A Caverna dos Antigos (2)
Posted by Thoth3126 on 13/10/2016
Este é um livro que trata do Oculto e dos Poderes do Homem. É livro simples, no sentido de que nele não há “palavras estrangeiras”, palavras em sânscrito, nem coisa alguma de línguas mortas. A pessoa média quer SABER as coisas, e não ficar a adivinhar palavras que o autor médio tampouco compreende!
Se um autor sabe trabalhar, pode escrever, sem ter de disfarçar sua falta de conhecimento com o emprego de uma língua estrangeira. Um número demasiado de pessoas deixa-se envolver pela confusão. As leis da Vida são realmente simples; não há necessidade alguma de revesti-las de cultos místicos ou pseudo-religiões. Tampouco existe qualquer necessidade de que alguém afirme ter tido “revelações divinas”. QUALQUER PESSOA pode obter as mesmas “revelações”, se se esforçar por alcança-las…
Edição e imagens: Thoth3126@protonmail.ch
T. LOBSANG RAMPA, e o livro “A CAVERNA DOS ANTIGOS”
Nenhuma religião tem em si as Chaves do Céu, nem pessoa alguma será condenada para sempre, por ter entrado em uma igreja com o chapéu na cabeça, ao invés de tirar os sapatos. À entrada das lamaserias tibetanas, lê-se a inscrição: “Mil monges, mil religiões”.
Qualquer que seja nossa crença, se ela englobar o “faze ao próximo o que queres que te seja feito”, teremos êxito, quando soar o Chamamento final. Alguns dizem que o Conhecimento Interior só pode ser obtido ingressando-se neste ou naquele culto, ao mesmo tempo em que se faça o pagamento de uma contribuição substancial.
As Leis da Vida dizem: “Procura e encontrarás”. Este livro é o fruto de toda uma vida, de ensinamentos obtidos nas grandes lamaserias do Tibete e de poderes conquistados por uma observância rigorosa das Leis. Trata-se de conhecimento transmitido pelos Antigos, e se acha inscrito nas Pirâmides do Egito, nos Altos Templos da Cordillheira dos Andes e no maior de todos os repositorios de conhecimentos ocultos do mundo, o Planalto do Tibete – T. LOBSANG RAMPA[Nasceu: Cyril Henry Hoskin-8 April 1910, em Plympton, Devon, United Kingdom – Morte: 25 January 1981 (aged 70) Calgary, Alberta, Canada]
Capítulo 2
O grande Templo parecia um ser vivo. De onde eu me encontrava, bem alto no telhado, podia olhar para baixo e ver toda a extensão do lugar. Em ocasião anterior do dia, o meu guia, o Lama Mingyar Dondup, e eu havíamos viajado para aquele lugar, em missão especial. O Lama, agora, se achava a portas fechadas com um alto dignitário e eu — que tinha liberdade de movimentos — encontrara aquele posto de observação dos sacerdotes, entre as vigas poderosas que sustentavam o telhado. Rondando pela passagem do telhado, descobrira a porta e, audaciosamente, a abrira.
Nenhum grito de ira veio assinalar meu ato, e eu espiei para o interior. O lugar se achava vazio, de modo que entrei e me encontrei em uma pequena sala de pedra, como cela embutida na pedra da muralha do templo. Por trás de mim, estava a pequena porta de madeira, degraus de pedra em ambos os lados, e à minha frente um ressalto de pedra, com uns três palmos de altura. Em silêncio, adiantei-me e me ajoelhei, de modo que apenas minha cabeça ficasse acima do ressalto. Sentia-me como um Deus nos Céus, fitando lá embaixo os mesquinhos mortais, examinando a obscuridade do chão do Templo, bem mais abaixo. Do lado de fora do Templo, o crepúsculo purpúreo cedia lugar à escuridão.
Os últimos raios do Sol poente esmaeciam por trás dos picos cobertos de neve, mandando chuveiros iridescentes de luz pela espuma perpétua de neve que voava das cordilheiras mais altas. A escuridão do Templo era atenuada, e em alguns lugares intensificada, por centenas de tremelicantes lâmpadas de manteiga. Eram lâmpadas que brilhavam como pontos dourados de luz, mas que ainda assim difundiam a radiação ao redor. Parecia que estrelas estavam a meus pés, ao invés de se acharem por cima da cabeça.
Sombras fantásticas deslizavam em silêncio por colunas poderosas; sombras ora finas e compridas, ora curtas e atarracadas, mas sempre grotescas e bizarras, com a iluminação cruzada fazendo com que o comum se tornasse fantástico e este ultrapassasse qualquer descrição. Eu contemplava aquilo, olhando para baixo, sentindo-me como em um semi-mundo, incerto do que via e do que imaginava. Entre mim e o soalho flutuavam nuvens de incenso azul, a fumaça erguendo-se camada após camada, fazendo-me recordar ainda mais a posição de um Deus a olhar para baixo, em meio às nuvens da Terra.
Nuvens de incenso, subindo com suavidade, rodopiavam, espessas, dos turíbulos que, em vaivém, pendiam dos braços de jovens cheios e piedosos. Eles seguiam de um para outro lado, com passos silentes e faces imóveis. Ao se voltarem repetidas vezes, um milhão de pontos luminosos se refletiam nos turíbulos dourados, emitindo feixes estonteantes de luz. De onde eu me encontrava, podia ver o incenso vermelho em brasa que, soprado pela brisa, às vezes quase prorrompia em chamas, emitindo chuveiros de fagulhas vermelhas, que logo se apagavam. Recebendo vida nova, a fumaça de incenso se erguia em colunas ainda mais espessas, azuis, formando trilhas acima e por trás dos chelas.
Erguendo-se mais alto, a fumaça formava uma outra nuvem, dentro do Templo. As contorções e movimentos das leves correntes de ar, causadas pelos monges em movimento, davam a impressão de uma coisa viva, como uma criatura, entrevista na penumbra, respirando e voltando-se no leito em que dormia. Por algum tempo observei, tornando-me quase hipnotizado com a fantasia de que me achava dentro de uma criatura viva, observando o soerguimento e o pulsar de seus órgãos, ouvindo os sons do corpo, da própria Vida. Em meio à penumbra e às nuvens de fumaça de incenso, eu via as fileiras cerradas de lamas, trapas e chelas.
Sentados de pernas cruzadas sobre o chão, estendiam-se em fileiras sem fim, até se tornarem invisíveis nos recantos mais distantes do Templo. Todos envergavam seus Mantos da Ordem, parecendo formar um retalho vivo e ondulante de cores conhecidas. Dourado, açafrão, vermelho, castanho, e um borrifo muito leve de cinzento, as cores pareciam viver e fundir-se umas nas outras, quando os monges se moviam. No ponto mais alto do Templo estava sentado Sua Santidade, O Mais Precioso, a Décima-Terceira Encarnação do Dalai Lama, a Figura mais reverenciada em todo o mundo budista. Observei por algum tempo, ouvi o canto dos lamas de voz profunda, acentuado pela voz alta dos pequenos cheias.
Observei as nuvens de incenso que vibravam em sintonia com as vibrações mais profundas. As luzes tremulavam na escuridão e eram substituídas, o incenso se queimava e era substituído por novos bastões, em meio a um chuveiro de fagulhas vermelhas. Eu via as sombras a dançar, crescendo e morrendo sobre as muralhas, observava os minúsculos pontos refulgentes de luz, até não saber mais onde me encontrava, nem o que fazia. Um lama idoso, curvado sob o peso dos anos muito além da duração normal, seguia devagar entre seus Irmãos da Ordem. Ao redor, havia trapas atentos, com bastões de incenso e uma luz à mão. Inclinando-se para O Mais Precioso, e voltando-se devagar em mesura para cada um dos Quatro Cantos da Terra, ele finalmente se pôs no meio da assembléia de monges, dentro do Templo. Com voz surpreendentemente forte para criatura tão idosa, entoou:
—Ouçam as Vozes de nossas Almas. Este é o Mundo de Ilusão. À Vida sobre a Terra é apenas um sonho, pois no tempo da Vida Eterna ela não passa de um piscar de olhos. Ouçam as Vozes de nossas Almas, todos os que estão muito abatidos. Esta vida de Sombra e Tristeza terminará, e a Glória da Vida Eterna brilhará sobre os justos. O primeiro bastão de incenso é aceso, para que uma Alma Perturbada possa ser guiada. Um trapa adiantou-se, fez uma mesura para O Mais Precioso, antes de se voltar devagar e reverenciar, a seu turno, os Quatro Cantos da Terra. Acendendo um bastão de incenso, voltou-se novamente e apontou com ele para os Quatro Cantos.
O cantar, em vozes profundas, ergueu-se novamente e morreu, sendo acompanhado pela voz alta dos jovens chelas. Um lama corpulento recitou certas passagens, pontuando-as com o toque de sua Sineta de Prata, com um vigor que era motivado apenas pela presença de O Mais Precioso. Voltando ao silêncio, olhou disfarçadamente ao redor, para ver se seu desempenho merecera a devida aprovação. O lama idoso adiantou-se mais uma vez, fez uma mesura para O Mais Precioso e para as Estações. Outro trapa se apresentava, atento, aflito na Presença do Chefe do Estado e da Religião. O lama idoso entoou:
—Ouçam as Vozes de nossas Almas. Este é o Mundo de Ilusão. A Vida sobre a Terra é a Prova, para que nos possamos purificar das impurezas e subir sempre. Ouçam as Vozes de nossas Almas, todos os que estão em dúvida. Logo a recordação da vida na Terra passará, e haverá Paz e libertação quanto ao Sofrimento. O segundo bastão de incenso é aceso, para que uma Alma em dúvida possa ser guiada.
Lá embaixo, o canto dos monges aumentou e tomou vulto novamente, enquanto o trapa acendia o segundo bastão e executava o ritual de inclinação para O Mais Sagrado, apontando o incenso para cada Canto a seu turno. As muralhas do Templo pareciam respirar, oscilar em uníssono com o canto. Ao redor do lama idoso, formas fantasmagóricas se reuniam: eram os que haviam recentemente passado desta vida sem estarem preparados, e agora vagavam sem orientação, sozinhos. As sombras trêmulas pareciam saltar e contorcer-se como almas em tormento; minha própria consciência, minhas percepções, até mesmo meus olhos, tremularam entre dois mundos.
Em um, eu fitava com atenção extasiada a marcha do culto, lá embaixo. Em outro, via o “entre-mundos”, onde as almas recém-partidas tremiam de medo, diante da estranheza do Desconhecido. Almas isoladas, envoltas em escuridão úmida e pegajosa, choravam em seu terror e solidão. Separadas umas das outras, separadas de todos os demais devido à sua falta de crença, eram tão imóveis como um iaque atolado num pântano das montanhas. Na escuridão viscosa do “entre mundos”, que era aliviada apenas pela débil luz azul vinda daquelas formas fantasmagóricas, penetrava o canto, o Convite, do lama idoso:
— Ouçam as Vozes de nossas Almas. Este é o Mundo de Ilusão. Assim como o Homem morreu na Realidade Maior para poder nascer na Terra, também tem de morrer na Terra para poder renascer na Realidade Maior. Não há Morte, apenas o Nascimento. As dores da Morte são as dores do Nascimento. O terceiro bastão de incenso é aceso, para que uma Alma em Tormento possa ser guiada.
À minha consciência veio uma ordem telepática: “Lobsang! Onde estás? Venha ter comigo, agora!” Com um solavanco, voltando a este mundo mediante grande esforço, cambaleei, pondo-me sobre os pés entorpecidos, e segui pela pequena porta. “Já vou, Respeitável Senhor!” pensei, para meu guia. Esfregando os olhos, que marejavam ao ar frio da noite, após o calor e fumaça do incenso no Templo, segui trôpego e apalpei o caminho acima do chão, até onde meu guia esperava, numa sala bem por cima da porta principal. Éle sorriu ao me ver.
—Ora, Lobsang! — exclamou. — Está com o aspecto de quem viu um fantasma!
—Senhor! — respondi. — Vi diversos.
—Esta noite, Lobsang, ficaremos aqui — disse o Lama. — Amanhã, iremos visitar o Oráculo do Estado. Você vai achar a experiência interessante, mas agora é o momento de comer, primeiramente, e depois dormir…
Enquanto comíamos, eu me achava preocupado, pensando no que vira no teto, imaginando como este podia ser “o Mundo de Ilusão”. Terminei rapidamente o jantar, seguindo para o quarto que me fora destinado. Envolvendo-me no manto, deitei-me e logo dormi. Sonhos, pesadelos e impressões estranhas me atormentaram durante toda a noite. Sonhei que estava sentado, inteiramente desperto, e que grandes globos de alguma coisa vinham ter comigo, como a poeira de uma tempestade. Eu estava sentado, e de grande distância pequenos fragmentos surgiam, tornando-se cada vez maiores, até eu poder ver que os globos, que já eram então, exibiam todas as cores. Tornando-se do tamanho da cabeça de um homem, vinham rapidamente em minha direção e logo se afastavam.
Em meu sonho — se era mesmo sonho! — não conseguia voltar a cabeça a fim de ver para onde tinham ido; havia, apenas, aqueles globos sem fim, vindos de algum lugar desconhecido, passando perto de mim, seguindo para — para onde? Fiquei imensamente espantado com o fato de que nenhum deles colidisse comigo. Pareciam sólidos, mas ainda assim não tinham substância. Com subtaneidade tão horrível que me pôs inteiramente desperto, uma voz se fez ouvir, por trás:
—Assim como um fantasma vê as paredes grossas e sólidas do Templo, você também está vendo agora!
Estremeci de apreensão; estaria morto! Teria morrido durante a noite? Mas por que motivo me preocupava com a “morte”? Sabia que a chamada morte era apenas o renascimento. Continuei deitado e, com o tempo, adormeci, outra vez. Todo mundo estremeceu, rangendo e desmoronando, de modo louco. Eu me sentei, com grande alarme, julgando que o Templo caía ao redor de mim. A noite era escura, tendo apenas a radiação fantasmagórica das estrelas no céu a apresentar levíssimos pontos de luz. Olhando diretamente à frente, senti que os cabelos se me punham em pé, tamanho o susto. Fiquei paralisado, não conseguia mover um só dedo e, pior ainda, aquele mundo se tornava cada vez maior.
A pedra lisa das muralhas fazia-se mais bruta, transformava-se em rocha porosa parecida com a dos vulcões extintos. Os buracos na parede aumentavam sempre, e eu vi que eram povoados por criaturas de pesadelo, que eu observara
mediante o bom microscópio alemão do Lama Mingyar Dondup. O mundo crescia sem parar, criaturas assustadoras adquiriam dimensões imensas, tornando-se tão vastas que, com a passagem do tempo, eu podia ver-lhes os poros! O mundo crescia sempre, e então compreendi que me tornava cada vez menor. Percebi que uma tempestade de poeira estava soprando. De algum lugar atrás de mim os grãos de poeira vinham estrugindo, mas nenhum deles me tocava.
Com rapidez, tornavam-se cada vez maiores. Alguns eram tão grandes quanto a cabeça de um homem, outros tão grandes quanto os Himalaias. Ainda assim, nenhum deles me tocava. Tornavam-se ainda maiores, até que perdi toda a noção de tempo. Em meu sonho, parecia estar deitado entre as estrelas, frio e imóvel, enquanto uma galáxia após outra passava, cintilante, e desaparecia na distância. Não sei por quanto tempo fiquei assim. Pareceu-me que ali permaneci deitado por toda uma eternidade. Finalmente, toda uma galáxia, toda uma série de Universos, veio diretamente em minha direção. “Isto é o fim!” Pensei, de modo vago, quando aquela multidão de mundos colidiu comigo.
—Lobsang! Você foi para os Campos Celestiais? — perguntou a Voz, retumbante e ecoando em todo o Universo, reverberando nos mundos… e voltando a ecoar nas paredes de minha câmara de pedra. Com um esforço penoso, abri os olhos e procurei focalizá-los. Acima de mim havia uma constelação de estrelas brilhantes, que de algum modo pareciam conhecidas. Estrelas que desapareceram devagar, sendo substituídas pelo semblante benigno do Lama Mingyar Dondup. Ele, com gentileza, me sacudia. A luz clara do sol iluminava o quarto. Um feixe de luz solar iluminava fragmentos de poeira que rebrilhavam com todas as cores do arco-íris.
—Lobsang! A manhã já vai alta. Eu o deixei dormir, mas chegou o momento de comer e em seguida partiremos.
Fatigado, pus-me em pé. Estava “escangalhado” aquela manhã; a cabeça parecia grande demais, o espírito ainda se achava nos “sonhos” da noite. Reunindo os poucos pertences na parte dianteira do manto, deixei o quarto à procura de tsampa, nosso alimento básico. Desci pela escada de nós, bem seguro, com medo de cair. Desci até onde os monges-cozinheiros se encontravam.
—Vim buscar comida, — anunciei, com humildade.
—Comida? A esta hora da manhã? Vá dando o fora! – berrou o monge-cozinheiro-chefe. Estendendo o braço, estava prestes a me desferir um golpe, quando outro monge cochichou, em voz roufenha:
—Ele está com o Lama Mingyar Dondup! O monge-cozinheiro-chefe deu um salto, como se houvesse sido mordido por um marimbondo, e em seguida berrou para o ajudante:
—E então? O que esperas? Dá ao jovem cavalheiro o desjejum dele!
Em condições normais, eu devia ter cevada suficiente na bolsa de couro que todos os monges carregam consigo, mas como estávamos fazendo visitas, tal suprimento se esgotara. Todos os monges, quer sejam chelas, trapas ou lama, carregam a bolsa de couro com cevada, bem como uma tigela na qual comê-la. O tsampa era misturado com chá amanteigado, proporcionando assim o alimento principal do Tibete. Se as lamaserias tibetanas imprimissem cardápios, haveria apenas uma palavra a ser impressa nos mesmos: tsampa! Um tanto retemperado apos a refeição, fui ter com o Lama Mingyar Dondup e partimos a cavalo para a Lamaseria do Oráculo do Estado.
Não conversamos durante a viagem, e meu cavalo tinha um movimento singular a requerer toda minha atenção, se eu quisesse continuar montado. Enquanto seguíamos pela Estrada de Lingkor os peregrinos, vendo a alta patente do manto de meu guia, pediam-lhe a bênção. Recebendo-a, retomavam seu Circuito Sagrado, com o aspecto de quem já estivesse a meio caminho da salvação. Logo entrávamos a cavalo pelo Bosque de Salgueiros, chegando à trilha de pedra que dava para o Lar do Oráculo. No pátio, monges-criados ficaram com nossos cavalos, enquanto eu, finalmente, e cheio de satisfação, deslizava para o chão. O lugar estava cheio de gente. Os lamas de categoria mais elevada haviam vindo de todos os pontos do país para estarem presentes.
O Oráculo ia entrar em comunicação com os Poderes que governavam o mundo. Eu, mediante arranjo especial, por ordem especial de O Mais Precioso, deveria estar presente. Mostraram-nos onde dormir, eu ao lado do Lama Mingyar Dondup e não em dormitórios com muitos outros cheias. Ao passarmos por um pequeno templo, dentro do edifício principal, ouvi: “Ouçam as Vozes de nossas Almas. Este é o Mundo de Ilusão”.
—Senhor! — disse eu a meu guia, quando estávamos a sós. — Como é este o “Mundo de Ilusão”? Ele me olhou, sorrindo.
—Bem — respondeu —, o que é verdadeiro? Você toca esta muralha, e seu dedo é detido pela pedra. Assim sendo, você raciocina que a muralha existe como sólido, que nada pode penetrar. Para além das janelas, as cordilheiras dos Himalaias se apresentam firmes, como se fossem a coluna dorsal da Terra. Um fantasma, entretanto, ou você, no plano astral, pode mover-se tão livremente em meio à pedra das montanhas quanto o pode pelo ar.
—Mas como é essa “ilusão”? — perguntei. — Ontem à noite tive um sonho, que realmente foi ilusão; empalideço, em pensar nele! Meu guia, com infinita paciência, ouviu enquanto eu lhe narrava o sonho, e assim que terminei ele, disse:
—Terei de falar-lhe sobre o Mundo de Ilusão. Não neste momento, porém, porque precisamos visitar o Oráculo. O Oráculo do Estado era um homem surpreendentemente jovem, magro, de aparência muito doentia. Fui-lhe apresentado, e seus olhos escaldantes me perfuraram, fazendo comichões de pavor percorrer minha espinha.
—Sim! É você, eu o reconheço bem, — afirmou. — Você tem o poder interno; terá também o conhecimento. Mais tarde conversaremos. O Lama Mingyar Dondup, meu amado amigo, pareceu muito satisfeito comigo.
—Você passa por todas as provas, Lobsang, todas as vezes! — comentou. — Agora, venha, vamos retirar-nos para o Santuário dos Deuses e conversar. Sorria para mim, enquanto tomávamos aquele caminho. —Conversar, Lobsang, — observou — a respeito do Mundo de Ilusão.
O Santuário se achava deserto, como meu guia já sabia antecipadamente. Lâmpadas tremeluziam diante das Imagens Sagradas, fazendo com que suas sombras dessem saltos e se movessem, como em alguma dança exótica. A fumaça do incenso fazia espirais, subindo, formando uma nuvem baixa acima de nós. Juntos nós nos sentamos ao lado do Atril do qual o Leitor fazia a leitura dos Livros Sagrados. Ficamos sentados, na atitude de contemplação, as pernas cruzadas, os dedos entrelaçados.
—Este é o Mundo de Ilusão — disse meu guia. — Por conseqüência, chamamos as Almas para que nos escutem, por que apenas elas se encontram no Mundo de Realidade. Nós dizemos, como você bem sabe, “ouçam as Vozes de nossas Almas”, e não dizemos “ouçam nossas Vozes físicas”. Escute, e não interrompa, porque esta é a base de nossa Crença Interna. Como explicarei depois, as pessoas que não se acham suficientemente evoluídas precisam, de início, ter uma crença que as sustenha, fazendo-as sentir que um Pai ou Mãe benevolente as vigia e protege. Somente quando se chegou à etapa apropriada é que se pode aceitar o que vou dizer agora. Olhei para meu guia, achando que ele era todo o mundo para mim, desejando que pudéssemos estar sempre juntos.
—Nós somos criaturas do Espírito — afirmou ele —, somos como cargas elétricas dotadas de inteligência. Este mundo, esta vida, é o Inferno, o lugar de provas, onde nosso Espírito se purifica, pelo sofrimento de aprender a controlar nosso grosseiro corpo carnal. Assim como um fantoche é controlado por cordéis manipulados pelo Senhor dos Fantoches, também nosso corpo carnal é controlado por cordões de força elétrica de nosso Eu Maior, nosso Espírito. Um bom Senhor de Fantoches pode criar a ilusão de que os bonecos de madeira são dotados de vida, que podem agir por vontade própria. Do mesmo modo, nós, enquanto não aprendemos mais, achamos que nosso corpo carnal é a coisa única que importa. Na atmosfera sufocante para o espírito, a da Terra, esquecemos que temos a Alma que realmente nos controla, julgamos estar fazendo as coisas por nossa própria vontade livre, e que somos responsáveis apenas perante nossa “consciência”. Assim, Lobsang, temos a primeira ilusão, a ilusão de que o fantoche, o corpo carnal, é o que importa. Ele se deteve, notando minha expressão de perplexidade.
—Bem? — perguntou. O que o perturba?
—Senhor! — disse eu. — Onde estão meus cordéis de força elétrica? Não posso ver coisa alguma a ligar-me com meu Eu Maior? Ele ria, ao responder:
—Você pode ver o ar, Lobsang? Não pode, enquanto estiver no corpo carnal. Inclinando-se à frente, apanhou meu manto, e quase me matou de susto, enquanto eu lhe fitava os olhos penetrantes.
—Lobsang! — disse ele com severidade. — O seu cérebro se evaporou todo? Você é realmente feito de osso, do pescoço para cima? Esqueceu-se do Cordão de Prata, aquela coleção de linhas de força elétrica, que o ligam… aqui… à sua alma? Francamente, Lobsang, você está no Mundo de Ilusão! Senti que o meu rosto se punha escarlate. Eu, naturalmente, tinha conhecimento do Cordão de Prata, esse fio de luz azulada que liga o corpo físico ao espiritual. Muitas vezes, quando viajando no plano astral, eu observava o Cordão bruxuleando e pulsando com luz e vida. Era como o cordão umbilical que liga a mãe e a criança recém nascida, só que a “criança” que é o corpo físico não poderia existir um só momento, se o Cordão de Prata fosse cortado. Ergui o olhar, e meu guia estava pronto para prosseguir, após minha interrupção.
—Quando estamos no mundo físico, inclinamo-nos a pensar que somente o mundo físico importa. Esse é um dos dispositivos de segurança do Eu Maior; se recordássemos o Mundo Espiritual com sua felicidade, somente conseguiríamos continuar aqui mediante um grande esforço de vontade. Se nos recordássemos de vidas anteriores, quando, talvez, fomos mais importantes do que nesta vida, não teríamos a humildade necessária. Vamos mandar trazer chá, e eu lhe mostrarei, ou lhe contarei, a vida de um chinês, desde sua morte ao renascimento e à morte e chegada ao Mundo Seguinte. O lama estendeu a mão, para tocar a pequena sineta de prata no Santuário, e logo se deteve, ao observar minha expressão.
—Bem? — perguntou. — Qual é sua pergunta?
—Senhor! — respondi. — Por que um chinês? Por que não um tibetano?
—Porque — respondeu ele — se eu disser “um tibetano” você procurará ligar o nome a alguém que conhece… e obterá resultados incorretos. Dito isso, tocou a campainha e um monge-criado trouxe chá para nós. Meu guia fitou-me, com a expressão pensativa.
—Você compreende que ao tomar este chá estamos engolindo milhões de mundos? — perguntou. — Os fluidos possuem um teor molecular mais esparso. Se pudéssemos ampliar as moléculas deste chá, você verificaria que elas rolam como as areias, ao largo de um lago turbulento. Até mesmo um gás, ou o próprio ar, se compõe de moléculas, de partículas diminutas. Entretanto, isso é uma digressão, e íamos falar sobre a morte e vida de um chinês, — disse, dando fim ao chá e esperando, enquanto eu terminava o meu.
—Seng era um velho mandarim, — disse meu guia. — Sua vida fora afortunada e agora, ao anoitecer dessa vida, sentia grande contentamento. A família era grande, as concubinas e escravos numerosos. O próprio Imperador da China o tinha em seu favor. Ao fitar com olhos idosos e míopes a janela do quarto, mal conseguia discernir os belos jardins com o canto dos pássaros que regressavam às árvores, ao encerramento do dia. Seng deitou-se, apoiado nas almofadas. Dentro de si, sentia os dedos da Morte, afrouxando seus laços com a vida. Devagar, o sol de vermelho cor de sangue se punha, por trás do pagode antigo. Devagar, o velho Seng inclinou-se nas almofadas, a respiração difícil e ruidosa passando entre os dentes. A luz do sol esmaeceu, as pequenas lâmpadas no quarto foram acesas, mas o velho Seng já se fora — já se fora com os últimos raios do sol. Meu guia olhou para mim, para ter certeza de que eu prestava atenção, e depois prosseguiu:
—O velho Seng estava caído em meio às almofadas, com os sons corporais rangendo e arquejando, chegando ao silêncio. O sangue já não percorria as artérias e veias, os fluidos do corpo já não gorgolejavam. O corpo do velho Seng estava morto, encerrado, sem mais serventia. Mas um clarividente, se estivesse presente, teria visto uma luz azul e difusa formar-se ao redor do corpo do velho Seng. Formar-se, e depois erguer-se acima do corpo, flutuando horizontalmente por cima, ligada pelo Cordão de Prata que se afinava. Gradualmente, o Cordão de Prata tornou-se fino e se separou. A Alma, que já fora o velho Seng, flutuou, afastando-se, derivando como uma nuvem de fumaça de incenso, desaparecendo sem esforço pelas paredes. O lama encheu novamente a chávena, verificou se eu também tinha chá, e prosseguiu:
—A Alma seguiu vagando por reinos, por dimensões que a mente materialista não pode compreender. Finalmente, alcançou um jardim maravilhoso, pontilhado de edifícios imensos, em um dos quais se deteve, e ali a Alma que já fora o velho Seng entrou e seguiu para um andar refulgente. Uma alma, Lobsang, em seu próprio ambiente, é tão sólida quanto você, neste mundo. A alma, no mundo da alma, pode ser confinada por paredes, e andar sobre o chão. Ali, a alma tem capacidades e talentos diferentes daqueles que conhecemos na Terra. Essa Alma prosseguiu andando, e finalmente entrou em pequeno cubículo. Sentando-se, fitou a parede à frente. De repente, a parede pareceu sumir, e em seu lugar viu cenas, as cenas de sua vida. Viu aquilo a que chamamos o Registro Akáshico, isto é, o Registro de tudo que já aconteceu, e que pode ser visto prontamente por aqueles que se acham capacitados. Também é visto por todos que passam da vida terrena à vida do Além, pois o homem vê o Registro de seus próprios êxitos e fracassos. O homem vê o seu passado, e julga a si mesmo! Não existe juiz mais severo do que o próprio Homem. Nós não nos sentamos tremendo diante de um Deus; sentamo-nos, e vemos tudo que fizemos e tudo quanto já tivemos a intenção de fazer. Eu estava sentado, em silêncio, achando que tudo aquilo era de grande interesse, e poderia ficar ouvindo horas seguidas — era muito melhor do que o trabalho tedioso com as lições!
—A Alma que fora o velho Seng, o mandarim chinês, sentou-se e viu novamente a vida que ele, sobre a Terra, julgara tão bem sucedida — prosseguiu meu guia. — Viu, e teve o pesar de ver suas muitas faltas, e depois se levantou e deixou o cubículo, seguindo rapidamente para uma sala maior, onde homens e mulheres do Mundo ‘das Almas o aguardavam. Em silêncio, sorrindo com compaixão e compreensão, eles esperavam sua aproximação, seu pedido para que o guiassem. Sentado em sua companhia, narrou-lhes suas faltas, as coisas que tentara fazer, quisera fazer, e não conseguira.
—Mas eu pensei que o senhor disse que ele não foi julgado, que se julgou a si próprio! — observei, depressa.
—É assim, Lobsang — respondeu meu guia. — Tendo visto seu passado e seus enganos, ele se aproximava agora daqueles Conselheiros, a fim de receber-lhes as sugestões… Mas não interrompa, escute e deixe suas perguntas para depois. —Como estava dizendo — continuou o lama —, a Alma sentou-se com os Conselheiros, narrando-lhes seus fracassos, falando-lhes das qualidades que ele tinha de “criar” em sua Alma, antes de poder evoluir mais. Em primeiro lugar, viria o regresso para ver seu corpo, e depois um período de descanso … anos ou séculos… e então seria auxiliado a encontrar condições tais como as que se mostravam essenciais para seu progresso maior. A Alma que fora o velho Seng voltou à Terra, para fitar seu corpo morto, já pronto para o sepultamento. E então, não sendo mais a Alma do velho Seng, porém uma Alma pronta para o descanso, ele regressou à Terra do Além. Por período indeterminado, descansou e se recuperou, estudando as lições das vidas anteriores, preparando-se para a vida que viria. Aqui, nesta vida além da morte, os artigos e substâncias eram tão sólidos à seu tato quanto haviam sido sobre a Terra. Ele repousou, até ficarem preparados o tempo e as condições.
—Eu gosto disso! — exclamei. — Acho de grande interesse. Meu guia sorriu para mim, antes de prosseguir:
—Em algum tempo predeterminado, a Alma que Espera foi chamada e levada para o Mundo da Humanidade por alguém cuja tarefa era a execução desse serviço. Eles se detiveram, invisíveis aos olhos dos que tinham corpos carnais, observando os que iam ser os pais, examinando a casa, avaliando as probabilidades que aquela casa proporcionaria aos recursos desejados para aprender lições que tinham de ser aprendidas dessa feita. Satisfeitos, eles se retiraram. Meses depois, a Futura Mãe sentiu algo em seu corpo, quando a Alma ingressou, e a criança passou a viver. Com o tempo, a Criança nasceu para o Mundo do Homem. A alma que já animara o corpo do velho Seng lutava agora, outra vez, com os nervos e cérebro relutantes da criança Lee Wong, vivendo num ambiente humilde, em uma aldeia de pescadores da China. Mais uma vez as vibrações elevadas de uma Alma foram convertidas para as vibrações de uma oitava inferior de um corpo carnal. Eu permanecia sentado, pensando. Depois, pensei mais. Finalmente, disse:
—Honrado Lama, se é assim, por que motivo as pessoas receiam a morte, que é apenas uma libertação quanto aos problemas da terra?
—Aí temos uma pergunta sensata, Lobsang, — respondeu meu guia.
— Se nós sequer nos lembrássemos das alegrias do Outro Mundo, muitos de nós não conseguiriam tolerar as vicissitudes aqui, em conseqüência das quais temos, implantado em nós, o medo à morte. Dedicando-me um olhar de esguelha e trocista, ele observou:
—Alguns de nós não gostam da escola, não gostam da disciplina que é tão necessária na escola. Entretanto, quando a gente cresce e se torna adulta, os benefícios da escola tornam-se evidentes. Não daria certo fugir da escola e esperar progredir no estudo; tampouco se aconselha dar fim à vida, antes do tempo destinado a cada um. Fiquei pensando sobre isso, porque poucos dias antes um velho monge, analfabeto e doente, se atirara de um alto eremitério. Homem velho e azedo que fora, sempre recusara todas as ofertas de ajuda. Sim, o velho Jigme estava melhor, tendo-se retirado, pensava eu. Melhor para si mesmo, melhor para os outros.
—Senhor! — disse eu. — Nesse caso o monge Jigme errou, quando deu fim à própria vida?
—Sim, Lobsang, errou muito, — respondeu meu guia. — Um homem ou mulher tem certo tempo sobre a Terra. Se der fim à vida antes desse momento, terá de regressar quase imediatamente. Assim, temos o espetáculo de uma criança que nasce para viver apenas alguns meses. Será a alma de um suicida, que regressa para apoderar-se do corpo, e assim viver o resto do tempo que deveria ter sido vivido antes. O suicídio nunca se justifica; constitui uma ofensa grave contra a própria pessoa, contra o Eu Maior da pessoa.
—Mas, senhor — disse eu —, que diz do japonês de alto nascimento, que comete suicídio cerimonial a fim de expiar a vergonha da família? Ele, por certo, é um homem corajoso, ao fazer isso.
—Não, Lobsang — disse meu guia, do modo mais enfático. — Não é assim. A bravura não está em morrer, mas em viver, diante da vicissitude, diante do sofrimento. Morrer é fácil. viver… isso é um ato de coragem! Nem mesmo a demonstração teatral de orgulho, o “Suicídio Cerimonial”, pode cegar alguém quanto ao erro do mesmo. Estamos aqui para aprender, e só podemos aprender vivendo o tempo que nos foi dado. O suicídio nunca se justifica! Voltei a pensar no velho Jigme. Era uma criatura muito idosa, quando se matara, de modo que quando voltasse, ao que eu pensava, seria apenas para uma estada curta.
—Honrado Lama — perguntei —, qual é o objetivo do medo? Por que temos de sofrer tanto, pelo medo? Eu já descobri que as coisas que mais temo jamais acontecem, mas ainda assim eu as temo! O lama riu, e disse:
— Isso acontece com todos nós. Nós receamos o Desconhecido. No entanto, o medo é necessário. É ele que nos acicata a prosseguir, quando, de outra forma, seríamos preguiçosos. O medo confere vigor adicional, com o qual evitamos os acidentes. O medo é um propulsor que nos confere mais poder, mais incentivo, e faz com que sobrepujemos nossa própria inclinação à preguiça. Você não estudaria nem faria seus trabalhos escolares, se não tivesse medo do professor, ou medo de parecer estúpido, diante dos colegas.
Os monges entravam no Santuário; chelas corriam de um lado para outro, acendendo mais lâmpadas de manteiga, mais incenso. Nós nos pusemos em pé e seguimos para o frescor da noite, onde uma brisa leve brincava com as folhas dos salgueiros. As grandes trombetas soavam, na Potala tão distante, e muito fracos os ecos vinham pelas muralhas da Lamaseria do Oráculo do Estado.
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