quinta-feira, 26 de julho de 2018

REVELAÇÃO TEMPLÁRIA - DISCÍPULOS DO REI DA LUZ


A Revelação Templária – 15 – Os Discípulos do Rei da Luz
Posted by Thoth3126 on 23/07/2018

CAPÍTULO XV – OS DISCÍPULOS DO REI DA LUZ

No século XVII, missionários jesuítas que regressavam da área circundante do Baixo rio Eufrates e rio Tigre, no que é o atual Iraque, trouxeram histórias de um povo a que chamavam «cristãos de S. João». Embora este grupo vivesse no mundo muçulmano e estivesse rodeado de árabes, eles ainda aderiam a uma forma de cristianismo em que João Batista era proeminente. Todos os seus ritos religiosos eram centrados no batismo, que não era uma cerimônia que se realizava apenas uma vez para iniciar e acolher um novo membro na congregação, mas que desempenhava um papel importante em todos os seus sacramentos e rituais.
Edição e imagens: Thoth3126@protonmail.ch
CAPÍTULO XV – OS DISCÍPULOS DO REI DA LUZ – Livro “The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de Lynn Picknett e Clive Prince.

Mas, desde estes primeiros contatos, tomou-se aparente que a designação «cristãos de S. João» não era apropriada. Esta seita tinha uma veneração especial por João Batista – mas os seus membros não podiam, de modo algum, ser chamados cristãos no sentido habitual. Consideravam Jesus um falso profeta, um mentiroso que, deliberadamente, enganou o seu povo e outros. Mas, tendo vivido durante séculos sob a ameaça constante de perseguições de judeus, muçulmanos e cristãos, eles adotaram a estratégia de se apresentarem aos visitantes na forma menos ofensiva. Foi por esta razão que adotaram o nome de «cristãos de S. João». A sua orientação religiosa está contida nestas palavras do seu livro sagrado, o Ginza:

“Quando Jesus vos oprimir, dizei-lhe: «Pertencemos-te.» Mas não o reconheçais nos vossos corações, nem negueis a voz do vosso Mestre, o grande Rei da Luz, porque ao falso Messias o oculto não é revelado”.

Atualmente, esta seita – que ainda sobrevive nas regiões pantanosas do Sul do Iraque e, em menor número, no sudoeste do Irã – é conhecida como os mandeístas. São um povo profundamente religioso e pacífico, cujo código proíbe a guerra e o derramamento de sangue. Vivem sobretudo nas suas aldeias e comunidades, embora alguns deles tenham partido para as cidades, onde, tradicionalmente, trabalham como ourives, trabalho em que são exímios. Conservam a sua linguagem e escrita próprias, ambas derivadas do aramaico, a língua falada por Jesus e João.

Em 1978, o seu número foi calculado em menos de 15.000, mas a perseguição movida aos árabes das regiões pantanosas por Saddam Hussein, depois da Guerra do Golfo, quase os condenou à extinção – as circunstâncias políticas do Iraque tornam impossível ser mais exato sobre a questão. Literalmente, o nome mandeístas significa gnósticos (de manda, gnose) e refere-se apenas aos leigos, embora se aplique, por vezes, à comunidade em geral. Os seus sacerdotes são chamados nasorenos. Os árabes designam-nos por subas, e surgem no Corão com a designação de sabeus.

Até 1880 não tinha sido feito nenhum estudo sério sobre os mandeístas. Mesmo assim, os estudos mais vastos continuam a ser os de Ethel Stevens (futura Lady Drower), nos anos imediatamente anteriores à segunda guerra mundial. Os acadêmicos continuam a confiar no material que ela compilou e que inclui muitas fotografias dos seus rituais e cópias dos livros sagrados mandeístas. Embora recebam bem os estranhos, eles são naturalmente – e com boas razões – um povo fechado e reservado, e Lady Drower precisou de muito tempo para ganhar a sua confiança, a ponto de lhe revelarem as suas crenças, doutrinas e história e de lhe facultarem o acesso aos seus manuscritos secretos, que contêm os seus textos sagrados. (No século XIX, eruditos franceses e alemães tentaram, sem sucesso, quebrar esta muralha de secretismo.) Mas é indubitável que existem mistérios internos que ainda não foram revelados a estranhos.

Os mandeístas têm vários textos sagrados – toda a sua literatura é religiosa – sendo os mais importantes o Ginza (Tesouro), também conhecido por Livro de Adão; o sidra d’Yahya ou Livro de João (também conhecido como o Livro dos Reis), e o Haran Gawaita, que é a história da seita. O Ginza, certamente, data do século VII, ou é mesmo anterior, enquanto o Livro de João deve ter sido compilado a partir dessa data. João, referido no título, é Batista, que, no texto mandeísta, é referido por dois nomes, Yohanna (que é mandeísta), e Yahya, o nome árabe com que surge no Corão. O último é mais usado, indicando que o livro foi escrito depois da conquista muçulmana da região, embora o material seja muito mais antigo. A questão importante é o grau da sua antiguidade.

Era hábito pensar que os mandeístas tinham criado o Livro de João e elevado Batista à posição de seu profeta como um estratagema astucioso para evitar as perseguições dos árabes, que apenas toleravam aqueles a quem chamavam «povo do livro» – isto é, povos que tinham um livro sagrado e um profeta; de outro modo, eram considerados pagãos. Contudo, os mandeístas surgem no próprio Corão, sob o nome de sabeus, como um «povo do livro», provando que eles eram reconhecidos como tal, muito antes de estarem sob a ameaça do domínio muçulmano. Em todo o caso, eles sofreram perseguições, particularmente no século XIV, quando os seus dominadores islâmicos quase os exterminaram.

Em constante fuga às perseguições, os mandeístas chegaram, finalmente, ao seu atual território no Iraque. As suas lendas e os estudos modernos revelam que eles vieram da Palestina, donde foram expulsos no século I d.C. Ao longo dos séculos, foram recuando para leste e para sul, deslocando-se à medida que sofriam perseguições. O que temos hoje é, efetivamente, o remanescente de uma religião muito mais divulgada.

Hoje, a religião mandeísta é, francamente, uma miscelânea desesperadamente confusa: fragmentos vários de judaísmo do Antigo Testamento, formas gnósticas heréticas de cristianismo e crenças dualistas iranianas, todos misturados nas suas teologia e cosmologia. O problema reside na averiguação de quais eram as suas crenças originais e quais as que surgiram depois. Parece que os próprios mandeístas esqueceram muito do significado inicial da sua religião. Mas é possível fazer algumas generalizações acerca dela, e uma análise laboriosa permitiu aos eruditos chegar a algumas conclusões sobre as suas crenças de um passado distante. Foi esta análise que nos ofereceu algumas indicações excitantes sobre a importância de João Batista e a sua verdadeira relação com Jesus.

Os mandeístas representam a única religião gnóstica sobrevivente do mundo: as suas ideias relativamente ao Universo, ao ato da criação e aos deuses são conhecidas crenças gnósticas. Acreditam numa hierarquia de deuses e de semi-deuses, tanto masculinos como femininos, com uma divisão fundamental entre os da luz e os das trevas.


O ser supremo dos mandeístas, que criou o Universo e as divindades menores, aparece sob várias designações que se traduzem por «Vida», «Mente» ou «Rei da Luz». Ele criou cinco «seres da luz», os quais automaticamente deram origem a cinco seres das trevas, iguais mas opostos. (Esta ênfase na luz ser igualada ao maior bem é caracteristicamente gnóstica: virtualmente todas as páginas do Pistis Sophia, por exemplo, usam esta metáfora. Para os gnósticos, ser iluminado é literal e figurativamente entrar num mundo de luz.) Como nos outros sistemas gnósticos, foram estes semi-deuses que criaram e governaram o universo material e esta Terra. A Humanidade foi também criada por um destes seres, chamado (dependendo da versão do mito) Hiwel Ziwa ou Ptahil. Os primeiros humanos são os somáticos Adão e Eva – Adão Paghia e Hawa Paghia – e os seus duplos «ocultos», Adão Kasya e Eva Kasya. Os mandeístas consideram-se descendentes de pais oriundos de ambos os «conjuntos», físico e espiritual – Adão Paghia e Hawa Kasya.

O seu mais próximo equivalente do Diabo é a sinistra deusa Ruha, que governa o reino das trevas, mas ela é também considerada o Espírito Santo. Esta ênfase em forças iguais e opostas de bem e mal, masculinas e femininas, é caracteristicamente gnóstica e está exemplificada nestas palavras:

[… ] a terra é como uma mulher e o céu como um homem, porque ele torna a terra fecunda.

Uma deusa importante, a quem são dedicadas muitas orações nos livros mandeístas, é Libat, que foi identificada com Ishtar.

Para os mandeístas, o celibato é um pecado: os homens que morrem solteiros estão condenados a reencarnar – mas, caso contrário, os mandeístas não acreditam no ciclo do renascimento. Na morte, a alma regressa ao mundo da luz de onde os mandeístas são originários, e a alma é ajudada no seu caminho com muitas orações e cerimônias, muitas das quais têm origem evidente nos ritos funerários egípcios.

A religião impregna todos os aspectos da vida diária dos mandeístas, mas o seu sacramento-chave é o batismo, que figura nas cerimônias de casamentos e mesmo de funerais. Os batismos mandeístas são imersões completas em tanques especialmente criados, que estão ligados a um rio conhecido como Jordão. Uma série de apertos de mão, entre os sacerdotes e os que estão a ser batizados, fazem parte de todos os rituais.

O dia santo dos mandeístas é o domingo. As suas comunidades são dirigidas pelos sacerdotes, que assumem também o título de «rei» (malka), embora alguns serviços religiosos possam ser realizados pelos leigos. O sacerdócio é hereditário e consiste em três estratos: os sacerdotes comuns, que são chamados «discípulos» (tarmide), bispos e um supremo «chefe do povo» – embora, há mais de um século, ninguém tivesse sido considerado digno de desempenhar este papel. Os mandeístas afirmam que já existiam muito antes da época de Batista, que eles consideram o grande líder da sua seita, mas nada mais. Dizem que deixaram a Palestina no século I d.C., tendo a sua origem numa região montanhosa que eles denominam Tura d’Madai, ainda não identificada pelos eruditos.

Quando, pela primeira vez, os jesuítas os encontraram, no século XVII, partiu-se do princípio de que eles eram os descendentes dos judeus que João batizara, mas, agora, as suas pretensões de que já existiam antes dessa época e noutro lugar são tomadas a sério pelos eruditos. Ainda conservam vestígios da sua permanência na Palestina do primeiro século: a sua escrita é semelhante à da Nabateia, o reino árabe limítrofe de Pereia onde João surgiu pela primeira vez. Indicações do Hawan Gawaita sugerem que eles deixaram a Palestina em 37 d.C. – aproximadamente a data da crucificação, mas se isso foi uma mera coincidência é impossível saber. Foram expulsos pelos seus rivais, o movimento de Jesus?


Até recentemente, os acadêmicos consideravam inexata a negação dos mandeístas quanto a terem tido origem numa seita judaica separatista, mas, agora, reconhece-se que eles não têm nenhuma raiz judaica. Porque, embora os seus textos incluam os nomes de algumas figuras do Antigo Testamento, eles desconhecem genuinamente os costumes e as observâncias rituais judaicos – por exemplo, os seus varões não são circuncidados e o seu sétimo dia não é o sábado. Tudo isto indica que, outrora, eles viveram próximo dos judeus, mas nunca fizeram, de fato, parte deles. 

Uma coisa que sempre intrigou os eruditos, relativamente aos mandeístas, foi a sua insistência em que vieram originalmente do Egito. Na verdade, nas palavras de Lady Drower, eles consideram-se, nalguns aspectos, «correligionários» dos antigos egípcios, como afirma um dos seus textos que «o povo do Egito era da nossa religião». A misteriosa região montanhosa, a Tura d’Madai, que eles citam como seu território original, foi onde a religião surgiu – entre o povo, dizem eles, que viera do Egito. O nome do seu semideus que governa o mundo – Ptahil – tem uma estranha semelhança com o do deus egípcio Ptah e, como já vimos, as suas cerimônias funerárias parecem dever muito às dos antigos egípcios.

Após a sua fuga da Palestina, os mandeístas viviam nas terras da Pártia e da Pérsia, governadas pelos sassânidas, mas fixaram-se também na cidade de Harran – que, como veremos, tem alguma importância para esta investigação.

Os mandeístas nunca afirmaram que João Batista fosse o seu fundador ou que tivesse inventado o batismo. Nem o consideram nada mais do que um grande – de fato, o maior – líder da sua seita, um nasurai (adepto). Afirmam que Jesus era também um nasurai, mas tornou-se «um rebelde, um herético, que desencaminhou os homens, [e] traiu doutrinas secretas … ». O seu Livro de João narra a história de João e de Jesus. O nascimento de João é profetizado num sonho e uma estrela surge a pairar sobre Enishbai (Isabel). O pai é Zakhria (Zacarias) e, como na história dos Evangelhos, são ambos idosos e não têm filhos. Depois do seu nascimento, os judeus conspiram contra a criança, que é confiada à proteção de Anosh (Enoc) e escondida numa montanha sagrada, de onde regressa aos 21 anos. Então, torna-se o líder dos mandeístas – e, curiosamente, e representado como um talentoso curandeiro.

João é chamado o Pescador de Almas e o Bom Pastor. A primeira designação foi usada para Ísis e Maria Madalena, além de Simão Pedro – como Pescador de Homens, e a última para muitos dos antigos deuses mediterrânicos. O Livro de João inclui a lamentação de Batista por uma ovelha perdida que fica enterrada na lama porque se inclina perante Jesus.

Na lenda mandeísta, João toma uma esposa, Anhar, que não tem um papel proeminente na história. Um elemento estranho desta lenda é que os mandeístas parecem não ter conhecimento da morte de João, que é, evidentemente, muito dramática no Novo Testamento. Há uma sugestão no Livro de João de que este morre pacificamente e que a sua alma é arrebatada pelo deus Manda-t-Hairy, sob a forma de uma criança, mas isto parece ser uma prefiguração poética do que eles pensam que deveria acontecer ao Batista. Muitos dos seus textos sobre João não se destinavam a ser considerados como fato biográfico, mas continua a ser intrigante que eles ignorassem o que foi, essencialmente, uma morte de mártir. Por outro lado, pode acontecer que o episódio seja central para os seus mistérios internos e mais secretos.

E quanto a Jesus, no Livro de João mandeísta? Ele surge sob dois nomes: Yeshu Messiah e Messiah Paulis (considerado derivado de uma palavra persa, significando «enganador»), e, por vezes, como «Cristo, o Romano». Ele surge na história pedindo para se tornar discípulo de João – o texto não é claro, mas a implicação é que Jesus não era membro da seita, mas um estranho. Quando se dirige ao Jordão e pede o batismo, João mostra-se cético quanto aos seus motivos e merecimento, mas Jesus consegue convencê-lo. Quando Jesus é batizado, Ruha – a deusa das trevas – surge sob a forma de uma pomba e lança uma cruz de luz sobre o Jordão.

No entanto, depois de se tornar discípulo de João – num paralelo surpreendente com as histórias contadas pelos cristãos sobre Simão, o Mago -, Jesus (nas palavras de Kurt Rudolph) «começa a perverter as palavras de João e modifica o batismo do Jordão e torna- se sábio através da sabedoria de João». O Hawan Gwaita denuncia Jesus nestas palavras:

“Ele perverteu as palavras da luz e transformou-as em escuridão, converteu os que me pertenciam e perverteu todos os cultos”.

No Ginza lemos: «Não acredites nele [Jesus] porque ele é adepto da feitiçaria e da traição.» Os mandeístas, na sua cronologia confusa, esperam a vinda de uma figura chamada Anosh-Uthra (Enoc) que «acusará Cristo, o romano, o mentiroso, filho de uma mulher que não é da luz» e que «desmascarará Cristo, o romano, como um mentiroso, ele será preso pelas mãos dos judeus, os seus devotos prendê-lo-ão, e o seu corpo será chacinado».

A seita tem uma lenda acerca de uma mulher chamada Miriai (Maria ou Maria), que foge de casa com o namorado e cuja família tenta desesperadamente fazê-la regressar (mas não antes de a censurarem, censura expressa em linguagem viva, chamando-lhe «prostituta» e «gamela debochada». Filha dos senhores de Jerusalém, ela passa a viver com o seu marido mandeísta na foz do Eufrates, onde se torna uma espécie de profetiza, sentada num trono, lendo o Livro da Verdade. Se, como parece mais provável, a história é uma alegoria das viagens e perseguições da própria seita, ela indicava que uma facção judaica se aliara, em tempos, a um grupo não judaico, sendo os mandeístas o resultado da fusão. Contudo, o nome Miriai e a sua representação como uma «prostituta» incompreendida e perseguida sugerem a tradição de Madalena, tal como os pormenores sobre a sua partida da pátria e a sua transformação numa pregadora ou profetiza. Em todo o caso, é interessante que os mandeístas escolhessem uma mulher para seu símbolo.

Os mandeístas podem parecer ser apenas uma curiosidade antropológica, um povo perdido e confuso, parado no tempo, que, ao longo dos anos, adquiriu ideias bizarras. Mas um estudo cuidadoso dos seus textos sagrados revela interessantes paralelos com outra literatura antiga que tem relação com a nossa investigação.

Os seus manuscritos sagrados estão ilustrados com representações de deuses que têm uma extraordinária semelhança com os papiros mágicos gregos e egípcios – do gênero que Morton Smith usou na sua investigação. Fizeram-se comparações entre as doutrinas dos mandeístas e as dos maniqueus, os discípulos do mestre gnóstico Mani (c. 216-275); na verdade, o consenso é de que a seita batismal dos Mughtasilah, a que o pai de Mani pertencia e entre os quais o próprio Mani foi educado, eram os mandeístas (durante o seu êxodo em direção ao sul do Iraque ou nalguma comunidade já extinta). Sem dúvida que as doutrinas de Mani foram influenciadas pelos mandeístas – e foram as suas doutrinas que, por vezes, exerceram uma forte influência nas seitas gnósticas europeias, incluindo os cátaros.

Alguns eruditos, como G. R. S. Mead, apontaram as surpreendentes semelhanças entre os textos sagrados mandeístas e o Pistis Sophia. De fato, uma secção do Livro de João, chamada Tesouro de Amor, é considerada por Mead como «os ecos de uma fase anterior» daquela obra. Estes textos apresentam também acentuados paralelos com os documentos de Nag Hammadi, que foram associados aos «movimentos baptismais» que existiam na época. Também se verificaram estreitas semelhanças entre a teologia dos textos mandeístas e a de alguns dos manuscritos do Mar Morto.

Outra associação intrigante é a da cidade de Harran, na Mesopotâmia, com os mandeístas, que se sabe terem-se lá fixado. Até ao século X, esta cidade era o centro de uma seita, ou escola, conhecida por Sabeus, que são muito importantes na história do esoterismo. Eram filósofos herméticos, herdeiros do hermetismo egípcio, e foram extremamente influentes em seitas místicas muçulmanas, como os sufis, cuja influência, por sua vez, pode ser acompanhada até à cultura do sul de França na Idade Média – por exemplo, no caso dos Templários. Como escreve Jack Lindsay em “The Origins of Alchemy in Graeco-Roman Egipt”:

“Uma estranha bolsa de crenças herméticas, incluindo muitas ligadas à alquimia, perdurou entre os sabeus de Harran, na Mesopotâmia. Os sabeus sobreviveram como seita pagã dentro do Islã, no mínimo, durante dois séculos”.

Os mandeístas, como vimos, ainda são denominados «sabeus» (ou subas) pelos muçulmanos modernos, portanto, é evidente que era a sua filosofia que era tão influente em Harran. E, além do seu hermetismo, que outro legado deixaram aos Templários? Transmitiram-lhes a sua veneração pelo Batista e talvez mesmo algum conhecimento secreto? Todavia, as associações mais excitantes são com o enigmático Quarto Evangelho. Kurt Rudolph, provavelmente a maior autoridade em mandeísmo, escreve: 

“Os mais antigos elementos da literatura mandeísta reservaram-nos um testemunho do meio social do primitivo cristianismo oriental, que podem ser utilizados para interpretar certos textos do Novo Testamento (em particular, a coleção de escritos joaninos)”.

Já vimos que muitos dos mais respeitados e influentes estudiosos do Novo Testamento, no século XX, consideram algumas partes do Evangelho de João – especialmente o prólogo «No princípio era o Verbo» e algumas das discussões teológicas – como tendo sido «plagiadas» de textos escritos pelos discípulos de João Batista. Muitos destes acadêmicos concordam que esses textos tinham uma origem comum: os livros sagrados dos mandeístas. Já em 1926, H. H. Schaeder sugeriu que o prólogo do Evangelho de João – com o seu verbo feminino – era um «hino mandeísta com origem nos círculos batistas. Outro erudito, E. Schweizer, chamou a atenção para os paralelos entre a dissertação sobre o Bom Pastor do Evangelho de João, no novo Testamento, e o capítulo do Bom Pastor do Livro de João dos mandeístas, e concluiu que eles provinham da mesma fonte original. É evidente que esta fonte original não aplicava esta analogia do Bom Pastor a Jesus, mas a João Batista. O Evangelho de João, no Novo Testamento, efetivamente, usurpou-a aos mandeístas/joaninos.


Alguns comentadores, como Rudolf Bultmann, concluíram que os modernos mandeístas são os verdadeiros descendentes dos discípulos de Batista – eles são a elusiva Igreja de João, que já foi discutida. Embora estas sejam razões poderosas para pensar que os modernos mandeístas são apenas um ramo da Igreja joanina sobrevivente, é elucidativo registrar as conclusões de Bultmann, resumidas por W. Schmithals:

“Por um lado, [o Evangelho de] João revela contatos estreitos com a concepção gnóstica do mundo. A fonte dos discursos, que João assume ou à qual adere, é de concepção gnóstica. Tem o seu mais estreito paralelo nos textos mandeístas, e os mais antigos estratos das tradições mandeístas remontam ao tempo do primitivo cristianismo”.

De forma ainda mais abrangente, sempre se defendeu que o material apocalíptico de Q, o documento-fonte dos Evangelhos de Mateus, Marcos e Lucas, provém da mesma fonte que o Ginza mandeísta – e foi até sugerido que o batismo cristão nasceu dos ritos mandeístas.

São espantosas as implicações deste plágio relativamente às escrituras. Seria possível que muito do material, tão acariciado por gerações de cristãos como relativo, ou mesmo representativo, das verdadeiras palavras de Deus, se referisse inteiramente a outro homem? E era esse outro o seu grande rival, o profeta que não anunciou a vinda de Jesus, mas que era venerado como o próprio Messias – João Batista?

A continuação da investigação revela cada vez maior evidência de que os mandeístas representam uma descendência direta que remonta aos discípulos originais de João. De fato, a primeira referência aos mandeístas data de 792 d.C., quando o teólogo sírio Theodore bar Konai, citando o Ginza, afirma explicitamente que eles descendem dos dositeístas. E, como vimos, os dositeístas eram uma seita herética fundada, de fato, por um dos primeiros discípulos de João, paralela ao grupo de Simão, o Mago.

Mas há mais. Já vimos que Jesus era chamado «o Nazoreno» ou «Nazareno», que era também um nome aplicado aos primeiros cristãos – embora ele não fosse inventado para os descrever. Era um termo que já existia e designava um grupo de seitas associadas das regiões da Samaria e da Galileia, que se consideravam os defensores da verdadeira religião de Israel. Quando usado em relação a Jesus, o termo «Nazoreno» identifica-o como membro de um culto que, segundo outras evidências, parecia já existir há, pelo menos, duzentos anos antes de Jesus nascer.

Mas recordemos que os mandeístas chamavam também aos seus adeptos «nasurai»: e não é coincidência. Hugh Schonfield, ao discutir os nazorenos pré-cristãos, afirma:

“Há boas razões para acreditar que os herdeiros desses nazarenos… sejam os atuais nazorenos (também conhecidos por mandeístas) do Baixo Eufrates”.

O grande erudito bíblico, o britânico C. H. Dodds, concluiu que os nazorenos eram a seita a que João Batista pertencia – ou, mais corretamente, dirigia – e que Jesus começou a carreira como discípulo de João, mas passou a fundar o seu próprio culto e levou o nome com ele.

É possível que os mandeístas não estejam confinados exclusivamente ao Iraque e ao Irã, atualmente (se, na verdade, eles conseguiram sobreviver às destruições de Saddam), mas podem também ser representados por uma outra seita, altamente secreta, que ainda existe na Síria moderna. São os nusairiyeh ou nosairi (também conhecidos, por vezes, por alavitas, segundo o nome da cordilheira de montanhas onde vivem). É óbvio que o nome é muito semelhante a «nazoreno». Aparentemente islâmicos, sabe-se que eles adotaram os aspectos exteriores dessa religião para evitar perseguições. Embora se saiba que eles têm uma «verdadeira» religião, que mantêm secreta, os seus pormenores – por razões óbvias – são difíceis de conhecer. Supõe-se, no entanto, que sejam alguma forma de cristianismo.


Um dos raros europeus que conseguiram aproximar-se das doutrinas secretas dos nosairi é Walter Birks, que fez um relato sobre eles em The treasure of Montségur (escrito em colaboração com R. A. Gilbert). Birks passou algum tempo na região, durante a segunda guerra mundial, e estabeleceu relações de amizade com alguns dos sacerdotes. O seu relato é muito circunspecto, porque sempre respeitou o juramento de segredo que lhes prestou, mas, pelo que ele diz, parecia muito possível que fossem uma seita gnóstica, muito semelhante à dos mandeístas. O que é particularmente interessante é uma conversa entre Birks e um dos sacerdotes nosairi, depois de terem discutido o tema dos cátaros e da possível natureza do Graal (Birks notara que alguns dos seus rituais se centravam no uso de um cálice sagrado). O sacerdote revelou-lhe que «o maior segredo» da sua religião era o seguinte:


«O GRAAL, a que se refere, é um símbolo e representa a doutrina que Jesus Cristo revelou apenas a João, o Discípulo Amado (autor do Livro do Apocalipse). Ainda a conservamos.» 

Lembremos a tradição «joanina» de algumas formas de maçonaria ocultista europeia e do Priorado de Sião – que os Cavaleiros Templários tinham adotado a religião dos «joaninos do Oriente» que era formada pelas doutrinas secretas de Jesus, tal como foram reveladas a João, o Discípulo Amado. Logo que fique claro que o Evangelho de João era, na sua origem, material batista, a aparente confusão, que já notamos, entre João, o Amado, e João Batista, está esclarecida.

As tradições mandeístas, relativas a João Batista e Jesus, adaptam-se extraordinariamente bem às conclusões que delineamos no capítulo anterior: originariamente, Jesus era discípulo de João, mas implantou-se por direito próprio, levando consigo, no processo, alguns dos discípulos de João. As duas escolas eram rivais, tal como eram os respectivos líderes.

Considerado em conjunto, tudo isto forma um quadro notavelmente consistente. Sabemos que João Batista era uma figura muito respeitada, com um grande número de discípulos – uma verdadeira Igreja, de fato – que, no entanto, desaparece dos registros «oficiais», depois de uma breve referência nos Atos dos Apóstolos. Mas este movimento tinha uma literatura própria, que foi eliminada, embora alguns dos seus elementos fossem «aproveitados» pelos Evangelhos cristãos, especificamente a «Natividade de João», por Lucas (ou pela sua fonte) e o «Magnificat», o cântico de Maria. Mais espantosa é a evidência, que já apresentamos, do mito do massacre dos inocentes, ordenado por Herodes, que, embora fictício, fora anteriormente associado ao nascimento de João, o qual Herodes receava que fosse o verdadeiro «rei de Israel».

Dois outros movimentos, que constituíam uma grande ameaça para a Igreja católica (cristã) emergente, foram fundados por outros discípulos de João – Simão, o Mago, e Dositeus; os dois movimentos eram seitas gnósticas influentes em Alexandria. Curiosamente, o «material» de Batista, que foi incorporado no Evangelho de João, no Novo Testamento, também é gnóstico, e os mandeístas são gnósticos. A conclusão é óbvia: o próprio João Batista era também gnóstico.

Há também paralelos significativos entre os textos dos mandeístas, Simão, o Mago, o Evangelho de João e os textos gnósticos coptas, principalmente o Pistis Sophia, que tem um papel importante na nossa investigação sobre Maria Madalena.

Nenhuma das seitas – mandeístas, simonistas e dositeístas – que estavam associadas a João Batista faz parte da religião judaica, embora todas surgissem na Palestina, duas delas nas terras heréticas do Norte, na Samaria. E, se estes grupos não eram de religião judaica, a inferência óbvia é que João também não era judeu. Porque, embora a influência das ideias gnósticas se estendesse a outros lugares e culturas – notavelmente, o Irã -, há uma clara linha de influência da religião do antigo Egito. É ali que encontramos os paralelos mais próximos com as ideias e atos de Jesus, e, curiosamente, os mandeístas fazem remontar a sua ascendência ao Egito.

Apesar do estado confuso dos seus textos, muito do que os mandeístas se atribuem é comprovado pelos estudos modernos – que, inicialmente, se mostravam céticos quanto às suas pretensões.

Os mandeístas afirmam que os precursores da sua seita eram oriundos do antigo Egipto, embora a seita surgisse na Palestina. Não eram judeus, mas viviam na sociedade judaica. A sua seita, conhecida, então, como os nazorenos, era dirigida por João Batista, embora já existisse há muito tempo. Curiosamente, eles veneram-no, mas não o consideram nada mais do que um líder e profeta. Sofreram perseguições, primeiro dos judeus, depois dos cristãos, e foram expulsos da Palestina, afastando-se cada vez mais para oriente, em direção ao seu precário território atual.


A perspectiva mandeísta de Jesus – que era mentiroso, impostor e feiticeiro – está de acordo com a do Talmude judaico, em que ele é condenado por «desencaminhar» os judeus e em que a sua morte é atribuída à sua condenação por ocultismo.

Todas as seitas associadas a João, apesar de serem relativamente pequenas, individualmente, se consideradas em conjunto, formavam um enorme movimento. Os mandeístas, os simonistas, os dositeístas – e, talvez, até os Cavaleiros Templários – foram impiedosamente perseguidos pela Igreja Católica devido ao seu conhecimento e à sua reverência, relativamente ao Batista, restando apenas o pequeno grupo do Iraque. Em qualquer outra parte, especialmente na Europa, os joaninos tornaram-se um movimento secreto, mas continuam a existir.

Nos círculos ocultistas europeus, dizia-se que os Templários tinham adquirido os seus conhecimentos junto dos «joaninos do Oriente». Outros movimentos esotéricos e secretos, como os maçônicos – especialmente aquelas ordens que se reclamam descendentes diretas dos Templários, e também os ritos egípcios – e o Priorado de Sião, sempre tiveram uma veneração particular por João Batista. Resumindo os pontos principais da tradição joanina:
Dá ênfase especial ao Evangelho de João porque afirma que ele contém as doutrinas secretas reveladas a João Evangelista (o discípulo amado) por «Cristo».
Há uma evidente confusão entre João Evangelista (o presumível autor do Quarto Evangelho) e João Batista.
As «tradições secretas» referidas são especificamente gnósticas.
Embora reclamando representar uma forma esotérica de cristianismo, a que conserva as «doutrinas secretas» de Jesus, a tradição revela uma grande falta de consideração pelo próprio Jesus. No máximo, parece considerá-lo apenas mortal, ilegítimo e talvez vítima de ilusões de grandeza. Para os joaninos, o termo «Cristo» não significa qualquer condição divina, mas é considerado como um mero termo respeitoso – de fato, todos os seus líderes são conhecidos por «cristos». Por essa razão, quando um membro destes grupos se intitula «cristão», isso pode ter um significado diferente do aparente.
A tradição considera que Jesus era adepto da escola egípcia de mistérios de Osíris, e os segredos que ele revelou eram os do círculo interno dos adoradores de Osíris.

Na sua forma original, o Evangelho de João, no Novo Testamento, não era uma escritura do movimento de Jesus, mas um documento que, originalmente, pertencia aos discípulos de João Batista. Isto explica não só as razões da grande consideração que os joaninos têm por este Evangelho mas também a confusão entre João Batista e João Evangelista. No entanto, esta confusão SEMPRE FOI deliberada.

Não há provas de que um movimento de «joaninos» orientais tivesse formado uma Igreja esotérica, fundada por João Evangelista. Há, no entanto, bastantes evidências de uma tal igreja fundada por João Batista. Esta ainda é representada pelos mandeístas e, talvez, pelos nosairi. É indubitável que os mandeístas se encontravam noutros pontos do Médio Oriente – não se conhecem as localizações -, mas, atualmente, estão confinados a pequenas comunidades do Iraque e do Irã. É mais que possível que eles ainda existissem na época das Cruzadas, e, por conseguinte, poderiam ter entrado em contato com os Cavaleiros Templários, e também é possível que a Igreja ocidental de João se tornasse secreta nos primeiros tempos da era cristã.


Apesar do tratamento atroz que receberam dos cristãos, é difícil explicar a razão por que, pelo menos, os mandeístas continuam a manifestar um ódio ardente contra o próprio Jesus. Na verdade, eles consideram-no um falso Messias, que usurpou os segredos do seu mestre João e os usou para desencaminhar alguns dos seus próprios membros; mas, passado todo este tempo, a pura veemência da sua hostilidade parece inexplicável. Nem a sua história de perseguições explica suficientemente o motivo por que continuam a desferir ataques contra a pessoa de Jesus com tanta veemência. Que poderia ele ter feito para merecer esta continuada humilhação, século após século?
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