Prof. Dr. Oscar Luiz Brisolara
Criei-me num meio e numa cultura em que a morte e suas manifestações era, muitas vezes, banalizada. Havia hábitos e necessidades que estavam vinculados a processos de morte.
Esse era o tipo de animal que mais facilmente se criava. Eram também as maiores vítimas do processo todo. Era a mais abundante proteína de origem animal disponível naqueles lugares ermos de pessoas rudes e simples.
Geralmente, torcia-se-lhes o pescoço e se as jogava ao chão onde saltavam macabramente até a vida se lhes fugir lentamente. Quando ficassem imóveis, eram colocadas em uma bacia e água fervente era jogada sobre as penas. Isso facilitava a depenagem.
Depois, abriam-se-lhes as entranhas. Retiravam-se os intestinos. Do meio deles, colhia-se o fígado, a moela, o coração, que eram os chamados miúdos aproveitáveis para o consumo humano. Se houvesse ovos em processo de formação, também eram separados. Esses, eram dispostos numa cadeia, desde os menores, que eram apenas uma bolota de gema, até os maiores, que às vezes já estavam prontos com casca e tudo. A moela tinha de ser batida para soltar uma camada interna dura, que precisava ser removida.
Como as aves não possuem dentes, tudo o que elas ingerem é depositado no papo, uma espécie de estômago, onde os alimentos são amolecidos pela umidade.
Em seguida passam para a moela, uma espécie de triturador, com movimentos peristálticos contínuos. A ave engole pequenas pedras, conhecidas cientificamente como gastrolitos, que associados a enzimas específicas fazem a digestão de todos os alimentos para serem metabolizados pelo organismo do animal. Observei, muitas vezes, um fato curioso. Elas engoliam cortantes cacos de vidro. E eles eram expelidos nas fezes completamente arredondados, eliminadas todas as arestas afiadas. Isso se dá devido ao atrito com os gastrolitos e à alta temperatura interna da moela. Aliás, a temperatura interna normal do corpo da galinha é muito superior à temperatura do corpo humano. Varia entre 41,5 e 42,5 graus Cº.
Nesse processo de abate, muitas vezes as penas também são aproveitadas para confeccionar colchões, acolchoados e travesseiros, mormente em lugares que se caracterizem por baixas temperaturas ambientais. As penas são revestidas de uma camada oleosa que protege o corpo da ave da água das chuvas.
A criança que cresce nas regiões rurais acompanha esses rituais da morte desde a mais tenra infância. Isso diminui gradativamente a sensibilidade de suas reações diante de atos que se caracterizam pela barbárie. Havia mesmo crianças que brincavam com as aves enquanto elas se debatiam no estertor da morte, diante das mães que consideravam essas atitudes naturais. A maioria delas apreciava todo o processo de abertura e trinchamento do corpo do animal.
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