A Revelação Templária – 7A – Sexo o Sacramento Final
Posted by Thoth3126 on 03/11/2019
CAPÍTULO VII – SEXO O SACRAMENTO FINAL
Os velhos textos alquímicos estão cheios de imagens confusas e complicadas – de forma deliberada, porque se destinavam a desencorajar os não-iniciados de descobrirem os seus segredos.
No entanto, como vimos, a alquimia, no seu nível mais profundo, estava interessada na transformação pessoal, espiritual e sexual, e os seus segredos estavam relacionados com as técnicas destinadas à realização desta «Grande Obra»…
Edição e imagens: Thoth3126@protonmail.ch
Capítulo 07A – SEXO: O SACRAMENTO FINAL – Livro “The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de Lynn Picknett e Clive Prince.
Capítulo VII A – SEXO: O SACRAMENTO FINAL
…Na verdade, reconhecendo as profundas preocupações não materiais e sexuais da alquimia, o psicólogo C. Gustav Jung considerou-a a precursora da psicanálise. Como vimos, a «Grande Obra» do alquimista era uma experiência rara e transformadora de vida e ninguém sabe, ao certo, a forma de que ela se revestia. Contudo, Nicholas Flamel (suposto grão-mestre do Priorado de Sião), que obteve este brilhante galardão, a 17 de Janeiro de 1382, em Paris, sublinhou que o conseguira em companhia da sua mulher, Perenelle.
Parece que eles constituíam um casal muito dedicado: segundo parece, Perenelle também era alquimista – muitas mulheres o eram, em segredo. Mas Flamel sublinhou a sua presença, naquele dia fatídico, como indicação da verdadeira natureza da Grande Obra? Há uma sugestão de que ela revestia a forma de algum gênero de rito sexual?
A Alquimia dos quatro elementos …
Não há dúvida quanto à existência de, pelo menos, uma componente sexual na prática de alquimia, como revela o clássico texto alquímico A Coroa da Natureza, citado em Alchemy de Johannes Fabricius:
A dama de pele branca, amorosamente unida a seu marido, de membros de cor rosa, envolvidos nos braços um do outro, na felicidade da união conjugal. Fundem-se e diluem-se quando atingem a meta da perfeição. Os dois tornam-se um só, como se fossem um só corpo.
Significativamente, existem duas disciplinas orientais que sublinham a transcendência religiosa e espiritual da sexualidade: o tantra indiano e o taoísmo chinês. Ambos são disciplinas antigas – e muito respeitadas nas suas culturas – e realçam o potencial de certas práticas sexuais para atingir o conhecimento místico, a regeneração física, a longevidade e a unidade com Deus. Atualmente, muitas destas ideias são largamente conhecidas, mas o que não é reconhecido, para além dos próprios grupos de iniciados, é que, surpreendentemente, tanto o tantra como o taoísmo têm um ramo alquímico. Como veremos, isso harmoniza-se com a verdadeira natureza da alquimia ocidental.
Por exemplo, no tantrismo, a terminologia «química» é interpretada como representação de práticas sexuais. Como afirma Benjamin Walker, um escritor ocultista, em Man, Myth and Magic:
Embora ostensivamente (aparentemente) interessada na transmutação dos metais mais vis em ouro, nas retortas, instrumentos e aparelhos da atividade, e nos gestos rituais do alquimista, na sua sala de trabalho, esta alquimia ocorre, de fato, no interior do próprio corpo humano.
Ironicamente, os elementos sexuais da alquimia ocidental têm sido interpretados como metáfora dos processos químicos! Como comenta Brian Innes, no seu artigo de The Unexplained, acerca da alquimia sexual tântrica e taoísta:
A estreita semelhança das imagens – e das substâncias utilizadas – da alquimia de todas estas culturas é surpreendente. A grande diferença é igualmente surpreendente: a alquimia medieval europeia não parece ter tido qualquer base sexual explícita.
Existia, no entanto, uma grande diferença entre as imagens públicas e os níveis de aceitabilidade do Oriente e do Ocidente. Na China e na índia, a alquimia não era uma ciência proibida, e as atitudes em relação ao sexo não eram tão neuróticas e reprimidas como eram na Europa; por conseguinte, o trabalho era mais aberto e honesto.
Recentemente, a «sexualidade sagrada» foi «descoberta» pelo Ocidente. Essencialmente, é a ideia de que a sexualidade é o sacramento mais nobre, conferindo não só júbilo mas também a unidade com o Divino e o Universo. O sexo é considerado (uma, entre muitas) a ponte entre o Céu e a Terra, provocando a libertação de enorme energia criativa, além de revitalizar os amantes de forma única – mesmo ao seu nível celular.
O conhecimento da sexualidade sagrada significa que os velhos textos alquímicos podem, finalmente, ser inteiramente compreendidos no Ocidente, embora (como habitualmente) sejam os investigadores franceses que estejam mais empenhados na exploração deste seu aspecto. Dos poucos escritores anglo-saxônicos que não se mantêm afastados do tema, A. T. Mann e Jane Lyle escreveram no seu livro Sacred Sexuality (1995):
É difícil duvidar que os ensinamentos alquímicos escondam segredos sexuais mágicos, que estavam estreitamente aliados ao conhecimento tântrico. Devido à sua complexidade e diversidade, a alquimia certamente envolveu outros mistérios em alegoria poética, a qual apenas, a mente e o CONHECIMENTO dos iniciados conseguia decifrar.
Um dos muitos autores franceses que escrevem sobre este tema, André Nataf, afirma que «[…] o segredo que a maioria dos alquimistas perseguia era um segredo erótico […] a alquimia é simplesmente a conquista do amor, uma “liga” de erótico e espiritual». Há muito que o tantrismo e o taoísmo são reconhecidos como as condutas da sexualidade sagrada da tradição oriental, mas não existiu uma tradição tão bem definida e facilmente detectável no Ocidente – a não ser que fosse conhecida simplesmente por alquimia.
As imagens sexuais dos textos alquímicos parecem demasiado banais a esta era pós- freudiana: a Lua diz ao seu esposo, o Sol: «Oh, Sol, não fazes nada sozinho, se eu não estiver presente com a minha força, tal como um galo nada pode fazer sem uma galinha.» As experiências químicas revestem a forma de «casamentos» ou «cópulas», tal como foi denominado o panfleto The Chemical Wedding de Johann Valentin Andraea.
Certamente que estas imagens podiam ser simplesmente literais: sendo exatamente uma «cópula» e não havendo nenhum segredo oculto no simbolismo alquímico. Contudo, as palavras eram cuidadosamente escolhidas para transmitir instruções complexas, abrangendo um significado tanto sexual como químico. Essencialmente, os textos alquímicos continham lições de magia sexual e de química, simultaneamente.
Curiosamente, dado o óbvio tom sexual de grande parte da atividade, a ideia-padrão histórica da alquimia era a de uma atividade apenas química e que todo o simbolismo era apenas fantasia. Isto deve-se ao fato de não existir nenhuma organização onde enquadrar toda a ideia da alquimia sexual, antes de os mistérios do Oriente serem mais largamente divulgados. Atualmente, no entanto, não temos esse problema, e este conceito está rapidamente a conquistar aceitação. Barbara Graal Waiker capta o significado subjacente da alquimia:
Parte do segredo é revelado pela preponderância do simbolismo sexual da literatura alquímica. A «cópula de Atena e Hermes» podia significar misturar enxofre [sic] e mercúrio numa retorta; ou podia significar a «atividade» sexual do alquimista e da sua namorada. As ilustrações dos livros alquímicos sugerem, com maior frequência, misticismo sexual. Mercúrio, ou Hermes, era o herói alquímico que fertilizava o Vaso Sagrado, uma esfera ou ovo, em forma de ventre, do qual nasceria o filium philosophorum. Este vaso pode ter sido real, um frasco ou uma retorta de laboratório; com maior frequência, parecia ser um símbolo místico. Dizia-se que o Diadema Real desta descendência aparecia no menstro meretricis, «no fluxo menstrual de uma prostituta», a Grande Prostituta sendo um antigo epíteto da deusa [… o poder feminino]».
Walker, no entanto, engana-se quando passa a sugerir que, na busca do vaso hermeticum – o Vaso de Hermes -, os alquimistas o identificavam com o vaso spirituale, o Vaso ou Ventre Espiritual, da Virgem Maria. Porque, qual é a outra Maria que, habitualmente, é representada levando um vaso ou um jarro? Tradicionalmente, quem é representada envergando um vestido escarlate ou envolta no seu longo cabelo ruivo? Que outra Maria está associada à ideia de prostituição e sexualidade? Mais uma vez, encontramos a Virgem Maria como disfarce do culto secreto de Maria Madalena.
Atualmente, falamos de «química sexual», mas para os alquimistas este conceito tinha um significado muito mais profundo do que a mera ideia de atração sexual imediata. Na revista esotérica francesa L’Originel, Denis Labouré, uma autoridade em ocultismo, discute a noção de alquimia «interna» em oposição à alquimia «metálica» e o seu paralelismo com o tantrismo, mas insiste em que ela faz parte de uma «herança tradicional ocidental» (o itálico é nosso) e afirma:
Se a alquimia interna é bem conhecida do tantrismo ou do hinduísmo, os constrangimentos históricos [isto é, a Igreja] obrigaram os autores ocidentais a usar da maior prudência. No entanto, certos textos fazem claras alusões a esta alquimia.
Labouré passa a citar um tratado de Cesar della Riviera, datado de 1605, e acrescenta:
Na Europa, os rastos destes antigos ritos [sexuais] passam pelas escolas gnósticas, pelas correntes alquímicas e cabalísticas da Idade Média e da Renascença – quando numerosos textos alquímicos podiam ser lidos em dois níveis – até que os voltamos a encontrar nas organizações ocultistas, formadas e organizadas, sobretudo na Alemanha, no século XVII.
De fato, o uso do simbolismo «metalúrgico» remonta ao próprio começo da alquimia, na Alexandria do 1.°-3.° século. Metáforas metalúrgicas sobre sexo encontram-se nos encantamentos mágicos e egípcios; os alquimistas limitaram-se a adotar as imagens. Este é um exemplo de um encantamento amoroso, atribuído a Hermes um Trismegisto, que remonta, no mínimo, ao 1.° século a.C. e que se centra no forjamento simbólico de uma espada:
Tragam-ma [a espada], temperada com o sangue de Osíris, e coloquem-na na mão de ÍSIS […] que tudo o que se forja nesta fornalha de fogo seja instilado no coração e fígado, nos rins e ventre de [o nome da mulher]. Conduzi-a à casa de [o nome do homem] e que ela ponha na mão dele o que está na mão dela, na boca dele o que está na boca dela, no corpo dele o que está no corpo dela, no seu bastão o que está no ventre dela.
A “ruiva” Madalena segurando o “vaso” de Alabastro …
A alquimia, tal como era praticada pela rede secreta medieval, nasceu no Egito dos primeiros séculos da era cristã. ÍSIS desempenhava um papel importante na alquimia daquela época. Num tratado intitulado ÍSIS, a Profetisa de seu filho Hórus, ÍSIS relata como obteve «de um anjo e profeta» os segredos da alquimia, através dos seus ardis femininos. Encorajou-o a alimentar o seu desejo por ela, até não poder ser contido, mas recusou entregar-se-lhe antes que ele lhe revelasse os seus segredos – uma clara referência à natureza sexual da iniciação alquímica. (Evoca a história do papa Silvestre II e Meridiana, discutida no Quarto Capítulo, em que ele obtém o seu conhecimento alquímico através do ato sexual com este arquétipo de figura feminina.)
Outro tratado primitivo, atribuído a uma alquimista, de nome Cleópatra – uma iniciada da escola fundada pela lendária Maria, a Judia -, contém imagens sexuais explícitas: «Compreender a realização da arte na união da noiva e do noivo e na sua transformação num único SER.» É notavelmente semelhante a um texto gnóstico contemporâneo, que regista o seguinte:
Quando o homem atinge o momento supremo e a semente brota, nesse momento a mulher recebe a força do homem, e o homem recebe a força da mulher […] É por este motivo que o mistério da união corporal é praticado em segredo, para que a conjunção da natureza não seja degradada por ter sido observada pela multidão que desprezaria a prática.
Os primitivos textos alquímicos estão saturados de simbolismo que sugere as técnicas secretas da sexualidade sagrada, provavelmente provenientes do equivalente egípcio do tantrismo e do taoísmo. A existência desta tradição é revelada no texto conhecido por Papiro Erótico de Turim (onde ele agora se encontra), o qual há muito é considerado um exemplo da pornografia egípcia. Novamente, no entanto, esta reação é um exemplo primordial da má interpretação “acadêmica e erudita” do Ocidente: o que é considerado pornográfico era, de fato, um rito religioso. Alguns dos mais sagrados ritos egípcios eram de natureza sexual – por exemplo, uma observância religiosa diária do faraó e da sua consorte implicava, provavelmente, que ele fosse masturbado por ela.
Este ritual era a reencenação simbólica da criação do Universo pelo deus Ptáh, a qual ele realizara por processos semelhantes. As imagens religiosas dos palácios e dos templos representavam, de forma inequívoca, este ato; no entanto, ele foi considerado tão ultrajante pelos arqueólogos e pelos historiadores que apenas recentemente o seu significado foi reconhecido – e, mesmo assim, o tema ainda é discutido em tons hesitantes e apologéticos. É evidente que o Ocidente tem um longo caminho a percorrer até alcançar a total aceitação egípcia do sexo como um sacramento (sagrado).
Esta relutância em aceitar o significado que o sexo tinha para os antigos não é um fenômeno novo. Para os eruditos do 1.º e 2.° séculos, o tema não era um problema, mas, como observa Jack Lindsay, no século VII, o simbolismo sexual das obras alquímicas é tratado de um «modo secretamente alusivo». Assim, desde o início, a alquimia ocidental tem uma faceta fortemente sexual. Devemos acreditar que, na Idade Média, esta profunda e influente tradição se extinguira totalmente?
Algumas das primeiras seitas gnósticas – como os carpocratianos de Alexandria – praticavam ritos sexuais. Não é surpreendente que fossem declarados degradantes e repugnantes pelos padres da Igreja, e, na falta de registros menos hostis, não há maneira de saber exatamente de que forma esses ritos se revestiam.
Ao longo da história da Cristandade, surgiram seitas «heréticas» que incorporavam uma atitude mais libertária relativamente ao sexo, mas foram invariavelmente condenadas e eliminadas – por exemplo, dizia-se que os irmãos e irmãs do Egito Livre, também conhecidos por adamitas, praticavam um «segredo sexual» que remontava aos séculos XIII e XIV. A filosofia dos adamitas teve uma notável influência no panfleto Schwester Katrai – que, como vimos, inclui provas de familiaridade com o retrato de Maria Madalena esboçado pelos Evangelhos gnósticos -, e a autora parece ter sido membro desta seita.
Outro grupo implicado no misticismo erótico – embora não conhecido como seita religiosa – era o dos trovadores, os famosos cantores do culto do amor do sudoeste da França (região que cultuava Madalena) cujos equivalentes alemães eram os minnesingers – sendo Minne uma mulher idealizada ou deusa. O amor do cavaleiro pela sua dama reflete uma devoção e uma reverência pelo Princípio Feminino. E o conteúdo dos poemas – um misto de «espiritualidade e carnalidade» – pode ser considerado uma série de alusões veladas à sexualidade sagrada. Mesmo a acadêmica Barbara Newman, ao resumir esta tradição, não pôde fugir a usar uma linguagem evocativa da sexualidade sagrada:
[…] um jogo erótico, com uma espantosa variedade de mudanças: o poeta podia transformar-se na noiva de um deus ou no amante de uma deusa ou fundir-se totalmente com a amada e tomar-se divino […].
Grande parte da tradição do amor cortês implica a compreensão de técnicas específicas, por exemplo, a da maithuna, a retenção deliberada do orgasmo, para induzir sensações de beatitude e conhecimento místico. Como afirma Peter Redgrove, autor e poeta britânico:
É possível reconstituir toda uma tradição de maithuna (sexualidade visionária tântrica) na literatura do conto medieval de cavalaria?
Os trovadores adotaram a rosa como símbolo, talvez porque o seu nome (em francês e em inglês, rose) é um anagrama de Eros, o deus do amor erótico. Também existe a possibilidade de que a sua «onipresente» senhora – aquela que devia ser obedecida, embora a casta distância – se destinasse a ter outro significado, a nível esotérico, como sugere o nome alemão de minnesinger.
O arquétipo desta senhora não podia ter sido a Virgem Maria porque, embora a rosa fosse conhecida como seu símbolo, na Idade Média, o seu culto não precisava de se ocultar em códigos. Além disso, a flor mais descritiva das suas qualidades não era a rosa erótica, mas o mais sugestivo lírio do Oriente: belo, mas austero, sem nenhuma sugestão de carnalidade. Então, quem mais podiam celebrar as canções dos trovadores? Quem mais era uma «deusa», muito amada pelos grupos heréticos dessa época? Quem mais senão Maria Madalena?
As grandes rosáceas das catedrais góticas estão sempre voltadas para Ocidente (leste,o nascer do SOL) – tradicionalmente, a direção consagrada às divindades femininas – e nunca estão longe de um santuário da Madonna (minha senhora) Negra. E, como vimos, estas enigmáticas estátuas são deusas pagãs, sob outra roupagem, uma personificação da antiga celebração da sexualidade feminina.
Além das rosáceas sagradas, as catedrais góticas também contêm outras imagens pagãs – por exemplo, o simbolismo da teia de aranha/labirinto de Chartres e de outras catedrais é uma referência direta à Grande Deusa, na sua manifestação de fiandeira e senhora do destino da humanidade, mas muitas outras igrejas também contêm inúmeras imagens femininas. Algumas delas são tão vivas que, uma vez interpretadas, podem alterar a impressão que os cristãos têm das suas igrejas. Por exemplo, as grandes portas góticas, que gerações de cristãos atravessaram tão inocentemente, representam, na realidade, a parte mais íntima da deusa.
Atraindo o crente as seu interior escuro e semelhante a um ventre, as portas são esculpidas em arestas afuniladas e quase sempre ostentam um botão de rosa, semelhante a um clítoris, no topo do arco. Uma vez no interior, o crente católico para junto a uma pia da água benta, quase sempre representada por uma concha gigantesca, símbolo da natividade da deusa – como Botticelli, suposto grão-mestre do Priorado de Sião, imediatamente antes de Leonardo, tão espantosamente a representou em O Nascimento de Vênus. (E a concha de caurim, outrora símbolo dos peregrinos cristãos, é reconhecida como sendo o símbolo clássico da vulva.).
Todos estes símbolos foram deliberadamente empregados pelos adeptos do Princípio Feminino, e, embora comuniquem algo a nível subliminar, têm um efeito perturbador sobre o inconsciente. Aliados à grande sonoridade da música, à luz das velas e ao aroma do incenso, não admira que, outrora, a ida à igreja inspirasse um fervor tão peculiar!
Para os iniciados nos mistérios do oculto, o Feminino era um conceito carnal, místico e espiritual simultaneamente. A sua energia e poder provinham da sua sexualidade, e a sua sabedoria (Sophia) – por vezes conhecida por «sabedoria da prostituta» – provinha de um conhecimento da «rosa», eros.
Segundo o ditado, «saber é poder», segredos desta natureza exercem um poder sem igual, constituindo, por isso, uma ameaça única à existência da Igreja de Roma e a todos os matizes de opinião católica. O sexo era – e, em muitos casos, ainda é – considerado aceitável apenas entre aqueles cuja união tinha probabilidades de resultar em procriação. Por esta razão, não existe conceito cristão de sexo apenas por prazer, para não referir a ideia – como no tantrismo ou na alquimia – de que ele possa proporcionar iluminação espiritual. (E, enquanto a Igreja Católica notoriamente proíbe a contracepção, outros grupos vão mais longe: por exemplo, os mórmons reprovam o sexo após a menopausa.)
O que todas estas regras inibitórias realmente pretendem, no entanto, é o controle das mulheres (do poder feminino e assim da humanidade). Elas devem aprender a encarar o sexo com apreensão – ou porque é triste, é seu dever conjugal e nada mais, ou porque conduz, inevitavelmente, às dores do parto. Esta ideia era central no modo como as mulheres eram encaradas pela igreja, e pelos homens, em geral, ao longo dos séculos: se as mulheres perdessem o receio do parto, sem dúvida que o caos se instalaria.
Um dos principais motivos que inspirou as atrocidades da caça às bruxas foi o ódio e o medo das parteiras, cujo conhecimento do modo de aliviar as dores do parto era considerado uma ameaça para a civilização “decente”: Kramer e Sprenger, autores do infame Malleus Maleficarum – o manual dos caçadores de bruxas europeus – escolheram particularmente as parteiras como sendo merecedoras do pior tratamento possível às suas mãos. O terror da sexualidade feminina terminou com centenas de milhares de mortos, a maioria das vítimas sendo de mulheres, ao longo de três séculos de julgamentos de feitiçaria, efetuados pela “santa igreja de Roma”.
Desde a época misógina dos primeiros padres da Igreja, quando ainda se duvidava de que as mulheres tivessem alma, tudo foi feito para as fazer sentirem-se profundamente inferiores, em todos os níveis. Não lhes ensinavam apenas que eram pecaminosas, em si mesmas, mas que também eram a maior – por vezes, a única – causa de pecado do homem. Aos homens era ensinado que, ao sentirem genuíno desejo sexual, estavam apenas reagindo às artimanhas diabólicas da mulher, que os enfeitiçava e os atraía para atos que, de outro modo, eles nunca teriam considerado praticar.
Uma expressão extrema desta atitude encontra-se na ideia da Igreja medieval de que uma mulher violada era responsável não só por provocar o ato contra si mesma mas também pela perda da alma do violador – perda que a mulher teria de reparar no Dia do Juízo Final. Como escreve R. E. I. Masters:
Quase toda a culpa do horrível pesadelo que foi a mania das bruxas, e a maior parte da responsabilidade pelo envenenamento da vida sexual do Ocidente, cabe inteiramente à Igreja Católica romana.
A Inquisição – que fora criada para resolver o problema dos cátaros – adaptou-se facilmente ao seu novo papel de caçadora de bruxas, torturadora e assassina, embora os protestantes também aderissem com prazer a essa prática. É significativo que o primeiro julgamento por feitiçaria se realizasse em Toulouse, quartel-general da Inquisição anti-cátaros. Foi apenas rancor por algum tipo de catarismo residual que conduziu a este julgamento crucial, ou foi um sintoma do medo que as mulheres do Languedoc provocavam aos Inquisidores, obcecados pelo sexo?
Subjacente ao ódio e ao medo das mulheres, estava o conhecimento de que elas tinham uma capacidade única para sentir prazer sexual. Os homens medievais podiam não ter se beneficiado da atual educação anatômica, mas a investigação pessoal não podia ter deixado de revelar a existência do órgão feminino do prazer, curiosamente ameaçador, o clítoris. Essa pequena protuberância, tão inteligentemente – embora subliminarmente – celebrada como o botão de rosa, no topo dos arcos góticos das igrejas, é o único órgão humano cuja função é unicamente dar prazer.
As implicações deste fato são, e sempre foram, enormes e estão no âmago de toda a supressão patriarcal, por um lado, e de todos os ritos sexuais tântricos e místicos, por outro. O clítoris, que ainda hoje não é considerado um tema adequado a discussão, revela que as mulheres se destinavam a ser sexualmente extáticas, talvez ao contrário dos homens, cujo órgão sexual tem a dupla função de urinário e reprodutor.
Contudo, a tradição misógina do patriarcado judaico-cristão teve tanto sucesso que apenas no século XX se tornou aceitável, no Ocidente, a ideia de que as mulheres têm prazer sexual, e, ainda hoje, não é este o caso no que diz respeito à Igreja. Embora seja verdade que a desigualdade sexual e a hipocrisia não sejam criações exclusivas das três grandes religiões patriarcais, catolicismo, judaísmo e islamismo – basta observar o costume indiano de queimar a esposa -, no entanto, a ideia de que o sexo é inerentemente sujo e vergonhoso é uma tradição meramente ocidental. E, em qualquer parte que esta atitude prevaleça, haverá sempre o tipo de desejo reprimido e de culpa que, inevitavelmente, darão origem a crimes contra as mulheres, talvez mesmo a manias de feitiçaria.
O ambiente puritano do Ocidente e o seu ódio e medo do sexo deixaram um terrível legado até ao fim do milênio, sob a forma de espancamento da esposa, pedofilia e violação. Porque, onde quer que o sexo seja olhado com desconfiança, o parto e as crianças também serão considerados intrinsecamente condenáveis, e os filhos serão vítimas de violência, tal como as mães. O contraditório e irascível Jeová do Antigo Testamento criou Eva – e, manifestamente, teve ocasião de se arrepender.
Quase logo que «nasceu», ela revelou uma capacidade para pensar por si própria que ultrapassava muito a de Adão. Eva e a «serpente» formaram uma equipe poderosa: o que não é de admirar porque as serpentes eram o antigo símbolo de Sophia, representando a sabedoria (conhecimento em oposição à ignorância) e não a maldade. Mas ficou Deus Jeová satisfeito porque a mulher que criara, mostrou iniciativa e autonomia ao comer da Árvore do Conhecimento – querendo aprender?
Depois de ter revelado uma curiosa (e estúpida) falta de previsão, relativamente às capacidades de Eva, especialmente para um “onipotente e onisciente” criador de universos, Deus condenou-a a uma vida de sofrimento, começando, deve observar-se, com a maldição da costura… (Porque ela e o infeliz Adão tiveram de fazer tangas de folhas de figueira para cobrir a sua nudez.) Assim, Adão e Eva conheceram a ideia de vergonha dos seus corpos e da sua sexualidade. Bizarramente, somos levados a concluir que foi próprio Deus que ficou horrorizado com a visão da carne nua, o próprio Jeová.
Este mito simplista serviu de justificação retrospectiva para a degradação das mulheres e desencorajou o alívio das agonias ginecológicas e do parto. Negou voz às mulheres durante milhares de anos – e aviltou, degradou e mesmo diabolizou o ato sexual, que deveria ser jubiloso e mágico, pois preserva a perpetuação da própria espécie humana. Se substituiu assim o amor e o êxtase criativo pela vergonha e pela culpa e inculcou um medo neurótico de um Deus masculino que, aparentemente, se odiou tanto que abominou a sua melhor criação – a própria Humanidade.
Desta história perniciosa nasceu o conceito do pecado original, que condena até os recém- nascidos inocentes ao Purgatório; até recentemente, envolveu o espantoso milagre do nascimento num manto de embaraço, ignorância e superstição e eliminou o poder único da mulher – que, evidentemente, foi a razão pela qual, em primeiro lugar, esta história foi inventada.
Embora, na nossa cultura, ainda exista um medo e uma ignorância espantosos em relação ao sexo, as coisas estão muito melhores do que estavam mesmo há dez anos atrás. Vários livros importantes abriram novas perspectivas – ou talvez renovassem antigas perspectivas. Entre eles encontram-se The Art of Sexual Ecstasy de Margo Anand (1990) e Sacred Sexuality de A. T. Mann e Jane Lyle (1995); ambos celebram o sexo como meio de iluminação e transformação espirituais.
Como vimos, outras culturas não sofrem do mesmo problema (a não ser que fossem contaminadas pelo pensamento ocidental). E, em certas culturas, o sexo era julgado superior a uma arte: era considerado um sacramento – algo que habilitava os participantes a identificarem-se com o Divino. É esta a raison d’être do tantrismo, o sistema místico de união com os deuses, através de técnicas sexuais como a Karezza ou a obtenção da felicidade, sem orgasmo. O tantrismo é a «arte marcial» da prática sexual, implicando uma preparação espantosamente disciplinada e demorada, tanto para homens como para mulheres – sendo ambos considerados iguais.
A arte do tantrismo, no entanto, não é exclusiva do mundo exótico do Oriente. Atualmente, surgem escolas de tantra em Londres, Paris e Nova Iorque, embora o extremo rigor da arte afaste muitas pessoas; por exemplo, são necessários meses somente para aprender a respirar de modo correto. Mas o uso do sexo, como sacramento, não é novo no Ocidente.
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