SONETO XXII - (O mito do pastor Fido).
Cláudio Manuel da Costa -
Neste álamo sombrio, aonde a escura
Noite produz a imagem do segredo;
Em que apenas distingue o próprio medo
Do feio assombro a hórrida figura;
Aqui, onde não geme, nem murmura
Zéfiro brando em fúnebre arvoredo,
Sentado sobre o tosco de um penedo
Chorava Fido a sua desventura.
As lágrimas a penha enternecida
Um rio fecundou, donde manava
D’ânsia mortal a cópia derretida:
A natureza em ambos se mudava;
Abalava-se a penha comovida;
Fido, estátua da dor, se congelava.
No mito de Fido, há uma dupla metamorfose: Fido, abandonado por sua amada, senta-se sobre um rochedo e se torna uma estátua de pedra. Enquanto Fido se petrifica, a rocha sobre a qual ele estava sentado gera uma fonte. A pedra é o mais acabado símbolo da morte; por outro lado, a água é o símbolo mais eloquente de vida.
Cláudio, poeta árcade brasileiro, aborda a duplicidade da dor: se há uma dor daquele que lamenta a própria desgraça, dor que desumaniza e petrifica; há, por outro lado, uma dor que humaniza e dá vida, a dor daquele que sofre pela desgraça alheia. Se Fido se transformara numa estátua de pedra pela dor do abandono, por outra, o rochedo sobre o qual ele se sentara havia gerado uma fonte que produzia a vida, pela dor que sentira, vendo desgraça do infeliz pastor. Conclui o poeta:
"A natureza em ambos se mudava;
Abalava-se a penha comovida;
Fido, estátua da dor, se congelava. "
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