terça-feira, 26 de maio de 2015

O PRETO CARVOEIRO

Oscar Luiz Brisolara
Sentado sobre um tramado de antigas achas que haviam ficado por queimar para todo sempre, o velho, preto como os carvões que queimara vida afora, roçava uma mão áspera contra a outra, mais áspera ainda. O que seria da vida? Não tinha ninguém.
A preta Maria, com quem dividira mais de cinquenta anos de cama e cabo de machado, mudara-se, de há anos, para o cerro dos ausentes, sobre cuja lápide grotesca mandara gravar o nome dela e as datas de nascimento e morte.
Os cinco filhos, um a um, haviam sumido no mundo. No princípio, vinham alguns domingos por ano. As visitas foram raleando. Agora, já fazia seis anos, ninguém quis mais saber dele...  Tinham lá seus compromissos. Compreendia. Amava-os assim como eram: bons. Remoeu ideias... costurou saudades... cozeu umas verduras com ovo e, enquanto comia e olhava o rancho descomposto... quase engolido pelas capoeiras que subiam por tudo... crescia até cipó enredando as plantas e o seu futuro... relembrou distantes tempos...
Buscou no passado um sentido para vida. Sim, o calo da direita era mais duro... quando o braço forte arremessava a lâmina afiada do ferro do machado contra o tronco rijo, o cabo da ferramenta conduzia de volta as vibrações da resistência que o cepo impunha ao instrumento. Desse modo, o cabo, também de madeira rija, vibrava no interior da mão.
Somente quem sentiu a dor dessas vibrações na pele jovem pode entender como se formam esses calos. Quando ainda muito jovem, a camada interna que reveste a mão é mais delicada. Nos moços do campo, muito menos do que nos jovens de livros e canetas.
E o cabo do machado primeiro forma bolhas de água, que por força do atrito se rompem. Depois, surgem feridas que sangram e, por fim, toda a mão se alinha, pouco a pouco, como a madeira que corta e forma uma crosta dura e uniforme, rachada aqui e ali em função das dobras do tecido. E é para sempre… Com a sola do pé acontece o mesmo… Uma espécie de camada quase óssea protege o pé dos pequenos espinhos, dos seixos dos caminhos muitos de uma vida descalça...
O velho Augusto enfrenta tudo, desde o frio dos invernos cortantes, passando pelo correr das cordas rudes ao puxar dos bois, até às vibrações dos machados, constantes e rítmicas, regidas pelo ritmo das pancadas, repetidas aos milhares pelos anos sem conta, e pelo ritmo cortante da existência que enrijece as mãos e as almas.
Desde o raiar do dia, para colher o tempo de surpresa e produzir mais, sempre estivera ao cabo do machado. Seu pai fora carvoeiro, o avô, escravo. Não lia letras. Passara os anos todos, quase noventa, derrubando árvores e queimando carvão. Era preciso ciência. Caso não soubesse, ou ficava duro e imprestável, ou virava tudo cinza e lá se iam dias ou semanas de trabalho duro.
Cortava os troncos. Separava os galhos. Tronco grosso tinha de se rachar. Depois, empilhava tudo. Uns dois metros de altura, três de eixo. A seguir, barreava. Uma pá de corte. Solo úmido. Tudo muito bem coberto. Um buraquinho para o fogo, bem embaixo. Um respiro por cima. Controlado. Apenas uma fumacinha. Três dias queimando, lentamente.
Quando esfriava, tirava tudo. Quebrava os nacos e ensacava. O pai botava na carroça e ia para a cidade, vender. Depois de um dia inteiro, casa por casa, voltava na alta noite. Os bois, ele, cansados. Um dinheirinho para a comida e tudo de novo. Ano afora, vida adentro, vida afora. Sempre, do mesmo modo, eternamente. Até que o destino chegasse e acabasse com tudo.
Com tudo não, que tudo mesmo não termina. Mas corre o dia, correm os anos, corre a vida e corre a história. A gente correndo atrás dele. Primeiro para ser homem, depois para continuar e, por fim, para não morrer.
Tinha carvão por tudo. Fibras de madeira carbonizada penetradas nas mãos, no corpo, nos pulmões. O médico havia dito que o pulmão do velho era mais preto que seu rosto. Sempre a fumaça, ardendo nos olhos, queimando o nariz. Depois as brasas. Mãos sempre queimadas. Ardendo. Pés esburacados, quase não doíam mais.
O carvão, que lhe dera aquela vida, ia-se-lhe até mesmo pela alma. Sem queixas nem lamúrios, olhava para as próprias mãos. Cumprira com dignidade tudo o que a existência lhe propusera. Sem nada, sem culpa nem mágoa, nem descrença aguardava o fim próximo de tudo...
Tudo o que enxergava era preto, a não ser o vermelho do braseiro, que apagado também preteava. Mas quem disse que preto é ruim ou feio? Ao preto carvão, tudo dedicara. Também dele tudo recebera. Será que Deus é preto? Quem sabe? Só branco que acha que Deus é branco. Eu acho que é pretinho como eu e a finada Maria. Um dia vou me rir tanto.
E agora, o doutor lhe afirmava que seu destino era negro. Câncer nos pulmões. Com a chaleira preta, servia um amargo chimarrão e o verde da água quentinha dava-lhe um novo alento. Que para pobre nunca se apaga o alento. Tragédia é para rico...


AS FLORES, AS CRIANÇAS E O MONGE


Oscar Luiz Brisolara
Hoje lembrei o jardim da tia Maria. Eram uma longa cerca viva e as grandes espirradeiras, reclinando sobre ela suas cabeleiras vermelhas, amarelas e brancas. Pois quem me levou para lá foi minha querida Stephanie Ribeiro, perguntando sobre as florinhas coloridas, cujo suco adocicado sacia a curiosidade infantil.
O Jardim da tia era imenso. Numa casa de campo... espaço era o que não faltava. Eram sempre-vivas amarelas, roseiras de todas as cores, hortênsias e, no meio de tudo, uma quantidade sem conta de uma florzinha miúda conhecida popularmente como maravilha. De múltiplas cores, às vezes, até mesmo numa única flor aparece mais de uma cor. E lá íamos, colhendo essas florinhas, como colibris, sugando seu suco e jogando o conezinho ao chão...
Depois, se me abateu certa tristeza. A tia se foi. Depois, a casa. O mato cresceu e tomou tudo. Olhando aquela enredeira de cordas, galhos e mato, difícil é acreditar que alguém pudesse habitar esse antro algum dia.
E fugi para a pesquisa do velho monge agostiniano austríaco Gregor Mendel e suas pesquisas sobre genética. A “maravilha”, para as crianças, para ele, “mirabilis jalapa”, foi o vegetal eleito para as pesquisas do frade germânico. 
Pois as cores movem os interesses de ambos, monge e crianças. Para o monge, as cores e seu cruzamento, cruzando cores, controla genes. Para as crianças, contemplando cores, surpreendem almas e capturam sentimentos que se hão de tornar a medida de contemplar a arte.
Oh tia Maria... oh velho Mendel... a cada um encantou uma diferente beleza da pequenina flor... do mesmo modo como um poeta e um filósofo contemplam diversamente o pórtico de uma cidade... ambos com olhares que se completam e se conflituam... no eterno cambiamento das almas.

sábado, 23 de maio de 2015

SIGNO DE GEMINI – MITOS FUNDANTES

 Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Noite de luar
Entramos no signo de “Gemini” ou “Geminorum”, conforme o genitivo plural latino (dos gêmeos). Muitos mitos encontram-se na base desse signo zodiacal.
Sabe-se que Gemini ou Gêmeos é uma das constelações  do zodíaco, localizada na porção Norte do planisfério celeste, por onde passa a linha da eclíptica (o caminho anual percorrido pelo Sol), que neste momento, marca o solstício de verão no hemisfério Norte e o solstício de inverno no hemisfério sul, correspondendo, de fato, em grande parte, com o signo de Câncer. 
Neste momento, no intervalo temporal que separa julho de 2014 e junho de 2015, o planeta Júpiter pode ser visto, passando por esta constelação. Muitas mitologias trazem os gêmeos, figuras intrigantes de muitas culturas, desde tempos remotos, a partir dos indianos e dos gregos de eras muito antigas.
Gemini
Observando a constelação de Gemini, destacam-se seus dois astros mais brilhantes: Castor e Pólux, os Dióscuros da mitologia grega. Eram os dois filhos homens de Leda, a encantadora rainha de Esparta, esposa de Tíndaro.
Ocorre que a fiel esposa do rei de Esparta, ao banhar-se no lago de defronte o palácio, encontra um cisne mais alvo do que qualquer outro que jamais vira igual, que nada ao seu encontro. Inocentemente, acolhe-o nos braços e toma-o em seu colo, sentada às margens do lago.
Inadvertidamente, acolhera ao colo o próprio Zeus, que tomado de paixão pela deslumbrante rainha, metamorfoseara-se na ave aquática símbolo da sofisticação dos palácios gregos, e fecundara a jovem de um filho divino. Nessa mesma noite, Tíndaro conhecera sua mulher, gerando um filho humano. Nasceram, assim, o divino Pólux e o humano Castor, irmãos distintos e amigos inseparáveis.
Segundo narram os mitólogos, Leda gerou dois ovos. Deles nasceram dois casais. Do ovo divino, nasceram Pólux e Helena, do terreno, Castor e Clitemnedtra.
Neste momento (no intervalo temporal que separa julho de 2014 e junho de 2015) o planeta Júpiter pode ser visto passando por esta constelação. Muitas mitologias trazem os gêmeos, figuras que desde tempos remotos intrigam a todas as culturas.
Na cultura indiana, também aparece uma narrativa mitológica de gêmeos, porém, são irmãos de sexos diferentes. O masculino recebeu o nome de chama Yama e a menina passou a chamar-se Yami. Em sânscrito, idioma em que foram escritos os livros sagrados da Índia, Yama significa gêmeo.
Como Yama foi o primeiro homem a morrer, pelo seu pioneirismo, tornou-se o regente dos mortos. Yama e Yami, na mitologia grega, corresponderiam mais propriamente a Hades e Perséfone, embora estes deuses gregos não sejam sequer irmãos.
Também os mitos da América Central, mitologia Asteca e Maia, possuem seus gêmeos.  Hun Hunahpu e seu irmão (não gêmeo) Vucub Hunahpu desentenderam-se com as divindades por causa de um jogo de bola muito comum nessas regiões, nos tempos anteriores à invasão dos europeus. Por essa razão foram mortos pelos deuses.
Porém, ao morrer, Hun Hunahpu deixou uma semente fecundada da qual nasceriam os irmãos gêmeos, heróis da mitologia centro-americana, conhecidos como Hunahpu e Ixbalanqué. Esses gêmeos teriam descido à morada dos mortos e conseguido dos deuses, após derrota-los no jogo de bola, o compromisso de que não mais prejudicariam os humanos.
Voltando à mitologia grega, os mitólogos afirmam que, posteriormente, Castor e Pólux com as irmãs Foebe e Hilaeira, filhas de Leucipo. Porém, elas tinham outros gêmeos pretendentes, Idas e Linceu que desafiaram os Dióscuros para a luta. Pólux matou Linceu, enquanto Castor foi morto por Idas.
Pólux, imortal, não poderia seguir o irmão ao Hades, morada dos mortos. Por essa razão, inconsolável, chorava sobre o cadáver do irmão. Zeus, comovido com a dor do filho, concedeu a Castor a imortalidade e os dois irmãos passaram a viver alternadamente, no Olimpo como deuses, e no Hades como humanos mortos. Há também a versão, segundo a qual Zeus os teria colocado como estrelas na constelação de Gemini.
Eles também teriam acompanhado Jasão, junto com os argonautas, na conquista do velocino de ouro. Também teriam combatido os piratas das costas e das ilhas gregas, o que teria originado a tradição de serem os Dióscuros venerados na Grécia como protetores dos marinheiros e da hospitalidade. Havia também uma crença segundo a qual eles apareciam nas cidades para fiscalizar o tratamento dado aos forasteiros.
Sendo Mercúrio um astro que tem domicílio em dois signos: Gemini e Virgo, estes são signos intelectuais e comunicativos, principalmente comunicativos. Em ambos, Mercúrio tem profunda influência.
Na casa de Gemini, Mercúrio tem tríplice atuação: confere, ao geminiano, fluência no uso da palavra; dá-lhe agilidade no raciocínio para estabelecer relação entre diferentes temáticas; e permite-lhe lidar com objetividade de assuntos desconhecidos e temas do intelecto. Muitos, entre os geminianos, são dotados de QI altíssimo, dada a sutileza inata e a rapidez de entendimento.
Gêmeos, o primeiro signo da trilogia do Ar, possui a inteligência das palavras, dos significados, da comunicação. É dele o dom de falar para o outro da maneira mais compreensível possível, explorando a linguagem em todas as suas formas: gestual, escrita e falada.
Os geminianos têm a clareza de saber perguntar, buscar informações, colocar em palavras aquilo que para muitos só pode ser sentido, tocado ou imaginado.
A consciência em Gêmeos possui a inigualável capacidade de ver as coisas com sensibilidade e abordar um assunto sobre vários ângulos, sabendo que nenhum deles é definitivo. Além disto, tem ainda o dom de sugerir ideias e tirar as pessoas da prisão de uma situação ou um ponto de vista.
A inteligência geminiana privilegia a versatilidade e dá às pessoas que nasceram sob este signo a convicção de saber que podem fazer várias coisas ao mesmo tempo, por mais diversificadas que possam parecer.
O signo marcado pelo  Sol em Gemini proporciona a facilidade de lidar com a duplicidade. Para os geminianos, é possível duplicar a si mesmo e também as experiências vividas, sem que com isto haja qualquer confusão. Para Gemini, tudo se movimenta, como no ar. Para que esta mobilidade seja possível, a consciência geminiana sabe que é preciso ter leveza, disponibilidade.
É inútil ao geminiano estar densamente envolvido em uma ideia, já que isto impediria a leveza necessária para estar voando, circulando e captando o que acontece ao redor. O geminiano prefere estar em todas as estações. A inteligência que nele brilha favorece a arte do movimento, a mente nunca se torna estática, uma ideia nova sempre surge, uma ação é desencadeada, um novo caminho se abre. O dom da ramificação e das múltiplas conexões é uma das maiores luzes que norteiam as pessoas que nasceram com o Sol em Gêmeos.
É necessária ao geminiano a consciência de sua multiplicidade de interesses e a vigilância constante para que evitar a instabilidade. Deve ter cuidado para não perturbar os mais lentos de raciocínio, o que não significa que sejam nem menos profundos, nem menos capazes, com a rapidez com que explana e percorre seu curso racional, para não ser interpretado como leviano ou superficial.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

O LEITE DO CAFÉ MATUTINO É A MORADA DA VIDA, QUE SE PERPETUA PELOS RAIOS ENERGÉTICOS DO UNIVERSO

Com uma bezerra no sítio
O leite alvo que escorre fumegante na taça do meu café matutino abriga as recônditas energias, escondidas nas folhas das pastagens campestres e nas águas cantantes dos regatos, pela sequência inquebrantável dos séculos, aliadas às ânsias maternas dos úberes fecundos, de onde brotou espumante e nutritivo, acolhido pelas mãos rudes dos agricultores, cujas almas singelas acolhem sonhos e perpetuam a vida, na permanente nutrição dos corpos.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS

São Francisco de Assis e os pássaros
O ser humano se foi tornando cada vez mais agressivo e violento, um pouco pelos 200 milhões de anos de disputas entre os mamíferos, somados a esses os milhões de anos da história do homem, do primata ao "homo contemporaneus", marcados muito mais pelo ódio da cobiça do que pelos encantos e doçuras do amor. Desaprendeu-se a mansidão primordial do sonhado Éden. Porém, o mundo será melhor quando os pássaros e as feras sentirem a inofensividade no olhar humano, como o faziam diante de "Il poveverello d'Assisi", sobre cujos obros pousavam os pássaros e diante de cujos pés deitou-se, mansamente, o perigoso lobo de Gubbio.

São Francisco e o lobo de Gubbio

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Sonnet - Johann Wolfgang von Goethe - Das Mädchen spricht



Du siehst so ernst, Geliebter! Deinem Bilde
Von Marmor hier möcht' ich dich wohl vergleichen;
Wie dieses gibst du mir kein Lebenszeichen;
Mit dir verglichen zeigt der Stein sich milde.

Der Feind verbirgt sich hinter seinem Schilde,
Der Freund soll offen seine Stirn uns reichen.
Ich suche dich, du suchst mir zu entweichen;
Doch halte stand, wie dieses Kunstgebilde.

An wen von beiden soll ich nun ich wenden?
Sollt' ich von beiden Kälte leiden müssen,
Da dieser tot und du lebendig heißest?

Kurz, um der Worte mehr nicht zu verschwenden,
So will ich diesen Stein so lange küssen,
Bis eifersüchtig du mich ihm entreißest.

SHAKESPEARE - SONNET 116 - sobre o amor

Let me not to the marriage of true minds
Admit impediments. Love is not love
Which alters when it alteration finds,
Or bends with the remover to remove:
O no; it is an ever-fixed mark,
That looks on tempests, and is never shaken;
It is the star to every wandering bark,
Whose worth's unknown, although his height be taken.
Love's not Time's fool, though rosy lips and cheeks
Within his bending sickle's compass come;
Love alters not with his brief hours and weeks,
But bears it out even to the edge of doom.
If this be error and upon me proved,
I never writ, nor no man ever loved.


*********************************
De almas sinceras a união sincera
Nada há que impeça: amor não é amor
Se quando encontra obstáculos se altera,
Ou se vacila ao mínimo temor.
Amor é um marco eterno, dominante,
Que encara a tempestade com bravura;
É astro que norteia a vela errante,
Cujo valor se ignora, lá na altura.
Amor não teme o tempo, muito embora
Seu alfange não poupe a mocidade;
Amor não se transforma de hora em hora,
Antes se afirma para a eternidade.
Se isso é falso, e que é falso alguém provou,
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.

TOI - POÈME DE ESTHER GRANEK

Toi

Toi c’est un mot
Toi c’est une voix
Toi c’est tes yeux et c’est ma joie
Toi c’est si beau
Toi c’est pour moi
Toi c’est bien là et je n’y crois
Toi c’est soleil
Toi c’est printemps
Toi c’est merveille de chaque instant
Toi c’est présent
Toi c’est bonheur
Toi c’est arc-en-ciel dans mon coeur
Toi c’est distant…
Toi c’est changeant…
Toi c’est rêvant et esquivant…
Toi c’est pensant…
Toi c’est taisant…
Toi c’est tristesse qui me prend…
Toi c’est fini.
Fini ? Pourquoi ?
Toi c’est le vide dans mes bras…
Toi c’est mon soleil qui s’en va…
Et moi, je reste, pleurant tout bas.


Esther Granek, 1978. (poétesse belge francophone contemporaine).

LIÇÕES DA NATUREZA

O trigo, balançado ao sabor dos ventos, recebe as energias do sol e do universo, por meses, paciente. Ao ingerir o pão, acolhemos, silenciosamente, as forças universais nele armazenadas e, num processo oculto, nosso ser as alberga e transforma, sem ruído nem alarde.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

MITO DA NEUTRALIDADE DA IMPRENSA

Mesmo publicando apenas verdades, pode-se manipular a opinião pública. A seleção do material a ser divulgado orienta a interpretação. Além do mais, as informações sempre vêm interpretadas por profissionais de prestígio e hábeis no uso da linguagem. Esse processo aparece nítido, especialmente em uma das grandes redes nos últimos meses.

domingo, 17 de maio de 2015

O RIO


O rio

O rio furioso e revolto
precipitou-se montanha abaixo
Levou com ele pedras e urzes com que topou em seu arrebatamento
Depois, envergonhado,
foi retornando, lentamente,
Virou um cálido vapor ainda imperceptível
Ficou serração, voltando,
montanha acima, primeiramente,
constrangido de seu ato,
Virou nuvens brancas passeando no topo dos vales
provocou arco-íris
por toda parte
nos vórtices abertos
e conferiu cor, luz e paz aos ares das montanhas...

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Posse de Oscar Luiz Brisolara - na Academia Sul-Brasileira de Letras - Postado por Equipe de apoio


Com madrinha acadêmica  Beatriz Mecking
 Com a esposa Maria Cristina Freitas Brisolara

Recebendo a pelerine acadêmica de Beatriz Mecking

Discurso de posse de Oscar Luiz Brisolara na Academia Sul-Brasileira de Letras


Senhoras e senhores acadêmicos, caros amigos que me prestigiam neste momento,

Em não sendo orador, por vezes, profiro peças oratórias;

Em não sendo poeta, visita-me, por vezes, a poesia;

Porém, na essência, busco a narrativa. E, dentro deste gênero, garimpo histórias, precisamente as que me chegaram aos ouvidos das formas mais inusitadas, desde as curiosidades surpreendidas nas falas durante a infância, retomadas das narrativas de amigos e conhecidos, até as das classes escolares e as dos livros, muitas...umas surpreendidas no modo como aconteceram, outras reinstauradas no modo como poderiam ter sido ou até mesmo como deveriam ter sido, até mesmo as que nunca foram, mas cuja plausibilidade a existência permite... Dessa intrincada dialética, surgem meus textos, meus livros, e até mesmo, atrever-me-ia a dizer, meu modo de ser no mundo...

Neste momento, sinto-me profundamente agradecido, primeiramente a todos aqueles que me prestigiam neste instante, de modo especial sou grato aos colegas do sodalício acadêmico, que me distinguiram com este convite. Agradeço à presidente desta instituição, ASBL, que engloba os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná;agradeço, digo, à presidente, a psicóloga NEUSA MARILÚ DUARTE. Agradeço, também,à minha madrinha acadêmica, a Profa. Dra. Beatriz Mecking, a quem devo profunda gratidão e um carinho muito especial.

Cumprimentos fraternos a meu colega, neófito comigo nesta instituição, o escritor e advogado GILBERTO STANIESKI FILHO, cuja companhia honra-me sobejamente.

Coube-me a cadeira nº 16, que tem como patrono o ilustre poeta Raul de Leoni, cujo nome e produção literária muito me apraz honrar.

Nascido no Rio de Janeiro, no final do longínquo século XIX, mais precisamente, em 1895, teve curta existência, apenas 31 anos. Porém, isso não lhe impediu uma profícua e prestigiosa produção literária. Dedicou-se, em sua carreira acadêmica, às lides das Ciências Jurídicas, tendo concluído o Curso Livre de Direito, já em 1916, com apenas 20 anos, área em que já atuava desde sua fase estudantil, a partir de 1914.

Nesse ano também, passa a colaborar com a imprensa de modo especial, divulgando seus poemas na afamada revista Fon-Fon, órgão de divulgação dos artistas da época, especialmente pintores e literatos. Seu nome FON-FON é uma onomatopeia da buzina dos automóveis, que começavam a circular em nossas grandes cidades, nesses anos iniciais do século XX.

Publicou também, como constante colaborador, no Jornal do Brasil, no Jornal do Comércio, em O Jornal, O Dia, do RJ, e na prestigiada revista Para Todos, que tinha como escopo a nova arte de então, o cinema.

Além do mais, foi desportista e admirador de esportes e participou de uma prova de natação e remo,tendo sido vencedor, pelo Clube Itaraí.

Outro destaque em suas atuações foi a diplomacia. Fez parte do corpo diplomático brasileiro no Uruguai, tendo-se transferido para Montevidéu em 1918.No entanto, foi em 1919 que publicou seu livro de maior prestígio, “Luz Mediterrânea”.

Quanto a sua participação na literatura brasileira, principia sob os moldes parnasianos, que influíram sua formação acadêmica. Migrou, depois, para o simbolismo cujos moldes pautaram a maior parte de seus poemas, sem jamais deixar de ser um tanto parnasiano. Produzia, de modo especial, sonetos, sob cuja arte e métrica produziu versos perfeitos.

Recebeu também influência filosófica dos modernistas de 1922. Como bom parnasiano, era profundo admirador de Bilac, em honra doqual compôs e dedicou o famoso poema Ode a um poeta morto, publicado em 1919, ano seguinte à morte do Príncipe dos Poetas Brasileiros.

Seus últimos poemas revelam abstrações filosóficas, apresentando modulações simbólicas. Como faleceu muito jovem, sua produção literária foi pequena. Contraiu tuberculose, mal que o levou à morte, em 1926.

De métrica modelar, seus versos revelam, também, grande erudição e cultura. Usa ricas metáforas e povoa seus versos de alusões pertinentes aos mitos gregos clássicos e à história da antiguidade.

VEJA-SE ESTE CLÁSSICO EXEMPLO DE SUA MAGNÍFICA POESIA:

Aos que sonham

Não se pode sonhar impunemente
um grande sonho pelo mundo afora,
porque o veneno humano não demora
em corrompê-lo na íntima semente...

Olhando no alto a árvore excelente,
que os frutos de ouro esplêndidos enflora,
o sonhador não vê, e até ignora
a cilada rasteira da serpente.

Queres sonhar? Defende-te em segredo,
e lembra, a cada instante e a cada dia,
o que sempre acontece e aconteceu:

Prometeu e o abutre no rochedo,
o calvário do filho de Maria
e a cicuta que Sócrates bebeu!

OBRIGADO A TODOS.
Cerimônia de posse dos novos acadêmicos Dr. Gilberto Stanieski Filho e Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara na Academia Sul-Brasileira de Letras
Assinando o livro de membros da Academia

Recebendo o diploma de membro da Academia das mãos da esposa Cristina

Os neófitos acadêmicos Oscar Brisolara e Gilberto Stanieski Filho
Oscar Brisolara e sua esposa Cristina

Discurso da madrinha Beatriz Mecking

Discurso de posse do acadêmico Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Desfile dos neófitos sob a alameda de louros

Saindo da alameda de louros

Abertura da cerimônia pela primeira secretária acadêmica Sra. Olga Maria Pereira



quinta-feira, 14 de maio de 2015

PENSAMENTO POLÍTICO



O excesso de benesses do Estado pode encobrir injustiças sociais. O que é dado pode ser retirado a qualquer momento. Por outro lado, remuneração mais justa é permanente e gera desejo de conquista. Benesse cria dependência, acomodação a um Estado paternalista que apenas dá, gerando uma aparência de generosidade e produzindo uma sociedade mendicante, que em vez de produzir, pede.

domingo, 10 de maio de 2015

LINGUAGEM - O EMPREGO DO ARTIGO DEFINIDO E INDEFINIDO NA NARRATIVA

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
À beira do Sena, no anoitecer
Uma dúvida atormenta muita gente na hora de empregar os artigos indefinidos (um, uma) ou definidos (o, a), especialmente no interior de uma narrativa.
Para esse emprego, há uma norma geral: Sempre que se introduz um elemento novo na narrativa, esse deve vir precedido de artigo indefinido. Exemplificando: “ ‘Um’ homem saiu de Jerusalém para Jericó e caiu na mão de ‘uns’ ladrões, ...” O artigo é ‘um’, indefinido, porque se trata de um homem qualquer, até então desconhecido na narrativa. Seguindo a narrativa, aparece: “Por acaso, a seguir ‘um’ sacerdote passou pela mesma estrada...”. Também o artigo é o indefinido ‘um’, porque também o sacerdote é novo na história,
Porém, na sequência da narrativa, o narrador afirma: “... ‘o’ sacerdote viu ‘o’ infeliz, olhou-o, sentiu compaixão dele, mas seguiu seu caminho...”. Agora, na narrativa, aparece o artigo indefinido ‘o’. Quando o artigo ‘o’ precede sacerdote, deve-se empregar este definido porque se trata do mesmo sacerdote já apontado na parábola. Da mesma forma, o artigo ‘o’, que precede o termo infeliz, refere-se a um elemento conhecido na história, porque o emprego do artigo não se fixa a um termo e, sim, à sua representação no texto. Infeliz é uma anáfora de homem, já empregado anteriormente nessa narrativa. (Para quem não é da área da linguagem, lembremos que a anáfora é a retomada de um mesmo elemento já citado com um termo diferente, com o intuito de deixar a narrativa menos monótona.). Esse é apenas um princípio geral: não é absoluto, nem observado por todos os grandes narradores, como se verá mais adisnte.
Abaixo, exponho uma narrativa minha, já publicada em outro espaço, com os artigos em destaque através de aspas:

      Minha avó me contava, e isso por vezes sem conta, como o exigem as crianças, a lenda de ‘uma’ menina que ia para ‘o’ armazém, com ‘um’ pote de leite à cabeça, como o faziam todas ‘as’ meninas desses velhos tempos. E eu visualizava ‘a’ garota... ‘os’ pés descalços... ‘os’ cabelos ao vento... ‘o’ pote... ‘o’ leite branco...
                Sonhava, dizia vovó, que eu sei, também sonhava muito com seus mais de setenta, pois venderia ‘o’ leite, compraria vinte ovos, chocaria n‘a’ carijó, teria em breve vinte pintinhos doirados, trocaria ‘os’ frangos por ‘um’ roliço leitão... e, em breve, teria ‘uma’ vaca com ‘um’ lindo bezerrinho... e apressava ‘o’ passo, acelerando ‘o’ sonho...

                De repente, ‘um’ desnível do caminho, e lá se foram pote e sonho...  e assim quantas meninas e meninos quebraram seus potes vida afora pelos séculos dos séculos...
O primeiro ‘uma’, referindo-se a menina é indefinido porque essa menina é um elemento novo em minha história. Veja-se que a palavra avó, se viesse precedida de artigo, deveria ser o definido ‘a’, pois ela é avó, do narrador, portanto definida em relação a ele. O artigo ‘o’, precedendo armazém, esta definido pela menina, pois ancora-se no fato de ser armazém frequentado por ela.
Mas vejamos mais adiante: ‘os’, precedendo pés e cabelos, são definidos porque estão contidos na menina; uma vez definida a menina, define-se tudo o que está nela, são definidos ancorados na palavra menina. O mesmo vai ocorrer com ‘o’ referente a leite, ‘a’ referente a carijó, e ‘os’ referentes a frangos.
Já, ‘um’ leitão, ‘uma’ vaca, ‘um’ bezerrinho, são elementos novos introduzidos na narrativa.
Temos, porém, o espaço do contraditório. A narrativa acima insere-se no modelo tradicional do gênero narrativo. No entanto, há autores contemporâneos, como Luis Fernando Verissimo e Millôr Fernandes, que não seguem esses princípios e constroem narrativas de enorme prestígio. Veja-se a fábula abaixo de Millôr, em Novas Fábulas Fabulosas: (O menininho... Este emprego já não está de acordo com o que a regra propõe).

A MORTE DA TARTARUGA - Millôr Fernandes
O menininho foi ao quintal e voltou chorando: a tartaruga tinha morrido. A mãe foi ao quintal com ele, mexeu na tartaruga com um pau (tinha nojo daquele bicho) e constatou que a tartaruga tinha morrido mesmo. Diante da confirmação da mãe, o garoto pôs-se a chorar ainda com mais força. A mãe a princípio ficou penalizada, mas logo começou a ficar aborrecida com o choro do menino. "Cuidado, senão você acorda o seu pai". Mas o menino não se conformava. Pegou a tartaruga no colo e pôs-se a acariciar-lhe o casco duro. A mãe disse que comprava outra, mas ele respondeu que não queria, queria aquela, viva! A mãe lhe prometeu um carrinho, um velocípede, lhe prometeu uma surra, mas o pobre menino parecia estar mesmo profundamente abalado com a morte do seu animalzinho de estimação.
Afinal, com tanto choro, o pai acordou lá dentro, e veio, estremunhado, ver de que se tratava. O menino mostrou-lhe a tartaruga morta. A mãe disse - "Está aí assim há meia hora, chorando que nem maluco. Não sei mais o que fazer. Já lhe prometi tudo mas ele continua berrando desse jeito". O pai examinou a situação e propôs: - "Olha, Henriquinho. Se a tartaruga está morta, não adianta mesmo você chorar. Deixa ela aí e vem cá com o papai". O garoto depôs cuidadosamente a tartaruga junto do tanque e seguiu o pai, pela mão. O pai sentou-se na poltrona, botou garoto no colo e disse: - "Eu sei que você sente muito a morte da tartaruguinha. Eu também gostava muito dela. Mas nós vamos fazer para ela um grande funeral". (Empregou de propósito a palavra difícil). O menino parou imediatamente de chorar. "que é funeral?" O pai lhe explicou que era um enterro. "Olha, nós vamos à rua, compramos uma caixa bem bonita, bastante balas, bombons, doces e voltamos para casa. Depois botamos a tartaruga na caixa em cima da mesa da cozinha e rodeamos de velinhas de aniversário. Aí convidamos os meninos da vizinhança, acendemos as velinhas, cantamos o "Happy Birth-Day-To-You"pra tartaruguinha morta e você assopra as velas. Depois pegamos a caixa, abrimos um buraco no fundo do quintal, enterramos a tartaruguinha e botamos uma pedra em cima com o nome dela e o dia em que ela morreu. Isso é que é funeral! Vamos fazer isso?" O garotinho estava com outra cara. "Vamos papai, vamos! A tartaruguinha vai ficar contente lá no céu, não vai? Olha, eu vou apanhar ela". Saiu correndo. Enquanto o pai se vestia, ouviu um grito no quintal. "Papai, papai, vem cá, ela está viva!" O pai correu pro quintal e constatou que era verdade. A tartaruga estava andando de novo, normalmente. "Que bom, hein?" - disse - "Ela está viva! Não vamos ter que fazer o funeral!" "Vamos sim papai" disse o menino ansioso, pegando uma pedra bem grande - "Eu mato ela!"...
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Veja-se, quem escreve bem, ultrapassa padrões, modelos e regras. Parece-me que o ‘o’, artigo definido que inicia a narrativa de Millôr cria a sensação de que é uma sequência narrativa que se iniciou anteriormente, sendo, essa introdução aparente, um segmento dando continuidade à fala.

sábado, 9 de maio de 2015

FREI SALVADOR PINZETTA PROCESSO DE BEATIFICAÇÃO


Está ocorrendo, na província dos frades capuchinhos do RS, o processo de beatificação do Frei Salvador Pinzetta, com o qual tive a honra e o prazer de conviver durante um ano, em Flores da Cunha, cidade em que fiz meu noviciado para a Ordem dos Frades Menores Capuchinos.
Frei Salvador já era considerado santo em vida. Quando não estava trabalhando como hortelão do convento, estava na capela, orando. Causa de beatificação de Frei Salvador Pinzetta:


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sexta-feira, 8 de maio de 2015

POR UMA PEDAGOGIA DO CONVÍVIO

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Convivi por mais de 30 anos num ambiente formidável. Muito se fala e se falava que a Católica é e era ... Que isso... que aquilo... que sempre se falou... não vale a pena... o reitor fulano e beltrano... os –anos todos, por anos sem conta... tocaram aquela isntituição que sempre estava para falir... mas que sempre se safou até nossos dias... a UCPel...
Mas havia a sala dos professores... uma sala de todos... nem muito grande... cabiam lá uns tantos fulanos que pensavam muito diferente uns dos outros... religiosos e ateus... filósofos, engenheiros, pedagogos, médicos, advogados, biólogos e tantos –logos que não quero esquecer ninguém... de economistas e contadores a sociólogos e assistentes sociais, algumas centenas, quase um milheiro... mais de setecentos... 
Iniciei como aluno... depois professor... diretor...Mas lá éramos todos o Wallnei, o Galvão, o Jandir, o Viana, o Alencar (alguns dos reitores), que em outra parte seriam o doutor fulano de tal...
Houve mesmo prefeitos, o Prof. Dr. Francisco Louzada Alves da Fonseca e Prof. Dr. Bernardo Olavo Gomes de Souza e o deputado federal Carlos Alberto Chiarelli. Mas lá eram o Chiquinho, o Bernardo e o Chiarelli.
Lembro-me de uma ocasião em que conversava, sentados lado a lado na mesa grande do centro da sala, com o prefeito Chiquinho. Eu tinha pouco mais de 30, ele mais de 60. Atrevimento de jovem, disse eu: Professor Chiquinho, suas concepções são tão avançadas (estava-se em pleno governo militar, não se pode esquecer isso), por que o senhor não muda para o MDB? Ele, respeitando minha ingenuidade, disse: Eu sou da esquerda da ARENA, que é idêntica à direita do MDB. Isso para se entender a intimidade que tínhamos uns com os outros.
Havia, porém, uns mais idosos e respeitáveis, o Dr.Planella, eterno diretor do Instituto de Medicina. Ninguém jamais dizia o Planella. Mas o velho médico formado na Itália, era o Baruffa. Grande conhecedor de doenças tropicais, trabalhou na África com o Dr. Albert Schweitzer, e reconhecido antropólogo, que publica mesmo em revistas europeias. Lembro de tê-lo encontrado há poucas semanas, no ponto de ônibus, jamais teve automóvel, embora não seja pobre. Na sua sutileza italiana, falou:"Brisolara, come tu tá velho". Eu, olhando para suas vestes descuidadas de solitário, e suas feições de nonagenário, respondi: É, Baruffa, o tempo passa.
Na verdade, foi nesse ambiente que aprendi um tanto, do pouco que de fato sei. Lembro-me do meu querido José Luís Marasco Leite, da minha querida Lina Monti, do amigo Ambrósio Bento Goicochea Andrade, do compadre Jandir João Zanotelli, do inesquecível Jorge Roberto Guimarães, do competente médico José Xavier de Freitas Netto, e seu colega urologista Sérgio Falchi, do Lino Soares, da matemática, do competente advogado Alencar Mello Proença, e seu colega Carlos Mário de Almeida Santos, da Maria Helena Hernadorena e da Brenda Máris Scur da Silva, amigas que já nos deixaram. Também lembro da falecida Lea Louzada e do médico legista Paulo Friedmann, que cochilava num sofá, enquanto aguardava o horário de suas aulas. Desejo deter-me aqui, porque seria enfadonho e impossível recordar centenas de nomes de profissionais com quem tinha maior ou menor intimidade, mas que nos conhecíamos e nos respeitávamos.
UCPel
Mas lá éramos o Oscar, o Marasco, a Lina, o Ambrósio, o Dr.Planella, é claro, o Jandir, o Jorge, o Alencar, a Lea, a Maria Helena, a Brenda, o Bernardo, mesmo quando era o prefeito.
E nos encontrávamos a toda hora, sem reverência. E havia o Assis, o Prefeito do Campus e o Ubirajara Ribas, renomado economista, o Leocir Cancela e depois, os colegas do Departamento de Letras.
Esses, então, foram de imensa importância no meu caminho, a partir do ensinamento daquilo que constitui a verdadeira amizade, o fazer pelo outro sem cobranças. Começo aí pelo meu velho mestre Victorino Piccinini, que afirmava ter Deus, ao criar o mundo, dado nome a todos os seres, menos ao Departamento de Letras da Católica, que era o DCHU9.
E havia a professora Eny Fetter Zambrano, que, aos quase 90 anos, continua trabalhando. E o velho mestre libanês Anwar Saliby, que me apresentou a Albert Camus e à filosofia do absurdo. E depois foram tantos colegas das Letras, o competente finado Prof. Wallney Hammes, mestre de alemão e inglês, a doce amiga Vera Fernandes, a perspicaz amiga Teresinha Elichirigoity, e a amiga da área de literatura Ângela Sapper e muitos outros amigos desses anos todos, cujo imperdoável esquecimento me condena inexoravelmente.
Sala dos professores - UCPel - vista externa
Recordo as discussões de história com o prof.Ewaldo Poeta, coronel do exército e competente historiador e os capitães Caldeira e Schzechir, professores de EPB. As discussões filosóficas com o Prof.Jandir Zanotelli e o doutor pela Sorbonne, Agemir Bavaresco.
Também havia os debates sociológicos agradabilíssimos, lembram queridos amigos José Luís Marasco Leite (por sinal, pai do atual prefeito de Pelotas), Jorge Roberto Guimarães e Lina Monti? E os debates sobre os planos econômicos com Ubirajara Ribas e Leocir Cancela? E as piadas e chistes do Assis e do Dr. Xavier? Tudo era profundamente educativo e enriquecedor. Tudo se debatia. Éramos uns "metidos" e atirávamos em todas as áreas e discutíamos de medicina a engenharia, passando por filosofia, educação e sociologia. Éramos mestres aprendizes. Mas quanto aprendi com vocês todos, meus irmãos de classe. Que saudades, Deus meu!!!

quinta-feira, 7 de maio de 2015

UMA PEDAGOGIA INUSITADA

Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
campo de meu avô
Por muitos anos, segui os frades capuchinhos, como aluno dos seus seminários. Muitas noites, até dez horas, tínhamos um aprendizado especial. Cada um escolhia o frade que desejava ouvir.
Em torno de cada um deles, reunia-se uma roda de meninos. O pátio era enorme. Por muitas noites estreladas, ouvi dos lábios de frei Paulo, de cabelos branquinhos, e com ele contemplei o céu. Ouvi e observei a demonstração das constelações e seus componentes. Do alto de seus oitenta anos, muito aprendi sobre as rotas dos astros, as ausências de algumas estrelas em nosso céu, por certos meses. E muito ouvi sobre os mitos e as constelações. Elas comportam estrelas que se encontram a distâncias imensas umas das outras. E, triste, acompanhei-o ao túmulo, na década de 60.
Depois, havia o jovem frei Hugo, que discorria sobre tecnologia. Falava sobre a máquina de reproduzir fitas de cinema. Como funcionavam a banda do som e a das imagens. Como som e imagem se transformavam em energia elétrica e depois voltavam ao mundo das vibrações imagéticas, formando a aparência de movimento. E assim, a cada semana, buscava uma nova invenção, da energia nuclear ao funcionamento dos monjolos do campo.
Gruta do seminário em que estudei
em Vila Flores  - RS

Então, ouvia o frei Marciano, que a cada semana, abordava um país do mundo, desde seu surgimento, até os dias de hoje. Quem eram seus governantes da época e qual o sistema de governo.
Por sua vez, frei Olavo falava sobre cinema. Comentava os filmes importantes. Seus diretores e a formação dos atores. Fazia uma interpretação filosófica de cada filme. E convidava, para, no sábado à noite, assistir a um filme que havia comentado. Foi com ele que vi, pela primeira vez, “Os Dez Mandamentos” e “Roma Città Aperta”.
Frei Efrain encenava magistralmente histórias de diversas literaturas e frei Genésio, negro como ninguém, doutorado em Londres, discorria sobre álgebra, geometria e abordava magistralmente as diferenças e combinações de cores. Era mestre em cores e pintura, e fora considerado, na Inglaterra, um dos maiores peritos em distinção de tonalidades de cores.

Assim, tantos outros, por tantos anos, doze, ao todo. Não se consideravam esses encontros como aulas. Não havia provas e ninguém era obrigado a nada. Mas quanto aprendi nessas sessões noturnas, que se ficava triste quando o sino chamava para as preces, denominadas de completas, pois completavam a jornada, antes do repouso até as cinco horas da manhã seguinte.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

OS SINOS - MANUEL BANDEIRA - OS SINOS, MARCANDO O NASCIMENTO, A MORTE E UMA POSSÍVEL RESSURREIÇÃO


Sino de Belém,
Sino da Paixão...

Sino de Belém,
Sino da Paixão...

Sino do Bonfim!...
Sino do Bonfim!...

Sino de Belém, pelos que inda vêm!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.

Sino da Paixão, pelos que lá vão!
Sino da Paixão, bate bão-bão-bão.
Sino do Bonfim, por quem chora assim?...

Sino de Belém, que graça ele tem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem-bem.

Sino da Paixão - pela minha mãe!
Sino da Paixão - pela minha irmã!

Sino do Bonfim, que vai ser de mim?...

Sino de Belém, como soa bem!
Sino de Belém, bate bem-bem-bem.

Sino da Paixão... Por meu pai?... - Não! Não!...
Sino da Paixão bate bão-bão-bão.

Sino do Bonfim, baterás por mim?

Sino de Belém,
Sino da Paixão...

Sino da Paixão, pelo meu irmão...

Sino da Paixão,

Sino do Bonfim...

Sino do Bonfim, ai de mim, por mim!

Sino de Belém, que graça ele tem!


O poeta vale-se da popular simbologia do som dos sinos para evocar o inexorável percurso da existência humana. Bem-bem-bem, o som de um pequeno sino, que, pela peqenez,bate mais rápido e agudo, marcando o nascimento e a infância. Depois vem bão-bão-bão, um pesado sino cujas badaladas são lentas e graves e evocam a paxão, do verbo latino pateri, depoente, que origina padecimento, paixão e morte. Por último, vem o sino do Bonfim, que ligado a mim, apela para bim-bim-bim, um sininho miúdo, em baterás por mim? interrogativo. Bonfim, é morte, há fim, mas fim bom. Bonfim é ressurreição, mas está sob interrogação. Haverá um fim bom? Ai de mim...

DO ROMÂNTICO E TRISTE POETA SIMBOLISTA ALPHONSUS DE GUIMARAENS






Hão de chorar por ela os cinamomos 
Murchando as flores ao tombar do dia 
Dos laranjais hão de cair os pomos 
Lembrando-se daquela que os colhia. 

 
As estrelas dirão: - "Ai, nada somos, 
Pois ela se morreu silente e fria..." 
E pondo os olhos nela como pomos, 
Hão de chorar a irmã que lhes sorria. 

 A lua que lhe foi mãe carinhosa 
Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la 
Entre lírios e pétalas de rosa. 

Os meus sonhos de amor serão defuntos... 
 E os arcanjos dirão no azul ao vê-la, 
Pensando em mim: - "Por que não vieram juntos?" 

A morte da amada: 

É um tema dominante em sua poesia: a morte da noiva amada, a doce Constança, desaparecida na flor da mocidade. De certa forma, não conseguirá mais esquecê-la e, assim, os seus poemas de amor sempre se vincularão à idéias fúnebres. Amor e morte é uma velha fórmula romântica, mas Alphonsus a tratará de maneira diferente, fugindo do patético e alcançando um tom elegíaco, onde predominam a melancolia e a musicalidade. 
Nem o casamento, nem o passar do tempo ajudarão o poeta a atenuar esta tristeza. Em vários momentos, a dor parece mais uma convenção poética do que propriamente um sentimento real. No entanto, um soneto como Hão de chorar por ela os cinamomos guarda forte carga de emoção.