sábado, 11 de março de 2017

HIBISCO VERMELHO




Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara


Acordei. Um grande hibisco espiava-me por trás da vidraça. Tão robusto. Cônico. Vermelho. Tão vermelho. Tão vigoroso. Olhava-me do interior de seu cone.
Era como se aí estivesse desde todo sempre. Não estava. Na véspera, devia ser um cartuxo verde. Nem o percebi. Fui ao café.
Na volta, continuava lá. As bordas mais abertas. Rebotalhos das gotas noturnas ainda o enfeitavam. Magnífico. Forte como se de aço fosse. Contrastava com o verde do folhado. Único desta borda da planta. Orgulhoso. Seguro...
Esqueci-o. Escritório. Leituras. Divagações. Textos. Falas. Pessoas. Imagens. O mundo. A rua. O almoço. A rotina.
À noite... a janela no escuro. A vidraça negra. O hibisco vermelho? Não via. A noite o havia engolido em seu ventre de trevas. Os sonhos. A lua. 
Dia seguinte. Quase já me esquecia dele. Um olhar na janela. Nada. Teria sido ilusão? Não. Um ponto na ponta do ramo. Do vermelho, uma pálida e minúscula mancha.
No chão, o cone no capim. Sem vigor. Como envergonhado, não ousava contemplar-me a face. O vulto sumido por entre as hastes içadas. Meio murcho. Flácido. Desfalecido. Desiludido do que fora.
Na tarde, completamente pálido, foi arrastado pelo ancinho da limpeza. Juntou-se ao lixo comum. Foi-se. Ninguém sentiu sua falta. Outros tantos o sucederam abaixo, acima, nas ramagens.
Quando será minha vez?
Pulvis est et in pulverem reverteris.

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