sexta-feira, 22 de abril de 2022

A DECADÊNCIA DA CIVILIZAÇÃO EUROPEIA E A SUA DÍVIDA COM OS POVOS INDÍGENAS

A decadência da “Civilização Europeia” e sua dívida com os povos indígenas

Posted by  on 19/04/2022

Um discurso feito pelo cacique Guaicaipuro Cuautémoc, de ascendência indígena, sobre o pagamento da dívida externa do seu país, o México, embasbacou os principais chefes de Estado da Comunidade Europeia. 

A Conferência dos Chefes de Estado da União Europeia, Mercosul e Caribe, em Madrid, viveu um momento revelador e surpreendente: os Chefes de Estado europeus ouviram perplexos e calados um discurso irônico, cáustico e historicamente muitíssimo exato.

Reproduzido da Renacer Indianista No 7, e da conversão em Resurgence n º 184. Consulte o site da Resurgence em: http://newint.org/  e  http://www.gn.apc.org/

Guaicaipuro Cuautémoc , um indígena do México, que visitou a Europa em 1992 para a comemoração dos 500 anos do “descobrimento” da América por Cristovão Colombo em 1492…

· A Conferência dos Chefes de Estado da União Europeia, Mercosul e Caribe, em Madrid, viveu um momento revelador e surpreendente: os Chefes de Estado europeus ouviram perplexos e calados um discurso irônico, cáustico e historicamente muitíssimo exato e correto.

· Eis o discurso:

· “Aqui estou eu, descendente dos que povoaram a América há 40 mil anos, para encontrar os que a “descobriram” há 500… O irmão europeu da alfândega pediu-me um papel escrito, um visto, para eu poder descobrir os que me descobriram. O irmão financeiro europeu pede ao meu país o pagamento, com juros, de uma dívida contraída por Judas, a quem nunca autorizei que me vendesse. Outro irmão europeu explica-me que toda a dívida se paga com juros, mesmo que para isso sejam vendidos seres humanos e países inteiros, sem lhes pedir consentimento. Eu também posso reclamar pagamento e juros.

Consta no “Arquivo da Companhia das Índias Ocidentais” que, somente entre os anos de 1503 a 1660, chegaram a São Lucas de Barrameda 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata provenientes das Américas.

· Teria aquilo sido um saque? Não acredito, porque seria pensar que os irmãos cristãos faltaram ao sétimo mandamento!

· Teria sido espoliação? Guarda-me Tanatzin de me convencer que os europeus, como Caim, matam e negam o sangue do irmão.

· Teria sido genocídio? Isso seria dar crédito aos caluniadores, como Bartolomeu de Las Casas ou Arturo Uslar Pietri, que afirmam que a arrancada do capitalismo e a atual civilização europeia se devem à inundação dos metais preciosos tirados das Américas.

· Não, esses 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata foram o primeiro de tantos empréstimos amigáveis da América destinados ao desenvolvimento [do hospício] da Europa. O contrário disso seria presumir a existência de crimes de guerra, o que daria direito a exigir não apenas a devolução, mas uma indenização por perdas e danos.

· Prefiro pensar na hipótese menos ofensiva.

· Tão fabulosa exportação de capitais não foi mais do que o início de um plano “MARSHALL MONTEZUMA”, para garantir a reconstrução da Europa arruinada por suas deploráveis guerras contra os muçulmanos, criadores da álgebra e de outras conquistas da civilização.

· Para celebrar o quinto centenário desse empréstimo, podemos perguntar: Os irmãos europeus fizeram uso racional responsável ou pelo menos produtivo desses fundos?

· Não. No aspecto estratégico, dilapidaram-nos nas batalhas de Lepanto, em navios invencíveis, em terceiros reichs e várias outras formas de extermínio mútuo.

· No aspecto financeiro, foram incapazes – depois de uma moratória de 500 anos – tanto de amortizar capital e juros, como de se tornarem independentes das rendas líquidas, das matérias-primas e da energia barata que lhes exporta e provê todo o assim chamado “Terceiro Mundo”.

· Este quadro corrobora a afirmação de Milton Friedman, segundo a qual uma economia subsidiada jamais pode funcionar, o que nos obriga a reclamar-lhes, para seu próprio bem, o pagamento do capital e dos juros que, tão generosamente, temos demorado todos estes séculos para cobrar. Ao dizer isto, esclarecemos que não nos rebaixaremos a cobrar de nossos irmãos europeus, as mesmas vis e sanguinárias taxas de 20% e até 30% de juros ao ano que os irmãos europeus cobram dos povos do Terceiro Mundo.

· Limitar-nos-emos a exigir a devolução dos metais preciosos, acrescida de um módico juro de 10%, acumulado apenas durante os últimos 300 anos, concedendo-lhes 200 anos de bónus. Feitas as contas a partir desta base e aplicando a fórmula europeia de juros compostos, concluímos, e disso informamos os nossos “descobridores”, que nos devem não os 185 mil quilos de ouro e 16 milhões de quilos de prata, mas aqueles valores elevados à potência de 300, número para cuja expressão total será necessário expandir o planeta Terra. 

· Muito peso em ouro e prata… quanto pesariam se calculados em sangue?

· Admitir que a Europa, em meio milênio  não conseguiu gerar riquezas suficientes para estes módicos juros, seria admitir o seu absoluto fracasso financeiro e a demência e irracionalidade dos conceitos capitalistas.

· Tais questões metafísicas, desde já, não nos inquietam a nós, índios da América. Porém, exigimos a assinatura de uma carta de intenções que enquadre os povos devedores do Velho Continente na obrigação do pagamento da dívida, sob pena de privatização ou conversão da Europa, de forma tal, que seja possível um processo de entrega de terras, como primeira prestação da dívida histórica…”

Quando terminou seu discurso diante dos chefes de Estado da Comunidade Européia, o Cacique Guaicaípuro Guatemoc não sabia que estava expondo uma tese de Direito Internacional para determinar a Verdadeira Dívida Externa.

Um exemplo da relação dos espanhóis com os indígenas que corrobora o discurso anterior vem da história da maior mina de prata das Américas jamais superada, o Cerro Rico, em Potosi. Foi aos pés desse enorme cone de pedra que, em 1545, o pastor de lhamas Diego Huallpa viu aflorar, à luz da fogueira, uma pequena quantidade de terra prateada. Não demorou para que os espanhóis, na condição de colonizadores, começassem a ordenar diversas escavações. 

A extensão das reservas argentíferas (pura prata) que eles encontraram pode ser medida pela quantidade de prata que extraíram. Segundo documentos da Casa da Moeda de Potosi, entre 1545 e 1825 – ano em que a Bolívia conquistou sua independência-, tirou-se da montanha aproximadamente 35 mil toneladas do nobre metal da prata.

Potosi tornou-se, ainda no século 16, uma das urbes mais ricas e cobiçadas da colônia de Espanha; em 1640, época em que metade da prata comercializada no mundo saía do Cerro Rico (Potosi), sua população de 160 mil almas rivalizava com a de capitais como Paris e Madri. Paróquias, havia 14. Conventos, cinco. Prostitutas, mais de 120. E, reza a lenda, até as ruas da cidade estavam banhadas com argento. A Coroa Espanhola e seus credores exultavam. Mas a opulência – e a perspectiva de uma riqueza sem fim -, trouxe também a degradação da vida dos indígenas. 

Coube ao vice-rei Francisco de Toledo instaurar em Potosi, em 1575, o sistema de “mitas”, que obrigava boa parte dos nativos locais a labutar dentro das minas, em situação análoga à da escravidão. A eles juntaram-se punhados de negros, trazidos de Angola e Cabo Verde.

A cidade de Potosi no sopé do Cerro Rico.

E o trabalho, como se pode imaginar, era árduo: equipados com picaretas, velas de sebo e quase nenhum acessório de segurança, homens adultos, adolescentes e crianças se embrenhavam nos túneis do Cerro Rico para, durante horas a fio, remover e transportar o minério de prata rumo à cidade; dali ele seguiria para o porto de Arica, no Pacífico – de onde seria, finalmente, exportado para a Europa.

Desmoronamentos e doenças pulmonares causadas pela poeira de sílica – composto venenoso que flutuava no ar viciado das minas – abriam ao destino dessas pessoas duas vias: a de uma morte súbita, ou a de um definhamento longo e doloroso. E ninguém podia se rebelar: a recusa ao trabalho mineiro era punida com a pena capital.

Em seu livro “As Veias Abertas da América Latina“, o historiador uruguaio Eduardo Galeano calcula que, entre os séculos 16 e 19, cerca de oito milhões de pessoas tenham morrido em decorrência do trabalho no Cerro Rico, em Potosi. A prata praticamente acabou. Mas, longe de assustar a cultura mineira, a exploração da combalida montanha ainda segue viva – e letal.

Gravura do interior das minas de Potosí, onde milhares de índios eram submetidos a intermináveis horas de trabalho escravo e perderam suas vidas de forma miserável para enviar toda a prata para a coroa espanhola….

Embora tenha sido, entre os séculos 16 e 18, uma das principais fontes de riqueza da Coroa Espanhola na América, Potosi é hoje a capital do Estado mais miserável da Bolívia – que, por sua vez, é o país mais pobre da América do Sul. Com a prata exaurida, carente de indústrias e situado a quatro mil metros acima do nível do mar, a única coisa que o lugar ostenta atualmente são dados estatísticos alarmantes.

Agora resta que algum Governo Latino-Americano tenha a dignidade e coragem suficiente para impor seus direitos perante os Tribunais Internacionais.  Os europeus teriam que pagar por toda a espoliação que aplicaram (e que ainda esta em curso) aos povos que aqui habitavam, com juros civilizados.


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