sábado, 22 de outubro de 2016

O HOMEM DAS CAVERNAS - CONTINUAÇÃO



A Caverna dos Antigos (3)

Posted by Thoth3126 on 21/10/2016

Este é um livro que trata do Oculto e dos Poderes do Homem. É livro simples, no sentido de que nele não há “palavras estrangeiras”, palavras em sânscrito, nem coisa alguma de línguas mortas. A pessoa média quer SABER as coisas, e não ficar a adivinhar palavras que o autor médio tampouco compreende!
Se um autor sabe trabalhar, pode escrever, sem ter de disfarçar sua falta de conhecimento com o emprego de uma língua estrangeira. Um número demasiado de pessoas deixa-se envolver pela confusão. As leis da Vida são realmente simples; não há necessidade alguma de revesti-las de cultos místicos ou pseudo-religiões. Tampouco existe qualquer necessidade de que alguém afirme ter tido “revelações divinas”. QUALQUER PESSOA pode obter as mesmas “revelações”, se se esforçar por alcança-las…
Edição e imagens: Thoth3126@protonmail.ch

T. LOBSANG RAMPA, e o livro “A CAVERNA DOS ANTIGOS”

Nenhuma religião tem em si as Chaves do Céu, nem pessoa alguma será condenada para sempre, por ter entrado em uma igreja com o chapéu na cabeça, ao invés de tirar os sapatos. À entrada das lamaserias tibetanas, lê-se a inscrição: “Mil monges, mil religiões”.

Qualquer que seja nossa crença, se ela englobar o “faze ao próximo o que queres que te seja feito”, teremos êxito, quando soar o Chamamento final. Alguns dizem que o Conhecimento Interior só pode ser obtido ingressando-se neste ou naquele culto, ao mesmo tempo em que se faça o pagamento de uma contribuição substancial.
As Leis da Vida dizem: “Procura e encontrarás”. Este livro é o fruto de toda uma vida, de ensinamentos obtidos nas grandes lamaserias do Tibete e de poderes conquistados por uma observância rigorosa das Leis. Trata-se de conhecimento transmitido pelos Antigos, e se acha inscrito nas Pirâmides do Egito, nos Altos Templos da Cordillheira dos Andes e no maior de todos os repositorios de conhecimentos ocultos do mundo, o Planalto do Tibete – T. LOBSANG RAMPA[Nasceu: Cyril Henry Hoskin-8 April 1910, em Plympton, Devon, United Kingdom – Morte: 25 January 1981 (aged 70) Calgary, Alberta, Canada]

Capítulo 3

A Lamaseria do Oráculo do Estado era pequena, compacta e muito isolada. Uns poucos chelas pequenos brincavam com toda liberdade. Nenhum grupo de trapas permanecia indolentemente no pátio banhado de sol, passando a hora do meio-dia em conversa ociosa. Velhos — velhos lamas, também! — encontravam-se em maioria, naquele lugar. Homens idosos, cabelos brancos e curvados sob o peso dos anos, eles andavam devagar, cuidando da vida. Aquele era o Lar dos Videntes. Aos lamas idosos, de modo geral, e ao próprio Oráculo, fora confiada a tarefa da Profecia, das Predições. Nenhum visitante entrava ali sem convite, nenhum viajante perdido batia à porta procurando descanso ou comida. Tratava-se de lugar receado por muitos e proibido a todos, a não ser àqueles especialmente convidados.
Meu guia, o Lama Mingyar Dondup, era a exceção: a qualquer momento, podia entrar e verificar que era realmente um visitante bem-vindo. Um bosque gracioso de árvores conferia à Lamaseria a solidão e a reserva com relação a olhares curiosos. Muralhas fortes de pedra proporcionavam aos edifícios a proteção quanto aos super curiosos, se surgisse algum que com sua curiosidade ociosa se arriscasse a incorrer na ira do poderoso Lama Oracular. Salas cuidadosamente mantidas eram reservadas para Sua Santidade, O Mais Precioso, que com tanta freqüência visitava aquele Templo do Conhecimento. A atmosfera era calma, a impressão geral de quietude, de homens que cuidavam placidamente de suas tarefas importantes. Tampouco havia qualquer oportunidade para brigas, para a admissão de intrusos ruidosos.
O Lugar era patrulhado pelos poderosos Homens de Kham, os homens enormes, muitos dos quais com dois metros de altura, e nenhum deles pesando menos do que cento e dez quilos, empregados em todo o Tibete como monges-policiais, encarregados da manutenção da ordem nas comunidades monásticas, que às vezes eram compostas de milhares de monges. O monge policial andava por ali, constantemente alerta, constantemente em guarda. Portando cacetetes poderosos, constituíam certamente uma visão assustadora para os donos de consciências culpadas. O manto de um monge não encobre necessariamente um homem religioso; há transgressores e preguiçosos em todas as comunidades, de modo que os Homens de Kham se mantinham ocupados.

Os edifícios da Lamaseria também estavam à altura de seu propósito. Não se viam edifícios altos ali, nenhum poste comprido e com entalhes para escalar; aquilo era para homens idosos, homens que haviam perdido a elasticidade da juventude, homens cujos ossos eram fracos. Os corredores apresentavam acesso fácil, e os de idade mais avançada residiam no pavimento térreo. O próprio Oráculo do Estado também vivia no térreo, ao lado do Templo de Adivinhação. Ao redor, alojavam-se os homens mais idosos, os mais sábios. E o monge-policial-chefe dos Homens de Kham.


—Vamos ver o Oráculo, Lobsang, — disse meu guia. — ele demonstrou grande interesse por você, e está preparado a dedicar-lhe grande parte de seu tempo. O convite — ou ordem — veio encher-me da maior tristeza; qualquer visita a um astrólogo ou “vidente”, no passado, somente me trouxera más notícias, mais sofrimento, mais confirmação de dificuldades no futuro. De um modo geral, igualmente, eu tinha de usar o meu melhor manto, e sentar-me como um pato empalhado, enquanto ouvia algum velho tagarela; balindo uma série de coisas conhecidas, que eu preferia não ter de escutar. Olhei para ele, com ar desconfiado; o Lama se esforçava por esconder um sorriso, ao retribuir o olhar. Como era óbvio, pensei com azedume, ele estivera lendo meus pensamentos! Prorrompeu em risada, ao dizer:
—Vá como está, o Oráculo não se deixa absolutamente impressionar pelo estado do manto da pessoa. Ele sabe mais a seu respeito do que você mesmo! Ouvindo isso, minha tristeza aumentou, e eu me pus a imaginar o que ia ouvir em seguida. Seguimos pelo corredor, saindo para o pátio interno. Olhei as cordilheiras imensas, sentindo-me como alguém que ia ser executado. Um monge policial, carrancudo, aproximou-se de nós, e a mim se parecia mais uma montanha em movimento. Reconhecendo meu guia, prorrompeu em sorrisos de acolhimento, com mesuras profundas.
—Prostrações à teus Pés de Lotos, Santo Lama, — disse. — Honra-me, permitindo que te leve à Sua Reverência, o Oráculo do Estado. Acertou o passo a nosso lado, e tenho a certeza de que o chão estremecia à sua marcha pesada. Dois lamas estavam ao lado da porta, lamas e não monges-guardas comuns, e à nossa aproximação puseram-se de lado, para que pudéssemos entrar.
—O Santo os aguarda, — disse um deles, sorrindo para meu guia.
—Ele anseia por tua visita, Senhor Mingyar, — disse o outro. Entramos, e nos encontramos num aposento de iluminação um tanto fraca. Por alguns segundos, pude distinguir apenas poucas coisas; meus olhos haviam sido ofuscados pela luz brilhante do sol, no pátio. Gradualmente, enquanto minha visão voltava ao normal, percebi uma sala vazia, tendo apenas dois tapetes nas paredes e um pequeno turíbulo, que fumegava a um canto. No centro da sala, sobre uma almofada simples, estava sentado um homem muito jovem. Parecia magro e frágil, e fiquei realmente espantado ao compreender que aquele era o Oráculo do Estado do Tibete. Tinha olhos um tanto esbugalhados, olhava para mim e via meu íntimo. Eu tinha a impressão de que ele via minha alma, e não meu corpo carnal. Meu guia, o Lama Mingyar Dondup, e eu prostramo-nos no cumprimento tradicional e prescrito, e depois nos pusemos em pé, assim permanecendo. Finalmente, quando o silêncio se tornava decididamente incômodo, o Oráculo falou:

—Bem-vindo, Senhor Mingyar, bem-vindo, Lobsang! — disse. Sua voz era um tanto alta, e não se mostrava forte, em absoluto; dava a impressão de vir de grande distância. Por alguns momentos, meu guia e o Oráculo falaram sobre questões de interesse comum; em seguida, porém, o Lama Mingyar Dondup fez uma mesura, voltou-se e deixou a sala. O Oráculo ficou a olhar-me, e disse, finalmente:
—Traga uma almofada, e sente-se perto de mim, Lobsang. Estendi a mão para uma das almofadas quadradas, encostadas em uma parede distante, e a coloquei de modo a poder sentar-me diante dele. Por algum tempo, fitou-me em silêncio um tanto soturno, mas, finalmente, quando eu já estava inquieto sob seu escrutínio, falou:
—Com que, então, você é Terça-Feira Lobsang Rampa! Nós nos conhecemos bem, em outra fase da existência. Agora, por ordem de O Mais Precioso, tenho de falar-lhe de vicissitudes que virão, dificuldades a vencer.
—Oh, Senhor! — exclamei. — Eu devo ter feito coisas horríveis nas vidas anteriores, para ter de sofrer assim na de agora. O meu carma, o meu Destino predestinado, parece ser mais duro do que o de qualquer outra pessoa.
—Não é assim — replicou ele —, e acontece um engano muito comum, quando as pessoas pensam que, devido a terem dificuldades nesta vida, estão obrigatoriamente sofrendo pelos passados de vidas anteriores. Se você aquecer o metal em uma fornalha, faz isso porque o metal errou e tem de ser punido, ou o faz para melhorar as qualidades do material? Fitou-me, com dureza, e acrescentou:
—Entretanto, o seu guia, o Lama Mingyar Dondup, falará sobre isso com você. Tenho de falar-lhe apenas do futuro.

Cidade de Lhasa e o palácio Potala

O Oráculo tocou uma sineta de prata, e um criado entrou, em silêncio. Seguindo até nós, colocou uma mesa muito baixa entre mim e o Oráculo do Estado e sobre a mesa depositou uma tigela ornamental de prata forrada, ao que parecia, por um tipo de porcelana. Dentro da tigela, brilhavam brasas de carvão, que emitiam um vermelho vivo, enquanto o monge-criado a fazia balançar no ar, antes de colocá-la diante do Oráculo. Com uma palavra murmurada, cujo significado não percebi, ele colocou uma caixa de madeira com muitos entalhes à direita da tigela, e partiu tão silenciosamente como viera.
Permaneci imóvel, pouco à vontade, imaginando o motivo pelo qual tudo isso tinha de acontecer comigo. Todos me diziam que eu ia levar uma vida difícil; e pareciam deleitar-se com isso. Agruras eram agruras, embora aparentemente eu não estivesse tendo de pagar pelos pecados de alguma vida anterior. Devagar, o Oráculo estendeu a mão à frente, abrindo a caixa. Com uma pequena colher de ouro, tirou um pó fino, que espargiu sobre as brasas vivas. A sala encheu-se de um nevoeiro azul e fino; notei que meus sentidos fraquejavam, a visão escurecia. De uma distância incomensurável, pareceu-me ouvir o bimbalhar de um grande sino. O som se aproximou mais, a intensidade aumentou até que julguei que minha cabeça ia estourar. A visão clareou, eu observei atentamente, enquanto uma coluna de fumaça se erguia da tigela, ininterrupta. Dentro da fumaça, vi movimentos, movimentos que se aproximavam e me engoliam, de modo que passei a fazer parte deles.
De alguma parte, para além de minha compreensão, a voz do Oráculo do Estado chegou a meus ouvidos, falando em tom monótono. Mas eu não necessitava de sua voz. Estava vendo o futuro, vendo-o de modo tão vívido quanto ele. Em certo ponto do Tempo, afastei-me e observei os acontecimentos de minha vida, que se desenrolavam diante de mim como se registrados em uma película de movimento constante. Minha infância, os fatos de minha vida, o caráter feroz de meu pai — tudo surgia à minha frente. Mais uma vez eu me achava sentado diante da grande Lamaseria em Chakpori. Mais uma vez senti as rodas duras da Montanha de Ferro, enquanto o vento me atirava do telhado da Lamaseria, com força capaz de quebrar ossos, pela encosta da montanha. A fumaça rodopiou e os quadros, o que chamamos “o Registro Akáshico”, prosseguiram.

Voltei a ver minha iniciação, cerimônias secretas envoltas em fumaça, quando eu ainda não fora iniciado. Nos quadros, vi quando partia na trilha comprida e solitária, para Chungking, na China. Uma estranha máquina girava e se sacudia no ar, levantando-se e caindo sobre os penhascos íngremes de Chungking. E eu… eu… estava nos controles da mesma! Mais tarde, vi revoadas de máquinas assim, com o Sol Crescente do Japão nas asas. Das máquinas caíam manchas negras, que iam ter à terra e explodiam em chamas e fumaça. Corpos estraçalhados eram atirados ao ar, e por algum tempo chovia sangue e fragmentos humanos do céu. Senti-me de coração pesado, aturdido, enquanto os quadros se moviam e me mostravam a mim mesmo, sendo torturado pelos japoneses. Vi minha vida, vi as dificuldades, a amargura. Mas o maior pesar de todos foi a traição e o mal de algumas pessoas no mundo ocidental que, como percebia, se dedicavam a destruir o trabalho pelo bem, tendo a única explicação de sua inveja.
Os quadros continuavam a se mover, e eu vi o curso provável de minha vida, antes de vivê-la. Como bem sabia, as probabilidades podem ser previstas do modo mais preciso. Apenas os detalhes de menor importância são diferentes, às vezes. As configurações astrológicas da pessoa determinam o limite do que se pode ser, e se pode suportar, assim como o controlador de um motor pode determinar suas velocidades mínima e máxima. “É uma vida dura para mim, não há dúvida!” pensei. Depois, saltei de tal modo que quase caí da almofada; uma mão fora posta em meu ombro. Ao me voltar, vi o rosto do Oráculo do Estado, que agora estava sentado atrás de mim. Sua expressão era da maior compaixão, de pesar pelo caminho difícil que eu tinha à frente.


—Você é muito psíquico, Lobsang, — disse. — Normalmente, tenho de descrever esses quadros para que sejam apreendidos. O Mais Precioso, como seria de esperar, está inteiramente certo.
—Tudo que desejo — respondi — é permanecer aqui, em paz. Por que motivo haveria de querer ir para o mundo ocidental, onde eles pregam tão ardorosamente a religião… e cortam a garganta da pessoa, pelas costas?
—Há uma Tarefa, meu amigo, — disse o Oráculo — tarefa que precisa ser cumprida. Você pode cumpri-la, a despeito de todas as oposições. Daí o preparo especial e difícil que está recebendo. Isso me encheu da maior tristeza, toda essa conversa sobre dificuldades e Tarefas. Tudo quanto eu queria era paz e tranqüilidade, e alguma diversão inofensiva, de vez em quando.
—Agora — disse o Oráculo — chegou o momento de regressar ao seu guia, pois ele tem muito a lhe dizer, e o está esperando. Pus-me em pé, e fiz uma mesura, antes de me voltar e deixar a sala. Lá fora, o enorme monge policial esperava para levar-me ao Lama Mingyar Dondup. Juntos seguimos, lado a lado, e eu pensei em um livro de ilustrações que vira, no qual um elefante e uma formiga seguiam pela trilha do mato, lado a lado…
—Bem, Lobsang! — disse o lama, quando entrei em sua sala. — Espero que não esteja abatido demais com tudo que viu. Sorria, fazendo-me um gesto para que me sentasse. —Alimento para o corpo, primeiro, Lobsang, e depois alimento para a Alma, — exclamou, rindo, enquanto tocava a sineta de prata para que o monge-criado trouxesse nosso chá. Evidentemente, eu chegara a tempo! As regras das lamaserias determinavam que ninguém devia olhar ao redor enquanto comia e que os olhos da pessoa não se deviam desviar, dedicando toda a atenção à Voz do Leitor. Ali, na sala do Lama Mingyar Dondup, não havia Leitor empoleirado lá em cima, lendo em voz alta os Livros Sagrados, a fim de afastar nossos pensamentos de coisas comuns tais como comida. Tampouco havia Inspetores severos, prontos a saltar sobre nós pela menor infração às regras.
Espiei pela janela, vendo os Himalaias que se estendiam sem fim à minha frente, pensando que breve chegaria a época em que eu não mais os poderia fitar. Eu recebera vislumbres do futuro — o meu futuro — e receava as coisas que vira claramente, mas que haviam estado, em parte, veladas na fumaça.
—Lobsang! — disse meu guia. — Você viu muito, mas muito mais ficou oculto. Se achar que não pode enfrentar o futuro planejado, nesse caso aceitaremos o fato… embora com tristeza… e você poderá permanecer no Tibete.
—Senhor! — respondi. — Certa feita me dissestes que o homem que parte para uma das Trilhas da Vida, mas que fraqueja e volta, não é um homem. Eu irei à frente, mesmo sabendo das dificuldades que encontrarei. Ele sorriu, assentindo com aprovação.

—Como esperava — afirmou —, você terá êxito, no fim.

—Senhor! — perguntei. — por que motivo as pessoas não vêm a este mundo com um conhecimento do que foram, nas vidas passadas, e o que deverão fazer, nesta vida? Por que deve haver o que chama “Conhecimento Oculto”? Por que não podemos nós todos saber tudo? O Lama Mingyar Dondup ergueu as sobrancelhas e riu.


—Você, por certo, quer saber muita coisa! — comentou. — E sua memória está falhando, também, porque recentemente eu lhe disse que nós, de modo normal, não nos lembramos das vidas passadas, porque isso seria aumentar nosso encargo neste mundo. Como dizemos, “a Roda da Vida gira, trazendo riqueza a um e pobreza a outro. O mendigo de hoje é o príncipe de amanhã”. Se não tivermos conhecimento de nossas vidas passadas, começamos tudo de novo, sem procurar tirar partido do que fomos em nossa última encarnação.
—Mas — perguntei — e o Conhecimento Oculto? Se todas as pessoas tivessem esse conhecimento, todas estariam melhor, progrediriam mais depressa. O meu guia sorriu, compadecido.
—Não é tão simples assim! — respondeu. Por momentos, permaneceu sentado, silente, e depois voltou a falar. —Existem poderes dentro de nós, dentro do controle de nosso Eu Maior, imensuravelmente maiores do que tudo que o Homem já conseguiu fazer no mundo material, no mundo físico. O Homem Ocidental, de modo particular, viria a abusar de tais Poderes, como os que podemos controlar, pois tudo com que ele se importa é o dinheiro. O Homem (os mais IMBECIS) Ocidental só sabe fazer duas perguntas: você pode provar? e… o que ganho com isso? Ele riu, com ar bastante juvenil, e acrescentou:
—Eu sempre me divirto muito, quando penso na vasta quantidade de mecanismo e aparelhagem que o Homem usa para enviar uma mensagem “sem fio” pelos oceanos. “Sem fios” é a última expressão que eles deviam usar, pois a aparelhagem consiste de muitas milhas de fios. Mas aqui, no Tibete, nossos lamas enviam mensagens telepáticas, sem qualquer aparelhagem. Entramos no plano astral e viajamos no espaço e no tempo, visitando outras partes do mundo, e outros mundos. Podemos levitar… erguer cargas imensas, pela aplicação de poderes que de um modo geral não são conhecidos. Nem todos os homens são puros, Lobsang, e tampouco o manto de um monge sempre encobre um homem santo. Pode haver um homem mau em uma lamaseria assim como um santo pode ser encontrado na prisão. Eu o fitei com certa perplexidade.
—Mas se todos os homens soubessem disso, por certo todos seriam bons, não é? — perguntei. O lama olhou para mim com pesar, ao responder:
—Nós mantemos o Conhecimento Secreto, para que ele continue secreto, a fim de que a Humanidade seja salvaguardada (DE SI PRÓPRIA). Muitos homens, em especial os do Ocidente, pensam apenas em dinheiro e no poder sobre os demais. Como foi previsto pelo Oráculo e outros, esta nossa terra será mais tarde invadida (o Tibete foi invadido pela China em 1950) e fisicamente conquistada por um culto estranho, um culto que não dedica qualquer pensamento ao homem comum, mas existe unicamente para aumentar o poder de ditadores, ditadores que escravizarão metade do mundo. Houve altos lamas que foram torturados até a morte pelos russos, porque não divulgavam conhecimentos proibidos. O homem comum, Lobsang, que tivesse repentinamente acesso ao conhecimento proibido, reagiria da seguinte maneira: em primeiro lugar, recearia o poder que adquirira. Depois, ocorrer-lhe-ia que tinha o meio de tornar-se mais rico, mais do que em seus sonhos mais tresloucados.
—Faria experiências, e o dinheiro lhe viria. Com poder e dinheiro cada vez maior, desejaria ainda mais dinheiro e mais poder. Um milionário jamais se satisfaz com um milhão, mas quer muitos milhões a mais! É dito que, nos não-evoluídos, o poder absoluto corrompe. O Conhecimento Oculto confere poder absoluto. Uma grande luz se fez para mim; eu sabia como o Tibete podia ser salvo! Saltando, agitado, exclamei:
—Nesse caso, o Tibete está salvo! O Conhecimento Oculto nos salvará da invasão! Meu guia fitava-me com compaixão.
—Não, Lobsang, — respondeu, com tristeza — nós não usamos os Poderes para coisas assim. O Tibete será perseguido, quase aniquilado, mas nos anos vindouros ele se levantará outra vez, tornando-se maior, mais puro. O país será purificado da escória, na fornalha da guerra, exatamente como, mais tarde, todo o mundo o será. Dito isso, dirigiu-me um olhar de esguelha.
—Tem de haver guerra, você sabe, Lobsang! — disse, falando baixo. — Se não houvesse guerras, a população do mundo tornar-se-ia grande demais. Se não houvesse guerras, não haveria pragas. As guerras e a doença regulam a população do mundo, e proporcionam oportunidades ao povo da Terra… e de outros mundos… para fazer o bem aos outros. Sempre haverá guerras, até que a população do mundo possa ser controlada de algum outro modo. Os gongos nos chamavam para o serviço noturno. Meu guia, o Lama Mingyar Dondup, pôs-se em pé.


—Venha, Lobsang, — disse — somos hóspedes aqui, e devemos demonstrar respeito aos nossos anfitriões, comparecendo ao serviço. Saímos da sala, passando ao pátio. Os gongos chamavam com insistência — e soavam por mais tempo do que teria ocorrido em Chakpori. Seguimos por nosso caminho, surpreendentemente devagar até o Templo. Eu estava pensando na lentidão de nossos passos, e ao olhar ao redor vi homens muito idosos, e os enfermos, andando com dificuldade pelo pátio, atrás de nós. Meu guia sussurrou-me:
—Seria uma cortesia, Lobsang, se você fosse para lá e se sentasse com aqueles chelas. Assentindo, dei a volta pelas paredes internas do Templo, até chegar ao ponto onde os cheias da Lamaseria do Oráculo do Estado estavam sentados. Eles me olharam com curiosidade, quando me sentei ao lado deles. De modo quase imperceptível, quando os Inspetores não estavam olhando, eles se aproximaram, até me cercarem.
—De onde vens? — perguntou um rapaz, que parecia ser o chefe.
—Chakpori, — respondi, em cochicho.
—Você é o camarada mandado por O Mais Precioso? — sussurrou outro.
—Sim — cochichei, em resposta —, fui mandado ver o Oráculo, ele me disse…
—SILÊNCIO! — berrou uma voz, por trás de mim. — Nem um som mais de vocês! Vi que o homenzarrão se afastava.
—Bolas! — disse o menino. — Não dê atenção a ele, o latido que tem é pior do que a mordida. Nesse exato instante o Oráculo do Estado e um Abade apareceram, por pequena porta lateral, e o serviço começou. Logo estávamos seguindo outra vez para fora. Em companhia dos outros, fui à cozinha, para encher novamente minha bolsa de couro com cevada, e obter chá. Não houve oportunidade para conversar; monges de todos os graus estavam ali, travando uma discussão final, antes de se recolherem para dormir. Segui para o quarto que me fora destinado, envolvi-me no manto e me deitei para dormir. O sono não veio depressa, porém. Fitei a escuridão purpúrea, pontilhada pelas lâmpadas de manteiga, de cor dourada.
Lá ao longe, os Himalaias eternos estendiam dedos rochosos para o céu, como em súplica aos Deuses do Mundo. Raios brancos e vívidos de luar rebrilhavam em meio às falhas das montanhas, desaparecendo e rebrilhando novamente, à medida que a lua subia no céu. Não havia qualquer brisa aquela noite, as bandeiras de oração pendiam inertes dos mastros. Uma nuvem pequena, quase um farrapo, flutuava brilhantemente sobre a Cidade de Lhasa. Eu me voltei, e imergi num sono sem sonhos. Às primeiras horas da manhã, despertei com um sobressalto de susto; dormira demais, e estaria atrasado para o serviço matutino. Pondo-me em pé com um salto, enverguei apressadamente o manto e parti para a porta. Em disparada pelo corredor deserto, cheguei ao pátio — e fui ter diretamente aos braços de um dos Homens de Kham.
—Aonde vais? — sussurrou ele, com ferocidade, enquanto me segurava com mãos de ferro.
—Ao serviço matutino, — respondi. — Devo ter dormido demais. Ele riu e me soltou.
—Oh! — disse. — Tu és um visitante. Aqui não existe serviço matutino. Volta, e vai dormir outra vez.
—Não há serviço matutino? — gritei. — Ora, todos têm serviço religioso de manhã! O monge-policial devia estar de bom humor, pois deu-me uma resposta educada:
—Nós temos homens idosos aqui, alguns que se acham enfermos, e por esse motivo dispensamos o serviço matutino. Vai e descansa um pouco em paz. Deu-me um tapa na cabeça, em gesto que para ele era gentil, e que a mim pareceu o ribombo e estremecimento de um trovão, empurrando-me de volta para o corredor. Voltando-se, retomou a caminhada pelo pátio, as passadas pesadas fazendo “bonk! bonk!”, o cacete pesado fazendo “thunk! thunk!” quando batia no chão, a cada dois passos. Segui em disparada pelo corredor, e em questão de minutos dormia outra vez. Mais tarde, naquele dia, fui apresentado ao Abade e a dois dos lamas superiores. Eles me interrogaram com atenção, fazendo perguntas a respeito de minha vida no lar, ou o que recordava de vidas anteriores, minha relação com meu guia, o Lama Mingyar Dondup. Finalmente, os três se puseram em pé, com esforço, seguindo rumo à porta.
—Venha — disse o último, voltando para mim o dedo dobrado. Espantado, andando como alguém ofuscado, segui com humildade. Eles prosseguiram lentamente, saindo pela porta, e andando com passos letárgicos pelo corredor. Eu os acompanhava, quase tropeçando em meus próprios pés, no esforço por andar devagar. Assim nos arrastamos, passando por quartos abertos onde trapas e chelas fitavam com curiosidade nossa passagem lenta. Senti as faces arderem de embaraço, por estar na “cauda” dessa procissão; à sua cabeça, o Abade seguia devagar, com a ajuda de dois bastões. Em seguida, vinham dois velhos lamas, tão decrépitos e encarquilhados que mal conseguiam acompanhar o Abade. E eu, fechando a retaguarda, quase não conseguia andar na mesma lentidão. Finalmente, chegamos a um pequeno umbral, em muralha distante. Paramos, enquanto o Abade procurava uma chave e resmungava baixinho.


Um dos lamas adiantou-se para ajudá-lo, e com o tempo uma porta foi aberta, com rangido de dobradiças em protesto. O Abade entrou, acompanhado pelo primeiro lama e depois o outro. Ninguém me disse coisa alguma, de modo que entrei também. Um velho lama fechou a porta, após eu ter entrado. À minha frente, havia uma mesa bastante comprida, cheia de objetos velhos e cobertos de poeira. Mantos antigos, antigas Rodas de Oração, velhas tigelas e fieiras variadas de Miçangas de Oração. Espalhadas sobre a mesa estavam algumas Caixas de Encanto, diversos outros objetos que, à primeira vista, eu não conseguia identificar.
—Hmmmm. Hmmmm. Venha cá, meu menino! — ordenou o Abade. Segui com relutância, e ele agarrou meu braço esquerdo, com a mão ossuda. A sensação que tive era como se houvesse sido agarrado por um esqueleto! -— Hmmmm. Hmmmm. Menino! Hmmmm. Qual destes objetos e artigos esteve em sua posse, durante uma vida passada, se é que há algum? Fez-me percorrer o comprimento da mesa, depois me voltou para o outro lado e disse: —Hmmmm. Mmmmm. Se você acha que algum artigo foi seu, Hmmmm, apanhe-o e Hmmmm, traga-o a mim. Sentou-se com esforço, parecendo não se interessar mais por minhas atividades. Os dois lamas sentaram-se com ele, e não disseram mais uma só palavra.
“Bem!” eu estava pensando. “Se os três velhos querem brincar assim… está bem, vou fazer o que desejam!” A psicometria, naturalmente, é a coisa mais simples de todas. Segui devagar, com a mão esquerda estendida de palma para baixo, sobre os diversos artigos. Com certos objetos, experimentei uma forma de comichão no centro da palma, e um leve estremecimento ou tremor que se estendia pelo braço. Apanhei uma Roda de Oração, uma tigela velha e surrada, e uma fieira de miçangas. Depois, repeti a viagem pelo lado da mesa comprida. Apenas um outro artigo fez com que a palma de minha mão comichasse e meu braço formigasse; um velho manto esfarrapado, na última etapa de deterioração. Era um manto açafrão de alto dignitário, a cor quase desfeita pela idade, o material apodrecido e transformando-se em pó ao contato.
Com cuidado, eu o recolhi, receando que se desintegrasse entre minhas mãos cuidadosas. Cautelosamente, levei-o ao velho Abade, depositando-o a seus pés e regressando para apanhar a Roda de Oração, a tigela em mau estado e a fieira de miçangas. Sem uma palavra, o Abade e os dois lamas examinaram os artigos e compararam certos sinais, ou marcas secretas, com os de um livro velho e negro que “o Abade tirara do manto. Por algum tempo, eles permaneceram sentados, olhando uns para os outros, as cabeças assentindo sobre pescoços encarquilhados, os cérebros antigos quase rangendo com o esforço por pensar.
—Harrumph! Arrrf! — resmungou o Abade, resfolegando como um iaque esgotado pelo trabalho. — Mmmmmnnn. É realmente ele. Hmmmn. Um feito notável. Mmmmm. Vá ao seu guia, o Lama Mingyar Dondup, meu rapaz, e Hmmm, diga a ele que ficaríamos honrados com sua presença. Você, meu filho, não precisa voltar. Harrumph! Arrrf! Eu me voltei e saí correndo da sala, satisfeito por estar livre daquelas múmias vivas, cuja presença ressecada estava tão distante da humanidade cálida do Lama Mingyar Dondup. Em disparada, ao passar por uma esquina, consegui deter-me a poucos centímetros de meu guia. Ele riu e disse:
—Oh! Não fique tão surpreso, eu também recebi a mensagem. . Dando-me um tapa amigo nas costas, apressou-se rumo à sala onde estavam o Abade e os dois velhos lamas. Eu segui para o pátio, e ali chutei uma ou duas pedras, ociosamente.
—Tu és o camarada cuja Encarnação está sendo Reconhecida? — perguntou uma voz, atrás de mim. Voltei-me e vi um chela que me fitava com atenção.

—Eu não sei o que eles estão fazendo — respondi. — Tudo que sei é que fui levado pelos corredores, para poder apanhar algumas de minhas coisas antigas. Qualquer um pode fazer isso! O menino riu, bonachão.
—Vocês, os homens do Chakpori, sabem o que fazem — disse —, ou não estariam naquela Lamaseria. Ouvi dizer que você foi alguém grande, em vida passada. Você deve ter sido, para que o próprio Oráculo lhe dedicasse meio dia. Deu de ombros, fingindo horror, e observou: —É melhor ter cuidado. Antes de saber o que está acontecendo, eles o terão Reconhecido, e feito de você um Abade. Depois, você não poderá brincar mais com outros homens de Chakpori. De uma porta na extremidade distante do pátio surgiu a forma de meu guia. Com rapidez, veio em nossa direção. O chela com quem eu estivera conversando fez mesura profunda, em saudação humilde. O lama sorriu para ele e falou com bondade, como sempre:

—Temos de seguir, Lobsang! — disse para mim. — Logo a noite cairá, e não queremos viajar pela escuridão. Juntos, seguimos para os estábulos, onde um monge-palafreneiro estava à espera, com nossos cavalos; Com relutância, montei e acompanhei meu guia na trilha pelos salgueiros. Sacolejávamos em silêncio, pois eu jamais conseguiria conversar de modo inteligente quando montado, uma vez que todas as minhas energias eram dedicadas a permanecer na sela. Para meu espanto, não voltamos para Chakpori, mas prosseguimos rumo à Potala. Devagar, os cavalos subiram a Estrada de Degraus. Por baixo de nós, o Vale já submergia nas sombras da noite. Com satisfação, desmontei, seguindo com pressa para a Potala, já minha conhecida, à procura de comida. Meu guia esperava por mim, quando fui para meu quarto após o jantar.
—Entre comigo, Lobsang, — ordenou. Entrei e, à convite dele, sentei-me. —Bem! — disse ele. — Você deve estar imaginando o que se passou.
—Oh! Conto ser Reconhecido como uma Encarnação! — respondi, desembaraçadamente. — Um dos homens e eu estivemos falando sobre isso, na Lamaseria do Oráculo do Estado, quando o senhor me chamou!
—Bem, isso é ótimo para você, — disse o Lama Mingyar Dondup. — Agora, precisamos de algum tempo para examinar as coisas. Você não precisa ir ao serviço desta noite. Sente-se de modo mais confortável e ouça, e não continue a me interromper. A maioria das pessoas vem a este mundo a fim de aprender as coisas — começou meu guia. — Outras vêm para que possam ajudar aos que necessitam, ou completar alguma tarefa altamente importante. Dedicou-me um olhar severo, para ter certeza de que eu prestava atenção, e prosseguiu:
—Muitas religiões falam de um Inferno, o lugar de castigo, ou de expiação pelos pecados da pessoa. O inferno é aqui, neste mundo. Nossa vida verdadeira é no Outro Mundo. Viemos aqui para aprender, pagar pelos erros que cometemos em vidas anteriores ou… como já disse… tentar a realização de alguma tarefa de alta importância. Você está aqui para executar uma tarefa relacionada com a aura humana. As suas “ferramentas” serão uma percepção psíquica excepcionalmente sensível, uma capacidade grandemente intensificada de ver a aura humana, e todo o conhecimento que lhe pudermos dar, com referência a todas as artes ocultas. O Mais Precioso decretou que todos os meios possíveis sejam usados para aumentar suas capacidades e talentos. O ensino direto, as experiências verdadeiras, o hipnotismo, vamos usar tudo para que você obtenha o máximo de conhecimento dentro do menor tempo possível.
—É o inferno, não há dúvida! — exclamei, tomado de tristeza. O lama riu de minha expressão.
—Mas este Inferno é apenas o degrau para uma vida muito melhor, — respondeu. — Aqui, conseguimos livrar-nos de algumas das faltas mais desprezíveis. Aqui, com alguns anos de vida na Terra, livramo-nos de faltas que poderão ter-nos perseguido no Outro Mundo, por faixas ilimitadas de tempo. Toda a vida neste mundo não passa de um piscar de olhos, em comparação à do Outro Mundo. A maioria das pessoas no Ocidente — prosseguiu — pensa que quando alguém “morre” pode ficar sentado em uma nuvem, tocando harpa. Outras julgam que quando alguém deixa este mundo, passando ao próximo, adquire um estado místico de inconsciência, e gostam da idéia. Ele riu, e prosseguiu:
—Se conseguíssemos fazê-los comprender, ao menos, que a vida após a morte é mais verdadeira do que qualquer coisa na Terra! Tudo, neste mundo, consiste de vibrações, as vibrações de todo o mundo… e tudo dentro do mundo… pode ser comparado a uma oitava de uma escala musical. Quando passamos ao Outro Lado da Morte, a “oitava” sobe mais na escala. Meu guia parou, tomou-me a mão e esfregou os nós de meus dedos no soalho.
—Isto, Lobsang, — disse — é pedra, as vibrações às quais chamamos pedra. Voltou a tomar minha mão e esfregou meus dedos em meu manto. —Isto — exclamou — é a vibração que indica a lã. Se subirmos com tudo a escala de vibrações, ainda assim mantemos os graus relativos de dureza e maciez. Assim, na Vida após a Morte, a verdadeira Vida, podemos possuir coisas, exatamente como neste mundo. Você compreendeu isso com clareza? — Perguntou. Era tudo obviamente claro, eu sabia essas coisas há muito tempo. O lama interrompeu meus pensamentos.
—Sim, sei que tudo isto é conhecimento comum aqui, mas se vocalizarmos esses “pensamentos impronunciados” poderemos torná-los mais claros em sua mente. Mais tarde — asseverou — você vai viajar para as terras do mundo ocidental. Lá, encontrará muitas dificuldades, provenientes das religiões ocidentais. Ele sorriu com certa tristeza, e observou:
—Os católicos nos chamam de pagãos. Em sua Bíblia, está escrito que “Cristo vagueou pelo deserto”. Em nossos registros, está revelado que Cristo peregrinou pela Índia, estudando as religiões indianas, e depois veio a Lhasa, estudando no Jo Kang, sob a direção dos nossos sacerdotes mais destacados da época. Cristo formulou uma boa religião, mas o catolicismo praticado hoje não é a religião ensinada por Cristo. Meu guia fitou-me com ar um tanto severo, afirmando:
—Eu sei que você fica um pouco entediado com isso, pensando que eu falo só por falar, mas eu viajei por todo o mundo ocidental, e é meu dever adverti-lo quanto ao que vai enfrentar. O melhor meio de fazer isso é falar com você sobre as religiões deles, pois sei que você tem uma memória eidética. Não pude deixar de corar, pois estivera realmente pensando: “Palavras em demasia!”. Lá fora, nos corredores, os monges seguiam em direção ao Templo, para o serviço noturno. Sobre o telhado os trombeteiros fitavam o Vale e emitiam as últimas notas do dia que terminava. Ali, à minha frente, meu guia, o Lama Mingyar Dondup, prosseguiu em sua preleção:
—Existem duas religiões básicas no Ocidente, porém são inúmeras as subdivisões. A religião judaica é antiga e tolerante. Você não encontrará problemas, não terá dificuldades causadas pelos judeus. Há séculos eles vêm sendo perseguidos, e têm grande simpatia e compreensão pelos outros. Os cristãos não se mostram tão tolerantes, a não ser nos domingos. Não vou dizer coisa alguma sobre as crenças individuais, porque você lerá sobre elas, mas vou-lhe dizer como as religiões começaram. “Nos primeiros dias de vida sobre a Terra — disse o lama — as pessoas se achavam, inicialmente, em grupos pequenos, tribos muito pequenas. Não havia leis, nenhum código de comportamento. A força era a lei única; uma tribo mais forte e feroz fazia a guerra contra as mais fracas. Ao correr do tempo, surgiu um homem mais forte e mais sábio. Ele compreendeu que sua tribo seria a mais forte, se fosse organizada. Fundou uma religião e um código de conduta.
“Crescei e multiplicai-vos”, ordenou, sabendo que quanto mais crianças nascessem, tanto mais forte sua tribo se tornaria.
“Honrai vosso pai e vossa mãe”, ordenou, sabendo que se desse autoridade aos pais sobre os filhos, teria autoridade sobre os primeiros. Sabendo, também, que se conseguisse convencer os filhos de suas obrigações para com os pais, seria mais fácil impor a disciplina.
“Não cometereis adultério”, trovejou o Profeta dessa época. Sua ordem verdadeira era que a tribo não devia ser “adulterada” com o sangue do membro de outra tribo, pois em casos assim as fidelidades ficariam divididas.
Com o correr do tempo, os sacerdotes haviam descoberto que havia alguns que nem sempre obedeciam aos ensinamentos religiosos. Depois de muito pensar, depois de muita discussão, esses sacerdotes prepararam um plano de recompensa e castigo. “Céu”, “Paraíso”, “Valhala”… podemos dar o nome que quisermos… para aqueles que obedeciam aos sacerdotes. O fogo do inferno e a condenação, com torturas infinitas, para quem desobedecesse.
—Quer dizer que o senhor se opõe às religiões organizadas no Ocidente? — perguntei.
—Não, certamente que não, — respondeu meu guia. — Há muitos que se sentem perdidos, a menos que possam sentir ou imaginar um Pai onisciente que os vigia, tendo um Anjo- Secretário pronto a anotar qualquer ato bom, bem como os atos maus! Nós somos Deus para as criaturas microscópicas que habitam em nossos corpos, e as criaturas ainda menores que habitam as moléculas dela! Quando à oração, Lobsang, você ouve com freqüência as orações das criaturas que existem em suas moléculas?
—Mas o senhor disse que a oração era eficaz! — retorqui, com algum espanto.
—Sim, Lobsang, a oração é muito eficaz, se orarmos para nosso próprio Eu Maior, a parte verdadeira de nós que está em outro mundo, a parte que controla nossos “cordões de fantoche”. A oração é muito eficaz, se obedecermos às regras simples e naturais que a tornam eficaz. Sorriu para mim, ao prosseguir. —O homem é um simples fragmento minúsculo, em um mundo conturbado. O homem só está a cômodo quando se sente seguro, em alguma forma de “Abraço Materno”. Para aqueles no Ocidente, sem preparo na arte de morrer, o último pensamento, o último grito, é “Mamãe!” Um homem inseguro de si mesmo, embora procure dar uma aparência de confiança, suga um charuto ou cigarro, exatamente como um bebê sugará uma chupeta. Os psicólogos concordam em que o hábito de fumar é apenas uma reversão aos traços da infância inicial, onde a criancinha extraia a nutrição e a confiança de sua mãe. A religião é um fator de reconforto. O conhecimento da verdade da vida… e da morte… é de reconforto ainda maior. Somos como a água, quando sobre a Terra; como o vapor, quando passamos pela “morte”; e voltamos a condensar-nos, formando água, quando renascemos mais uma vez neste mundo.
—Senhor! — exclamei. — Acha que os filhos não devem honrar os pais? Meu guia fitou-me, com certa surpresa.
—Ora, essa, Lobsang! Os filhos, naturalmente, devem respeitar os pais… enquanto os pais o merecerem. Os pais demasiadamente dominadores não devem ter licença de arruinar os filhos, porém, e um “filho” adulto certamente tem a primeira responsabilidade para com o cônjuge. Aos pais não deve ser permitido tiranizar e impor vontade aos filhos adultos. Permitir que os pais ajam assim é prejudicar tanto os mesmos quanto a si próprio. Isso cria uma dívida que os pais terão de pagar, em alguma outra vida.
Pensei nos meus pais. Meu pai severo e áspero, um pai que jamais tinha sido um “pai” para mim. Minha mãe, cujo pensamento principal era a vida social. Depois, pensei no Lama Mingyar Dondup, que era mais do que mãe e pai para mim, a única pessoa que me demonstrara bondade e amor, em todos os momentos. Um monge-mensageiro entrou apressadamente, fazendo profunda reverência.


—Honrado Senhor Mingyar, — disse, com respeito. — Recebi ordens de transmitir os respeitos e cumprimentos de O Mais Precioso e pedir que tenha a bondade de ir ter com Ele. Posso levá-lo a Ele, Senhor? Meu guia pôs-se em pé e acompanhou o mensageiro. Eu saí, subindo ao telhado da Potala. Pouco mais alta, a Lamaseria Médica de Chakpori se apresentava na escuridão da noite. A meu lado, uma Bandeira de Oração tremulava debilmente em seu mastro. De pé, numa janela próxima, vi um velho monge, ocupado em fazer girar sua Roda de Orações, cujo estrépito era um som alto no silêncio da noite. As estrelas se estendiam por cima, em procissão infinita, e eu fiquei imaginando se nós parecíamos assim aos olhos de alguma outra criatura, em alguma parte.
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