segunda-feira, 7 de abril de 2014

CULTURA INDIANA - MAHATMA GANDHI




Mahatma Gandhi (1869-1946)
         Seu nome de família era Mohandas Karamchand Gandhi. Foi o grande poeta e pensador indiano Rabindranath Tagore que o denominou de Mahatma, ou seja, grande alma, contra o qual Gandhi protestou inutilmente durante toda a vida.
         Segundo um de seus biógrafos, o suíço Edmond Privat, numa visita que Gandhi fez a Tagore em 1915 esse o teria cognominado de Mahatma, a grande alma.
         Para entender minimamente a vida de Gandhi, é necessário conhecer a história dos padroados. Foram sucessivas bulas pontifícias, ou sejam, documentos oficiais da Igreja Católica, reconhecidas internacionalmente, e oficializava determinado ato, neste caso, domínio de povos. O termo bula vem de uma bola de cera ou chumbo, uma espécie de carimbo da época que autenticava um documento. Nesses casos, tratava-se de concessões de domínios políticos.
         Os primeiros padroados foram concedidos pelo papa Calisto III à Espanha e a Portugal no início da expansão ultramarinha. É preciso saber que Calisto III era espanhol. Seu nome civil era Alonso Borja, e foi eleito papa em 08 de abril d 1455 e governou até sua morte em 06 de agosto de 1458. Foi um curtíssimo mandato.
         Iniciava-se, nessa época a ascensão da Península Ibérica como principal sede do poder na Europa, o que valia dizer, no mundo. Em 1453, os turcos otomanos tinham tomado o Oriente Médio e impediam as viagens terrestres para o extremo Oriente. de onde a Europa importava uma série de produtos essenciais, mormente a pimenta.
         Ocorre que, forçados pelos fortes invernos, os povos europeus abatiam o gado antes dos grandes frios e, não conhecendo ainda processos mais eficazes de conservação da carne, salgavam o produto e o guardavam em grandes depósitos. Desse processo resultava um produto de cheiro muito ruim. Somente com muito tempero, especialmente pimenta, tornava-se palatável.
         Portugueses e espanhóis iniciam as navegações que vão descobrir uma nova rota para o extremo Oriente, que dava novo acesso aos temperos e outros produtos. Porém, enquanto os antigos viajantes como Marco Polo e tantos outros comercializavam com os orientais, os novos descobriam uma forma mais lucrativa de interação.
         Fizeram acordo com os papas e, que, em troca da evangelização dos povos orientais, concederam-lhes o domínio político dessas nações. No início de 1455 faleceu o papa Nicolau V. Havia uma forte disputa pelo papado entre membros de famílias influentes da época. Aproveitando-se dessa disputa, influentes membros da corte espanhola sugeriram que se elegesse o cardeal Alonso Borja, catalão de Xátiva, que já contava quase oitenta anos, como um mandato tampão, até que se elegesse um papa mais definitivo.
         Alonso escolhe o nome eclesiástico de Calisto III. Como Nicolau V, seu predecessor tinha concedido, via bula pontifícia, o domínio de todas as terras descobertas, e estando a Espanha na mesma empreitada das navegações propôs um acordo que resultou num processo que se denominou de padroado.
         Esse sistema teve seu início internamente nos reinos da Espanha e de Portugal: ficaria ao encargo dos reis a construção e manutenção das igrejas e a nomeação de padres e bispos, sendo posteriormente estes confirmados pelo papa. Nas colônias estabelecidas no Oriente e na América, este sistema se fez presente desde o início de dominação dos países ibéricos.  
         Alguns anos mais tarde, com outro papa dos Borja, agora italianizados em Bórgia, Rodrigo Bórgia, como Papa Alexandre VI, é feito o Tratado de Tordesilhas, destinando as novas descobertas à corte espanhola.  Porém, e Estado Português da Índia gradativamente foi substituído pelo estado inglês. Houve uma decadência do império português.
         Foi criada pela corte inglesa, aliada a poderosos comerciantes britânicos, a Companhia Britânica das Índias Orientais (“Company of Merchants of London Trading to the East Indies”). Assim, gradativamente, a Inglaterra tomou o espaço então dominado por Portugal. Esse domínio incluía a atual Índia, o Paquistão, Bangladesh e Mianmar (antiga Birmânia) e gradativamente o exército britânico foi estabelecendo bases para proteger seus comerciantes.
         Agregou-se aos tradicionais produtos importados do oriente, o lucrativo comércio do ópio, cujo consumo na época equivalia ao atual emprego da cocaína. Assim, como a Inglaterra procedeu em relação à Índia, a França fez o mesmo com a China e todo o sudeste asiático.
         Esses conhecimentos histórico-geográficos são fundamentais para o entendimento do papel de Gandhi no processo de libertação da Índia. Gandhi conheceu o jovem político paquistanês Zilfikar Ali Buto que defendia a luta armada para a libertação do domínio inglês. Ali Buto era pai da ex-ministra Benazir Buto, tragicamente assassinada em 2007.
         Voltando a Gandhi, o menino era filho de um ministro do príncipe de Rajkot, uma função ligada à casta alta da sociedade indiana. De acordo com os costumes da época e do seu país foi casado aos 13 anos.
         Desde a infância preocupou-se com os problemas sociais, condoendo-se da situação dos párias em seu país. Quando jovem, chegou mesmo a auxiliar os coletores de lixo na rua.
         Em 1888 transfere-se para Londres para fazer o curso de Direito. Na Europa, entrou em contato com o cristianismo, especialmente com a leitura dos Evangelhos. Apaixona-se pelo Sermão da montanha.
         Compara esse texto poético do Evangelho ao Gita. Bagvad Gita é um belíssimo texto religioso hindu. Embora seja um texto mais recente, foi incluído ao épico Mahabharata do século IV a. C., cuja autoria é atribuída a Krishna Dvapayana Vyasa.
         “O Mahabharata é visto por alguns autores como o texto sagrado de maior importância no hinduísmo, e pode ser considerado um verdadeiro manual de psicologia evolutiva de um ser humano. A obra discute o tri-varga ou as três metas da vida humana: kama ou desfrute sensorial, artha ou desenvolvimento econômico e dharma, a religiosidade mundana que se resume a códigos de conduta moral e rituais.”
         “Além dessas metas mundanas, o Mahabharata trata de moksha, ou a liberação do ciclo de tri-varga e a saída do samsara, ou ciclo de nascimentos e mortes. Em outras palavras, é uma obra que visa ao conhecimento da natureza do "eu" e à sua relação eterna com toda a criação e aquilo que transcende a ela.”
         Assim, Gandhi associa seus conhecimentos da filosofia hinduísta ao pensamento cristão, ambos marcados pela tolerância e moderação. Retornando à pátria, com apenas 23 anos, é mandado à África do  Sul, numa missão profissional.
         Lá constata a humilhação de um ser humano pelo outro. Constata um fato humilhante em que os indianos residentes nesse país eram obrigados a transitar pela sarjeta para que os brancos usassem a calçada.
         Foi então que desenvolveu a filosofia que leva a uma política de não-violência. Tratava-se de um método ativo de desobediência, de não-cooperação não-violenta, que visava ao despertar da consciência do oponente. Ele e seus seguidores foram presos por diversas ocasiões por desrespeitarem leis injustas. Afirmava que a desobediência não violenta deles seria como a pedra que quebra o arado, o gelo que parte a pedra, o rio que se infiltra na montanha.
         Em 1915, retorna à índia com a esposa e os filhos, ocasião em que visita Tagore, então já famoso poeta e pensador, que vai chamá-lo de Mahatma, a grande alma.
         Assume, então, a liderança da longa luta para a independência de seu país, jamais abrindo mão de sua metodologia da não-violência. Quando seus compatriotas, tanto muçulmanos quanto hindus, recorriam a métodos violentos contra os britânicos ele entravam em greve de fome até que a violência cessasse.
         A independência da Índia que somente se deu em 1947 deu-se pelo triunfo do Espírito Iluminado, o Satyagraha, ou seja, o próprio princípio e espírito de não-agressão.
         Chegados à independência, Gandhi seguiu sua luta pela união de todos os povos da Índia. Afirmava que as religiões diferentes são caminhos diversos que conduzem ao mesmo ponto.

         Em 30 de janeiro de 1948, quando se dirigia à praça para fazer as orações vespertinas com uma multidão que o aguardava foi assassinado por um compatriota. Logo a seguir, o primeiro ministro Nerhu pronunciava pelo rádio as seguintes palavras que se eternizaram: “O Mahatma Gandhi morreu. Apagou-se a nossa luz. O pai da Índia, o amigo, o consolador de todos nós não existe mais.”

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