetivos e advérbios precedem a palavra modificada.
O problema é escrever e ler numa língua que não possui alfabeto, mas um conjunto de mais de quatro mil ideogramas. Exemplo: homem é 男人
(que se lê nan ren). Mulher é
女人 (que se lê nü ren). Assim, Eu sou mulher我是
女人. Muitas vezes eles simplesmente apagam o verbo, dizendo, eu homem, eu mulher.
Aqui está o nosso grande problema. A nossa sorte é que existe um programa de computador que transcreve os ideogramas chineses para um sistema que se chama Pinyin, que converte a chinês em nossos caracteres latinos.
As gramáticas de línguas como espanhol, o francês, o italiano e o romeno são gramáticas originadas da gramática latina. portanto, muito semelhantes às nossa. Já o inglês possui uma gramática muito mais simples do que a nossa. Elimina muitos elementos de concordância. O alemão, por sua vez, tem resquícios das declinações, como o latim e o grego, mas é mais simples do que essas línguas.
Portanto, é puro mito dizer que a língua portuguesa é mais difícil do que as outras. Quanto mais diferente uma língua é mais diferente da língua de um falante, mais difícil vai ser para ele.
EMPREGO DA VÍRGULA
Aprendi com um velho e sábio frade capuchinho, que me orientava nas minhas produções textuais, quando eu não tinha mais do que doze ou treze anos, que todas as regras do emprego da vírgula se reduzem a duas. É apenas uma questão de simplificação e raciocínio.
Dizia-me o velhinho frei Irineu, com o cenho frisado, por entre as barbas longas e os cabelos alvos cortados em forma de auréola: As regras para o emprego da vírgula são apenas duas e muito lógicas:
REGRA NÚMERO 1
Emprega-se a vírgula para separar ideias justapostas.
REGRA NÚMERO 2
Emprega-se ainda a vírgula para separar ideias intercaladas, ou deslocadas de sua ordem de posição na estrutura frasal.
Exemplificando:
Ideias justapostas são aquelas que vêm uma ao lado da outra, podendo ser representadas por palavras, expressões ou mesmo por frases. Podem ocorrer sujeitos justapostos: Pedro, Maria, João e Antônio chegaram. Podem ser objetos diretos justapostos: Compramos cadernos, canetas, livros e borrachas.
Assim, sempre que se seguem palavras que tenham a mesma função, devem ser separadas por vírgula. Desse modo, também, quando se seguem ideias representadas por frases, devem separar-se por vírgula. O dia começava, o sol brilhava no horizonte, os pássaros distribuíam sua alegria pelos ares e tudo se tornava encantador e alvissareiro. Veja-se que é o mesmo princípio da justaposição, que justifica a separação de um elemento do outro, pelo emprego de vírgula.
REGRA NÚMERO 2
Exemplificando: A estrutura frasal canônica da língua portuguesa é: sujeito, predicado, objetos e seus atributos e circunstâncias. Isso não significa que não haja outras distribuições diferentes e possíveis dos elementos frasais. Essa é, no entanto, a distribuição não marcada dos componentes da frase. Os atributos e circunstâncias devem acompanhar os componentes a que se referem.
Assim, quando alguma explicação ou intervenção qualquer se interpuser à sequência de um pensamento na sentença, deve ela ser separada por vírgula, no começo e no final. Veja-se o caso: Napoleão, imperador da França, morreu no exílio. Ou, Napoleão, que foi imperador da França, morreu no exílio. Tem-se a primeira sentença: Napoleão foi imperador da França. Intercalada está: Napoleão morreu no exílio.
Esse princípio serve também para justificar qualquer alteração da ordem de distribuição dos elementos na sentença. Veja-se o exemplo que segue: Na sociedade moderna, os privilégios não se sustentam mais. A expressão “na sociedade moderna” é um modificador adverbial, devendo acompanhar o verbo e não precedê-lo, como ocorre neste exemplo.
Podem-se tomar todas as regras apresentadas nas diversas gramáticas e chegar-se-á à conclusão de que todas elas se reduzem a um desses dois princípios apresentados anteriormente. Parece-me que o esforço didático dos gramáticos, em vez de facilitar, exige do aprendiz a memorização de um enorme conjunto de regras, que provoca a sensação de nunca lembrar todas, causando uma enorme insegurança. A simplificação do velho frade, já de há muito desaparecido, foi-me de grande utilidade em toda a minha carreira acadêmica e literária.
Aprendi com um velho e sábio frade capuchinho, que me orientava nas minhas produções textuais, quando eu não tinha mais do que doze ou treze anos, que todas as regras do emprego da vírgula se reduzem a duas. É apenas uma questão de simplificação e raciocínio.
Dizia-me o velhinho frei Irineu, com o cenho frisado, por entre as barbas longas e os cabelos alvos cortados em forma de auréola: As regras para o emprego da vírgula são apenas duas e muito lógicas:
REGRA NÚMERO 1
Emprega-se a vírgula para separar ideias justapostas.
REGRA NÚMERO 2
Emprega-se ainda a vírgula para separar ideias intercaladas, ou deslocadas de sua ordem de posição na estrutura frasal.
Exemplificando:
Ideias justapostas são aquelas que vêm uma ao lado da outra, podendo ser representadas por palavras, expressões ou mesmo por frases. Podem ocorrer sujeitos justapostos: Pedro, Maria, João e Antônio chegaram. Podem ser objetos diretos justapostos: Compramos cadernos, canetas, livros e borrachas.
Assim, sempre que se seguem palavras que tenham a mesma função, devem ser separadas por vírgula. Desse modo, também, quando se seguem ideias representadas por frases, devem separar-se por vírgula. O dia começava, o sol brilhava no horizonte, os pássaros distribuíam sua alegria pelos ares e tudo se tornava encantador e alvissareiro. Veja-se que é o mesmo princípio da justaposição, que justifica a separação de um elemento do outro, pelo emprego de vírgula.
REGRA NÚMERO 2
Exemplificando: A estrutura frasal canônica da língua portuguesa é: sujeito, predicado, objetos e seus atributos e circunstâncias. Isso não significa que não haja outras distribuições diferentes e possíveis dos elementos frasais. Essa é, no entanto, a distribuição não marcada dos componentes da frase. Os atributos e circunstâncias devem acompanhar os componentes a que se referem.
Assim, quando alguma explicação ou intervenção qualquer se interpuser à sequência de um pensamento na sentença, deve ela ser separada por vírgula, no começo e no final. Veja-se o caso: Napoleão, imperador da França, morreu no exílio. Ou, Napoleão, que foi imperador da França, morreu no exílio. Tem-se a primeira sentença: Napoleão foi imperador da França. Intercalada está: Napoleão morreu no exílio.
Esse princípio serve também para justificar qualquer alteração da ordem de distribuição dos elementos na sentença. Veja-se o exemplo que segue: Na sociedade moderna, os privilégios não se sustentam mais. A expressão “na sociedade moderna” é um modificador adverbial, devendo acompanhar o verbo e não precedê-lo, como ocorre neste exemplo.
Podem-se tomar todas as regras apresentadas nas diversas gramáticas e chegar-se-á à conclusão de que todas elas se reduzem a um desses dois princípios apresentados anteriormente. Parece-me que o esforço didático dos gramáticos, em vez de facilitar, exige do aprendiz a memorização de um enorme conjunto de regras, que provoca a sensação de nunca lembrar todas, causando uma enorme insegurança. A simplificação do velho frade, já de há muito desaparecido, foi-me de grande utilidade em toda a minha carreira acadêmica e literária.
Frei Irineu na juventude. Única foto que consegui dele, em seu necrológio.
QUANDO SE EMPREGA DE OS, E DOS, DE ESTE E DESTE?
Às vezes, há dúvidas quanto à aglutinação ou não-aglutinação da preposição ao artigo ou ao pronome. Veja-se o seguinte caso: Está na hora "de os políticos tomarem" posição diante das ações dos corruptos.
À primeira vista, esta construção pode parecer estranha, mas está correta. Não se pode aglutinar a preposição ao artigo o porque a preposição “de” refere-se à forma verbal “tomarem” e o artigo “os” se refere a "políticos". Equivale a: Está na hora de tomarem os políticos...
Há muitos outros exemplos similares. Veja-se: É a ocasião "de estas meninas receberem" nosso apoio. (Porque “de” se refere a “receberem” e “estas”, a “meninas”. Seria como: É a ocasião de receberem estas meninas nosso apoio.
Somente se faz a aglutinação, quando preposição e artigo ou preposição e pronome se referem ao mesmo termo da oração. Vejam-se os seguintes casos: Esta é a ocasião "dos" políticos novos. (A preposição “de” e o artigo “os” referem-se, ambos, a “políticos”). O exemplo a seguir mostra a mesma ocorrência em relação ao pronome. Observe-se: A mãe "destas" meninas não compareceu. (Da mesma forma, a preposição “de” e o pronome “estas” referem-se, ambos, ao termo “meninas”).
À primeira vista, esta construção pode parecer estranha, mas está correta. Não se pode aglutinar a preposição ao artigo o porque a preposição “de” refere-se à forma verbal “tomarem” e o artigo “os” se refere a "políticos". Equivale a: Está na hora de tomarem os políticos...
Há muitos outros exemplos similares. Veja-se: É a ocasião "de estas meninas receberem" nosso apoio. (Porque “de” se refere a “receberem” e “estas”, a “meninas”. Seria como: É a ocasião de receberem estas meninas nosso apoio.
Somente se faz a aglutinação, quando preposição e artigo ou preposição e pronome se referem ao mesmo termo da oração. Vejam-se os seguintes casos: Esta é a ocasião "dos" políticos novos. (A preposição “de” e o artigo “os” referem-se, ambos, a “políticos”). O exemplo a seguir mostra a mesma ocorrência em relação ao pronome. Observe-se: A mãe "destas" meninas não compareceu. (Da mesma forma, a preposição “de” e o pronome “estas” referem-se, ambos, ao termo “meninas”).
GRAFIA DE CERTOS VERBOS
Muitas vezes se tem dúvidas na grafia de tempos especiais de alguns verbos, como o futuro do subjuntivo e o pretérito imperfeito do subjuntivo, em formas como quiser, quisesse, puser, pusesse, fizer, fizesse.
Uma dica importante é o princípio geral de que verbo que não tem "z" no infinitivo, não tem "z" em tempo algum.
Uma dica importante é o princípio geral de que verbo que não tem "z" no infinitivo, não tem "z" em tempo algum.
Assim:
- querer origina quiser, quisesse;
- pôr origina puser, pusesse;
- mas fazer origina fizer, fizesse.
- querer origina quiser, quisesse;
- pôr origina puser, pusesse;
- mas fazer origina fizer, fizesse.
CONCORDÂNCIA DA INTERJEIÇÃO VIVA! VIVAM!
Continuando na área da linguagem, faço uma observação quanto ao emprego da expressão muito empregada: viva!
Ela também se submete às regras de concordância.
Assim dizemos: Viva a Pátria! Viva a professora! Viva o Papa!
Porém, se for plural, temos de gritar: Vivam as mães! Vivam os pais!
Ela também se submete às regras de concordância.
Assim dizemos: Viva a Pátria! Viva a professora! Viva o Papa!
Porém, se for plural, temos de gritar: Vivam as mães! Vivam os pais!
EMPREGO DE OBRIGADO, OBRIGADA
Já uma pessoa do sexo masculino diria: Obrigado, Senhor. Assim como uma pessoa do sexo feminina diria: Estou muito agradecida. Uma do sexo masculino diria: Estou muito agradecido.
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