CAPÍTULO VI – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS
Uma influência importante na convenção do Lyons – e no subsequente esoterismo francês – foi o filósofo ocultista Louis Claude de Saint-Martin (1743-1804). Embora pareça que ele se dedicou ao celibato, à sua filosofia centra-se numa veneração do Feminino, sob a forma de Sophia, que ele considerava «a forma feminina do Grande Arquiteto». O «martinismo» foi a mais influente filosofia ocultista, não só sobre estas formas de Maçonaria ocultista, mas também sobre as sociedades rosacruzes da França do século XIX, que serão discutidas pormenorizadamente no próximo capítulo.
Edição e imagens: Thoth3126@gmail.com
Capítulo 06C – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS – Livro “The Templar Revelation – Secret Guardians of the True Identity of Christ”, de Lynn Picknett e Clive Prince.
http://www.picknettprince.com/
CAPÍTULO VI – A HERANÇA DOS TEMPLÁRIOS
Alguns anos após a reunião de Lyons, em 1782, realizou-se outra grande conferência maçônica – desta vez com representantes de todos os grupos maçônicos da Europa – em Hessen, sob a presidência do duque de Brunswick; o seu objetivo era sanar as profundas divisões no seio da Maçonaria, resolvendo definitivamente a questão da relação entre a Maçonaria e os Cavaleiros Templários. O resultado foi uma humilhação para o barão Von Hund, que defendeu a causa templária e foi, efetivamente, o fim da Estrita Observância Templária. No entanto, os Templários ganharam a guerra: a convenção concordou em reconhecer o Rito Escocês Retificado – que era exatamente a Estrita Observância Templária sob outro nome.
Também importantes na Maçonaria ocultista são os sistemas conhecidos por «ritos egípcios», que irão assumir importância no desenrolar da nossa investigação. Mas todos eles derivam da dileta Estrita Observância Templária do barão Von Hund e estão, por conseguinte, muito intimamente relacionados com o Rito Escocês Retificado. Ao contrário da imagem habitual da Maçonaria, eles dão um realce especial ao Feminino (algumas formas incluem ativas lojas femininas). Todos os maçônicos veneram o misterioso «filho da viúva». Nos ritos egípcios, a «viúva» é ÍSIS.
O Priorado de Sião, com a sua reconhecida insistência em venerar ÍSIS, afirma que começou como um círculo interno da Ordem Templária e, naturalmente, desenvolveu-se, ao longo dos anos, e adquiriu outras associações esotéricas, algumas das quais são, em si mesmas, muito significativas. Uma forte influência parece ter sido Jacques-Étienne Marconis de Nègre (1795-1865), que fundou um dos ritos egípcios da Maçonaria ocultista, em 1838, conhecido por «Rito de Mênfis». Este rito também se afirmava descendente da tradição «templarista» de Von Hund.
Marconis de Nègre esboçou um complicado «mito da fundação» para a sua organização, fazendo a habitual afirmação pomposa de que o rito remontava à antiguidade, a um grupo chamado a Sociedade dos Irmãos Rosacruzes do Oriente. Esta, por sua vez, fora fundada por um sacerdote da antiga religião egípcia, que fora convertido ao cristianismo por S. Marcos e cujos discípulos incluíam membros dos essênios.
O mito de Ormuz sugere quatro influências: rosacruz, egípcia, esoterismo judaico, como a cabala (certa ou erradamente, os essênios eram considerados como tendo sido cabalistas), e cristã, talvez de um gênero herético.
O que realmente nos interessava neste mito era – como saberão os leitores de The Holy Blood and the Holy Grail (O Santo Graal e a Linhagem Sagrada) – o fato de o Priorado de Sião ter adotado o nome «Ormuz» como «subtítulo». E, viríamos a saber, a história de Ormuz surgiu, pela primeira vez, em ligação com a Ordem da Cruz Ouro e Rosa, quando, em 1770, ela se tornou uma Loja da Estrita Observância Templária. Mas, como veremos, a história que inspirou este mito tinha implicações muito vastas no que diz respeito a esta investigação.
Talvez não seja surpreendente que existam sociedades que se declarem sucessoras oficiais dos Templários. A maioria delas (n.t. ou a sua totalidade) pode ser facilmente ignorada, embora a Antiga Ordem Militar do Templo de Jerusalém apresente argumentos suficientemente convincentes para ser levada a sério. Atualmente, tem a sede em Portugal, onde afirma dedicar-se a obras de caridade e à investigação histórica, embora exista um grupo minoritário, que opera a partir de uma localidade da Suíça, com o sugestivo nome de Sion. Mas as suas origens – na sua forma ressurgida – estavam em França.
A Antiga Ordem Militar do Templo de Jerusalém foi fundada, em 1804, por um médico com o imponente nome de Bernard Fabré-Palaprat, que alegava ter recebido a sua autoridade da Carta de Transmissão de Armênio, geralmente conhecida por Carta de Armênio. Se fosse verdade, contribuiria muito para determinar se Fabré-Palaprat era, na verdade, da verdadeira linha templária, porque esta carta reivindicava ter sido escrita em 1324, por Marco Armênio, que fora nomeado grão-mestre pelo próprio Jacques de Molay. Supostamente, o pergaminho apresenta as assinaturas de todos os subsequentes grão-mestres da Ordem dos Cavaleiros Templários, o que é significativo, porque, após a execução de Jacques de Molay, supunha-se que não existia mais nenhum grão-mestre.
Como era de prever, os historiadores rejeitaram a carta como sendo uma falsificação. Mesmo autores de espírito aberto, como Baigent e Leigh, concordaram que ela era uma mistificação. Mas os críticos nunca a viram, de fato, e basearam as suas objecções numa tradução do latim original, datada do século XIX. (O documento está escrito em latim, que foi transcrito num código baseado na geometria da cruz templária). Uma das razões por que a carta foi declarada uma falsificação é que o latim é demasiado bom para a sua época – o latim medieval é notoriamente irregular -, mas, neste caso, o tradutor corrigira a gramática. Os críticos também rejeitaram a lista das declarações de grão-mestres porque a formulação das palavras de cada uma delas é a mesma – uma coisa improvável, durante o espaço de tempo entre 1324 e 1804. Mas isso também se pode dever ao fato de o copista as ter uniformizado: no original, elas eram diferentes. Assim, as duas razões principais para rejeitar a Carta de Marco Armênio não são, de fato, válidas.
Outra razão por que a carta tem sido criticada é pelo fato de conter censuras contra «os desertores Templários escoceses», os quais, declara Armênio, deviam ser «excomungados» (juntamente com os Cavaleiros Hospitalários). Assumindo que estes cismáticos eram maçônicos da Estrita Observância Templária de Von Hund, os historiadores consideraram isso uma prova de que a carta era uma fraude – porque eles pensavam que o barão inventara a «Transmissão Escocesa» por volta 1750. Mas, se ele estiver dizendo a verdade sobre as origens dos maçônicos, emerge um quadro radicalmente diferente.
De fato, a Antiga Ordem Militar do Templo afirma que a carta já existia, pelo menos cem anos antes de Fabré-Palaprat a ter tornado pública, quando Filipe, duque de Orleãs – mais tarde regente da França – a usou como texto para convocar uma assembleia de membros do Templo em Versalhes. Se é verdade, então este acontecimento é, em si mesmo, a prova da continuidade da presença templária na Europa. (Foi o mesmo duque de Orleãs que admitiu o Cavaleiro Ramsey na Ordem de S. Lázaro.)
Além da Carta de Armênio, Fabré-Palaprat possuía outro documento importante – que também foi rejeitado imediatamente pela maioria dos comentadores. Era o Levitikon – uma versão do Evangelho do Apóstolo João, com flagrantes implicações gnósticas -, que Palaprat afirma ter encontrado num quiosque de livros em segunda mão. Mais uma vez, isto parece ser demasiado simples, mas, se o documento for autêntico, ele lança uma luz sobre as verdadeiras razões para conservar secreta grande parte do conhecimento gnóstico. Porque o Levitikon, uma versão do Evangelho de S. João, que alguns críticos datam do século XI, conta uma história muito diferente da que se encontra no livro habitual do Novo Testamento, com o mesmo nome.
Fabré-Palaprat usou o Levitikon como base para fundar a sua Igreja Joanina Neotemplarista de Paris, em 1828, na qual os seus adeptos foram devidamente iniciados, e após a sua morte, dez anos mais tarde, sucedeu-lhe Sir William Sidney Smith, membro da alta hierarquia maçônica e herói das Guerras Napoleônicas.
O Levitikon, que fora traduzido de latim para grego, era formado por duas partes. A primeira contém doutrinas religiosas que se destinam aos iniciados, incluindo rituais relativos aos nove graus da Ordem Templária. Descreve a «Igreja de João» dos Templários e explica o fato de se intitularem «joaninos» ou «cristãos originais».
A segunda parte é igual ao Evangelho oficial de João, exceto em algumas omissões significativas. Faltam os capítulos 20 e 21, os dois últimos do Evangelho. Também elimina todas as sugestões de milagre das histórias da transformação da água em vinho, do pão e dos peixes e da ressurreição de Lázaro. São excluídas certas referências a S. Pedro, incluindo a história de Jesus declarar «sobre esta pedra edificarei a minha Igreja».
Se isto causa perplexidade, o Levitikon também contém material surpreendente, mesmo chocante: Jesus é apresentado como tendo sido iniciado nos mistérios de Osíris, o grande deus egípcio da sua época.
Osíris era consorte da sua irmã, a bela deusa ÍSIS, que dominava o amor, a cura e a magia – entre muitos outros atributos. (Embora, atualmente, nos possa parecer desagradável esta relação incestuosa, ela fazia parte da tradição faraônica e teria parecido perfeitamente normal a qualquer crente do antigo Egito.) Set, o irmão de ambos, desejava ÍSIS e planejou matar Osíris. Este foi surpreendido pelos sequazes de Set, que desmembraram o seu corpo e espalharam os seus restos mortais. Terrivelmente desolada, ÍSIS vagueou pelo mundo, procurando-os, sendo ajudada na sua busca pela deusa Néftis, mulher de Set, que desaprovou este crime.
As duas deusas encontraram todos os restos do corpo de Osíris, exceto o falo. Reconstituindo-os, ÍSIS usou um falo artificial com o que “magicamente” concebeu o seu filho, Hórus. Em algumas versões desta história, ÍSIS teve uma aventura amorosa com Set, embora os motivos de ÍSIS pareçam obscuros – parece haver um elemento de vingança implicado nesta relação. Hórus, agora um jovem, ficou enfurecido por esta união, que ele considerava uma traição à memória do seu pai, Osíris, e travou um duelo com Set, que resultou na morte do último e deixou Hórus apenas com um olho. Curou-se e o Olho de Hórus transformou-se no talismã mágico favorito do Egito.
O Levitikon, além de fazer a extraordinária afirmação de que Jesus era um iniciado do culto de Osíris, também declara que ele transmitiu este conhecimento esotérico a João, «o Discípulo Amado». O Levitikon também afirma que Paulo e os outros apóstolos podem ter fundado uma Igreja cristã, mas que o fizeram sem nenhum conhecimento dos verdadeiros ensinamentos de Cristo, através de Jesus. Eles não faziam parte do círculo interno e Paulo (Saulo) sequer conheceu Jesus. Segundo Fabré-Palaprat, foram esses ensinamentos secretos, tal como foram revelados a João, o discípulo amado (o autor do Livro das Revelações – Apocalipse), que foram preservados pelos Templários, e que, eventualmente, os influenciaram.
O Levitikon regista uma tradição que, alegadamente, foi transmitida ao longo das gerações, acerca de uma seita, ou Igreja, de cristãos joanitas do Oriente Médio. Estes afirmavam-se herdeiros dos «ensinamentos secretos» e da verdadeira história de Jesus, a quem eles se referiam como «Yeshu, o Ungido (pelo Cristo)». De fato, se esta seita existiu, a sua versão da história de Jesus é tão heterodoxa que não sabemos por que razão se intitulavam «cristãos». Para eles, não só Jesus era um iniciado de Osíris como era apenas um homem, não o (ÚNICO) “filho” de Deus. Além disso, era filho ilegítimo de Maria – não se punha a questão de miraculoso nascimento virginal. Atribuíam essas afirmações a uma engenhosa – embora indigna – história de fachada, inventada pelos evangelistas para obscurecer a ilegitimidade de Jesus e o fato de sua mãe não fazer nenhuma ideia da identidade do seu pai!
A seita joanina reconhecia que o título de «Cristo» não era único e exclusivo de Jesus: o grego original Christos apenas significava «o Ungido» – um termo que se podia se aplicar a muitos outros, incluindo reis e oficiais romanos. Assim, os líderes joaninos sempre se intitulavam «Cristo», (Curiosamente, o Evangelho de Filipe de Nag Hammadi aplica o termo «Cristo» a todos os iniciados gnósticos.
O grupo era considerado uma seita gnóstica, que preservou vários segredos esotéricos, incluindo os da cabala. Também conceberam um plano para se transformarem numa organização secreta, que seria (nas palavras do escritor do século XIX Elias Levi) o único repositório dos grandes segredos religiosos e sociais, elegeria reis e pontífices sem se expor à corrupção do poder – isto é, uma organização secreta que não estaria sujeita aos caprichos e às incertezas das mudanças políticas e sociais no decurso dos anos. O seu instrumento seria a Ordem dos Cavaleiros Templários, e Hugues de Payens e os restantes Cavaleiros fundadores foram, de fato, iniciados joanitas.
Contudo, os próprios Templários se tornaram corruptos, devido ao seu amor pela riqueza e pelo poder, e foram eventualmente extintos. O rei francês e o papa não podiam permitir que a verdadeira natureza da ameaça templária se tornasse conhecida publicamente; portanto, inventaram as acusações de idolatria, heresia e imoralidade. Mas, antes da sua execução, Jacques de Molay, segundo as palavras de Levi, «organizou e instituiu a Maçonaria Ocultista».
Admitindo que é verdadeira, só esta reivindicação altera dramaticamente a versão oficial da história. Apresenta o elo de ligação direta e autorizada entre um tipo de Maçonaria e os antigos Templários – e, assim, podia acontecer que estes mesmos maçônicos pudessem ter alguma coisa a ensinar-nos sobre o conhecimento templário.
Como vimos, Eliphas Levi dedica uma seção da sua History of Magic à tradição joanina, tal como ela é descrita no Levitikon. Já a tínhamos lido na tradução inglesa de A. E. Waite, mas deparamos com outra tradução desta mesma seção, numa obra de Albert Pike, o erudito intelectual maçônico e grão-mestre do Antigo e Reconhecido Rito Escocês da América, Morals and Dogma of the Ancient and Accepted Scottish Rite of Freemasonary (1871). Esta versão apresenta várias diferenças – mas qual delas era a autêntica?
Consultamos a edição francesa original da obra de Levi e verificamos que Pike fizera certos aditamentos ou correções pessoais, provavelmente baseado na sua própria compreensão desta tradição. Por exemplo, ele traduz a frase histórica, acima citada, como «Maçonaria Ocultista, Hermética ou Escocesa». Também corrige as palavras de Levi relativamente a uma ligação entre os Templários joaninos e os rosacruzes. Levi escreve (na fiel tradução de A. E. Waite):
Os sucessores dos rosacruzes, modificando gradualmente os métodos austeros e hierárquicos dos seus precursores da iniciação, tinham-se transformado numa seita mística e adotado zelosamente as doutrinas mágicas dos Templários, do que resultou eles considerarem-se os únicos depositários [sic] dos segredos sugeridos pelo Evangelho segundo S. João.
De forma notável, Pike emenda as palavras em itálico para:
… Tinham-se associado com muitos Templários, confundindo-se o dogma dos dois…
As alterações de Pike são significativas porque, enquanto Levi era um observador e comentador do mundo ocultista e maçônico e, até certo ponto, um leigo, Pike conhecia bem a questão. Achou adequado corrigir a versão de Levi, de modo que, em vez de falar dos rosacruzes adotarem as «doutrinas templárias», ele fá-los, de fato, fundirem-se com os grupos templários existentes.
Mas a correção mais significativa de Pike é algo inteiramente novo. Depois da frase sobre o incitamento de Jacques de Molay à «Maçonaria Ocultista, Hermética ou Escocesa», Pike acrescenta que esta ordem:
Adotou S. João Evangelista (autor do Apocalipse) como um dos seus patronos, associando-se a ele, para não despertar as suspeitas de Roma aparentava venerar S. João Batista…
Isto é curioso, para dizer o mínimo. Considerando que tanto João Evangelista como João Batista são santos católicos reconhecidos, por que deveria a veneração de um deles ser necessária como «cobertura» da veneração prestada ao outro? Contudo, não é provável que Pike, o mais erudito dos intelectuais maçônicos, tenha inserido esta informação na reprodução da passagens do livro de outro autor sem uma boa razão. Evidentemente que precisávamos investigar ainda mais este tema joanino, no seio da tradição maçônica.
Como vimos, no último capítulo, A. E. Waite referira-se a uma «tradição joanina» que influenciara as lendas do Graal e que, a princípio, parecia mistificadora. Mas agora começava a fazer sentido: era evidente que a «tradição joanina» era algo relacionado com João Evangelista ou com João Batista.
É claro que a história subjacente não é nova para esta investigação. A «tradição joanina», com a sua clara ligação a S. João, também é central para o Priorado de Sião – e, para eles, como tínhamos discernido, é João Batista que é preeminente.
Como vimos no Capítulo II, o Priorado afirma que Godefroi de Bouillon conheceu representantes de uma misteriosa «Igreja de João» – por outras palavras, os Irmãos de Ormuz – e, em consequência desse encontro, decidiu formar um «governo secreto». Os Cavaleiros Templários e o Priorado de Sião foram criados como parte desse plano original. Nunca é demais salientar que, pelo menos, segundo esta história, tanto o Priorado como os Templários foram criados para dar forma aos ideais desta misteriosa Igreja de João. À parte alguns detalhes menores, esta história é idêntica à do Levitikon e, além disso, demonstra que o moderno Priorado e os Templários fazem parte da mesma tradição.
O conceito dos Templários como uma organização secreta, com autoridade para eleger e depor reis, é igual ao dos Cavaleiros Templários do Graal de Parsifal de Wolfran Eschenbach – certamente que há provas de que os Templários reivindicaram esse direito. O problema é que a maioria destas exóticas reivindicações de uma longa linhagem histórica data apenas das organizações neotemplárias do século XIX. Mas elas podiam ser válidas, se pudessem ser corroboradas por provas independentes que ligassem os seus movimentos a organizações que já existiam definitivamente há séculos, como a ligação rosacruz – Maçonaria.
Outra dificuldade reside no fato de serem feitas duas reivindicações diferentes: uma delas defende que certas formas de Maçonaria descendem diretamente dos Templários. De acordo com a outra, os próprios Templários são uma continuação de uma tradição herética, mais antiga, que remonta à época de Jesus. Infelizmente, provar a primeira não significa automaticamente que a segunda seja verdadeira.
Mas a importância atribuída à versão idiossincrática do Evangelho de João é excitante, embora pareça haver alguma confusão entre João Evangelista e João Batista. A afirmação de Albert Pike, segundo a qual os maçônicos adotaram Batista como cobertura para a sua veneração secreta de João Evangelista, é, como vimos, absurda. Por que deveriam os maçônicos querer esconder a sua veneração de qualquer dos santos, quando ambos são perfeitamente aceitáveis para a Igreja? Tudo o que Pike conseguiu foi chamar a atenção para os dois santos de nome João e envolvê-los numa aura de mistério e intriga. Talvez fosse essa a sua REAL intenção. Noutra obra, A. E. Waite cita textos maçônicos, relativos à Maçonaria joanina, que reclamam uma ligação com um cristianismo joanino centrado em Batista e que o considera o «único verdadeiro profeta».
Como já vimos, João Batista era santo patrono dos Cavaleiros Templários e dos maçônicos. Na verdade, a Grande Loja de Inglaterra foi fundada a 24 de Junho – Dia de João Batista. E no pavimento de todos os templos maçônicos vêem-se duas linhas paralelas: uma representa o bordão de João «Evangelista» (outra designação de João, o discípulo Amado), enquanto a outra linha representa o bordão de Batista. É evidente que os dois «João» são de especial importância para a irmandade, embora seja o mais velho que tenha precedência. Além disso, o juramento maçônico é prestado aos «divinos santos João». Mas, atualmente, os maçônicos, como eles próprios admitem, não sabem por que razão os dois santos de nome João são tão venerados.
Talvez estas duas figuras bíblicas, ao longo dos anos, se tenham confundido e que o termo «joanino», que se julga referir aos discípulos do Amado (Cristo), também possa, de fato, se referir ao Batista. Mas se é o João mais velho ou o mais novo – ou ambos – que é venerado pelos maçônicos, há um nome que é conspícuo pela sua virtual ausência nas lojas maçônicas: o nome de Jesus, de uma maneira geral, não surge. Supõe-se que esta ausência é devido ao fato de os maçónicos não serem essencialmente uma organização cristã; é suficiente ser um teísta para aderir às suas fileiras. Mas, nesse caso, por que devem tanta fidelidade aos santos cristãos de nome João?
A ideia de que o Evangelho de João encerra segredos arcanos (n. T.Para quem tem “olhos para ver”…), ou de que existe uma outra versão dele, recorre nesta investigação. Diz-se que os cátaros possuíam uma alternativa herética, e Sir Isaac Newton ficou obcecado por ela. (Como escreve Graham Hancock: «[…] apesar das suas firmes convicções religiosas, por vezes, parecia ter considerado Jesus Cristo mais como um homem especialmente dotado [… ] do que, propriamente, o (n.t. Único) Filho de Deus.»
Assim, tanto os maçônicos do Rito Escocês como os Templários da «Transmissão de Armênio» podem ter preservado os segredos templários originais e ambos seguem o rastro dos Templários até à «seita joanina». Embora não exista nada explicitamente joanino nos ritos egípcios da Maçonaria, todos estes sistemas tiveram origem na Estrita Observância Templária do Barão von Hund. E o Priorado de Sião associa-se a estes três sistemas.
Como vimos, Pierre Plantard de Saint-Clair descreveu o objetivo da Ordem do Templo como sendo «os guerreiros da Igreja de João e os porta-bandeiras da “primeira dinastia”, as armas que obedecem ao espírito de Sião».
O resultado deste grande plano deveria ser «um renascimento espiritual» que «voltaria a Igreja católica de Roma de cabeça para baixo». É evidente que isto não aconteceu – AINDA, embora as nossas investigações mostrem que a revelação que podia provocar esta modificação aguarda, nos bastidores, o momento de fazer uma entrada dramática no cenário mundial, talvez sob a forma do Priorado ou das escolas de mistério associadas, como as joanitas (n.T. ou com a revelação da VERDADEIRA história da vida do homem conhecido como Jesus…).
Mas, seja como for, tínhamos conseguido uma coisa muito extraordinária: tínhamos partido da aparente obsessão de Leonardo com João Batista, seguíramos a ligeira sugestão de que o Priorado de Sião, de algum modo, também estava implicado com aquele santo.
Naquela fase, a implicação não tinha grande significado, mas, à medida que seguimos as pistas dos Templários até os maçônicos, e depois prosseguimos até aos grupos ocultistas, uma ligação muito mais convincente começou a tomar forma ante os nossos olhos. A heresia joanina existia, sob os diversos aspectos do mundo secreto ocultista – e é a esta tradição que o Priorado declara pertencer.
Embora muitas perguntas importantes continuem sem resposta, um quadro coerente começava a emergir, um quadro que, de algum modo, ligava João Batista a uma tradição que, de forma complexa, se mantinha oculta. Mas isto era apenas uma parte do que emergia como uma heresia composta por dois elementos, sendo o outro elemento (n.T. e o PRINCIPAL) a veneração secreta de uma deusa, a veneração do princípio feminino de Deus.
É evidente que este último elemento é difícil de conciliar com as formas exteriores de organizações, como os maçônicos, que parecem ter uma orientação excepcionalmente masculina. Evidentemente que vale a pena possuir os segredos que estão por detrás destes dois elementos – o Feminino e os temas joaninos – porque eles têm sido defendidos, guardados e protegidos contra todas as eventualidades e parecem ter atraído a particular hostilidade da Igreja de Roma. Isto não é surpreendente, porque o segundo elemento destes antigos segredos esotéricos – a veneração do princípio feminino – revestiu a forma de magia pagã transcendental, com todas as suas implicações do poder inerente do Feminino. (Final do capítulo VI)
Permitida a reprodução desde que mencione as fontes e respeite a formatação original.
Nenhum comentário:
Postar um comentário